A Dispensa por Justa Causa e o Dano Moral

21/05/2012. Enviado por

A alegação de Justa Causa pelo empregador é ato, a princípio, legal de modo que não enseja direito a indenização por dano moral ao empregado no caso da Justiça do Trabalho entender que o ato praticado não foi gravoso

A dispensa por justa causa é entendida como a autorização legal que o empregador possui de rescindir o contrato de trabalho sem ônus, em razão de ter havido prática de ato faltoso grave pelo empregado.

O legislador trabalhista brasileiro enumerou de forma taxativa os atos faltosos graves ensejadores do direito de dispensar sob a alegação de justa causa no artigo 482 da CLT (como fonte principal). No entanto, existe autorização expressa para a rescisão justificada em outros artigos, como por exemplo, o artigo 240 - parágrafo único, o artigo 432 - parágrafo segundo e o artigo 508, todos da CLT.

Adotou-se o princípio de que não há “justa causa” sem que haja previsão expressa.

O enquadramento legal do ato gravoso alegado é tarefa do juiz, que interpretará os fatos narrados pelas partes e decidirá pela confirmação da dispensa justificada ou não.

Percebe-se que o empregador, ao alegar extrajudicialmente ou judicialmente, a prática de ato faltoso grave (justa causa) pelo empregado, age de forma lícita, a princípio, por utilizar-se de uma prerrogativa legal.

Entende-se por ato ilícito aquele praticado com desvio de conduta do comportamento do “homem médio”, podendo ser explicado como sendo aquele praticado de forma contrária à lei ou com negligência ou com imperícia ou com imprudência ou, ainda, com abuso de direito.

A responsabilidade civil subjetiva (artigo 159 do CCB) e de aplicação subsidiária no Direito do Trabalho (artigo 8º da CLT), envolve a existência de prática de um ato culposo ou doloso, de um prejuízo e do nexo causal entre eles. O fundamento da responsabilidade é a culpa lato sensu, que advém da prática de um ato civilmente ilícito. O causador do dano ficará isento de responsabilidade, e assim não terá que indenizar a vítima, se não se configurar qualquer um dos pressupostos da responsabilidade subjetiva (dano, culpa e nexo causal).

Imagine-se um caso em que o empregador dispensou o empregado por justa causa, o que foi alegado em defesa quando o trabalhador ajuizou reclamação com pedidos decorrentes de uma dispensa sem justa causa. Os pedidos foram julgados procedentes e assim não foi reconhecida a alegada “justa causa”.

Em seguida, o empregado vai novamente à Justiça Especializada para pleitear a indenização por danos morais decorrentes da atitude patronal de alegação de prática de ato grave faltoso.

Percebe-se a existência do dano moral sofrido pelo empregado, que foi ofendido em sua honra de homem trabalhador, e do nexo causal entre a acusação e o dano.

No entanto, isto não é o suficiente para ter de imediato o deferimento de uma indenização. Há que se provar ainda a culpa patronal, pois o ressarcimento do dano depende da existência de todos os pressupostos da responsabilidade subjetiva.

Na teoria clássica da culpa, cabe ao obreiro/vítima a prova da existência dos elementos fundamentais de sua pretensão, sob pena de improcedência do seu pedido indenizatório (inciso I do artigo 333 do CPCB c/c artigo 769 da CLT).

“Improcede ação de indenização fundada em responsabilidade por ato ilícito na falta de prova da culpa, que constitui um dos pressupostos do dever de indenizar” (TARJ - 4a. C. - Ap. - Rel.Raul Quental - j. 10.2.81 - RT 565/214).

Logo, cabe ao empregado, ao pleitear a indenização por dano moral decorrente da acusação de prática de ato faltoso grave - a “justa causa”, narrar e provar qual foi o ato ilícito (contrário a lei, negligente, imprudente, imperito ou com abuso de direito) e do qual decorre a culpa lato sensu do empregador.

Assim, não basta a prova do dano e do nexo causal, para ter o obreiro garantido o ressarcimento do seu prejuízo.

Ademais, vale lembrar que a lei garantindo ao patrão o direito da dispensa motivada, e não havendo possibilidade de se utilizar o Judiciário para simples “consulta” (o que provocaria a existência de ações visando saber se o ato praticado pelo empregado é ou não reconhecido pela Justiça do Trabalho como ato faltoso grave motivador desta dispensa), não pode ele ser penalizado por agir dentro do seu direito (ainda que não reconhecida a justa causa na via judicial), exceto se provado o ato culposo ou doloso.

 

A fim de ampliar nosso conhecimento sobre o tema, entrevistamos a Dra. Clarice Couto, autora do artigo, sobre as questões tratadas acima:

MeuAdvogado: De acordo com o tema tratado no artigo de sua autoria sobre a justa causa e o dano moral, quais são os principais pontos do artigo 482 da CLT que fazem menção aos "atos faltosos graves ensejadores do direito de dispensar sob a alegação de justa causa"?

