Da teoria da relativização da regra de incompensabilidade de pensão alimentícia

27/06/2013. Enviado por

Apresentar os requisitos necessários e alguns posicionamentos jurisprudenciais no que tange a teoria da relativização da incompensabilidade de pensão alimentícia.

O Código Civil em seus artigos 373, inciso II e 1.707, prevê a impossibilidade da compensabilidade de alimentos, principalmente para os casos de débitos de mesma origem, a saber:

“Art. 373. A diferença de causa nas dívidas não impede a compensação, exceto:

I - se provier de esbulho, furto ou roubo;

II - se uma se originar de comodato, depósito ou alimentos;

(...)

Art. 1.707. Pode o credor não exercer, porém lhe é vedado renunciar o direito a alimentos, sendo o respectivo crédito insuscetível de cessão, compensação ou penhora.

Atualmente tanto a doutrina como a jurisprudência, tem permitido a relativização desta regra, baseando-se nos princípios da razoabilidade e do bom sendo do julgador na análise do caso concreto, como muito bem narrado na jurisprudência pelo Desembargador Flavio Rostirola, na Apelação Cível nº 2009.01.1.117504-8, de Brasília:

“a toda evidência, deve-se ter um juízo de razoabilidade e bom senso como diretrizes para a análise da compensação postulada, razão pela qual a doutrina e a jurisprudência tem se inclinado para a relativização da regra da incompensabilidade de alimentos descrita nos artigos 373, II, e 1.707 do Código Civil, principalmente para o caso de débitos de mesma origem.” (grifou-se)

Para que seja possível a compensação da obrigação alimentar é fundamental a ocorrência de certos pressupostos, primeiramente as dívidas que se pretende compensar devem ter caráter nitidamente alimentar, como gastos com vestuários, colégio, plano de saúde e transporte escolar, ou seja, devem compor a pensão alimentícia previamente fixada. O alimentante deverá demonstrar a excepcionalidade do caso, o motivo que o fez pagar os valores de forma in natura, e por fim, o alimentado não pode experimentar um acréscimo patrimonial em detrimento do alimentante, sem uma causa que o justifique enriquecimento sem causa.

Este é o atual entendimento do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, nos casos de pagamentos feitos in natura destinados exclusivamente a alimentos:

FAMÍLIA. EXECUÇÃO DE ALIMENTOS. VERBA FIXADA EM SALÁRIOS MÍNIMOS. PARTE DO PAGAMENTO IN NATURA.[...] ALIMENTOS. POSSIBILIDADE DE ABATIMENTO, DA INTEGRALIDADE DO VALOR, DOS GASTOS COM LAZER, VESTUÁRIO, ALIMENTAÇÃO, TRANSPORTE, ESCOLA, SAÚDE, HIGIENE E MORADIA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. Não há falar em julgamento ultra petita quando a decisão admite o caráter alimentar de determinadas verbas pagas in natura pelo devedor, em detrimento de outras, anuídas pelas credoras, porque, tratando-se de alimentos, está-se diante de matéria de ordem pública. (Agravo de Instrumento n. 2006.020867-3, de Capital. Relator: Luiz Carlos Freyesleben. Juiz Prolator: Naiara Brancher. Órgão Julgador: Segunda Câmara de Direito Civil. Data: 22/02/2008) (grifou-se)

APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO DE ALIMENTOS. RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO VISANDO IMPEDIR A COMPENSAÇÃO DO DÉBITO ALIMENTAR COM O VALOR PAGO À UNIMED. POSSIBILIDADE DE PARTE DO PAGAMENTO IN NATURA. ALIMENTOS. POSSIBILIDADE DE ABATIMENTO, DA INTEGRALIDADE DO VALOR PAGO AO PLANO DE SAÚDE. VERBA QUE MANTÉM O CARÁTER ALIMENTAR DA PRESTAÇÃO.

(...)

