A compensação por dano moral pleiteada pelo empregado decorrente da dispensa indireta

12/01/2014. Enviado por

A pesquisa pretende abordar sobre a temática da compensação por dano moral em algumas hipóteses de dispensa indireta, modalidade de resolução contratual de trabalho prevista no artigo 483 da norma consolidada.

1 INTRODUÇÃO

 

O ordenamento jurídico brasileiro possibilita que diversos ramos do direito possam se interligar e ter seus conflitos dirimidos pela função jurisdicional. A interdisciplinaridade entre o Direito Civil e Direito do Trabalho, no que tange à compensação por dano moral e as espécies de dispensa indireta, respectivamente, foi possibilitada antes mesmo da entrada em vigor da Emenda Constitucional nº. 45/2004.

A responsabilidade civil, prevista entre os artigos 927 e 954 do Código Civil, pauta-se na necessidade de, em regra, ressarcir integralmente o dano sofrido pela vítima, em decorrência do prejuízo causado a ela. Como se trata de um dever jurídico sucessivo, a obrigação pelo sinistro é gerada pela violação de dever jurídico originário, seja por contrato, seja por previsão em lei.

Os pressupostos da responsabilidade são os elementos necessários para que haja a imputação do agente à reparação danosa, tais como o ato ilícito, o nexo de causalidade e a existência do dano. Se este último não ocorrer, não há o que se discutir sobre os demais pressupostos, visto que o dever de ressarcir é gerado pela ocorrência de um evento. E, não existindo nexo que interligue a conduta do agente e a produção do resultado, também estará afastada a reparação.

Quanto à comprovação do pressuposto “culpa”, a responsabilidade civilista subdivide-se em subjetiva e objetiva, respectivamente, sendo que à primeira é imprescindível que exista a conduta culposa do agente para a sua responsabilização (art. 927, caput, do CC) e a segunda está pautada na Teoria do Risco (parágrafo único).

Já a dispensa indireta é a resolução do contrato de trabalho decorrente de faltas graves cometidas pelo superior hierárquico, dirigidas ao seu subordinado. São exemplos de desligamento da relação de emprego, por iniciativa do empregado: o ato lesivo contra a honra do subordinado e seus familiares, perigo manifesto de mal considerável, o descumprimento das obrigações contratuais pelo empregador, os assédios moral e sexual, ofensa física dirigida contra o empregado, entre outras condutas arroladas nas alíneas do artigo 483 da Consolidação das Leis do Trabalho.

Para que a despedida indireta seja reconhecida, é necessária a propositura de uma ação trabalhista, alegando, por meio de um conjunto probatório, a(s) causa(s) ensejadora(s) dessa modalidade de ruptura.

Convém destacar, contudo, que algumas hipóteses, tendo em vista a impossibilidade de se provar os fatos alegados, tais como aquelas onde existe uma transgressão da honra e da boa fama do empregado, basta o fato em si ou prova testemunhal que atestem a veracidade das alegações, a fim de que o contrato seja rompido judicialmente.

Além de requerer a ruptura indireta do contrato de trabalho, o empregado pode, na própria ação trabalhista, dentro dos pedidos da inicial, pleitear a compensação por dano moral decorrente de atitudes incoerentes com a função de superior hierárquico, colocando em xeque a integridade psíquica, moral e íntima do prestador de serviços.

 

2 DA RESPONSABILIDADE CIVIL

 

Em sentido etimológico, responsabilidade denota a ideia de uma contraprestação ou, nos dizeres de Gagliano e Pamplona Filho (2011, p. 43), o encargo que alguém assume com as “[...] consequências jurídicas de sua atividade [...]”. O instituto da responsabilidade civil está adstrito a um dever jurídico de trato sucessivo, isto é, decorrente de uma violação a um bem jurídico preexistente.

Cavalieri Filho (2010, p. 2) realiza uma diferença entre a obrigação e a responsabilidade. O primeiro termo trata-se de um dever jurídico originário, enquanto o segundo é tratado como um dever jurídico sucessivo, obrigação surgida de um ato ilícito, cuja ação ocasiona um dano a determinado bem jurídico.

