Do direito de preempção como modalidade de intervenção do Estado na propriedade

07/05/2013. Enviado por

Trata o presente Trabalho do Direito de Preempção Municipal, instituído pela Lei n.º 10.257/2001, em atendimento a Função Social da Propriedade, a exemplo das demais espécies de Intervenção do Estado na Propriedade Privada, por seus Entes Federativos

1 Introdução

A expressão preempção é originária do latim, praeemptione, sua tradução significa a compra antecipada, direito de precedência ou preferência na compra e venda, consistindo em verdadeiro pacto adjeto à esta, submetido às regras particulares, pacto este que também é denominado como prelação, pactum protimiseos no pactum maelationis.

Em sua essência o direito de preferência é um instituto advindo de transações de compra e venda. Tem seu surgimento do pactum protimiseos, ou o pacto do melhor comprador, oriundo do direito romano, na qual havia um acordo entre particulares, dando privilégio de preferência na hipótese da venda de determinado bem.

O proprietário possui dentre seus direitos o jus abutendi, ou seja, o direito de dispor da coisa a título gratuito ou oneroso, por meio de doação ou venda, desta nasce o direito de preferência como uma faculdade de o proprietário, dispor de seu bem o vendendo a terceiro com a qual tenha previamente acordado a preferência na compra, ou a quem a lei garanta esta prerrogativa.

No Direito Brasileiro, o direito de preempção ou de preferência foi inserido, primeiramente na esfera privada, regulada pela legislação civil e como uma faculdade pessoal que originava uma relação obrigacional pela qual o vendedor de determinado bem móvel ou imóvel poderia readquiri-lo na hipótese de sua revenda, relação esta que caso fosse inobservada poderia ser resolvida em perdas e danos. Na atualidade é regulado pelos artigos 513 a 520 do Código Civil[1] vigente.

Importante ressaltar que o direito preempção civil, oriundo do Direito Privado não se confunde com o direito de preempção do Poder Público Municipal, consubstanciado no Direito Público.

Há mera semelhança na nomenclatura e na finalidade, ou seja, a própria preferência, todavia devemos salientar que os fundamentos jurídicos, o procedimento e as sanções que lhes são atinentes, tornam absolutamente distintos o direito de preempção civil e o direito de preempção do Poder Público.

No Direito Público, o direito de preferência em consonância com a intervenção estatal na propriedade surgiu no advento do Decreto-lei nº 25/1937(1), que regula a organiza a proteção, por meio do Tombamento, do patrimônio histórico e artístico nacional.

Nos termos do artigo 22 e seus parágrafos do §1º ao §6º do Decreto-lei do Tombamento o direito de preferência é concedido à União, aos estados e aos municípios, nesta ordem, na hipótese de alienação onerosa de bens tombados, até mesmo em via judicial.

Para que seja permitida a alienação do bem tombado, deve seu proprietário notificar os detentores do direito de preferência, ou seja, a União; bem como o estado e município onde se encontrar o bem, oferecendo-os ao mesmo preço, pelo prazo de 30 dias, sob pena de perdê-lo. (art. 22, §1º).

De tal sorte que é nula a alienação que não observar o direito de preferência dos referidos Entes Públicos, ficando estes habilitados a proceder com o sequestro da coisa e a imposição de multa correspondente a vinte e cinco por cento do valor transacionado entre vendedor e comprador, que serão, por ela, solidariamente responsáveis. (art. 22, §2º)

Dentre as outras disposições, trata o artigo 22, ao parágrafo terceiro, que o direito de preferência não obsta que a coisa seja gravada, por seu proprietário, de ônus advindo de penhor, anticrese ou hipoteca.

Devemos, no entanto, ressaltar que o direito de preferência no Tombamento distingue-se do Direito de Preempção Municipal, pois, conforme visto, recai sobre bens móveis e imóveis tombados em proteção ao patrimônio histórico e artístico nacional e é inerente à União, e pelo critério territorial, ao estado-membro onde se encontra localizado o bem e da mesma forma ao município deste.

Enquanto no Direito de Preempção Municipal, como sua própria denominação, destina-se unicamente ao direito de preferência do município onde se situa o bem imóvel, não incidindo sobre bens móveis.

Ademais, o direito de preferência no Tombamento, culmina como sanção a nulidade da alienação entre os particulares, com o sequestro do bem e a imposição de multa correspondente a vinte e cinco por cento do valor da venda, a qual vendedor e comprador responderão solidariamente.