(Apelação Cível n. 2010.021915-0, da Capital, rel. Des. Cinthia Beatriz da Silva Bittencourt Schaefer, D.J. 27/09/2011) (grifou-se)

O Superior Tribunal de Justiça vem mitigando essa regra da não compensabilidade dos alimentos em situações excepcionais, a fim de não causar enriquecimento sem causa do alimentado:

"RECURSO ESPECIAL - EXECUÇÃO DE PRESTAÇÃO ALIMENTÍCIA SOB O RITO DO ART. 733 DO CPC - LIMITES DA MATÉRIA DE DEFESA DO EXECUTADO E LIQÜIDEZ DOS CRÉDITOS DESTE - PREQUESTIONAMENTO - AUSÊNCIA - COMPENSAÇÃO DE DÍVIDA ALIMENTÍCIA – POSSIBILIDADE APENAS EM SITUAÇÕES EXCEPCIONAIS, COMO IN CASU – RECURSO ESPECIAL NÃO CONHECIDO. 1. É inviável, em sede de recurso especial, o exame de matéria não prequestionada, conforme súmulas ns. 282 e 356 do STF. 2. Vigora, em nossa legislação civil, o princípio da não compensação dos valores referentes à pensão alimentícia, como forma de evitar a frustração da finalidade primordial desses créditos: a subsistência dos alimentários.3. Todavia, em situações excepcionalíssimas, essa regra deve ser flexibilizada, mormente em casos de flagrante enriquecimento sem causa dos alimentandos, como na espécie.4. Recurso especial não conhecido. (REsp 982.857/RJ, Rel. Ministro MASSAMI UYEDA, TERCEIRA TURMA, julgado em 18/09/2008, DJe 03/10/2008) (grifou-se)

Diferente não é o entendimento dos diversos Tribunais de Justiça, deste país, a saber:

“Execução – Alimentos provisórios – Pleito de compensação de valores executados com despesas pagas de forma direta em benefício das alimentandas – Admissibilidade – Hipótese excepcional para justificar a medida – Princípio da não compensação da dívida alimentar que deve ser aplicado ponderadamente, para que dele não resulte eventual enriquecimento sem causa por parte do beneficiário – Pedido de exclusão dos juros de mora do débito que desborda da matéria abordada na decisão recorrida – Recurso provido na parte conhecida.”

(TJSP, A. Instrumento n 583.117-4/7, 1ª C. de Direito Privado, Rel. Des. Carlos Augusto De Santi Ribeiro, j. 11.03.2008) (grifou-se) 

Execução de diferença de verbas alimentícias – Sentença que admite satisfeita a obrigação com o pagamento de verbas relativas a IPTU, condomínio e plano de saúde, de inequívoca natureza alimentar – Cabimento, sob pena de exigir dupla quitação do débito pelo executado. Recurso improvido.

(TJSP, Apelação Cível nº 316.224-4/6, 6ª C. de Direito Privado, Rel. Desª. Isabela Gama de Magalhães, j. 12.05.05) (grifou-se)

Cumpre ressaltar, que a aplicação da relativização da regra de incompensabilidade da obrigação alimentar, não poderá ser utilizada nos casos em que o alimentando utilizar os valores devidos a título de alimentos com outros pagos por sua mera liberalidade e que também não sejam destinados à verba alimentícia.

Desta forma, entendo que o rigorismo da regra dos artigos 373, II, e 1.707 ambos do Código Civil, que impossibilitam a compensação de dívidas alimentares, deve ser atenuado quando se estiver diante de um caso concreto, que o responsável pela dívida, tenha deduzido o valor para fins alimentícios, destinando-se tal valor como forma de adiantamento que visa impedir eventual enriquecimento sem causa do alimentando.

 

 

 

Assuntos: Atraso pensão alimentícia, Cancelamento de Pensão Alimentícia, Direito Civil, Direito de Família, Direito processual civil, Família, Pensão alimentícia, Revisão de Pensão Alimentícia

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