A prisão do devedor de alimentos - Instrumento de vingança?

01/06/2012. Enviado por

No Brasil, um pai que se vê obrigado a pagar pensão alimentícia está sujeito a uma draconiana legislação. Tem pouca chance de defesa, caso não possa pagar, desempregado ou não.

No Brasil, um pai que se vê obrigado a pagar pensão alimentícia está sujeito a uma draconiana legislação. Tem pouca chance de defesa, caso não possa pagar, desempregado ou não. A prisão, muitas vezes, não passa de um subterfúgio para satisfazer a um desejo de vingança pela separação mal resolvida.        

“Só é possível controlar e manipular as pessoas quando delas se esconde o conhecimento”. (Alexandra Robbins). 

Enquanto expressiva parcela de brasileiros pede o fim da impunidade, o ilibado poder legislativo, aparceirado com juristas “garantistas”, na contramão do legítimo anseio, tenta aprovar um novo Processo Penal mais permissivo que o atual, com espeque na falaciosa ideia de que as cadeias estariam superlotadas e são despiciendas. Desnecessárias para quem, caras pálidas?

Na verdade, a população carcerária reúne, majoritariamente, os pobres e os que são juridicamente mal assistidos. Noutra ponta, os criminosos de colarinho branco, que desviam, malversam o dinheiro público e prejudicam a vida de milhões, permanecem impunes. Vale a pena cometer tais crimes para cidadãos de uma “elite” indesejável, mas invejada.

Tanto na seara cível, como na penal, as leis que regem as prisões carecem de ajustes que reflitam o contexto atual. O Direito deveria expressar leis consonantes com a realidade social. Contudo, nosso parlamento, frequentemente, produz as leis em trilhos próprios.

Sobra contradição. Enquanto as leis processuais penais atenuam, vicejam normas irrazoáveis e crueis no direito de família. A anosa Lei nº 5.478, de 25 de julho de 1968, que cuida da ação de alimentos, estabelece no artigo 19:

Art. 19. O juiz, para instrução da causa, ou na execução da sentença ou do acordo, poderá tomar todas as providências necessárias para seu esclarecimento ou para o cumprimento do julgado ou do acordo, inclusive a decretação da prisão do devedor até 60 (sessenta) dias.
§ 1º O cumprimento integral da pena de prisão não eximirá o devedor do pagamento das prestações alimentícias, vincendas ou vencidas e não pagas.
§ 2º Da decisão que decretar a prisão do devedor, caberá agravo de instrumento.
§ 3º A interposição do agravo não suspende a execução da ordem de prisão.

O Código Civil (Lei nº 10.406/2002) igualou não só os filhos havidos ou não do casamento, mas também por adoção (art. 1596 e CRFB/88, art. 227, § 6º) e inovou ao dispor que parentes podem pedir alimentos uns aos outros (art. 1694).

Nessa esteira, acaso o alimentante não possa arcar com a totalidade do encargo, concorrerão os parentes de grau imediato, isto é, os avós (art. 1698). Se ficarem eventualmente inadimplentes, podem ter a prisão decretada.

E no momento em que o devedor de alimentos tem a prisão decretada, se não tiver nível superior, cumprirá a pena no presídio junto com presos comuns. Daí o desespero de alguns devedores em recorrer a amigos e parentes pedindo que façam uma ‘vaquinha’ e paguem, de modo a evitar uma prisão, muitas vezes, injusta.

Vários advogados encontram, em muitos juízes e desembargadores, seja por convicção, seja por indiferença, resistência maior em conceder habeas corpus ao devedor de alimentos que ao homicida cruel, em estrábica visão.

O exagero dos decretos prisionais localiza-se em casos determinados, como queda abrupta de renda e desemprego. Nestes casos, a prisão acontece menos por haver inadimplência que pela morosidade e má vontade de alguns juízes.

Para piorar, enquanto a dívida alimentícia não for paga, o devedor corre o risco de ter a prisão decretada sucessivamente até que ele possa quitar a dívida ou realizar um acordo com o alimentando ou seu representante.