Já a infração ao Direito de Preempção Municipal, também gera a nulidade da alienação que não observe seus ditames, mas todavia gera como sanção a aquisição do bem pelo Município pelo valor venal, ou seja, da base de cálculo do IPTU, se este for inferior ao valor transacionado na alienação.

Vejamos adiante o Direito de Preempção Municipal, em sua plenitude:

2 Direito de preempção municipal

A Constituição Federal de 1988(2) dispõe 182 que “A política de desenvolvimento urbana, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes”.

O parágrafo primeiro do referido dispositivo constitucional reza acerca da obrigatoriedade da existência de Plano Diretor, obrigatório para cidades com população superior a 20 mil habitantes, como instrumento básico da política de desenvolvimento de expansão urbana, aprovado pela respectiva Câmara Municipal.

Ao passo que o parágrafo segundo do mesmo artigo trata da função social da propriedade urbana no atendimento das “exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor”

Frise-se que a lei mencionada no caput do artigo 182 da Carta Magnaé o próprio Estatuto da Cidade, Lei nº 10.257/2001(3), que o regulamenta conjuntamente o artigo 183, e que estabelece diretrizes e normas gerais de política urbana e demais providências.

Tratando a matéria, ou seja, o Direito Urbanístico, de competência concorrente entre os entes federativos, de acordo com o artigo 24, I, §1º da Constituição, à União compete o estabelecimento de normas gerais, limitando-se a estas, o que é, em suma, a função jurídica do Estatuto da Cidade, norma de ordem pública e de interesse social.

O Estatuto da Cidade(3) objetiva regular o uso da propriedade urbana em prol do bem e do interesse coletivo e do bem estar dos cidadãos. Como também do equilíbrio ambiental (art. 1º, parágrafo único).

Ao passo que o artigo 2º do referido Estatuto traz as diretrizes gerais da política urbana voltada a regular e ordenar a função social da cidade e da propriedade urbana, senão vejamos:

“I – garantia do direito a cidades sustentáveis, entendido como o direito à terra urbana, à moradia, ao saneamento ambiental, à infraestrutura urbana, ao transporte e aos serviços públicos, ao trabalho e ao lazer, para as presentes e futuras gerações;

II – gestão democrática por meio da participação da população e de associações representativas dos vários segmentos da comunidade na formulação, execução e acompanhamento de planos, programas e projetos de desenvolvimento urbano;

III – cooperação entre os governos, a iniciativa privada e os demais setores da sociedade no processo de urbanização, em atendimento ao interesse social;

IV – planejamento do desenvolvimento das cidades, da distribuição espacial da população e das atividades econômicas do Município e do território sob sua área de influência, de modo a evitar e corrigir as distorções do crescimento urbano e seus efeitos negativos sobre o meio ambiente;

V – oferta de equipamentos urbanos e comunitários, transporte e serviços públicos adequados aos interesses e necessidades da população e às características locais;

VI – ordenação e controle do uso do solo, de forma a evitar:

a) a utilização inadequada dos imóveis urbanos;

b) a proximidade de usos incompatíveis ou inconvenientes;

c) o parcelamento do solo, a edificação ou o uso excessivos ou inadequados em relação à infraestrutura urbana;

d) a instalação de empreendimentos ou atividades que possam funcionar como pólos geradores de tráfego, sem a previsão da infraestrutura correspondente;

e) a retenção especulativa de imóvel urbano, que resulte na sua subutilização ou não utilização;

f) a deterioração das áreas urbanizadas;

g) a poluição e a degradação ambiental;

h) a exposição da população a riscos de desastres

VII – integração e complementaridade entre as atividades urbanas e rurais, tendo em vista o desenvolvimento socioeconômico do Município e do território sob sua área de influência;

VIII – adoção de padrões de produção e consumo de bens e serviços e de expansão urbana compatíveis com os limites da sustentabilidade ambiental, social e econômica do Município e do território sob sua área de influência;

IX – justa distribuição dos benefícios e ônus decorrentes do processo de urbanização;

X – adequação dos instrumentos de política econômica, tributária e financeira e dos gastos públicos aos objetivos do desenvolvimento urbano, de modo a privilegiar os investimentos geradores de bem-estar geral e a fruição dos bens pelos diferentes segmentos sociais;

XI – recuperação dos investimentos do Poder Público de que tenha resultado a valorização de imóveis urbanos;

XII – proteção, preservação e recuperação do meio ambiente natural e construído, do patrimônio cultural, histórico, artístico, paisagístico e arqueológico;

