A OIT e a Aplicação Normativa de Suas Regras nas Relações Trabalhistas Portuárias Brasileiras

22/08/2011. Enviado por

O artigo em comento trata a respeito da OIT e a aplicação normativa de suas regras nas relações trabalhistas portuárias brasileiras.

I) A OIT está sediada em Genebra, mas as suas normas estão em vigor aqui e deveriam ser mencionadas sempre que possível, nas relações trabalhistas portuárias e em normas regulamentares das autoridades competentes.

II) Agora, pergunta-se: os postos de trabalho portuário, cujas nomenclaturas existem na Lei 8.630/93 devem ser protegidos como instituto jurídico, como garantia ao emprego e renda, conforme reza a Constituição da República de 1988, ou devem ser simplesmente lançados e tirados da mão das comunidades que rodeiam os portos e terminais instalados em todo o país e que durante anos retiraram deles o seu real desenvolvimento e sustento?

Embora distante, a OIT existe sim, sua sede é em Genebra e suas normas são total e prontamente aplicáveis no Brasil, pois o Decreto 29/93, foi promulgado pelo Presidente do Congresso Nacional e a Convenção 137 da OIT foi objetivamente ratificada por Decreto Presidencial.

Por sua vez, Genebra é uma cidade da Suíça, localizada a oeste do país, sendo sua segunda maior cidade, atrás apenas de Zurique. É depois de Nova Iorque, o centro mais importante da diplomacia e da cooperação internacional em razão da presença de inúmeras Organizações Internacionais, incluindo a sede de muitas das agências das Nações Unidas e da Cruz Vermelha. É por isso também conhecida como "Capital da Paz" e é nela também onde está sediada a OIT ou em inglês ILO, International Labour Organization (www.ilo.org).

Com relação à aplicação das regras da OIT no país, asseveramos isso com a consciência de que esta informação é do conhecimento de todos os líderes sindicais portuários do país, mas nem sempre os trabalhadores das bases sabem da situação jurídica e de vinculação obrigatória que as normas da OIT sujeitam a classe patronal aqui no Brasil.

É necessário lembrar que o sistema de produção legislativa no Brasil, em âmbito federal, é bicameral, pois em Brasília temos a Câmara de Deputados e o Senado Federal; diferentemente ocorre nos municípios que, por suas vezes, tem no Poder Legislativo atuação de forma unicameral, somente com a câmara de Vereadores.

Importante destacar, também, que o presidente do Senado Federal é quem atua como presidente do Congresso Nacional (que é a união da Câmara dos Deputados e Senado), e a este é dada também a incumbência de promulgar Leis, tornado-as válidas no âmbito nacional.

É o que ocorre com a norma que tornou obrigatória, já num primeiro momento, a análise da Convenção 137 e da Recomendação 145 da Organização Internacional do Trabalho - OIT, quanto às negociações e demandas trabalhistas que ocorrem em nosso país. Tal norma, além de ser um documento histórico e valoroso para trabalhadores portuários do Brasil, possui eficácia erga omnes (contra todos) nas tratativas do setor portuário. Veja-se:

Faço saber que o CONGRESSO NACIONAL aprovou, e eu, HUMBERTO LUCENA, Presidente do Senado Federal, nos termos do art. 48, item 28, do Regimento Interno, promulgo o seguinte:

DECRETO LEGISLATIVO N° 29, DE 1993

Aprova os textos da Convenção n° 137 e da Recomendação n° 145, da Organização Internacional do Trabalho, relativas às Repercussões Sociais dos Novos Métodos de Processamento de Carga nos Portos, adotadas em Genebra, em 25 de junho de 1973, durante a 58ª Sessão da Conferência Internacional do Trabalho.

O CONGRESSO NACIONAL decreta:

Art. 1° São aprovados os textos da Convenção n° 137 e da Recomendação n° 145, da Organização Internacional do Trabalho, relativas às Repercussões Sociais dos novos Métodos de Processamento de Carga nos Portos, adotadas em Genebra, em 25 de junho de 1973, durante a 58ª Sessão da Conferência Internacional do Trabalho.

Art. 2° Este decreto legislativo entra em vigor na data de sua publicação.

Senado Federal, 22 de dezembro de 1993.