 

 

2.1 DAS ESPÉCIES DE RESPONSABILIDADE

 

Embora a responsabilidade civil seja um conceito atrelado à reparação do dano, a doutrina se encarregou de definir algumas espécies de responsabilidade, visto que, dependendo do bem jurídico tutelado e da esfera do direito (cível ou criminal), os efeitos ocasionados por uma conduta ilícita serão distintos.

Visto essa consideração, algumas espécies de responsabilidade merecem maior destaque, tais como as diferenças entre responsabilidade contratual e extracontratual, entre responsabilidade civil e penal e entre responsabilidade subjetiva e objetiva – cujo elemento central está em torno da “culpa”.

A primeira delas, a contratual, decorre de um vínculo obrigacional preexistente, sendo que o dever de indenizar é desfecho do inadimplemento das partes. Gagliano e Pamplona Filho (2011, p. 58) abordam que, se já existia um contrato firmado entre as partes, vinculando-as a uma determinada obrigação, o descumprimento desse acordo gera a responsabilidade contratual. Já a responsabilidade extracontratual provém de uma obrigação jurídica prevista em lei, gerada fora do contrato, precisamente à margem dos negócios jurídicos, como, por exemplo, um acidente automobilístico, cujos condutores não possuem entre si uma relação contratual. E, nesta situação hipotética, a responsabilidade subsiste, pois o causador do dano fica com o encargo de repará-lo, mesmo sem qualquer liame anterior.

A responsabilidade civil visa reparar o dano patrimonial ou a compensação por dano moral, restaurando, respectivamente, o status quo ante (estado anterior), mediante o ressarcimento do prejuízo ou, amenizando o sofrimento da vítima, indenizando-a com base no princípio da razoabilidade. A penal, por sua vez, tem natureza punitiva, isto é, a repressão estatal por meio de uma sanção legal.

Nos casos excepcionais, a reparação do dano também é possível na esfera penalista, sobretudo nas ações civis “ex delicto” (artigos 63 e seguintes do Código de Processo Penal). Além disso, Cavalieri Filho (2010, p. 14) tece que a responsabilidade civil deriva da infringência de normas de direito privado, enquanto a penal resulta da violação de normas de direito público.

Na responsabilidade subjetiva, para que haja a reparação danosa, aquele que se sentiu deve comprovar a existência do ato ilícito (artigo 186) ou do abuso de direito (artigo 187 do CC), o nexo causal, a conduta culposa e o dano. Convém mencionar que a expressão “culpa” é ampla, visto que independe se agente quer produzir ou assumir o risco do resultado ou se o mesmo falta com o seu dever objetivo de cuidado.

Já na objetiva, prevista no parágrafo único do artigo 927 da norma civilista, independe de comprovação da conduta culposa, pois o agente que desenvolve atividade que implique risco para os direitos de outrem (Teoria do Risco), responde pelo dano ocasionado à vítima. Como se trata de exceção à responsabilidade subjetiva, suas hipóteses devem estar expressamente recepcionadas em lei.

 

2.2 DOS PRESSUPOSTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL

 

A responsabilidade civil, para ser imputada ao causador do dano, deve ater-se à análise de três pressupostos que, se comprovados no caso concreto, ensejará a reparação do dano. É imprescindível que se analise, em conjunto, a conduta culposa, geradora do ato ilícito, o nexo causal, isto é, se a conduta do agente concorreu com a produção do resultado e o próprio prejuízo causado ao bem jurídico de outrem.

É importante frisar que, na responsabilidade pautada na teoria do risco, prevista no parágrafo único do art. 927 da norma civil, a existência do pressuposto culpa fica afastada, visto que, o agente, independente de agir com ou sem ela, e por meio de sua atividade que desenvolve, gera riscos aos direitos de outrem.

A conduta é o comportamento humano voluntário que se exterioriza por meio de uma ação ou omissão, como aborda Cavalieri Filho (2010, p. 24). E o que interessa para a responsabilidade é a conduta culposa que, neste caso, é analisada amplamente, visto que não se faz necessário averiguar se a ação/omissão do agente faltou com o dever objetivo de cuidado (negligência, imprudência ou imperícia) ou se, ainda, o episódio teve a finalidade de produzir o resultado naturalístico (dano).

