Terminais Portuários Privados e Portos Públicos: Origens, Realidades e Situações Jurídicas Distintas

13/06/2011. Enviado por

O referido artigo trata especificamente sobre os terminais portuários privados e portos públicos, suas origens, realidades e situações jurídicas distintas.

Inicialmente, vale destacar que, já na origem podemos distinguir terminais portuários privados de portos públicos, pois estão sujeitos a regimes jurídicos diferentes, uma vez que o porto público (porto organizado) tem concessão de uso por via licitatória, no arrendamento e o terminal privado é concedido por outorga de autorização[1] – em que pese agora tais autorizações serem dadas aos terminais portuários privativos por intermédio de contrato de adesão, vide resoluções da ANTAQ n.º 1660/10 e 1695/10.

Ademais, é necessário fixar que a Lei 8.630/93, especializante da norma trabalhista geral, definiu o que é área de porto organizado, mas não o que a define como tal, e nesse ponto destacamos que o que estabelece uma área como sendo porto organizado são os Decretos-Lei oriundos da Presidência da República, como os de número 4.989/04 (porto organizado de São Francisco do Sul - SC) e Decreto-Lei de 16 de Março de 2005 (porto organizado de Itajaí – SC), citados aqui como exemplo – tudo nos moldes da Medida Provisória 2.217-3/01, que deu nova redação a Lei 10.233/01[2].

Em outro giro, temos a definição de porto organizado da própria Lei 8.630/93[3] (Lei dos Portos) que assim o define:

Art. 1º - Cabe à União explorar, diretamente ou mediante concessão, o porto organizado.

§ 1º Para os efeitos desta Lei, consideram-se:

I - PORTO ORGANIZADO: o construído e aparelhado para atender as necessidades da navegação e da movimentação e armazenagem de mercadorias, concedido ou explorado pela União, cujo tráfego e operações portuárias estejam sob jurisdição de uma autoridade portuária:

Porém, os Decretos-Lei emitidos pela Presidência da República, acima citados, definem de forma mais pormenorizada o que representa área de porto organizado nas regiões, tomemos como exemplo os portos de São Francisco do Sul – SC e o de Itajaí – SC:

Em São Francisco do Sul, área de Porto Organizado compreende:

Art. 1º - A área do Porto Organizado de São Francisco do Sul, no Estado de Santa Catarina, é constituída:

I - pelas instalações portuárias terrestres e marítimas, delimitadas pela poligonal[4] definida pelos vértices de coordenadas geográficas a seguir indicadas, abrangendo todos os cais, docas, pontes, píeres de atracação e de acostagem, armazéns, silos, rampas roro, pátios, edificações em geral, vias internas de circulação rodoviária e ferroviária e ainda os terrenos ao longo dessas faixas marginais e em suas adjacências, pertencentes à União, incorporados ou não ao patrimônio do Porto de São Francisco do Sul ou sob sua guarda e responsabilidade: (...)

II - pela infra-estrutura de proteção e acesso aquaviário, tais como áreas de fundeio, bacias de evolução, canal de acesso e áreas adjacentes a estes, até as margens das instalações terrestres do porto organizado, conforme definido no inciso I deste Decreto, existentes ou que venham a ser construídas e mantidas pela Administração do Porto ou por outro órgão do Poder Público.

Em Itajaí – SC, porto organizado, ou como preferem alguns, porto público é:

Art. 1o A área do Porto Organizado de Itajaí, no Estado de Santa Catarina, é constituída: 

I - pelas instalações portuárias terrestres existentes na cidade de Itajaí, contidas na poligonal do porto organizado. A delimitação da área inicia-se na interseção da linha limite dos terrenos do Porto de Itajaí, Terminal Braskarne e da margem direita do Rio Itajaí-Açu, localizada no extremo noroeste e a montante do porto (V-01).

(...) segue até o ponto inicial de delimitação da Área do Porto Organizado(V-01), fechando a poligonal;

II - pela infra-estrutura de proteção e acessos aquaviários, compreendendo canal de acesso ao sistema portuário, bacia de evolução, área de despejo de material dragado, cujo centro encontra-se nas coordenadas: longitude 48°37’27’’ e latitude 26°54’00’’, Saco da Fazenda, área de espera da praticagem (área de fundeio), pelo espigão de proteção a noroeste do cais comercial, montante do Porto de Itajaí, demais espigões e guias correntes, abrangendo, ainda, todos os cais, docas, píeres de atracação, armazéns 2 e 3, pátios, edificações em geral, vias rodoviárias e passeios, até as margens das instalações terrestres do porto organizado, conforme definido no inciso I deste artigo, existentes ou que venham a ser construídas e mantidas pela Administração do Porto ou por outro órgão do Poder Público;

III - a poligonal da área do Porto Organizado de Itajaí, descrita no inciso I, tem seus vértices referenciados às coordenadas geográficas constantes do Anexo a este Decreto.