Assim, verificou-se que o Presidente do Senado, que também age simultaneamente como Presidente do Congresso Nacional, promulgou norma que o Congresso Nacional Decretou (aprovação dos textos da OIT). Agindo assim, o Congresso Nacional atuou com intenções de proteção aos hipossuficientes nas relações trabalhistas nos portos (portuários), com visão democrática e garantidora dos direitos trabalhistas dos trabalhadores portuários, nos moldes existentes e condizentes com a Constituição da República de 1988.

Posteriormente e, somente após o advento da Lei 8.630/93, o Presidente da República Fernando Henrique Cardoso, de maneira objetiva, como em boa parte de sua atuação presidencial, que sempre foi mais técnica do que populista, decretou:

DECRETO Nº 1.574, DE 31 DE JULHO DE 1995

Promulga a convenção nº 137, da Organização Internacional do Trabalho, sobre as Repercussões Sociais dos Novos Métodos de Manipulação de Cargos nos Portos, assinada em Genebra, em 27 de junho de 1973.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe confere o art. 84, inciso VIII, da Constituição, e

Considerando que a Convenção nº 137, da Organização Internacional do Trabalho, sobre as Repercussões Sociais dos Métodos de Manipulação de Cargas nos Portos, foi assinada em Genebra, em 27 de junho de 1973;

Considerando que a Convenção ora promulgada foi oportunamente submetida ao Congresso Nacional, que a aprovou por meio do Decreto Legislativo nº 29, de 22 de dezembro de 1993, publicado no Diário Oficial da União de 23 de dezembro de 1993;

Considerando que a Convenção em tela entrou em vigor internacional em 24 de julho de 1975;

Considerando que o Governo brasileiro depositou a Carta de Ratificação do instrumento multilateral em epígrafe em 12 de agosto de 1994, e que o mesmo passará a vigorar, para o Brasil, em 12 de agosto de 1995, na forma de seu artigo 9,

DECRETA:

Art. 1º A Convenção nº 137, da Organização Internacional do Trabalho, sobre as Repercussões Sociais dos Novos Métodos de Manipulação de Cargas nos Portos, assinada em Genebra, em 27 de junho de 1973, apensa por cópia a este Decreto, deverá ser cumprida tão inteiramente como nela se contém.

Art. 2º O presente Decreto entra em vigor na data de sua publicação.

Brasília, em 31 de julho de 1995; 174º da Independência e 107º da República.

FERNANDO HENRIQUE CARDOSO

E assim, ratificou-se, para apoio aos trabalhadores da área portuária, a Convenção 137 da OIT, nos estritos moldes do art. 1º acima citado, não se devendo esquecer o seguinte apontamento do Decreto do Excelentíssimo Presidente Fernando Henrique que, a Convenção 137 deverá ser cumprida no Brasil “tão inteiramente como nela se contém”.

É importante destacar, que muitas das atuações legislativas (Congresso Nacional) e regulamentares (leia-se ANTAQ) na área portuária seguem rumo natural de especialização da norma, porém, de forma muito lenta com relação à modernização, globalização e nova ordem capitalista e ceifadora de postos de trabalho dos portuários.

Algo realmente contundente em prol do trabalho portuário é sempre muito raro de se encontrar no âmbito legislativo, no campo acadêmico-jurídico e, em outras palavras, a ratificação da Convenção 137 da OIT demorou a chegar; mas que bom que está aí e não deve ser esquecida. E atenção para o que se destaca nas considerações iniciais da Convenção 137 da OIT, que em sua introdução diz:

Considerando que os portuários deveriam beneficiar-se das vantagens que representam os novos métodos de processamento de carga e que, por conseguinte, o estudo e a introdução desses métodos deveriam ser acompanhados da elaboração e da adoção de disposições, tendo por finalidade a melhoria duradoura de sua situação, por meios como a regularização do emprego, a estabilização da renda e por outras medidas relativas à condições de vida e de trabalho dos interessados e á segurança e higiene do trabalho portuário;

Deveriam sim! Ora, a Convenção 137 diz (e ela é Lei) que os portuários deveriam se beneficiar dos novos métodos de processamento de cargas; e não ao contrário. Todavia, o que vem ocorrendo dia sim e outro também é o esgotamento dos postos de trabalho, o espancamento dos salários com a justificativa pífia e oportunista do maquinário mais moderno do operador portuário concorrente e sem a abertura de novas vagas na área portuária, quiçá por ser mais vantajoso para taxas de operação, atracação e de logística da classe patronal? Abnegado TPA.