O ato ilícito é a conduta humana voluntária que agride o direito de outrem, sendo um dos pressupostos da responsabilidade civil. E, conforme artigo 186 da nova carta civil, o agente que, agindo comissiva ou omissivamente, por negligência ou imprudência, transgredir direito e causar dano a outrem, ainda que moralmente, comete o ato ilícito.

Mesmo que o agente esteja acobertado em seu direito de exigir determinada prestação de outrem, e se exceder manifestamente nos limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes, também comete ato ilícito (artigo 187, do CC). É denominado de abuso de direito.

O nexo de causalidade é a compatibilidade entre a conduta culposa e se essa foi determinante para que o resultado dano pudesse ocorrer. Ou, conforme explica Cavalieri Filho (2010, p. 47), “É o vínculo, a ligação ou relação de causa e efeito entre a conduta e o resultado”. Esse pressuposto é de suma importância, haja vista que se analisa a relação entre a ação ou omissão praticada pelo agente e a ocorrência do dano. É um dos principais pressupostos para configuração da responsabilidade civil, haja vista que, se não houver uma condição para o evento, afasta-se qualquer alegação sobre a reparação danosa.

O dano, conforme assevera Gagliano e Pamplona Filho (2011, p. 77), é um pressuposto indispensável para o ressarcimento do dano, visto que inexiste a responsabilidade sem a sua ocorrência. Cavalieri Filho (2010, p. 73) o conceitua como:

 

[...] a subtração ou diminuição de um bem jurídico, qualquer que seja a sua natureza, quer se trate de um bem patrimonial, quer se trate de um bem integrante da própria personalidade da vítima, como a sua honra, a imagem, a liberdade etc. Em suma, dano é a lesão de um bem jurídico, tanto patrimonial como moral, vindo daí a conhecida divisão do dano em patrimonial e moral.

 

E, conforme a natureza do dano, se dirigido em desfavor de um bem jurídico ou violando direito subjetivo do indivíduo, esse pressuposto se subdivide, respectivamente, em dano patrimonial, cuja finalidade é o ressarcimento da coisa ao seu estado anterior, mensurando-se tal reparação, conforme artigo 944 do código civilista, à extensão do dano e, em lesão imaterial, que denigre a honra e a imagem pessoal, fazendo-se necessário arbitrar o valor pecuniário a vítima, com a devida razoabilidade do magistrado.

A lesão patrimonial é a diminuição efetiva de bens e direitos, ocasionada pelo ato ilícito cometido pelo agente, decorrente de uma conduta culposa. O dano material deve ser analisado sob dois aspectos: o dano emergente – lesão efetiva da vítima – e o lucro cessante, isto é, aquilo que o lesado deixou de perceber a partir da ocorrência danosa.

O dano emergente ou positivo, como diz Cavalieri Filho (2010, p. 74), “[...] importa efetiva e imediata diminuição no patrimônio da vítima em razão do ato ilícito”. A segunda parte do artigo 402 do Código Civil menciona esta modalidade de dano, sendo “[...] o que efetivamente perdeu [...]”, conforme a expressão restitutio in integrum (restituição integral).

A última parte do mesmo artigo menciona a ideia do lucro cessante ou negativo – lesão mediata e futura. Cavalieri Filho (2010, p. 75) trata a cessação de ganhos como a “[...] perda do ganho esperável, na frustração da expectativa de lucro, na diminuição potencial do patrimônio da vítima”.

Já o dano moral é a transgressão aos direitos inerentes à dignidade da pessoa humana, ao nome, à intimidade, à privacidade e à liberdade. Como se trata de uma violação de âmbito subjetivo, não existe a possibilidade de se quantificar a extensão do dano, muito menos o valor exato que proporcionaria à vítima uma diminuição de seu sofrimento.

Tecida uma singela análise das espécies e dos pressupostos da responsabilidade civil, far-se-á a abordagem da dispensa indireta e a existência do dano moral.