XIII – audiência do Poder Público municipal e da população interessada nos processos de implantação de empreendimentos ou atividades com efeitos potencialmente negativos sobre o meio ambiente natural ou construído, o conforto ou a segurança da população;

XIV – regularização fundiária e urbanização de áreas ocupadas por população de baixa renda mediante o estabelecimento de normas especiais de urbanização, uso e ocupação do solo e edificação, consideradas a situação socioeconômica da população e as normas ambientais;

XV – simplificação da legislação de parcelamento, uso e ocupação do solo e das normas edilícias, com vistas a permitir a redução dos custos e o aumento da oferta dos lotes e unidades habitacionais;

XVI – isonomia de condições para os agentes públicos e privados na promoção de empreendimentos e atividades relativos ao processo de urbanização, atendido o interesse social.”

Denota-se, pois, que são inúmeras as diretrizes gerais de política urbana e que regulam a função social da cidade e da propriedade urbana, dentre as quais podemos destacar: a sustentabilidade das cidades; a gestão democrática e participativa da sociedade; o planejamento do desenvolvimento das cidades, da distribuição espacial da população e das atividades econômicas desenvolvidas; o atendimento dos interesses e das necessidades da coletividade com a oferta de equipamentos urbanos adequados a esse fim; dentre outras.

Para o atendimento de suas diretrizes, o Estatuto da Cidade(3), ao artigo 4º, disponibiliza os instrumentos que serão utilizados pelo Poder Público Municipal, dentre estes, o direito de preempção, de acordo com o inciso III, alínea m, do referido artigo, cumprindo assim a observância ao Princípio da Legalidade Administrativa.

O Direito de Preempção é o direito de preferência voltado ao Município para a aquisição de bens imóveis localizados em seu território, cujo proprietário demonstre o interesse em promover sua venda, ou seja, alienação onerosa transacionada com outro particular.

Possui o escopo de promover a organização e o desenvolvimento urbano. E está fundamentado pelos artigos 25 a 27 do Estatuto da Cidade(3).

O artigo 25, caput do referido Estatuto, assim dispõe:

“Art. 25. O direito de preempção confere ao Poder Público municipal preferência para aquisição de imóvel urbano objeto de alienação onerosa entre particulares.”

Toshio Mukai(4) (2008, p. 18), assim conceitua o Direito de Preempção Municipal:

“Entende-se por direito de preempção a possibilidade legal que permite ao Poder Público municipal (no caso da lei) exercer o direito de preferência para aquisição de imóvel urbano objeto de alienação onerosa entre particulares. (art. 25).

A preferência municipal, não recai sobre imóvel determinado, mas em todos os imóveis particulares que estejam situados em área definida por Lei Municipal e baseada no respectivo Plano Diretor.

Possui a vigência legal que não excederá a cinco anos, renovável a partir de um ano a partir do decurso do prazo inicial de vigência (art. 25, §1º). Destarte, findo durante o ano vindouro posterior ao término do prazo de cinco anos, o Poder Público municipal não poderá exercer o direito de preempção.

Importante salientar, que consoante o disposto no artigo 25, §2º, o Direito de Preempção, na vigência do prazo legal retro mencionado, ou seja, pelo período de cinco anos, possui demasiada aplicabilidade de modo a incidir em tantas quantas forem as alienações onerosas de um mesmo bem imóvel sobre o qual recaiu operando em favor do Poder Público municipal.

A preempção municipal, indubitavelmente é uma modalidade de intervenção do Estado na propriedade na medida em que aplica restrição ao direito de disposição da coisa inerente ao proprietário de bem imóvel, tolhendo a livre alienação deste.

Ao passo que o uso e o gozo da propriedade ficam mantidos como direitos do particular que pode exercê-los livremente, desde que não prejudique terceiros, lesando assim os interesses da coletividade.

Desta feita, conclui-se que em sua formação o Direito de Preempção Municipal é, em primeiro momento, uma das modalidades restritivas de intervenção Estatal na propriedade que recai sobre o jus abutendi ou disponendi, como faculdade do particular advinda do direito de propriedade.

Restringe, parcialmente, o direito à livre alienação onerosa do bem imóvel particular cuja preferência operar em favor do Poder Público Municipal. Ao passado que as demais faculdades inerentes a disposição deste bem ficam desimpedidas pelo proprietário.

