Adoção Por Homossexuais

25/05/2012. Enviado por

É uma questão que ainda está longe de ser solucionada, cabendo analisar até que ponto o preconceito deve ser mantido em detrimento do real objetivo preconizado pela adoção, que é a supremacia do interesse do adotando.

Trata-se de uma temática bastante controversa no Brasil. Sua dificuldade maior reside no embate entre os posicionamentos morais e costumeiros de nossa sociedade contra as constantes inovações nas relações afetivas, às quais vêm se transformando com afinco ao longo da história, passando a assumir contornos e formas de manifestação e institucionalização pluralizadas.

Ainda não há qualquer indicação ou previsão, ou mesmo afirmações ou proibições em relação ao homossexualismo elencadas em nosso Código, em face da preservação do princípio da igualdade, onde se enquadra a orientação sexual de cada indivíduo, muito embora fatos isolados já estejam constatados em decisões de diversos Tribunais.

Devemos entender que a homossexualidade de um adotante, preferência esta garantida pela nossa Constituição, não poderá servir de empecilho à adoção se não demonstrada qualquer manifestação capaz de deformar o caráter do adotado, por ser necessário o desejo de oferecer um ambiente familiar estável, com condições dignas de se viver, fomentando um padrão de ética e moral congruentes ao equilíbrio na vida adulta. Cabe à figura do juiz apurar sua conduta social da mesma forma que ocorre com o requerente heterossexual e, com base no caso concreto, dispor a respeito do pedido.

 

A fim de estender sanar nossas dúvidas sobre o tema tratado, entrevistamos a Dra. Nicole Medeiros, autora do artigo acima:

MeuAdvogado: Há algo na Lei que faça menção à adoção de crianças pelos casais homossexuais? Se sim, qual seria esta Lei?

Dra. Nicole Medeiros: Os requisitos indispensáveis ao processo de adoção estão previstos no Código Civil, em seus artigos 1.618 a 1.629, no Estatuto da Criança e do Adolescente ECA (Lei 8.069/90), em seus artigos 39 a 52, além da Nova Lei de Adoção (Lei 12.010/09) que aperfeiçoou a sistemática prevista no ECA e revogou dispositivos do Código Civil.

Destaque-se, que em nenhum dos diplomas infraconstitucionais há proibição expressa da adoção por indivíduo homossexual isoladamente. Não se vislumbra qualquer menção quanto à orientação sexual do adotante dentre os requisitos necessários à adoção. O que se veda, inclusive em sede constitucional, é justamente a discriminação contra as pessoas de orientação afetiva homossexual.

A questão torna-se mais controvertida quando se trata da adoção conjunta por casais homossexuais. Nesse assunto, a nova lei foi silente e a Constituição Federal, igualmente, não vedou as uniões entre pessoas do mesmo sexo. A ausência de subsunção da norma para esta situação específica não pode ser tida, portanto, como empecilho para a adoção por pares homossexuais. A despeito da grande importância de um pronunciamento legislativo, o julgador tem o dever de suprir as lacunas.

Atualmente, cada vez mais casais homossexuais vêm adotando legalmente crianças no Brasil e na análise dos casos concretos, os julgadores têm buscado amparo no art. 4º da Lei de Introdução ao Código Civil que dispõe que as lacunas devem ser colmatadas pela analogia, os costumes e os princípios gerais de direito.

A decisão está nas mãos do magistrado, é ele quem decide a favor ou não da adoção. Normalmente os que deferem baseiam-se em dois princípios legais. O primeiro deles diz respeito ao “interesse da criança”, no qual o artigo 3º da Convenção Internacional sobre os Direito da Criança (ONU,1989) assegura que o bem-estar da criança deve vir antes de qualquer outra coisa. O segundo é a regulamentação do artigo 227 da Constituição através do Estatuto da Criança e do Adolescente, que consolidou o direito da criança e do adolescente de terem garantida a convivência familiar.

MeuAdvogado: Com o reconhecimento da União Homoafetiva no país, filhos adotados por casais homossexuais também terão os memos direitos que as demais crianças (Ex. pensão alimentícia)?

Dra. Nicole Medeiros: A jurisprudência brasileira, inicialmente, equiparou as uniões homossexuais a um instituto tipicamente obrigacional, qual seja, a sociedade de fato. Entretanto, em fevereiro de 2006, o Ministro do Supremo Tribunal Federal Celso de Mello, no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade 3300 MC/DF, afirmou que as uniões homossexuais deviam ser tidas como entidades familiares e não como mera sociedade de fato, indicando que o Direito aplicável à matéria é o de Família.

Partindo do pressuposto de que as uniões entre pessoas do mesmo sexo constituem entidades familiares, proliferam decisões em vários estados brasileiros reconhecendo que a relação de tais casais configura uniões estáveis.

Com isso, filhos adotados por casais homossexuais que tenham reconhecida a união estável, garantem a mesma segurança jurídica das demais crianças. Passam a ter direito à pensão, herança, seguros sociais, entre outros benefícios que antes de registrados não teriam direito.

MeuAdvogado: Em sua opinião, o Brasil tem avançado em relação à diminuição do preconceito contra os casais homossexuais? Como você vê a relação dessa possível diminuição do preconceito com o reconhecimento da União Homoafetiva?

Dra. Nicole Medeiros: Como se percebe, não obstante a carência de regramento expresso, os posicionamentos jurisprudenciais sobre o assunto abordado já progrediram significativamente. Tal fato comprova que a jurisprudência mostra-se compassiva à realidade dos fatos.

Não enxergar episódios que estão diante dos nossos olhos é permanecer na ideia de uma Justiça cega. Condenar à invisibilidade circunstâncias reais é produzir desatinos e deixar de lembrar que a Ética regula o Direito, sobretudo, o de Família.

O preconceito contra casais homossexuais vêm diminuindo no nosso país nos últimos tempos. Contribuem para isso, a maior visibilidade dos homossexuais e uma crescente divulgação do assunto na mídia, como os gays e lésbicas que aparecem nas novelas, de forma cada vez menos estereotipada, provocando debates e discussões sobre os relacionamentos homoafetivos e os direitos dos homossexuais na sociedade como um todo.

Tratar deste tema - famílias homoafetivas - é uma tentativa de contribuir com a diminuição do desconhecimento e do preconceito, de tornar mais aparentes algumas experiências e dificuldades dessas pessoas que mantêm um relacionamento íntimo com parceiros do mesmo gênero.

Não podemos negar que muito já aconteceu no combate à homofobia, mas ainda há muito a se fazer para que as pessoas tenham o direito de viverem como escolheram. Independente da orientação sexual, o respeito deve prevalecer acima de tudo.

A Dra. Nicole Medeiros é advogada em João Pessoa-PB e atua nas áreas de: Direito Civil, Direito do Consumidor, Direito do Trabalho, Direito Empresarial, Direito Previdenciário.

Assuntos: Adoção, Direito de Família, Direito processual civil, Direitos homoafetivos, Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), Família

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