 

3 DA RESOLUÇÃO CONTRATUAL POR DISPENSA INDIRETA E O DANO MORAL

 

A dispensa indireta é, nos dizeres de Martins (2009, p. 373), “[...] a forma de cessação do contrato de trabalho por decisão do empregado em virtude de justa causa praticada pelo empregador [...]”, conduta esta que legitima o trabalhador a requerer o desligamento mediante provocação judicial.

Para a configuração desta ruptura, analisam-se dois aspectos: o subjetivo, no que tange à relação interpartes, se o ato praticado pelo superior hierárquico foi grave o suficiente para a quebra de confiança dessa relação, tornando insustentável a continuidade do subordinado na empresa e, o aspecto objetivo, pertinente às hipóteses do artigo 483, da CLT.

Algumas das condutas arroladas na legislação possuem a faculdade de, além de possibilitar ao empregado ajuizar ação trabalhista, requerer também, nos pedidos dessa mesma ação, uma compensação por dano moral ocasionado pelas condutas do empregador. Estabelecido o conceito de dispensa indireta, é forçosa a necessidade de se abordar o dano moral em sua acepção genérica.

A violação moral, nos dizeres de Barros (2009, p. 650), é o menosprezo que alguém sofre “[...] como consequência de ato ilícito ou atividade de risco desenvolvida por outrem capaz de atingir direitos da personalidade e princípios axiológicos do direito, independentemente de repercussão econômica”.

Entretanto, para que se configure o dano moral, é necessária a comprovação dos elementos da responsabilidade civil, tais como o ato ilícito, o nexo de causalidade, a conduta culposa e a existência do dano. A comprovação desses pressupostos é perfeitamente visualizável do ressarcimento de um dano patrimonial, não o sendo na violação imaterial.

Embora a responsabilidade civil se paute na reparação do dano (artigo 927, CC) decorrente de ato ilícito (artigos 186-187), cuja indenização será medida conforme a extensão deste dano (artigo 944), quando se trata de prejuízo moral, não existe possibilidade de se comprová-lo por meios probatórios, nem de estabelecer um valor determinado que repare integralmente à vítima. Cavalieri Filho (2010, p. 90) entende que:

 

[...] por se tratar de algo imaterial ou ideal, a prova do dano moral não pode ser feita através dos meios utilizados para a comprovação do dano material. Seria uma demasia, algo até impossível, exigir que a vítima comprove a dor, a tristeza ou a humilhação através de depoimentos, documentos ou perícia.

 

O autor ainda complementa que o dano moral existe in re ipsa (da própria coisa), ou seja, somente será preciso a própria ofensa para se configure a existência do dano moral, pois é impensável a exigência de meios probatórios que demonstrem o sofrimento e a humilhação do indivíduo (CAVALIERI FILHO, 2010, p. 90).

Nesse caso, não há como se utilizar meios de prova para atestar a veracidade de tal sofrimento, pois basta apenas que a vítima, no caso, o colaborador, diga que sua imagem foi deturpada, que a conduta do empregador seja grave o suficiente para que o dano moral esteja caracterizado, garantido à parte contrária contestar as alegações do subordinado, tendo em vista o artigo 818 da CLT, combinado com o artigo 333 do CPC e os princípios do contraditório e da ampla defesa, venerados em texto magno.

 

3.1 HIPÓTESES CONFIGURADORAS DA DISPENSA INDIRETA

 

Na legislação trabalhista, as hipóteses para a configuração da despedida indireta estão arroladas no artigo 483 e alíneas da Consolidação das Leis do Trabalho. Elencar-se-ão algumas delas a seguir.

A primeira possibilidade é a exigência de serviços vedados pela lei (alínea “a”), em contrariedade aos bons costumes ou alheios ao contrato de trabalho, que extrapolam as forças do empregado. O artigo 390 da norma consolidada, por exemplo, veda o superior hierárquico empregar mulheres em serviços cuja força superior ultrapasse os 20 (vinte) quilos para o trabalho contínuo e os 25 (vinte e cinco) para o trabalho contínuo.