Assim, o Direito de Preempção, não impede que o proprietário proceda à doação de seu bem imóvel, tampouco que este seja gravado de ônus, como penhor, hipoteca e a anticrese.

Também não existem restrições ao direito de abusar da coisa pelo proprietário, que pode consumi-la ou destruí-la livremente, ou ainda, coloca-la a serviço de outrem, se assim desejar.

Conforme retro mencionado, tais características diferem o Direito de Preempção, ou a preferência municipal do direito de preferência que incide sobre os bens tombados.

Feitas estas considerações, passemos a analise das finalidades públicas que ensejam o Direito de Preempção municipal.

2.1 Finalidade pública

Conforme citado, a preempção municipal emerge no Direito Urbanístico, sub-ramo do Direito Administrativo, como meio de atuação do Poder Público com a finalidade de ordenar o desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana e o atendimento dos interesses público e da coletividade.

De acordo com o artigo 26 do Estatuto da Cidade(3) o Direito de Preempção será exercido pelo Poder Público municipal no que concerne a disponibilização de áreas para satisfazer a finalidade pública e suas necessidades atinentes a:

a) Regularização fundiária;

b) Execução de programas e projetos habitacionais de interesse social;

c) Constituição de reserva fundiária;

d) Ordenamento e direcionamento da expansão urbana;

e) Implantação de equipamentos urbanos e comunitários;

f) Criação de espaços públicos de lazer e áreas verdes;

g) Criação de unidades de conservação ou proteção de outras áreas de interesse ambiental;

h) Proteção de áreas de interesse histórico, cultural ou paisagístico.

As finalidades legais, acima dispostas com fidelidade ao rol taxativo da norma, traduzem o interesse público pertinente ao exercício do Direito de Preempção pelo Poder Público municipal, de tal sorte que não é permitido ao Administrador inovar nesse sentido, com a adoção de finalidade diversa daquelas dispostas na norma geral.

Insta salientar que as finalidades públicas do Direito de Preempção objetivam satisfazer as necessidades da coletividade, bem como do próprio município, voltadas à implantação de equipamentos urbanos destinados à saúde, educação, segurança pública; centros comunitários de lazer e cultura; moradias populares, praças e parques públicos; espaços destinados à pratica de esportes e à proteção do meio ambiente; proteção do patrimônio histórico, cultural ou paisagístico; dentre outras.

A Lei Municipal que delimitar a área de incidência do Direito de Preempção deverá indicar uma ou mais finalidades contidas no artigo 26 do Estatuto da Cidade(3) e que deram ensejo ao exercício desse direito pelo Município.

Para a válida execução do Direito de preempção, além das finalidades públicas a ele inerentes, o Administrador deve observar sempre o interesse público e os princípios norteadores do Direito Administrativo, dentre os quais, especialmente, o Princípio da Legalidade como embasamento da atuação do Poder Público municipal no escopo de ordenar o desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana.

2.3 Das obrigações do particular

Diante da existência de Lei Municipal, consoante com o Plano Diretor, e que estabeleça área de incidência do Direito de Preempção do município para o atendimento de uma ou mais de suas finalidades públicas.

O particular que seja proprietário de bem imóvel que esteja inserido em tal área que seja objeto do Direito de Preempção, e que deseje aliená-lo onerosamente, deverá notificar previamente o Poder Público Municipal, para que este, no prazo de 30 dias manifeste seu interesse em comprá-lo, de acordo com o disposto no artigo 27, caput, do Estatuto da Cidade(3), vejamos:

“Art. 27. O proprietário deverá notificar sua intenção de alienar o imóvel, para que o Município, no prazo máximo de trinta dias, manifeste por escrito seu interesse em comprá-lo.”

Trata-se de obrigação de fazer do particular advinda desta modalidade de intervenção do Estado na propriedade, como forma de sujeição ao Direito de Preempção Municipal, oferecendo ao Poder Público, em preferência a qualquer outro, a possibilidade de adquirir onerosamente seu respectivo bem imóvel.

O particular deve ainda, anexar à notificação a proposta formalizada e assinada pelo terceiro interessado em adquirir o bem imóvel, informando o preço, as condições de pagamento e o prazo de sua validade, nos termos do §1º do artigo 27 do referido Estatuto.

O Município, em atenção ao Princípio da Publicidade e em respeito ao ditame do §2º do artigo 27, publicará por meio do órgão de imprensa oficial e em pelo menos um jornal local ou regional de grande circulação o aviso do recebimento da notificação emitida pelo particular e de sua intenção em adquirir o imóvel nas condições da proposta que lhe fora apresentada.

