O trabalho portuário, a Lei 8630/93 e a continuidade da gestão portuária trabalhista

30/05/2011. Enviado por

Este artigo se refere ao trabalho portuário e a continuidade da gestão portuária trabalhista.

Em todos os canais onde se vislumbra o neoliberalismo encontramos o capital agindo de forma  agressiva em detrimento dos trabalhadores. Um exemplo emblemático dessa desproporção entre o capital e o trabalho é a República da China, que tem conseguido resultados extremos às custas de uma remuneração péssima ao setor laboral.

Todo esse neoliberalismo, essa globalização, esse link entre produção e bens  de  consumo  entrou  num  campo  de  competitividade  desenfreada, “estourando” diretamente nas costas dos trabalhadores em geral e, quando falamos em globalização, temos como referência principal os portos do mundo, que são em   realidade os instrumentos que materializam objetivamente essa distribuição e logística de produtos.

Todavia, no que se refere ao trabalho portuário; aos poderes constituídos nesta federação (art. 2º da CF/88); ministérios específicos e a constituição, temos  o  trabalhador  portuário  como  categoria diferenciada,  sujeita  a princípios  como  o  indubio  pro  operario [1], o  Princípio  da  Proteção  do Emprego,  as  regras  de  hipossuficiência, os  mecanismos  e  instrumentos coletivos  que  tentam,  de   forma muito  tímida,  acalmar  esse  apetite capitalista.

Não se pode olvidar, que a implementação de novos terminais e, portanto, da  instauração  de  uma  competitividade  majorada  entre  portos,  que  se apresentam cada vez mais modernos, não deve retirar das médias salariais dos trabalhadores portuários as suas diferenças positivas e lucros.

Ademais, nos casos de concorrência desleal, dumping [2], ou até mesmo de tomada integral de mercado  de operação portuária, uns em desfavor de outros, os órgãos incumbidos em fiscalizar as práticas predatórias e desleais devem ser provocados, para que ao final, a justificativa do patronal não seja a de que não está mais suportando a concorrência, tentando assim, baixar custos  de  mão-de-obra;    sendo    que   ao  invés    deverá  acionar  órgãos fiscalizatórios e aprimorar o seu  desempenho administrativo. Não deve a classe patronal querer induzir em erro a sociedade e as pessoas  do meio portuário,  que  atuam  nos  desdobramentos  da  operação,  sob  a  pálida justificativa de que  os custos de outros terminais estão a diminuir e que assim deve também a redução de salário ser um fato – ledo engano.

Se formos focar toda a questão portuária, em metas de produção a serem alcançadas,  no  que   diferem  entre  si  os  terminais  portuários  em  sua operação?    A    resposta    é    clara:    Diferenciam-se    em    tecnologia,    em automação.  Quem  possuir  a  maior  abrangência  tecnológica  e  o  mais modernos equipamentos eliminará custos e se tornará ainda mais atrativo ao mercado. Só que a diminuição de custos nestes casos também representa ao   trabalho  portuário  a  diminuição  de  postos  de  trabalho.  Portanto, otimização de custos para o patronal não deve andar separada do conceito que de Proteção do Emprego, princípio que por sua vez protege o trabalho da automação (artigo. 7º, XXVII, da CF/88).

Sobre o princípio da proteção, ensina Maurício Godinho Delgado:

[...] que o Direito do Trabalho estrutura em seu interior, com suas regras, institutos, princípios e presunções próprias, uma teia de proteção    à parte    hipossuficiente    na relação empregatícia - o obreiro-, visando retificar (ou  atenuar), no plano  jurídico,  o  desequilíbrio  inerente  ao  plano fático  do contrato de  trabalho. O princípio tutelar influi em todos os segmentos do  Direito  Individual do Trabalho, influindo  na própria perspectiva desse ramo ao construir-se, desenvolver- se e atuar como direito. Efetivamente, há ampla predominância nesse ramo jurídico especializado de regras essencialmente  protetivas, tutelares  da  vontade  e  interesse obreiros; seus princípios são fundamentalmente favoráveis ao trabalhador; suas  presunções  são  elaboradas  em  vista  do alcance da mesma vantagem jurídica retificadora da diferenciação social prática. Na verdade, pode-se afirmar que sem  a  idéia  protetivo-retificadora,  o  Direito  Individual  do Trabalho não se justificaria histórica e cientificamente [3].