O rigor excessivo está previsto na alínea “b” do artigo 483, sendo importante ressaltar que a existência de uma mera discussão entre empregador e subordinado não é passível de configurar a rescisão indireta, visto que aquele, exercendo o poder de direção, assume os riscos de seu negócio.

A terceira hipótese se remonta ao perigo manifesto de mal considerável (alínea “c”). Delgado (2011, p. 1161) diz que esta ameaça ocorre quando o empregador submete o subordinado, “[...] pelas condições do ambiente laborativo ou pelo exercício de certa atividade ou tarefa, a risco não previsto no contrato, ou que poderia ser evitado [...]”.

A alínea “d” do artigo 483 trata do não cumprimento das obrigações contratuais por parte do empregador. O contrato de trabalho, quando firmado entre as partes, “deve ser cumprido com um todo [...]. O culposo e grave descumprimento do conteúdo [...] configura, sem dúvida, a falta prevista na alínea ‘d’ [...]” (DELGADO, 2011, p. 1161).

A prática de ato lesivo em desfavor da honra e boa fama o empregado e seus familiares (alínea “e”) também enseja ação trabalhista por dispensa indireta. Martins (2009, p. 374) exemplifica as condutas caluniosas, difamantes e/ou injuriosas dirigidas contra o empregado. Se a conduta do empregador provocou constrangimento, é plausível requerer, nos pedidos da própria reclamação, uma compensação por dano moral.

A sexta hipótese (alínea ‘f’) é a ofensa física do empregador ou prepostos, cometida em desfavor do empregado. Como menciona Barros (2009, p. 920), uma bofetada ou um pontapé já caracterizaria uma falta grave, visto que o legislador não se referiu à lesão corporal. Todavia, se o patrão evitar uma injusta agressão do empregado, a possibilidade de desligamento judicial da empresa estará descartada.

A redução proposital dos vencimentos do empregado (alínea “g”), decorrente da diminuição de seu labor e, sendo este condicionado à quantidade de peça ou tarefa, também enseja a dispensa indireta. É o caso de uma microempresa de confecção que, em regra, remunera o empregado pela quantidade de peças produzidas por mês e, diante disso, diminui a quantidade de calças do colaborador X, ao ponto de refletir na percepção de seus vencimentos.

O artigo 407 da norma consolidada ainda prevê a hipótese de o trabalho estar prejudicando a saúde, o desenvolvimento físico e a moralidade do menor, verificado pela autoridade competente. Nesse caso, se a empresa não atender esta solicitação, configurar-se-á a dispensa indireta (parágrafo único) do aprendiz menor de dezoito anos.

Outra possibilidade de rescisão indireta está na Lei nº. 9.615/98 (Lei Pelé), em seu artigo 31. O dispositivo legal assevera que, se a entidade de prática desportiva atrasar o pagamento salarial de atleta profissional, no todo ou em parte, por período igual ou superior a três meses, o contrato estará automaticamente reincidido.

Os assédios moral e sexual também podem ser determinantes para o colaborador requerer a dispensa indireta, tendo em vista que o empregador está se utilizando de ato lesivo contra o seu subordinado (art. 483, ‘d’, CLT), contra os bons costumes pregados pela sociedade. Em relação ao aliciamento moral, Garcia (2010, p. 176) o conceitua como a:

 

[...] conduta reiterada, de violência psicológica, desestabilizando e prejudicando o equilíbrio psíquico e emocional do empregado (como atitudes de perseguição, indiferença ou discriminação, normalmente de forma velada), deteriorando o meio ambiente de trabalho, podendo resultar em enfermidades graves como a depressão.

 

Já o assédio sexual “[...] se configura pela repetição de condutas praticadas pelo assediador, nem sempre explícitas, como gestos e falas que indiquem a manifestação da intenção sexual, sem receptividade por parte do assediado” (GARCIA, 2010, p. 178). Pode-se dizer que esta modalidade de assédio, trata-se, na verdade, de uma espécie de assédio moral.