Neste sentido, cumprida a obrigação pelo particular em adequadamente proceder a notificação com o anexo da proposta de aquisição onerosa de seu imóvel por terceiro, denota-se que o Poder Público municipal, caso objetive a compra do bem para o atendimento das finalidades públicas pertinentes, pode exercer seu direito de preferência sobre o bem imóvel, todavia, adquirindo-o nas mesmas condições de onerosidade em que fora oferecido e aceito pelo terceiro.

Evidentemente, estamos diante de uma fase em que o Direito de Preempção é restritivo, pois faz sobrepor o direito de preferência do Município sobre qualquer outra pessoa física ou jurídica, pública ou privada, no que concerne à aquisição do bem à título oneroso.

Destaque-se, todavia, que não há qualquer interferência quanto ao preço acordado pelo proprietário com o terceiro, devendo o Poder Público sujeitar-se a ele, caso intente adquirir o bem imóvel, na forma da lei.

Na hipótese de o Poder Público permanecer silente ante à notificação que lhe foi apresentada, decorrido o prazo legal de 30 dias, fica o particular autorizado a efetuar a alienação onerosa de seu bem com terceiros, nas mesmas condições da proposta em que havia informado o Município. (art. 27, §3º).

Ao passo que, desta alienação onerosa de bem imóvel com terceiro, autorizada pelo Estatuto da Cidade(3), nasce outra obrigação de fazer ao proprietário particular, na condição de vendedor, que é o de apresentar ao Município, no prazo de 30 dias contados do efetivo ato que foi levado ao Registro de Imóveis, a cópia do instrumento público de alienação do bem imóvel. (art. 27, §4º).

Conclui-se assim que o Direito de Preempção municipal gera ao particular proprietário de bem imóvel sobre o qual incida o direito de preferência, três obrigações de fazer e uma obrigação de não fazer correlatas ao sua vontade de alienar onerosamente seu bem.

A primeira, de notificar previamente o Poder Público municipal informando-lhe o desejo de alienar seu bem imóvel.

Consequente, como requisito de validade de sua notificação, a segunda obrigação de fazer consiste no dever de anexá-la da proposta formalizada e com a aquiescência do terceiro interessado, informando ao município o valor, as condições e o seu prazo de validade, inerentes a alienação onerosa do referido bem.

Com a observância do dever do particular de notificar o Poder Público municipal, nasce uma obrigação de não fazer, ou seja, não efetuar a alienação onerosa do bem imóvel com o terceiro interessado pelo prazo de 30 dias, conferido pela lei, respeitando o Direito de Preempção, de modo o município possa se manifestar a respeito de seu direito de preferência.

Caso deseje o município adquirir o bem, usará de seu direito de preferência sobrepondo-se ao desejo do terceiro interessado e assim efetuando a compra do bem imóvel, incorporando-o ao patrimônio público, pelas mesmas condições informadas pelo particular proprietário, extinguindo-se assim as obrigações deste.

Todavia, diante do silêncio do Poder Público municipal, e decorrido o prazo legal de 30 dias, o proprietário ficará autorizado a efetuar com o terceiro interessado a alienação onerosa de seu bem imóvel nas condições da proposta apresentada.

Diante da concretização da venda, nasce a terceira obrigação de fazer do particular, que é a de apresentar ao município o instrumento público que comprove a efetiva alienação onerosa.

Descumpridas tais obrigações pelo particular, este estará sujeito às sanções legais, conforme veremos adiante.

2.4 Das sanções administrativas

O descumprimento das obrigações decorrentes do Direito de Preempção do município acarretará duas sanções administrativas ao proprietário infrator na forma da lei.

A primeira é a nulidade de pleno direito da alienação onerosa do bem objeto do direito de preferência, celebrada em condições diversas que a disposta no artigo 27 do Estatuto da Cidade(3), nos termos do art. 27, §5º: “A alienação processada em condições diversas da proposta apresentada é nula de pleno direito.”

Há quem diga, em sentido contrário, que a nulidade da alienação onerosa celebrada entre o particular e o terceiro interessado, em desacordo com o dispositivo legal retro mencionado, é mera consequência legal, não caracterizando uma efetiva sanção administrativa.

