Responsabilidade Civil do Empregador em caso de Acidente de Trabalho

22/01/2013. Enviado por

Apesar de ser consagrado constitucionalmente a responsabilidade subjetiva do empregador em caso de acidentes de trabalho, verifica-se, julgados no sentido de se atribuir responsabilidade ao empregador independente de dolo ou culpa.

A palavra "responsabilidade" origina-se do latim, "re-spondere", que consiste na idéia de segurança ou garantia da restituição ou compensação. Como bem pondera SERPA LOPEZ, “que a responsabilidade é a obrigação de reparar um dano, seja por decorrer de uma culpa ou de uma outra circunstancia legal que a justifique, como a culpa presumida, ou por uma circunstancia meramente objetiva”.(LOPEZ: 1986,56-58).

A Constituição da República reconhece expressamente a possibilidade de o empregador ser obrigado a ressarcir o empregado pelos danos que esse venha a sofrer, desde que tenha contribuído para o resultado com a prática de uma conduta, seja ela dolosa ou culposa. Neste sentido, cumpre citar o disposto no art. 7º, XXVIII da Carta Magna:

 

Art. 7º. São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

(...)

XXVIII - seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa.

 

Verifica-se, portanto, que a obrigação do empregador de ressarcir o empregado por eventuais danos causados, advém de mandamento constitucional sendo, portanto, norma imperativa da qual não se pode afastar. O ressarcimento neste caso constitui, inclusive, uma garantia mínima do empregado que, aliada a outras prerrogativas, objetiva à melhoria de sua condição social.

Neste sentido, para garantir a efetividade da norma constitucional, torna-se indispensável se estabelecer parâmetros e requisitos para se auferir as hipóteses, graus de responsabilidade do empregador e elementos que a constituem.

Neste contexto é que se aplica, para o caso de fixação da responsabilidade civil do empregador, como regra geral, o disposto nos artigos 186 e 927 do Código Civil:

 

Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.

Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.

 

Cumpre registrar, no entanto, que, por força do disposto no parágrafo único do art. 927, haverá hipóteses em que a obrigação do empregador independerá da comprovação de ato culposo ou doloso, conforme se explorará a seguir.

Conceito de acidente do trabalho

Antes de passarmos a análise da responsabilidade do empregador pelo acidente do trabalho sofrido por seu empregado, faz-se necessário apresentar o conceito deste instituto.

Assim, será considerado acidente do trabalho, por interpretação da legislação previdenciária de regência, aquele que decorra do exercício do trabalho a serviço da empresa, provocando lesão corporal ou perturbação funcional que cause a morte ou a perda ou redução, permanente ou temporária, da capacidade para o trabalho.

No tocante à caracterização do acidente do trabalho é necessário que se observe, portanto, a presença de alguns elementos, quais sejam: acidente ocorrido no percurso, ou durante o mister laboral, o resultado lesão corporal, perturbação funcional, ou doença que cause morte, ou perda, ou redução permanente ou temporária da capacidade para o trabalho.

No entanto, não é objeto do presente estudo as questões previdenciárias que permeiam o acidente do trabalho, sendo importante, para este contexto, que se tenha ciência que ao empregador, poderá se impor à responsabilidade de repor os danos sofridos pelo empregado em decorrência de um acidente de trabalho sofrido por este.

Para tanto, será necessário comprovar a ocorrência de alguns requisitos.

Responsabilidade subjetiva e objetiva:
Como já exposto, para ensejar a responsabilidade por danos causados em razão do acidente sofrido pelo empregado, a regra geral é da necessidade de que o empregador ou seus prepostos tenham agido com dolo ou culpa no exercício da atividade (responsabilidade subjetiva).

A partir da definição legal, a doutrina passou a apresentar quatro pressupostos fundamentais que deverão ser comprovados para que se configure a responsabilidade civil do empregador: a ação ou omissão; a culpa ou o dolo do agente; o dano; o nexo causal entre os pressupostos anteriores.

A ação ou omissão pressupõe um agir ou uma omissão do agente, quando a prática de um ato era exigível, podendo vir, a responsabilidade civil, em decorrência de um ato direto da pessoa, de terceiro, ou de uma coisa ou animal que lhe pertença. No caso do acidente de trabalho, para que enseje o dever de indenizar será necessário que o resultado acidente e os prejuízos daí advindos, decorram direta ou indiretamente, da ação ou omissão do empregador.

Poderão ocorrer, por exemplo: quando na execução de ordem ou na realização de serviços sob a autoridade da empresa; b) na prestação espontânea de qualquer serviço a empresa para lhe evitar prejuízo ou proporcionar proveito; c) em viagem a serviço da empresa, inclusive para estudo quando financiada por esta dentro dos seus planos para melhor capacitação da mão-de-obra, independentemente do meio de locomoção utilizado, inclusive veiculo de propriedade do segurado; d) no percurso da residência para o local de trabalho ou deste para aquele, qualquer que seja o meio de locomoção, inclusive veiculo de propriedade do empregado.

