13/04/2015. Enviado por Dr. Líbero Coelho de Andrade Filho em Moradia
Os direitos e deveres de que possui animais em condomínio edilício
Uma das maiores fontes de problemas e de discussões nos condomínios edilícios diz respeito a posse de animais de estimação. Mas como analisar esta questão do ponto de vista jurídico? O Artigo 1.336, IV do atual Código civil determina:
São deveres do condômino:
IV – das às suas partes a mesma destinação que tem a edificação, e não as utilizar de maneira prejudicial ao sossego, salubridade e segurança dos possuidores, ou aos bons costumes;
Normalmente tal assunto deve estar previsto na convenção do condomínio, que é o estatuto que regulamenta os interesses dos condôminos, ditando as regras gerais e específicas do local. Nestes casos só pode ocorrer alguma das três hipóteses: ou a convenção permite, ou é omissa quanto ao assunto ou não permite. Nos dois primeiros casos não há muito o que se discutir, quando permitida a posse de animais no condomínio a convenção deverá também regulamentar os aspectos referentes ao assunto como locais aonde eles podem circular, horários, etc. Na segunda hipótese, em caso de omissão da convenção entende-se que é permitida a posse de animais, uma vez que na legislação pátria não existe qualquer tipo de proibição.
A questão mais polêmica se dá na última hipótese citada, quando a convenção proíbe a posse de animais no condomínio. Temos observado nos tribunais muito condôminos desafiarem a convenção e terem animais em suas unidades mesmo quando a convenção determina o contrário. Como fica tal questão perante o Judiciário?
Na prática condôminos que têm recorrido ao Judiciário para manter a posse de animais no condomínio mesmo quando a convenção determina o contrário têm obtido vitória. Isto se deve principalmente ao fato de que a Lei não veda tal posse, e, em tais casos a convenção condominial estaria contrariando a legislação pátria ao proibir algo que a lei não veda. O que há de se ter é o bom senso, lembremo-nos do que determina o artigo acima citado “não as utilizar de maneira prejudicial ao sossego, salubridade e segurança dos possuidores”. A posse de animais deve ter por pressuposto que tal fato não venha a incomodar os outros condôminos, seja por questões de sossego (barulhos), segurança (cães ferozes), ou higiene e salubridade. No Rio de Janeiro já existe inclusive uma Lei Municipal tratando do assunto, a Lei n.º4.785/2008, transcrita a seguir:
Lei n.º 4.785/2008
GARANTE A HABITAÇÃO DE ANIMAIS DOMÉSTICOS NAS UNIDADES RESIDENCIAIS E APARTAMENTOS DE CONDOMÍNIOS E DÁ OUTRAS PROVIDÊNCIAS.
Art. 1º Fica garantida a habitação de animais domésticos pertencentes ao proprietário de imóvel ou inquilino residente nas unidades residências e apartamentos de condomínios em cumprimento da Constituição Federal de 1988, art. 5º e seu inciso XI.
Art. 2º A circulação dos animais nas áreas comuns do condomínio ficará a critério de decisão da maioria absoluta dos condôminos em assembleia geral, não podendo ser vedada a entrada e saída dos animais do condomínio.
Art. 3º O proprietário deverá cadastrar o animal no condomínio apresentando registro oficial expedido por veterinário competente ou pelo Centro de Controle de Zoonoses-CZ.
§ 1º O proprietário do animal deverá ser pessoa maior de dezoito anos.
§ 2º Ao transitar em áreas comuns do condomínio o animal deverá estar sempre acompanhado de pessoa responsável e ser facilmente identificado por placas ou coleiras.
§ 3º Sempre que solicitado pelo condomínio o proprietário do animal ou responsável deverá apresentar certificado da vacinação em dia contra raiva, cinomose, tratamento de verminoses e, no caso das aves vacinação contra psitacose.