Existem, ainda, outras hipóteses de dispensa indireta, tais como a possibilidade de o subordinado requerer a suspensão da prestação de serviços ou mesmo a rescisão contratual, quando desempenhar funções, embora legais, incompatíveis com a continuação do serviço, conforme § 1º do artigo 483 da norma consolidada. O falecimento do empregador constituído em empresa individual concede ao empregado a faculdade de rescindir o contrato de trabalho (§2º do artigo supracitado). Por derradeiro, o inferior hierárquico poderá pleitear a ruptura contratual e a percepção das respectivas indenizações, nas hipóteses das alíneas “d” e “g”, podendo ou não permanecer até o fim do processo de despedida indireta (parágrafo terceiro).

Quanto aos efeitos gerados pelo reconhecimento judicial da despedida indireta, o primeiro deles seria a desconstituição da relação de emprego, gerando responsabilidade ao empregador, conforme assevera Nascimento (2009, p. 1223). A segunda consequência é a percepção das verbas resolutórias, tais como saldo de salário, aviso prévio, décimo terceiro salário, férias proporcionais e/ou vencidas acrescidas de 1/3, saque do FGTS - Código 01, multa de 40% sobre o fundo de garantia, além da indenização por dano moral, caso solicitado pelo reclamante.

 

4 A COMPENSAÇÃO DO DANO MORAL NA DESPEDIDA INDIRETA

 

Para que se adentre à análise do dano moral nas hipóteses de dispensa indireta, é interessante trazer à tona a definição do dano imaterial no âmbito trabalhista. Garcia (2010, p. 175) traz o conceito, denominado pelo mesmo autor de “dano moral trabalhista”, que é entendido como:

 

[...] aquele ocorrido no âmbito do contrato de trabalho, no seu bojo e em razão da sua existência, envolvendo os dois polos desta relação jurídica (de emprego), ou seja, o empregador e o empregado. Normalmente, este se apresenta como o lesado e aquele como o sujeito ativo [...].

 

Deve-se analisar, todavia, que a compensação por danos morais pressupõe um dano efetivo, e não um singelo aborrecimento decorrente de algum desentendimento ou contratempo.

Além disso, é forçoso salientar que a fixação do valor da compensação a ser arbitrado pelo juiz deve se pautar no princípio da razoabilidade, analisando-se a condição pessoal do empregado, a possibilidade econômica da empresa na qual labora e a gravidade do fato gerador do dano.

No que tange à indenização por dano moral na seara trabalhista, a Emenda Constitucional nº. 45/2004 estendeu à Justiça do Trabalho a competência para apreciá-la, conforme inciso VI do artigo 114, da Constituição Federal. Logo, caso se comprove que a conduta do empregador ocasionou à vítima uma violação subjetiva relevante, o reclamado poderá sofrer condenação para rescindir o vínculo e/ou, ainda, compensá-lo pelo dano moral.

Diante das considerações anteriores, far-se-á uma análise da existência do dano moral em algumas das hipóteses configuradoras da dispensa indireta.

Sobre a questão dos assédios moral e sexual, insta comentar que, embora não haja previsão expressa na CLT a respeito destas condutas, é perfeitamente possível que sejam utilizadas como argumento aceitável para que o empregado requeira a despedida indireta, tendo em vista o ato lesivo à boa fama e à honra do empregado (alínea “d”, art. 483, da CLT).

Isso porque tanto o assédio moral como o sexual cometido pelo empregador viola os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da Constituição Federal), do direito à inviolabilidade, da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das pessoas (artigo 5º, inciso X), do direito de ninguém a ser submetido à prática de tortura e tratamento desumano e degradante (artigo 5º, III), entre outros.

Barros (2009, p. 640) traz a hipótese de o empregador não proporcionar trabalho ao obreiro e do fato dele não realizar as metas impostas. São condutas em atentam em desfavor da dignidade de seu subordinado. Verifica-se que este caso concreto se encaixa nas alíneas “e” (ofensa moral) e “g” (redução de trabalho e de salário) do art. 483 da norma trabalhista.