O dano é o prejuízo em si, a lesão sofrida pela vítima, que pode ser patrimonial e/ou extra patrimonial. É, portanto, o resultado lesivo advindo da conduta. Poderá ser de ordem material ou mesmo moral e a fixação de eventual indenização irá depender da sua extensão.

O nexo causal é a relação existente entre a ação ou omissão do agente e o dano apurado. No Direito do trabalho ele é a relação de causalidade entre a conduta do empregador ou de seus prepostos e o dano sofrido pelo empregado.

Por último está o pressuposto da culpa e do dolo. O primeiro atina-se à falta de diligência do agente em seu ato, o agir negligente, imprudente ou eivado de imperícia do empregador, capaz de gerar o dano ao empregado. O dolo seria a vontade de cometer o ilícito e violar direito da vítima.

Não obstante se trace tais pressupostos, nem todos se fazem necessários em todos os casos, pois, com os avanços conseguidos ao longo dos anos, com as modificações trazidas ao ordenamento jurídico, e com a reflexão jurídica doutrinária e jurisprudencial sobre o assunto, muitas teses acerca da responsabilidade civil foram surgindo.

Deste modo, tem-se como regra geral a necessidade de comprovação de todos os elementos acima descritos para que surja a obrigação do empregador quanto aos danos sofridos aos empregados. Vejamos:

 

“EMENTA: DANO MORAL. O dano moral consiste na violação de interesses não patrimoniais da pessoa, acarretando-lhe dor íntima, sofrimento ou transgressão de seus atributos morais, como a honra, o bom nome e a sua reputação. Resulta da conduta ilícita daquele que impõe à vítima determinada comoção que seria sentida por qualquer outro ser humano em iguais condições, atingindo os direitos da personalidade. É o sofrimento íntimo que acomete o "homem médio" ou que é reconhecido pelo senso comum. Caracteriza-se pelo sofrimento, angústia, constrangimento moral e dificuldades cotidianas resultantes da doença ocupacional adquirida. A reparação do dano moral no direito brasileiro encontra fundamento constitucional (artigo 5º, incisos V e X, da CF/88). Conforme cediço, no nosso Direito Positivo o dano decorre de um ato ilícito que provoca contra quem o praticou a obrigação de repará-lo, fundando-se o princípio geral da responsabilidade civil, no artigo 186 do Código Civil; ou seja, aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito, ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano. O artigo 927 desse mesmo diploma legal também estabelece que "aquele que, por ato ilícito (arts. 186/187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo". Ou seja, na etiologia da responsabilidade civil, estão presentes, portanto, três elementos, ditos essenciais na doutrina: a ofensa a uma norma preexistente ou erro de conduta; um dano; e o nexo de causalidade entre uma e outro. Presentes estes elementos, o dever de indenizar se impõe.” (00738-2011-100-03-00-0 RO)

 

“EMENTA: RESPONSABILIDADECIVIL. DANOS MORAIS. REQUISITOS. A responsabilidadecivil do empregador tem por fundamento os artigos 7º, XXVIII, da Constituição Federal, e 186 c/c 927 do Código Civil, segundo os quais é imprescindível a ocorrência simultânea de três requisitos, assim entendidos a prática do ato ilícito, materializada por sua conduta dolosa ou culposa, o dano propriamente dito ao empregado e o nexo de causalidade entre o ato ilícito e o dano. Presentes os elementos constituintes da obrigação de indenizar, o deferimento da pretensão é medida que se impõe.” (02287-2011-023-03-00-0 RO)

 

No entanto, conforme já asseverado anteriormente, a doutrina e jurisprudência trabalhistas permitem a condenação do empregador por danos causados em virtude de acidente de trabalho, independente de este ter agido com dolo ou culpa, nos casos em que o risco do acidente seja inerente a sua atividade. Tem-se, portanto, a teoria do risco (responsabilidade objetiva), amplamente difundida em nossos tribunais, conforme julgados a seguir descritos:

 

