A Responsabilidade civil do médico e dos hospitais à luz do CDC

29/05/2014. Enviado por

Artigo que versa sobre a responsabilidade subjetiva dos médicos e hospitais, conforme §4º do artigo 14 do CDC.

Código de Defesa do Consumidor determina, em seu artigo 14, que o fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes e inadequadas sobre sua fruição e riscos.

Visivelmente o CDC garante às relações consumeristas a aplicação da responsabilidade objetiva, aquela em que para haver indenização o consumidor não precisa comprovar a culpa do fornecedor, o que facilita a defesa do consumidor caso se depare com prestação de serviços e circulação de mercadorias defeituosas e de má qualidade. Isso porque o fornecedor deve zelar, a todo custo, pela qualidade dos seus serviços e produtos.

No entanto, por expressa determinação do CDC, conforme § 4º do artigo 14, a responsabilidade objetiva não atinge os profissionais liberais, como médicos. Em todo o seu sistema, essa é a única exceção à aplicabilidade da responsabilidade objetiva. Vejamos:

§ 4º A responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação de culpa.

Assim, os médicos (profissionais liberais) somente serão responsabilizados por danos quando ficar demonstrada a ocorrência da culpa subjetiva, em quaisquer das suas modalidades: negligência, imprudência ou imperícia, mantendo-se o tradicional sistema baseado na culpa.

No que tange à responsabilização dos hospitais, inicialmente os tribunais entendiam que a exceção contida no § 4º do artigo 14 não se aplicava aos hospitais, tendo em vista serem pessoas jurídicas. Assim, o hospital deveria reparar os danos sofridos pelo consumidor ainda que não houvesse culpa na conduta do médico.

Contudo, os tribunais já adotam quase que pacificamente novo entendimento, pelo qual embora o hospital se trate de pessoa jurídica, a ele não se aplica a responsabilidade objetiva, na medida em que o que se discute nas ações de erro médico é o próprio trabalho médico, enquadrando-se também na exceção prevista no § 4º do artigo 14.

O novo entendimento destaca que a necessidade de comprovação da culpa do médico para que haja responsabilização solidária do hospital independe de haver ou não o vínculo empregatício. Mesmo havendo vínculo, há necessidade de comprovação de negligência, imprudência e imperícia na conduta do médico.

Seguem jurisprudências:

“MÉDICO – Responsabilidade Civil – Quando ocorre – Ação improbidade. A responsabilidade civil dos médicos somente decorre de culpa provada, constituindo espécie particular de culpa. Não resultando provadas a imprudência, imperícia ou negligência, nem o erro grosseiro, fica afastada a responsabilidade dos doutores em medicina em virtude, mesmo, da presunção de capacidade constituída pelo diploma obtido após as provas regulamentares.

(TJRJ, rel. Des. Felisberto Ribeiro, RT 558/178)”

“INDENIZAÇÃO – Responsabilidade Civil – Hospital – Ajuizamento com base noCódigo de Defesa do Consumidor – Responsabilidade objetiva – Inadmissibilidade – Hipótese de Exercício de Profissão Liberal, na medida em que o que se põe em exame é o próprio trabalho médico – Necessidade da prova de que o réu agiu com culpa ou dolo – Art. 14§ 4ª do referido Código – Recurso não provido. Em ação de indenização contra hospital, ajuizada com base no Código de Defesa do Consumidor, embora se trate de pessoa jurídica, a ela não se aplica a responsabilidade objetiva, na medida em que o que se põe em exame é o próprio trabalho médico. Aplicável, pois, o § 4º do art. 14 do referido Código.

(TJSP, rel. Des. Marcos Cesar, RJTJSP – Lex 141/248)”

“Civil – Indenização – Morte - Culpa – Médicos – Afastamento – Condenação – Hospital – Responsabilidade – Objetiva – Impossibilidade. 1 – A responsabilidade dos hospitais, no que tange à atuação técnico-profissional dos médicos que neles atuam ou a eles sejam ligados por convênio, é subjetiva, ou seja, depende da comprovação de culpa dos prepostos, presumindo-se a dos preponentes.

(STJ, 4.ª T., REsp 258389-SP, rel. Min. Fernando Gonçalves, j. 16.06.2005, DJU 22.08.2205, p. 275)”

A meu ver, entendo que a aplicação do § 4º do artigo 14 do CDC deve ser feita tanto em relação aos médicos quanto aos hospitais, pois não há nenhum sentido responsabilizar o hospital se não houve negligência, imperícia e imprudência por parte do médico. Não tendo o médico atuado com culpa, não há que se falar em defeito na prestação do serviço, até mesmo porque a sua obrigação é de meio, e não de resultado.

Sendo uma obrigação de meio, o médico zela pelo melhor atendimento possível, aplicando as melhores técnicas, porém, diante do risco da atividade exercida, não pode assegurar o êxito. Assim, como poderia o hospital ser obrigado a indenizar um paciente por mais que o médico tivesse agido com a melhor conduta? Ora, o defeito na prestação do serviço só se configura quando a lesão ao paciente resultar de procedimento totalmente desviado dos padrões e, portanto, com culpa evidente de seu causador.

Por fim, destaco uma hipótese em que a responsabilidade do hospital será objetiva: quando a ação versar somente sobre estadia do paciente (internação), instalações, equipamentos, serviços auxiliares (enfermagem, exames, radiologia), etc., serviços relacionados puramente com o estabelecimento empresarial, em que não foi garantido ao consumidor a segurança e qualidade esperada.

Nesse último caso, aplica-se o caput do artigo 14 do CDC, não sendo de competência do consumidor que já suportou todo o dano provar de quem foi a culpa. Caberá ao hospital pagar ao consumidor a indenização cabível, podendo posteriormente ajuizar ação regressiva contra o real causador do dano.

Assuntos: Consumidor, Direito Civil, Direito do consumidor, Direito Médico, Direito processual civil, Problemas com produtos/serviços

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