O mesmo autor ainda aborda a revista abusiva, aquela cometida somente a um empregado, em detrimento dos demais. Esta ocorrência, dirigida na frente de funcionários e de terceiros, causa constrangimento, transparecendo a imagem de alguma suspeita, lesando a boa fama e a honra do subordinado (alínea “e”). A decisão proferida pela Primeira Turma do TRT da 3ª Região (2006, p. 5) corrobora com a afirmação acima:

 

REVISTA ÍNTIMA DE EMPREGADOS. DANO MORAL. PROCEDÊNCIA. A revista íntima adotada pela reclamada - como medida fiscalizadora - que obriga o reclamante a ficar nu na frente do vigilante da empresa, constitui uma conduta abusiva que viola a intimidade, a privacidade e a honra do empregado. A afronta direta à garantia insculpida no artigo 5º, inciso X, da Constituição da República, implica na condenação do empregador ao pagamento de indenização pelo dano moral sofrido pelo obreiro (Tribunal Regional do Trabalho da 3º Região – Recurso Ordinário nº. 01374-2005-107-03-00-1, 1ª Turma, Relator Marcio Flavio Salem Vidigal. DJMG em 21.07.2006).

 

A restrição da realização das necessidades basilares também viola subjetivamente o trabalhador, visto que, diante da urgência em utilizar o banheiro, acaba obrigado a fazê-las em público, no local de trabalho (BARROS, 2009, p. 644).

Também é passível de compensação por dano moral a colocação de câmeras em locais privados por natureza, como nos vestiários e toaletes, pois além de extrapolar a vigilância, expõe seus empregados a situações vexatórias e humilhantes.

O descumprimento da obrigação em pagar o salário (alínea “d” do art. 483, da CLT) na data aprazada, embora não seja razão direta para transgredir a dignidade da pessoa humana, enseja obliquamente nela, visto que, estando o pagamento em atraso, o subordinado deixa de cumprir com diversos compromissos, como as despesas adquiridas para com os credores. E, por irresponsabilidade da empresa, o nome do prestador de serviços é inserido no Serviço de Proteção ao Crédito (SPC/Serasa), gerando preocupação e constrangimento.

Contudo, ressalte-se que, conforme julgado de Recurso Ordinário do TRT da 4ª Região (2011, p. 89), o fato de atrasar o pagamento dos salários não gera por si só a presunção da existência de dano moral sofrido pelo empregado, não havendo prova da ofensa à boa fama do reclamante, nem do constrangimento perante o meio social.

Em sentido contrário, se o atraso do pagamento salarial for frequente, é cabível a compensação por danos morais, haja vista que a não percepção do salário causou graves transtornos psicológicos e patrimoniais à subordinada, pois dependia deles para satisfazer suas necessidades pessoais, conforme acórdão proferido pelo mesmo tribunal supracitado (2011, p. 153).

Sobre ameaça de morte feita pelo superior hierárquico ao subordinado, a Sexta Turma do TRT da 2ª região (2012, p. 156-157) entendeu que, se comprovada a ameaça de morte feita por superior hierárquico, não só a reparação por dano moral deve ser reconhecida, assim como a rescisão indireta do contrato de trabalho, sem prejuízo da ação penal pública condicionada à representação do ofendido, pelo crime de ameaça (art. 147, do Código Penal):

 

Ameaça de morte por superior hierárquica comprovada. Reparação por dano moral devida e rescisão indireta do contrato de trabalho reconhecida. A ameaça de morte traz em si, a desvalorização à vida do ameaçado. O valor à vida, bem maior do ser humano, insere-se nos direitos da personalidade, cuja afronta enseja reparação (Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região – Recurso Ordinário nº. 0001016-35.2011.5.02.0062, 6ª Turma, Relator Valdir Florindo, DOE em 13.01.2012).

 

No que diz respeito à ofensa psíquica ao subordinado, o julgado proferido pelo TRT da 4ª Região (2010, p. 155) assevera que:

 

[...] 1-Demonstrada pela prova oral colhida a prática de atos constrangedores e atentatórios à dignidade pessoal da trabalhadora no ambiente de trabalho, é devida a reparação dos danos morais. 2-Tais atos, além de ensejar o pagamento de uma indenização pelo dano moral sofrido, se enquadram na hipótese da alínea “e” do artigo 483 da CLT, configurando a hipótese de [...] rescindir o contrato [...], por justa causa do empregador (Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região – Recurso Ordinário nº. 0087600-96.2009.5.04.0005, 9ª Turma, Relatora Juíza Convocada Lucia Ehrenbrink, DEJT em 05.05.2010).