RECURSO DE REVISTA. DANO MORAL. ARTIGO 7º, XXVIII, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. CULPA LATO SENSU. PRECEDENTE DA SBDI-1 DESTA CORTE. DESPROVIMENTO. A interpretação sistemática e teleológica do art. 7º, caput e XXVIII, da Constituição Federal, permite concluir que o rol de direitos dos trabalhadores ali enumerados não é taxativo, em nada impedindo que sejam atribuídos outros direitos aos trabalhadores, bastando que impliquem a melhoria de sua condição social. Assim, o inciso XXVIII do artigo 7º da Carta Magnatraz um direito mínimo do trabalhador à indenização por acidente de trabalho, no caso de dolo ou culpa, mas outra norma pode atribuir uma posição mais favorável ao empregado que permita a responsabilidade por culpa lato sensu. Assim, a teoria do risco profissional consideraque o dever de indenizar decorre da própria atividade profissional,principalmente naquelas de risco acentuado ou excepcional pelanatureza perigosa, de modo que a responsabilidade incide automaticamente. Assim, a obrigação de indenizar por ocorrência de acidente de trabalho subsiste, incidindo na hipótese a regra do parágrafo 13 único do artigo 927 do Código Civil, no que se refere à ocorrência da responsabilidade sem culpa stricto sensu. Recurso de revista conhecido, por divergência jurisprudencial, e desprovido- (RR-2289/2005-482-01-00.2 Data de Julgamento: 23/09/2009, Rel. Min. Aloysio Corrêa da Veiga, 6ª Turma, 2/10/2009).

RECURSO DE REVISTA - TRABALHO EM REDE ELÉTRICA - ACIDENTE DO TRABALHO - RESPONSABILIDADE OBJETIVA 1. A teoria da responsabilidade objetiva, cujos elementos identificados são o dano e o nexo causal, prescinde da comprovação da culpa. Desse modo, a simples demonstração do nexo entre a conduta do empregador e o dano sofrido pelo empregado é suficiente para que surja o dever de indenizar. 2. O Eg. TST já afirmou a responsabilidade objetiva se a atividade do trabalhador é de risco, como na situação vertente. Precedentes. 3. Demonstrados, pois, o dano moral (morte do familiar) e nexo de causalidade (morte relacionada com o trabalho desenvolvido), é a empresa responsável pelos riscos oriundos do contrato, sendo devida indenização a título de danos morais e materiais. Inteligência dos arts. 186 e 927, caput, do Código Civil. Recurso de Revista conhecido e provido. (Processo: RR - 404/2005-116-15-00.8 Data de Julgamento: 02/12/2009, Relatora Ministra: Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, 8ª Turma, Data de Divulgação: DEJT 04/12/2009).

INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS – INEXISTÊNCIA DE CULPA OU DOLO DA RECLAMADA – RESPONSABILIDADE OBJETIVA - IMPOSSIBILIDADE . 1. Tendo o Regional confirmado a sentença condenatória que determinou o pagamento de indenização por danos morais e materiais decorrentes de acidente de trabalho, sob o fundamento de que, independentemente de culpa da Reclamada, a sua responsabilização seria objetiva, de se acolher o pleito recursal. 2. Isso porque a responsabilidade objetiva fundada no risco da atividade, configurasse, em tese, apenas quando a atividade desenvolvida pelo autor do dano vier a causar ao trabalhador um ônus maior do que os demais membros da coletividade.

3. Como o Empregado, no caso, foi vitimado por um acidente automobilístico quando retornava de sua atividade, não há de se falar em situação de risco superior a qualquer outro cidadão. Logo, para que pudesse haver a responsabilização do empregador pelo dano, haveria a necessidade de inequívoca prova de culpa, o que inocorreu. Recurso de revista provido. (TST - RR - 555/2005-012-17-00. Publicação: DEJT - 25/09/2009. 7ª Turma. Rel. Min. Maria Doralice Novaes).

EMENTA - RESPONSABILIDADE CIVIL - ACIDENTE DE TRABALHO - MORTE DO EMPREGADO - NEGLIGÊNCIA DO EMPREGADOR O empregador, no exercício de seu poder diretivo e no atendimento de sua função social, deve tomar todas as medidas de prevenção de acidentes e de proteção aos trabalhadores. Obriga-se, assim, a oferecer condições plenas de ativação, no que pertine à segurança, salubridade, higiene e conforto. Não o fazendo, havendo-se com negligência, assume o risco da produção de acidente e, este ocorrendo, deve responder pelos danos decorrentes. (00975-2011-150-03-00-7 RO)

 

O que se verifica, portanto, é uma relativização da adoção da teoria da responsabilidade subjetiva, consignada na Constituição da República, nos casos de acidente de trabalho em que a atividade explorada pelo empregado acarrete risco em potencial aos empregados. Vê-se uma crescente tendência jurisprudencial a se adotar a responsabilidade objetiva (independente da comprovação de dolo ou culpa por parte do empregador), como forma de resguardar e proteger os interesses do hipossuficiente.

Esta forte tendência jurisprudencial, apesar de não unânime, nada mais é do que um mecanismo de proteção do trabalhador, com o objetivo de resguardar os seus direitos sociais também consagrados na Carta Magna e fomentar a atividade preventiva dos empregadores e a adoção de mecanismos eficientes de prevenção de acidentes.

 

 

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Assuntos: Acidente de trabalho, Direito do Trabalho, Direito processual civil, Direitos trabalhistas, Indenização, Trabalho

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