Quando nasce para o autor o direito de ação nos processos civil e penal

06/01/2014. Enviado por

Quais os momentos em que surgem os direitos subjetivos públicos de ação nos processos civil e penal ? Breve escorço sobre a matéria.

O direito subjetivo público de ação não é um direito substancial ou material no sentido próprio daquela expressão, no dizer de Luiz Guilherme Marinoni é um direito fundamental, declarado na Constituição da República, no art. 5º, inciso XXV, através do direito-garantia da inafastabilidade/indeclinabilidade/ubiquidade da jurisdição-, que se constitui em princípio constitucional, e para Rodolfo de Camargo Mancuso é uma cláusula de reserva-, que ao lado do devido processo legal (“due process of law” - art. 5º, inciso LIV, da Carta Magna), princípio regente, segundo Guilherme de Souza Nucci, e também direito-garantia fundamental humano do cidadão, nascido da faculdade de agir (jusestfacultasagendi) que tem o titular de um direito material. Neste sentido, o direito subjetivo público de ação é um direito humano básico, pois quando o Estado tomou para si a incumbência de dizer o direito, aboliu a Lei do Talião (“Olho por olho, dente por dente”). Ou seja, não mais abarca, o direito, a vingança privada, constituindo-se em crime o exercício arbitrário das próprias razões (nomemjuris do crime), previsto no art. 345, do Código Penal (Decreto-lei 2.848/40), idest, predeterminam os preceitos primário e o secundário do referido artigo que “fazer justiça pelas próprias mãos, para satisfazer pretensão, embora legítima, salvo quando a lei o permite: pena – detenção, de 15 (quinze) dias a 1 (um) mês, ou multa, além da pena correspondente à violência”.Ora, exceção e excludente da ilicitude, pelo art. 23, inciso III, do Decreto-lei nº 2.848/40 (Código Penal), é o desforço imediato para defesa da posse, exempligratia, previsto no art. 1.210, §1º, da Lei nº 10.406/02 (Código Civil de 2002).

Ora, se somente ao Estado-juiz compete dizer o direito aplicável, através da provocação do Poder Judiciário, na pretensão deduzida em juízo competente para tanto, este só age quando provocado, no caso do processo civil, ne procedat judex ex officio, nemo judex sine actore, é o que decorre da leitura dos arts. 2º, 128 e 460, do Código de Processo Civil. Os adágios, em epígrafe, tem por exceção a instauração do processo de inventário, previsto no art. 989, da Lei nº 5.869/73 (Código de Processo Civil).

Mas, quando, especificamente, nasce para o titular do direito de ação, o direito subjetivo público de propor a ação ? No caso do direito processual civil, topograficamente mal disposto no art. 189, da Lei nº 10.406/02 prescreve o referido art. o princípio da actio nata. A meu ver, a lei civil é quem deve prescrever quando nasce o direito subjetivo público de ação, pois é ela quem preceitua os direitos objetivos que violados se tornam subjetivos através da descrição, do comportamento humano empírico, hipotética e abstratamente, da norma, para a correspondência/subsunção à fattispecie. Contudo, como o direito de ação não se confunda, muito embora, com o direito substancial, este é quem prescreve as técnicas processuais adequadas ao exercício daquela faculdade (tutela dos direitos) de modo tempestivo (art. 5º, inciso LXXVIII, da Constituição da República que declara o princípio-garantia da razoável duração do processo), no dizer de Luiz Guilherme Marinoni. Logo, não é de todo errônea a doutrina segundo a qual o princípio da actio nata esteja mal disposto, pois o direito subjetivo público de ação é um direito básico previsto fundamentalmente na Carta Magna, mas toca ao processo. Matéria processual, pois.

O art. 189, da Lei nº 10.406/02 diz “violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual se extingue, pela prescrição, nos prazos a que aludem os arts. 205 e 206”. A pretensão não se confunde com o direito de ação. Pois o direito subjetivo remanesce, embora fulminada pela prescrição a pretensão. Se faltar qualquer uma das condições da ação, quais sejam, a possibilidade jurídica do pedido, a legitimidade ad causam e o interesse de agir, o autor será carecedor de ação e o direito subjetivo público de ação, embora remanesça, dever-se-á julgar extinto o processo sem resolução do mérito (art. 267, inciso VI, da Lei nº 5.869/73). Logo, o princípio da actio nata, em nosso ordenamento jurídico, tornou-se princípio implícito ou explícito? A meu ver implícito. Senão, vejamos!

