O Supremo Tribunal Federal e o julgamento do Mensalão

23/07/2012. Enviado por

Em 02 de agosto próximo o Supremo Tribunal Federal inicia o julgamento do que já considerado o maior da história de nosso país, sendo que a sociedade vem se preparando para acompanhar o andamento de forma cada vez mais ativa

O STF E O JULGAMENTO DO MENSALÃO.

Wellington Alves Valente**

No próximo dia 02 de agosto o Supremo Tribunal Federal iniciará aquele que vem sendo considerado o maior julgamento daquela Corte, onde os Ministros irão decidir o destino dos 38 réus incluídos na Ação Penal nº 470.

Quando se fala a respeito deste julgamento, normalmente os ânimos são inflados em decorrência do clamor da sociedade por uma conduta proba dos denominados “Homens Públicos” e daqueles que profissionalmente ou não, têm relações com o chamado setor público.

Muita coisa já se falou a respeito deste julgamento, principalmente no sentido de que deve haver uma condenação em massa de todos os denunciados, o que a nosso ver não poderá ocorrer dado às particularidades do processo e mesmo dos supostos crimes a cada um deles imputado.

Neste sentido, ou seja, de que cada conduta deve e terá de ser analisada de forma individual, destaca-se a situação dos réus que foram denunciados apenas pela prática de suposto crime de lavagem de dinheiro, principalmente depois do julgamento do Habeas Corpus nº 96.007, impetrado em favor dos fundadores da Igreja Renascer em Cristo, Estevan Hernandes Filho e Sônia Haddad Moraes Hernandes, que também haviam sido acusados de lavagem de dinheiro por meio de organização criminosa, como ocorreu no caso do mensalão, quando o Procurador Geral da República à época do oferecimento da denúncia baseou toda sua argumentação na suposta existência de uma “organização criminosa”.

Ao apreciar aquele processo (HC 96.007), a 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal, sob a relatoria do Ministro Marco Aurélio, por unanimidade decidiu que não existe no sistema jurídico brasileiro o tipo penal denominado “organização criminosa”, concedendo a ordem de Habeas Corpus, afastando assim a punibilidade dos réus.

Ao examinar aquele processo, os Ministros que integram a 1ª Turma do STF acompanharam o entendimento do Relator, segundo o qual se não há o tipo penal antecedente, que supõe ter provocado o surgimento do que posteriormente seria “lavado”, não é possível dizer que os acusados teriam praticado o delito previsto no artigo 1º da Lei 9.613/98, ou seja, a lavagem de dinheiro, tendo concluído que “a definição emprestada de organização criminosa seria acrescentar à norma penal elementos inexistentes, o que seria uma intolerável tentativa de substituir o legislador, que não se expressou neste sentido”.

Qual o efeito que esta decisão tem para o deslinde do processo do mensalão? Podemos afirmar sem medo de errar que a decisão prolatada no Habeas Corpus 96.007 é de crucial importância para o desfecho do caso, principalmente para os réus que estão sendo acusados apenas da prática do crime de lavagem, visto que não há no ordenamento legal regente do processo penal brasileiro nenhuma definição ou mesmo tipificação acerca da ocorrência de crimes por meio de “organização criminosa”, sendo impossível sua aceitação como antecedente do crime de lavagem, posto que a Lei 6.913/98 em seu texto legal vigente por ocasião da apresentação da denúncia, não definia o que seria a propalada “organização criminosa”, faltando ao Ministério Público a base legal para a fundamentação da acusação, restando o entendimento que na ausência do tipo penal antecedente, não há que se falar em surgimento do que posteriormente seria “lavado”, afastando assim a pretensão punitiva em relação aos Réus acusados do crime de lavagem.

A referida decisão é um elemento de suma importância para nós advogados habilitados para a defesa dos Réus do mensalão, vez que o entendimento dos 05 Ministros que compõem a 1ª Turma do STF possibilitou o fortalecimento das teses apresentadas durante o transcorrer do processo, pois a denúncia do Procurador Geral da República está estruturada numa ligação entre o crime de lavagem de dinheiro e a formação de uma “organização criminosa”, principalmente quando nos deparamos com a afirmação de que foi formada uma “sofisticada organização criminosa, dividida em setores de atuação, que se estruturou profissionalmente para a prática de crimes como peculato, lavagem de dinheiro, corrupção ativa, gestão fraudulenta, além das mais diversas formas de fraude”.

Porém, o entendimento consolidado na decisão proferida nos autos do HC 96.007, beneficia apenas os réus em relação ao crime de lavagem de dinheiro, sendo que dos 38 denunciados, 30 deles respondem por mais de um crime, como formação de quadrilha e peculato.

Interessante que destas 30 pessoas que podem ser beneficiadas, apenas 03 respondem somente pelo ilícito de lavagem de dinheiro, podendo e devendo ser inocentadas tendo em vista o entendimento do STF consolidado no julgamento do HC 96.007, sendo eles os ex-deputados federais Luiz Carlos da Silva (professor Luizinho – do PT), João Magno de Moura (PT) e José Luiz Alves (ex-chefe de gabinete do à época Ministro dos Transportes, Anderson Adauto).

Destaque-se também que esta decisão (HC 96.007) pode vir a beneficiar aos outros 27 indiciados pelo crime de lavagem de dinheiro, sendo que esta nova interpretação da aplicação da Lei 6.913/98 não se aplica aos outros crimes pelos quais eles respondem. Integra a lista de 27 possíveis beneficiados o empresário Marcos Valério, apontado como suposto operador do mensalão; o presidente nacional do PTB, Roberto Jefferson; o deputado federal Valdemar Costa Neto (PR) e o publicitário Duda Mendonça.

O certo é que a decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal nos autos do HC nº 96.007 é histórica e pode ser considerada como marco referencial para o julgamento do chamado “mensalão”, culminando na absolvição daqueles que não praticaram os crimes descritos na denúncia.

O tema é polêmico mas permite uma boa e merecida reflexão a respeito da aplicação do ordenamento legal de maneira cada vez mais isenta dos clamores quase sempre condenatórios da sociedade, que na maioria das vezes age mediante provocação, insuflada por “gritos de guerra” dissociados da realidade contida nos processos judiciais.

Aguardemos o desenrolar do julgamento a partir do dia 02 de agosto próximo.

** (O Autor é advogado e defensor do Ex-Deputado Federal por Minas Gerais, João Magno de Moura, denunciado no processo do Mensalão – valente1@ibest.com.br)

Assuntos: Criminal, Direito Constitucional, Direito Penal, Direito processual penal, Direito Público, Improbidade Administrativa

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