Parecer sobre nomeação de servidor efetivo para cargo em comissão - nepotismo

21/05/2013. Enviado por

Parecer exarado em processo administrativo acerca da possibilidade de nomeação de servidora ocupante de cargo efetivo para exercer cargo em comissão no Poder Executivo Municipal, sendo parente colateral em 2º grau(irmã) de Vereador no mesmo Município

S. O. S. C., na qualidade de servidora efetiva desta municipalidade, requer, em breve e apertada síntese, “seja renomeada para cargo em comissão que ocupava”, entendendo ilegítima sua dispensa, sob os argumentos: 1) suposta motivação de nepotismo, oriunda de decisão em Ação Civil Pública, não seria aplicável ao seu caso, porquanto também servidora efetiva; 2) inaplicabilidade da Súmula Vinculante nº 13 do Supremo Tribunal Federal, tendo em vista analogia a atos normativos do STF e CNJ; 3) inexistência de nepotismo cruzado, considerando a natureza de seu cargo municipal no Poder Executivo e o cargo eletivo municipal de seu parente no Poder Legislativo; 4) impossibilidade de extensão dos efeitos da decisão proferida em sede de Ação Civil Pública a terceiros que não participaram da relação jurídica processual; 5) Subsidiariamente, requer sejam expostos os motivos ensejadores do ato de dispensa.

 I.          DO MÉRITO

1)       Sobre o primeiro argumento lançado devemos esclarecer a natureza dos cargos efetivos e em comissão.

O primeiro é reservado àqueles que se mostraram aptos ao seu exercício através de seleção pública, guardando estrita relação entre o cargo e as funções descritas em lei para o mesmo, sob pena de desvio funcional. A este, certamente, não se pode aventar a possibilidade de aplicação da Súmula Vinculante nº 13 do STF, por não haver discricionariedade ou qualquer subjetividade em sua contratação. Ao contrário, seu provimento mostra-se como concretização dos princípios da impessoalidade, da moralidade, da eficiência e da isonomia.

O segundo, de natureza diversa, tem por escopo possibilitar ao Administrador Público cercar-se de pessoas capazes de auxiliá-lo no desempenho de seus deveres, cujas atribuições pressupõem uma relação de confiança recíproca para com o auxiliado. Neste caso, não há um critério objetivo de aferição de sua capacidade e/ou eficiência para o desempenho de tais atividades, tendo deixado o ordenamento jurídico seu provimento aberto ao julgamento subjetivo do nomeante.

Em se tratando de cargo em comissão, a legislação, stricto sensu, não restringe sua nomeação, podendo a mesma recair sobre indivíduo já ocupante de cargo de natureza efetiva o que, aliás, mostra-se recomendável frente à capacidade, em tese, desse indivíduo para o desempenho de cargo público.

Tal situação de preferência se verifica quando da nomeação de servidor efetivo para ocupar cargo em comissão com atribuições ou funções semelhantes àquelas decorrentes de seu cargo originário.

Assim decidiu o Min. Relator Eros Grau, quando da apreciação da Reclamação 6582/SP, quando da análise sobre alegação de ausência de nepotismo sobre cargos em comissão ocupados por servidores efetivos:

(...)

Posto isso, conquanto não se tenha ainda conhecimento do entendimento completo dos eminente Ministros do Supremo a respeito do tema e tendo em conta que aqui se veiculou pedido genérico, delibero aclarar a decisão concessiva da liminar (fls. 708/711), apenas no que concerte aos servidores que ingressaram no serviço público por concurso, mantida, no mais, em seus termos originais, doseguinte modo:

a) os servidores públicos municipais, da administração direta, indireta ou fundacional, que tenham ingressado no serviço público por concurso e que exercem cargo de confiança ou em comissão, se subordinados a parentes seus, em linha reta, colateral ou por afinidade, até o 3º grau, deverão ser demitidos ou exonerados de tais cargos;
b) os servidores públicos municipais, da administração direta, indireta ou fundacional, que tenham ingressado no serviço público por concurso e que exercem cargo de confiança ou em comissão, que sejam parentes de autoridades locais, definidas na decisão de fls. 708/711, em linha reta, colateral ou por afinidade, até o 3º grau, dentro da respectiva carreira, poderão ser mantidos em seus cargos;
c) os servidores públicos municipais, da administração direta, indireta ou fundacional, que tenham ingressado no serviço público por concurso e que exercem cargo de confiança ou em comissão, que sejam parentes de autoridades locais, definidas na decisão de fls. 708/711, em linha reta, colateral ou por afinidade, até o 3º grau, fora da respectiva carreira, deverão ser demitidos ou exonerados de tais cargos.