 

O trabalho em condições análogas a de escravo também é passível de propositura de reclamatória por despedida indireta e da indenização por dano moral, isso porque tal prática é vedada tanto por tratados internacionais, como pela ordem constitucional vigente, em seu artigo 5º, incisos III e XLVII, “c”. O empregado poderá suscitar a fundamentação na alínea “a” (serviços superiores às suas forças, proibidos em lei) do artigo 483, da CLT e, tendo em vista o fato de pessoas assistirem à humilhação sofrida pelo colaborador em seu ambiente de labor, é evidente que, diante da violação dos princípios da dignidade da pessoa humana, é legítima a alegação de uma transgressão imaterial.

Diante à abrangência das hipóteses configuradoras da dispensa indireta, convém salientar que não há o exaurimento da discussão deste tema. É necessário, em cada caso concreto, analisar se o fato alegado pelo subordinado possa vir a se adequar e, caso fira a sua honra, de ser também compensado em seu sofrimento.

 

5 CONCLUSÃO

 

Com o acréscimo do inciso VI ao artigo 114 da carta magna pelo advento da E.C. nº. 45/2004 tornou-se menos dificultoso ao empregado provocar o judiciário, ensejando a compensação por dano moral e/ou ressarcimento por dano material nas relações de emprego.

Todavia, no que tange ao dano imaterial, o juiz trabalhista deve-se pautar no princípio da razoabilidade, visto que não é imaginável que o mero constrangimento sofrido pelo trabalhador diante de um caso concreto seja uma hipótese necessária e suficiente para compensá-lo pecuniariamente.

Nessas situações, é indispensável que a honra objetiva e/ou subjetiva seja efetivamente violada, bastando o próprio fato em si para ensejar uma pretensão indenizatória, embora o meio probatório seja mais dificultoso. Isso não significa que os pressupostos da responsabilidade civil não devem estar preenchidos, visto que, se não houver o elo entre conduta do agente e a produção do dano, a compensação por dano moral fica afastada.

E nas hipóteses de dispensa indireta arroladas pelo artigo 483 e alíneas da norma consolidada, a configuração da transgressão moral ocorre da mesma maneira, pois o empregador, exercendo o seu poder de direção de seu empreendimento, se encontra no direito de emanar ordens aos seus subordinados. No entanto, o que não pode ocorrer é o fato de se aproveitar desta condição de chefia para extrapolar seus limites, ao ponto de denegrir, de maneira efetiva, a honra e a boa-fé dos empregados, pois essas atitudes vão de encontro aos princípios elencados pela Constituição Federal, tais como a dignidade da pessoa humana.

Talvez, o grande empecilho que faz o empregado não pleitear seus direitos perante o judiciário seja a possibilidade de represália do empregador, sobretudo se a reclamatória trabalhista for julgada improcedente. Isso porque, é comum que o superior hierárquico interprete o período de afastamento do empregado como abandono de emprego, uma das causas de ruptura por justa causa (alínea “i” do artigo 482, da CLT).

Mas há entendimentos jurisprudenciais que impedem esta prática do empregado, embora, em apenas duas possibilidades (descumprimento das obrigações contratuais e redução de trabalho que importe na diminuição de vencimentos), o empregado poderá optar por continuar ou não até o transcorrer do processo (parágrafo terceiro do artigo 483).

O que se percebe é que o desligamento da empresa, por iniciativa do empregado, quando resultado da falta grave cometida pelo superior hierárquico, ainda não é conhecimento da maioria das pessoas, e tem a finalidade de coibir os abusos provocados pelo empregador.

 

REFERÊNCIAS

 

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MARTINS, Sergio Pinto. Direito do trabalho. 25. ed. São Paulo: Atlas, 2009.

Assuntos: Danos morais, Direito do Trabalho, Direitos trabalhistas, Rescisão, Rescisão Indireta, Rescisão trabalhista ou indireta, Trabalho

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