Questionam ainda a formação estudantil do trabalhador portuário com relação ao salário que o mesmo recebe oriundo da movimentação da carga (oras, essa carga é globalizada e seu salário deve ser bom e condizente com a importância do que se está transportando às escondidas dentro de um contâiner – salário bem pago da mesma forma que ocorre em outros países portuários pelos quais a carga passa – insista-se: globalização e carga globalizada). Essas alegações contra os trabalhadores portuários, enfim... Tudo oportunismo!

Agora, pergunta-se: os postos de trabalho portuário, cujas nomenclaturas existem na Lei 8.630/93 devem ser protegidos como instituto jurídico, como garantia ao emprego e renda, conforme reza a Constituição da República de 1988, ou devem ser simplesmente lançados e tirados da mão das comunidades que rodeiam os portos e terminais instalados em todo o país e que durante anos retiraram deles o seu real desenvolvimento e sustento?

Ademais, como já citamos em outros artigos, a questão voltada à existência de uma área de porto organizado está ligada direta e verdadeiramente a um estudo técnico realizado visando à garantia de qualidade de vida dos cidadãos que residem e tem sua comunidade desenvolvida pelas atividades do porto de sua localidade.

Após o estudo técnico por uma comissão criada por Lei, são elaborados relatórios e pareceres sugerindo a criação de uma área de porto organizado, protetiva de postos de trabalho e garantias aos portuários de determinada comunidade (reserva legal, constitucional, válida e democrática).

Se retirarem postos de trabalho de membros das comunidades próximas aos portos, esses valores e riquezas serão repassados e retirados diretamente da mão do povo para a mão do empresariado e será agregado ao lucro deste, que muitas vezes, sequer é representante de interesses nacionais, regionais ou locais. Há a possibilidade real do surgimento de verdadeiros bolsões de pobreza nas cidades portuárias.

Arrematando o que já disse Castro Jr. “não se deve tomar como certa, como única opção, o corte de vagas como a principal feição do processo de mudança[1].

Voltando-se novamente para a regra da OIT, mais especificamente a Convenção 137, é de evidência solar que a intenção do regramento foi a de adaptar o mercado de trabalho à modernização e mesmo assim preservar os direitos dos trabalhadores e os postos de trabalho, que são em realidade da comunidade e não dos donos dos terminais e das empresas arrendatárias. O concurso público para o trabalho portuário está aí para comprovar esta assertiva.

Inclusive, para detalharmos mais este aspecto (manutenção dos postos de trabalho portuário), temos como certo que a diminuição destes postos deve obedecer fielmente às regras de segurança no trabalho e não as regras do capitalismo e, ainda, respeitar a proteção contra a mecanização existente na Constituição da República de 1988, e sempre, repiso, sempre por intermédio de Convenção Coletiva, caso contrário será alteração unilateral, nula e ilegal.

Assim, caso a classe dos trabalhadores não queira mais negociar postos de trabalho, poderá simplesmente optar por repasse dos índices e valores econômicos, pois acordos e convenções coletivas de trabalho são bilaterais, mútuos, sinalagmáticos, em outras palavras, como diz o dito popular: quando um não quer dois não brigam.

Se tivermos que substituir todos por máquinas, num futuro não muito distante, não haverá mais capital circulando no comércio e na sociedade local e isso irá com certeza desestabilizar o mercado, quem dirá em regiões que se desenvolveram exclusivamente do porto desde sempre e que não possuem outro setor para gerar riquezas.

Por fim, em 1973 a Convenção 137 da OIT foi assinada em Genebra, tardiamente foi promulgada no Brasil pelo Congresso Nacional em 1993, posteriormente, mesmo com as manifestações contrárias do Ministério do Trabalho à época (que sustentava as técnicas rudimentares de manipulação das cargas), foi ratificada pelo Presidente da República em 1995 e ainda hoje a Convenção 137 da OIT é permeada por uma nuvem de dúvidas e camuflagens patronais sobre sua aplicação, mas ela está aí, vigente e forte, necessária para o equilíbrio econômico, só temos é que lembrá-la, levá-la no bolso mesmo e aplicá-la, sem que precisemos ter que viajar até Genebra pra saber da sua existência.


[1] CASTRO JR., Osvaldo Agripino de. In Temas de Direito de Comércio Internacional. Florianópolis: OAB/SC, 2005, pg. 172

Assuntos: Benefícios trabalhistas, Contrato de trabalho, Direito do Trabalho, Direito Processual do Trabalho, Direitos trabalhistas, Trabalho

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