Dra. Clarice Couto: São os seguintes atos graves que constituem justa causa para a resolução do contrato de trabalho pelo empregador:

  • Ato de Improbidade (ação ou omissão desonesta do empregado, abuso de confiança, fraude ou má-fé);
    Incontinência de Conduta ou Mau Procedimento (atos de excessos, inconveniência de hábitos, desrespeito tais que torna-se impossível o vínculo empregatício)
  • Negociação Habitual (negociação não eventual sem autorização expressa do empregador, configurando muitas vezes a atividade concorrente
  • Condenação Criminal (com transito em julgado - como consequência da inviabilidade de manutenção do contrato de emprego, uma vez que tenha o empregado que cumprir pena criminal e não possa exercer a atividade empregatícia)
  • Desídia (consiste na repetição de pequenas faltas leves, que, acumuladas, culminam na dispensa justificada)
    Embriaguez Habitual ou em Serviço (alcoolismo, porém, o novo entendimento é que, tratando-se o alcoolismo de doença, não é possível a dispensa do empregado, mas sim, encaminhamento para tratamento)
  • Violação de Segredo da Empresa (repasse de informação sigilosa da empresa a terceiros que podem vir a causar prejuízo à empresa)
  • Ato de Indisciplina ou de Insubordinação (atentados aos deveres jurídicos de subordinação assumidos pelo empregado)
  • Abandono de Emprego (faltas injustificadas e contínuas ao serviço, havendo entendimento de que por mais de 30 dias das ausências injustificadas, e mesmo após convocação para retorno, presume-se que o empregado não vai mais voltar ao trabalho. Pode ocorrer abandono de emprego em menos de 30 dias se houver prova do desinteresse do empregado ao retorno.)
  • Ofensas Físicas (devem ter relação com o vínculo empregatício, praticadas em serviço ou fora dele)
    Lesões à Honra e à Boa Fama (gestos ou palavras que importem em expor outrem ao desprezo de terceiros ou por qualquer meio magoá-lo em sua dignidade pessoa)
  • Jogos de Azar (devem ter  intuito de lucro e estar relacionado ao vínculo de emprego)
  • Atos Atentatórios à Segurança Nacional (devem ser comprovados por autoridades administrativas).

 

MeuAdvogado: Caso o empregado sinta-se injustiçado pela demissão por justa causa, como ele pode provar essa possível irregularidade? São necessárias testemunhas, provas materiais?

Dra. Clarice Couto: O empregado deve receber suas verbas rescisórias sobre ressalva, informando sua discórdia quando da homologação da rescisão, para os casos de empregados com mais de um ano de serviço. Para os casos de menos de um ano de serviço, preferencialmente, o empregado deve recusar o recebimento dos valores rescisórios.
Em ambos os casos, o empregado deve, após o período do acerto rescisório, buscar a reversão da Justa Causa na Justiça do Trabalho.

MeuAdvogado: Como é feito o cálculo do possível dano moral que o empregador deverá pagar ao empregado?

Dra. Clarice Couto: No caso de deferimento de indenização por dano moral, caberá ao juiz arbitrar um valor, ou seja, caberá ao juiz, analisando o caso, dizer o quanto entende cabível, que considerará que a indenização tem intuito compensatório mas também  intuito preventivo, para que o empregador não mais haja com erro no uso do direito de dispensa por justa causa.

MeuAdvogado: No caso do empregador, como este deverá fazer sua defesa em caso de processo por parte do empregado?

Dra. Clarice Couto: Em alguns casos, a justa causa se configura aos poucos (por exemplo, a desídia) e em outros um único ato grave já autoriza a dispensa justificada (por exemplo, agressão física).
No primeiro caso, o empregador precisa, antes da justa causa dada, orientar o obreiro para que o ato não se repita. Sem a obediência do empregado, o empregador deverá puni-lo gradativamente (exemplo, advertência, suspensão) de acordo com a medida do ato gravoso praticado pelo empregado. Deverá o empregador ser capaz de provar tais medidas (com documentos e/ou testemunhas, são as provas mais comuns).
No segundo caso, o ato é de tal gravidade que não cabe orientações anteriores.
Vale lembrar que a Justa Causa é ato em que não cabe excesso (deve ser proporcional ao ato praticado, uso do bom senso), deve ser atual (não podendo passar longo período entre o ato praticado pelo empregado e a reação do empregador após o conhecimento do fato), e ato único (não cabe penalizar duplamente ou mais vezes o empregado pelo mesmo ato grave praticado).
Os meios de prova são os que a lei permite: documentos, testemunhas, perícia quando couber.
É preciso verificar se existem exigências outras para a dispensa por justa causa que estejam estabelecidas em instrumentos normativos, bem como se o empregado é detentor de estabilidade que exija processo específico para sua dispensa por justa causa (exemplo: diretor sindical). Neste caso, o empregador deverá ir a Juízo para que seja declarada a dispensa motivada.

 

Clarice Couto e Silva de Oliveira Prates. OAB/MG 60.139. Advogada em Belo Horizonte no escritório PRATES & FIUZA - ADVOCACIA

Assuntos: Demissão, Demissão sem justa causa, Direito do Trabalho, Direito Processual do Trabalho, Direitos trabalhistas, Justa causa, Rescisão, Trabalho

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