Visto isso e depois de todo esse “rodeio jurídico”, que torna muitas vezes o tema de difícil compreensão não só para os operadores do Direito, mas também para as partes diretamente interessadas no sistema portuário, temos como óbvio e de clareza solar, que a norma definidora dos portos organizados teve por bem a proteção do trabalho, meio ambiente e do desenvolvimento regional e outros, tudo nos moldes do modificado inciso I, do art. 5º, da Lei 10.233/01, vejamos:

Art. 5o Fica criado o Conselho Nacional de Integração de Políticas de Transporte – CONIT, vinculado à Presidência da República, com a atribuição de propor ao Presidente da República políticas nacionais de integração dos diferentes modos de transporte de pessoas e bens, em conformidade com:

I - as políticas de desenvolvimento nacional, regional e urbano, de defesa nacional, de meio ambiente e de segurança das populações, formuladas pelas diversas esferas de governo; (Redação dada pela Medida Provisória nº 2.217-3, de 4.9.2001)

Se a norma não fosse confeccionada pelo prisma da proteção do trabalho não iria ter em seu bojo as políticas de desenvolvimento nacional, regional e urbano. Tire-se daí a compreensão da necessidade de uma área de porto organizado para a manutenção de postos de trabalho, que em nossa interpretação visou a continuidade do comércio e do desenvolvimento social nas regiões próximas aos portos da União, concedidos aos empresários.

Nesse espeque também, vemos como situações distintas aquelas existentes entre terminais privados e portos públicos (leia-se área de porto organizado), até mesmo porque, com a delimitação do porto organizado veio também a proteção ao trabalho portuário, com conseqüente e natural “reserva legal” da Lei 8.630/93 que nominou as atividades; fala-se em reserva da Lei e não em “reserva de mercado”, adjetivação esta pejorativa ao trabalho portuário e que não se adapta confortavelmente a toda normatização que existe, pois se assim fosse não começariam a surgir no país os concursos públicos para trabalho nas áreas portuárias públicas licitadas.

Note-se, também, que um olhar mais cuidadoso na norma supramencionada traz claro entendimento de que o inciso III, do art. 5º, nos informa da incrementação para a “promoção da competitividade, para redução de custos, tarifas e fretes, e da descentralização, para a melhoria da qualidade dos serviços”

Todavia, não se fala na referida Lei em redução dos salários e postos de trabalho para melhorar a competitividade, até porque tal redução tem campo fértil “somente” no ramo do Direito Privado e das relações trabalhistas.

Assim, em nosso sentir, a competitividade entre portos públicos e terminais só deve ser levada a efeito tendo em vista as reduções administrativas próprias de cada um e não as reduções em sistemas operacionais voltados ao trabalho portuário; em outras palavras, o que se tem como redução de custos não toca e não deve tocar postos de trabalho e nem a renda dos obreiros, pois isso deve ser debatido no campo específico do Direito do Trabalho, ramo privado, na esfera de direitos coletivos, conforme frisamos.

Por fim, destacamos que devido à essência, a mens legis, a legislação existente e a origem de cada terminal privado e porto público, devemos dar aos mesmos tratamentos totalmente diferenciados, pois não só em sua qualidade jurídica (contrato de adesão versus arrendamento), diferem-se terminais privados e portos públicos, mas são diferentes também no tipo de carga que estão autorizados a administrar e manusear (conforme art. 35 do Decreto-Lei n.º 6620/08), pois se ambos tivessem que ter em seus terminais o mesmo tipo de carga, tal fato agiria contra legem, pois feriria mortalmente o inciso I, do art. 5º da Lei 10.233/01, modificado pela medida provisória 2.217-3/01, que foi elaborado num contexto de proteção ao trabalho, de defesa a valores sociais e com base em pareceres positivos ao desenvolvimento nacional, emanados pelo CONIT[5].

Referências:

[1] Outorga de autorização: ato administrativo unilateral, editado pela Agência Nacional de
Transportes Aquaviários – ANTAQ (conforme art. 2º, inciso I, da Resolução Normativa 517/05 da ANTAQ).

[2]Dispõe sobre a reestruturação dos transportes aquaviário e terrestre, cria o Conselho Nacional de Integração de Políticas de Transporte, a Agência Nacional de Transportes Terrestres, a Agência Nacional de Transportes Aquaviários e o Departamento Nacional de Infra-Estrutura de Transportes, e dá outras providências.

[3] Vide também art. 2º do Decreto-Lei n.º 6.620/08.

[4] Poligonal: 1. Relativo ao polígono; 2. Que tem muitos ângulos (Dic. Michaelis - 2011). Vide link: http://www.projetos.unijui.edu.br/matematica/principal/medio/plana/poligono/poligonal.htm

[5] Conselho Nacional de Integração de Políticas de Transporte – criado pela Lei 10.233/01

Assuntos: Direito Constitucional, Direito do Trabalho, Direitos trabalhistas, Trabalho

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