Entendimento pelo qual, ousamos discordar, pois inobstante todas as consequências cíveis que surgirão com a nulidade da alienação onerosa e do consequente desfazimento do negócio jurídico entre o proprietário e o terceiro interessado e, atinentes ao bem imóvel; outra sanção administrativa e correlata recairá por sobre o particular proprietário do bem objeto do Direito de Preempção.

Na forma do artigo 27, §6ª; havendo interesse do Poder Público municipal na aquisição do referido bem imóvel, poderá fazê-la, compulsoriamente, ou seja, independentemente da vontade do particular, que será indenizado em valor correspondente á base de calculo do IPTU, ou seja, pelo valor venal do bem, se este for inferior ao valor objeto da alienação onerosa celebrada ilegalmente entre os particulares. Isto é, da forma que se apresentar mais vantajosa financeiramente ao município.

Vejamos o disposto no artigo 27, §6ª do Estatuto: “Ocorrida a hipótese prevista no § 5o o Município poderá adquirir o imóvel pelo valor da base de cálculo do IPTU ou pelo valor indicado na proposta apresentada, se este for inferior àquele.”

Temos então que o Direito de Preempção se apresenta de maneira mais severa e grave, na medida em que o Poder Público municipal, se desejar, diante do descumprimento do direito de preferência que por lei lhe foi conferido, poderá tomar-lhe do particular que será indenizado pelo valor venal deste, na corriqueira possibilidade de ser inferior ao valor da alienação onerosa celebrada pelos particulares.

Não há acordo de vontades entre o Poder Público municipal e o particular, que uma vez tendo infringido as regras do direito de preferência, deverá aceitar as sanções legais que deu causa, vendendo seu bem ao município da maneira que for mais vantajosa a este, independentemente se é justo ou injusto o valor correspondente ao bem imóvel que será incorporado ao patrimônio público da municipalidade.

3 Conclusão

A doutrina majoritária administrativista, sequer inclui o Direito de Preempção municipal como uma das modalidades de intervenção do Estado na propriedade, limitando-se, unicamente, a caracterizá-lo como o direito de preferência que opera em favor dos municípios legalmente fundamentado pelo Estatuto da Cidade.

Entendimento este o qual ousamos discordar, pois, pela análise em sua estrutura e fundamentos, verifica-se que indubitavelmente se trata de modalidade de intervenção do Estado na propriedade, originariamente restritiva, pois impõe restrições jus abutendi ou disponendi, faculdade inerente ao direito de propriedade que permite ao particular, dentre outras, promover a livre alienação onerosa de seu bem.

Com a efetiva preferência, decorrente de lei, em prol do Poder Público municipal, o particular fica impedido de exercer livremente o direito a disposição de seu bem, devendo submeter-se a restrição que lhe foi imposta.

No entanto, o Direito de Preempção não se limita a impor tão somente restrições à livre alienação onerosa do bem imóvel urbano.

Conforme citado, como forma de sanção, diante de eventual descumprimento das normas contidas no artigo 27 e parágrafos do Estatuto da Cidade, o particular poderá ser compelido a vender seu bem imóvel ao Município pelo valor de base de cálculo do IPTU, e que corriqueiramente é muito aquém dos valores de mercado.

O Poder Público municipal poderá adquirir o bem imóvel, indenizando o particular em espécie, quantia equivalente ao valor venal, tomando-lhe o domínio da propriedade e incorporando-a ao patrimônio público e nítida supressão dos direitos de propriedade.

Todavia, ainda que em sua vertente mais severa, diante de sua característica supressiva do direito de propriedade, o Direito de Preempção não se confunde com a desapropriação, são, pois, modalidades distintas de intervenção estatal na propriedade.

Temos então que o Direito de Preempção inicialmente uma modalidade restritiva de intervenção Estatal na propriedade, em caráter de mutabilidade, pelos ditames legais, vem a tornar-se uma modalidade supressiva, havendo o interesse público e a necessidade do Município do bem imóvel para a aplicação das finalidades públicas, poderá proceder com a aquisição compulsória deste, na hipótese do desrespeito do direito de sua preferência pelo particular.

REFERÊNCIAS

1 BRASIL. Decreto-Lei n° 25, de 30 de novembro de 1937

2 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF, Senado, 1998.

3 ESTATUTO da cidade: Lei nº 10.257, de 10 de julho de 2001.

4 MUKAI, Toshio. O Estatuto da Cidade. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2008


[1] Correspondentes aos artigos 1.149 a 1.157 do CC/1916.

Assuntos: Direito Civil, Direito imobiliário, Direito processual civil, Moradia, Propriedade

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