Este princípio, antigamente disposto no art. 75, do revelho Código de 1916 (Lei nº 3.071/16), que dizia que “a todo direito corresponde uma ação que o assegura”, muito “criticado” pela doutrina processualística, que vem desde os romanos, preceitua que enquanto não nascida a ação, não corre prescrição (actione non natae, non praescribitur) que nasce da violação de um direito já adquirido pelo seu titular de forma incondicional. A prescrição, para Teresa Arruda Alvim Wambier, não é da ação, como preleciona uma corrente minoritária da doutrina nacional. Ensina a referida doutrinadora, citando Agnelo Amorim Filho, que “o novo Código Civil optou claramente pela orientação segundo a qual a prescrição atinge a pretensão, e não o próprio direito subjetivo (material). Assim, embora atingido pela prescrição, nem por isso deixará de existir, materialmente, o direito”. O que prescreve, portanto, é a pretensão de direito material, pois o direito subjetivo pode permanecer. Haja vista poder-se invocar a prescrição ou, como matéria de ordem pública que é, após o advento da reforma do §5º, do art. 219, da Lei nº 5.869/73, por meio da edição da Lei nº 11.232/06, ser declarada de ofício por sentença que resolve o mérito da ação (art. 269, inciso IV, da Lei nº 5.869/73).

No que tange à pretensão punitiva estatal, o jus puniendi estatal e o jus persequendi, sendo deste titular o Ministério Público, órgão precipuamente acusador, para Guilherme de Souza Nucci “o poder-dever de punir estatal nasce com o cometimento do crime; antes não existe”. Não existindo na legislação penal e processual penal em vigor um dispositivo que açambarque o momento que nasce para o titular do jus persequendi o direito de ação penal pública previsto no art. 129, inciso I, da Constituição da República.

Ouso, todavia, divergir do doutrinador, pois o direito de ação penal pública nasce para o seu titular, no caso em tela, o Ministério Público, quando a notitia criminis chega ao conhecimento do titular da ação, por meio do Inquérito Policial, quando o indiciado não vê o Inquérito Policial sendo trancado por força da ordem do juiz, art. 18, do Código de Processo Penal (Lei nº 3.689/41) ou quando o Ministério Público toma conhecimento por outros elementos de prova, não estando adstrito aos autos do Inquérito Policial, ex vi do disposto nos arts. 12 e 27, do Código de Processo Penal, este art. assim preceitua: “qualquer pessoa do povo pode provocar a iniciativa do Ministério Público, bastando o fornecimento, por escrito, informações sobre o fato e sua autoria e indicando o tempo e o lugar e os elementos de convicção”. Notadamente, na Ação Penal Pública incondicionada. Para esta não é imprescindível a instauração do Inquérito Policial. Creio que nas ações penais públicas condicionada à representação e à requisição do Ministro da Justiça também não são imprescindíveis.

No que pertine a Ação Penal Privada, cuja petição inicial é a queixa, o disposto no art. 19, do Código de Processo Penal, que nos crimes em que não couber ação pública, os autos do inquérito serão remetidos ao juízo competente, onde aguardarão a iniciativa do ofendido ou de seu representante legal, ou serão entregues ao requerente, se o pedir, mediante traslado, por força do art. 12, do mesmo Diploma Legislativo, o Inquérito Policial sempre servirá de base à queixa.

Mas não parece muito acertada a referida doutrina, concordando com a doutrina de Guilherme de Souza Nucci, o Inquérito Policial e a colheita de provas fora deste, são apenas formas para dar legitimidade interna ao jus persequendi, tendo em vista que, nestes elementos de prova, encontram-se perfilhados os dia e hora em que ocorreu o delito, por força do disposto nos arts. 27 e 41, do Código de Processo Penal. Ademais o princípio da oficialidade, princípio processual penal implícito, nos conduz a este entendimento, vez que a polícia investigativa tem o munus publicum de iniciar aquele procedimento administrativo inquisitorial de acordo com o disposto no art. 6º, do Código de Processo Penal. Inclusive com ordem da autoridade judiciária (arts. 17 e 18, do Código de Processo Penal).

 

Bibliografia

Técnica Processual e Tutela dos Direitos – MARINONI, Luiz Guilherme

Princípios Constitucionais Penais e Processuais Penais – NUCCI, Guilherme de Souza

Nulidades do Processo e da Sentença – WAMBIER, Teresa Arruda Alvim

A Resolução dos Conflitos e a Função Judicial no contemporâneo Estado de Direito – MANCUSO, Rodolfo de Camargo

 

Por KARLA CHRISTINA FARIA DE ALMEIDA, advogada.

 

Assuntos: Criminal, Direito Civil, Direito Penal, Direito processual civil, Direito processual penal, Prazo para prescrição

Comentários


Conteúdo Relacionado

Fale com advogados agora


Compartilhe com seus amigos

Compartilhar no Facebook Compartilhar no Twitter Compartilhar no Google+