Reversamente, igual rigor não é utilizado se houver desvio e mau uso dos recursos destinados ao alimentando pelo ex-cônjuge detentor da guarda.

Sucesso, fama, salários milionários e glórias surgem na vida do jogador de futebol famoso. Toda essa alegria, no entanto, pode vir acompanhada de ingratas surpresas.

Alexandre Pato casou-se com a linda atriz Sthefany Brito. O glamour durou pouco. Em nove meses se separaram. A manchete estampada nos jornais era a pensão milionária que o jogador teria que pagar à ex-mulher.

A atriz, que deixara de trabalhar para morar com o jovem marido na Itália, pedia 20% dos ganhos do jogador. A Justiça, inicialmente, fixou a pensão em R$ 50 mil por mês. O Pato se defendeu e obteve a suspensão do pagamento até o final do processo.

José Elias, ex-jogador de futebol, não teve a mesma sorte do Pato. A ex-companheira com quem tem dois filhos pediu na Justiça a prisão pela dívida alimentar. Desfalcado de um diploma de nível superior e de recursos financeiros para pagar a dívida, foi encarcerado numa prisão comum.

Não conseguira reunir dinheiro suficiente para pagar a alta quantia cobrada. Recorrera à Justiça tão logo se viu desprovido de renda e de condições financeiras para continuar a arcar com a alta pensão e pediu redução do valor na Vara de Família competente.

Sem condições de pagamento, foi levado à prisão e de lá só saiu após quitá-la, com muito custo e auxílio de parentes e amigos. Elias conseguiria reduzir o valor dos alimentos meses depois. As atuais condições lhe permitem pagar só um salário mínimo, conforme sentença prolatada.

Magistrados esclarecem que se deve pedir revisão de alimentos a qualquer tempo, sempre que alterar a possibilidade de pagamento ou a necessidade. Na prática, a decisão que reduz a pensão é demorada e aí se situa uma das principais causas de injustas prisões.

Em dados momentos, é possível que alimentos sejam fixados com base em condições generosas que acarretam o pagamento de expressivo valor. Porém, a vida é uma gangorra. Em algum momento pode sobrevir uma acentuada queda nos ganhos e ficar impossível pagar por absoluta falta de condição.

Nesse caso, deve-se requerer redução no valor da pensão alimentícia com pedido liminar. Não é raro, porém, que, nesse ínterim, sobrevenha o decreto prisional e o devedor seja compelido a pagar. A demora na revisão judicial e o acúmulo da dívida podem impossibilitar o pagamento do débito. Nesse caso, se não houver acordo, será difícil evitar que a prisão seja decretada.

Hoje, a isonomia constitucional determina que homem e mulher arquem com pensão alimentícia de acordo com a condição financeira de cada um. Uma professora foi presa em Ubaitaba, na Bahia, por dever a pensão alimentícia de duas filhas que estão sob a custódia do ex-cônjuge. Ela perdera a guarda das filhas e teve a prisão decretada após o ex-marido ingressar em Juízo.

As adolescentes de 16 e 18 anos trabalham. Inclusive, uma delas já não mora com o pai. O pedido de prisão foi decretado pela juíza. O ex-marido exige o pagamento do débito alimentício.

A doutrina recente entende majoritariamente que a Lei nº 5.478/68 deve mudar para adequar-se à atual Carta constitucional e evitar as injustiças. Enquanto o Legislativo cuida de “assuntos mais importantes”, resta aos infelizes alimentantes, presos injustamente, orar para escapar da violência dos presídios comuns.


Assuntos: Atraso pensão alimentícia, Direito de Família, Direito processual civil, Família, Pensão alimentícia

Comentários ( Nota: 5 / 2 comentários )


Conteúdo Relacionado

Fale com advogados agora


Compartilhe com seus amigos

Compartilhar no Facebook Compartilhar no Twitter Compartilhar no Google+