§ 4º Fica o proprietário ou responsável pelo animal obrigado a cumprir o caput deste artigo em noventa dias sob pena de proibição da circulação no interior do condomínio e multa de até R$ 100,00 (cem reais) mensais até a apresentação do comprovante de cadastramento do animal.
Art. 4º Esta Lei trata exclusivamente de animais domésticos, animais considerados ferozes conforme o estabelecido no § 2º do art. 4º da Lei Estadual nº 4.597 de 16 de setembro de 2005, se aceita a sua permanência pela Assembleia Geral do condomínio deverão cumprir os dispositivos desta Lei além dos dispositivos de segurança estabelecidos na mesma Lei Estadual 4.597/2005.
Art. 5º O descumprimento desta Lei incidirá aos condomínios multa de R$ 380,00 (trezentos e oitenta reais), e na sua reincidência a multa será em dobro.
Art. 6º A partir da promulgação desta Lei, o Poder Executivo terá noventa dias para regulamentá-la.
Art. 7º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Câmara Municipal do Rio de Janeiro, em 02 de abril de 2008
Como se observa a posse de animais, mesmo não estando vedada, está sujeita a uma série de normas voltadas à boa convivência entre os condôminos, podendo a convenção do condomínio estabelecer regras, desde que não contrariem a lei e o bom senso.
Por outro lado, entende-se que sempre será possível a remoção de animais do condomínio quando ficar caracterizado que a posse do animal contrariar as regras da boa convivência, como nos casos de ruídos em excesso ou em horários de repouso, norma de higiene e salubridade bem como de segurança (animais ferozes que representem riscos para os demais condôminos). Recente decisão judicial determinou que moradora reduzisse a quantidade de animais em sua unidade condominial conforme reproduzido abaixo:
CONDOMÍNIO DE EDIFÍCIO-ANIMAL EM APARTAMENTO-USO NOCIVO DA PROPRIEDADE-SALVAGUARDA DO INTERESSE COLETIVO –Ação de obrigação de fazer-Rito sumário- Criação de gatos em condomínio-Redução do número de animais.
A questão controvertida versa a respeito da criação de animais domésticos em condomínio, sendo certo que no caso concreto a ré/apelante é possuidora de 18 gatos, fato que vem tornando insuportável a vida de outros condôminos. A presença de animais de pequeno porte, que não perturbam o sossego e gozam de boa saúde, não ofende a convivência social em condomínios horizontais ou verticais. Todavia quando há o uso anormal do direito, causador de dano a outrem, o direito de propriedade individual deve ser mitigado para permitir a conciliação do interesse comum da coletividade. Manutenção da sentença que determinou a redução do número de animais domésticos para três. Desprovimento do recurso.
(TJ-RJ 6.ªCÂMARA CÍVEL, APELAÇÃO CÍVEL 2006.001.27408, Relator DES. FRANCISCO DE ASSIS PESSANHA, 12/09/2006)
Vejamos ainda o Enunciado n.º 14.7.1 aprovado pelo Encontro de Juízes de Juizados Especiais Cíveis e Turmas Recursais do RJ:
“A convenção condominial que proíbe a permanência de animais domésticos no prédio ou em apartamento, deve ser interpretada com bom senso e em consonância com o direito de propriedade, admitindo-se a presença daqueles de pequeno porte que não causem incômodo ou risco à segurança, sossego e à saúde dos vizinhos.”
Evidente então que não se pode proibir a posse de animais em condomíniosresidenciais, desde que tal posse não interfira no direito dos demais condôminos.
No parágrafo anterior grifamos a palavra residenciais, e isto se deve ao fato de que no que se refere a condomínios comerciais tem-se por entendimento que a posse de animais é vedada, principalmente aonde possa haver consultórios médicos, dentários, estabelecimentos de alimentação (restaurantes, lanchonetes) entre outros, uma vez que nestes casos a presença de animais pode efetivamente representar riscos para a salubridade do local, bem como para a segurança dos frequentadores do local, uma vez que é notório que em um condomínio comercial o número de pessoas estranhas ao condomínio que circulam diariamente é muito maior.