A Lei  8.630/93,  que  por  sua  vez  também  é  conhecida  como  Lei  de Modernização dos Portos, não modernizou nada no que tange a automação, pois não traz em seu conteúdo regramento específico para a proteção dos trabalhadores contra essas novas modalidades e equipamentos, porém, o próprio art. 29 da Lei informa que a remuneração, a definição das funções, a composição dos termos e as demais condições do trabalho avulso serão objeto de negociação entre as entidades representativas dos trabalhadores portuários avulsos e dos operadores portuários.

Portanto, não é necessário fazer algum esforço interpretativo-jurídico para se concluir que a cada novo  equipamento inserido na operação portuária, quer  seja  em  área  de  porto  organizado  (onde  nesses   casos  há  uma autoridade  portuária  e  um  OGMO),  quer  seja  fora  dela,  os  setores fiscalizatórios das mais variadas áreas (Ministério do Trabalho, Ministério Público do Trabalho, CADE [4], Conselho de  Supervisão Portuária) devem ser informados – pois os reflexos ocorrem em todos os terminais em geral.

Mutatis mutandis, é quase como se operadores portuários patronais fossem pescadores, alguns usam  redes que pegam peixes menores; outros usam redes que pescam somente os peixes maiores, ao final quem terá recolhido mais peixes?

Há que se respeitar o defeso e a continuidade das espécies, não é  mesmo? Da mesma forma, o patronal deverá respeitar o limite de quantidade de postos de trabalho  nos  terminais privativos e portos pelo Brasil  afora,  pois  não  estamos  na  Europa  (onde  as  regras  são  outras), estamos  em  um  país  regido  por  uma  Constituição  Federal,  por  Leis Trabalhistas,  pelo Princípio da Proteção do Emprego, pelo in dúbio pro operario e demais regras preventivas que protegem os obreiros, em tese, do capitalismo selvagem – somos um país republicano, e os portos são  da União.  Essas  regras  acima  citadas  deveriam  ser  colocadas  em  prática definitivamente, com certeza – cobrando ainda o regramento específico da Convenção 137 da OIT.

Por fim, caberá as entidades sindicais (federais e regionais) e ao suporte técnico  existente  nessas  áreas  trabalhistas  e  portuárias  a  manutenção  e vigilância constante a partir de agora das regras que manterão, ou não, os postos de trabalhos, sob pena de que o trabalhador portuário passe a ser apenas   mais  uma  espécie  que  foi  extinta  no  oceano  do  capitalismo intolerante, gerador de pobrezas  progressivas dentro de nossa sociedade contemporânea.

Referências:

[1]  Arnaldo Sussekind em seu livro “Instituições de Direito do Trabalho”, ed. Ltr, 11 ed. p. 129, leciona que o “(...) princípio ‘in dubio pro operario’, que aconselha o intérprete a escolher, entre duas ou mais interpretações viáveis, a mais favorável ao trabalhador, desde que não afronte a nítida manifestação do legislador, nem se trate de matéria probatória”.

[2]   Dumping é uma prática comercial que consiste em uma ou mais empresas de um país venderem seus produtos por preços extraordinariamente abaixo de seu valor justo para outro país (preço que geralmente se considera menor do que se cobra pelo produto dentro do país exportador), por um  tempo, visando prejudicar  e  eliminar  os  fabricantes  de  produtos  similares  concorrentes  no  local,  passando  então  a dominar o mercado e impondo preços altos.

[3] DELGADO, 2004, p.197-198

[4]  CADE - Conselho Administrativo de Defesa Econômica, autarquia vinculada ao Ministério da Justiça
Brasileiro / www.cade.gov.br

Assuntos: Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS), Direito do Trabalho, Direito Processual do Trabalho, Direitos trabalhistas, Trabalho, Vinculo empregatício

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