Determino, então e em consequência, a expediição de mandado para notificação dos réus para que cumpram esta decisão, nos termos em que posta, no prazo de cinco dias, sob pena de pagamento de multa diária de R$ 10.000,00, sem prejuízo da apuração oportuna do cometimento de eventual crime de improbidade administrativa” [fls. 82/83].

(...)

Brasília, 9 de dezembro de 2009. Ministro Eros Grau - Relator (DJe-235 DIVULG 15/12/2009 PUBLIC 16/12/2009) (grifos nossos)

Ou seja, uma das interpretações possíveis para que se resguarde a moralidade administrativa é a de se utilizar de um critério objetivo, tendo como norte a manutenção do servidor efetivo em cargo de funções que guardem similitude ou compatibilidade com seu cargo efetivo.

Em argumentação suplementar, temos por bem esclarecer que o exercício de cargo em comissão possui natureza diversa daquele atribuído ao desempenho de uma função de confiança (ou função gratificada), onde há a manutenção perene do vínculo jurídico efetivo adicionando a este a especial execução de atividades inerentes a chefia, direção e assessoramento.

Nessa linha, a função de confiança pressupõe a existência de vínculo efetivo com o serviço público como condição para sua designação.

Ainda, as regras mencionadas pela peticionaria (fls.) como parâmetro a ser considerado, tem como claro objetivo a não incidência da prática do chamado nepotismo aos servidores que, em razão da capacidade para o exercício de suas atribuições inerentes ao seu cargo efetivo, acabam por ser posicionadas dentro da estrutura organizacional pública a cargos/funções de direção, chefia ou assessoramento, não se afastando de suas atividades originárias.

Tal como exposto acima, essa regra visa à preferência por servidores efetivos quando do preenchimento de cargos em comissão pela Administração Pública, o que, teleologicamente, mostra a necessidade de guarda de um mínimo de coincidência de funções e atividades.

Feitos os esclarecimentos e considerações preliminares, passamos à conclusão sobre o pedido, propriamente dito, exposto em nosso item 1.

Como a própria Requerente faz menção, o cargo ocupado pela servidora tem por característica principal seu provimento e vacância com ausência de motivação ou procedimento específico, ou seja, como menciona a doutrina, sua nomeação ou exoneração pode ocorrer “ad nutum”.

Destarte, e considerando a fundamentação supra, não se pode pretender a necessidade de fundamentação do ato exoneratório, porque discricionário, ficando assim colocado tal pedido à apreciação da autoridade nomeante.

2)       Sobre a aplicação por analogia dos dispositivos constantes no Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal e Resolução nº 7, do Conselho Nacional de Justiça, não nos parece correta tal técnica de integração jurídica, tendo em vista os argumentos que passamos a expor.

Há de se ressaltar que o dispositivo mencionado pela Requerente (Art. 355, §7º, do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal) possui redação anterior à Sumula Vinculante nº 13 e à própria Constituição Federal de 1988, motivo pelo qual entendemos prudente sua não aplicação, considerando ser a mesma confrontante com o art. 37, caput, da Constituição vigente.

Quanto à possível aplicação analógica do art. 2º, §1º, da Resolução nº 7, do Conselho Nacional de Justiça, novamente não encontramos tal possibilidade, tendo em vista as especificidades técnicas inerentes à atividade jurisdicional, bem como sua edição, também anterior à Súmula mencionada.

Em que pese esta posição, o STF, através do voto do Ministro Ricardo Levandowski no julgamento do RE 579.951/RN, assim entendeu sobre a Resolução nº 7, do CNJ:

“(...) E, muito embora haja então o STF estabelecido que a eficácia vinculante daquele texto normativo estaria circunscrito à seara da magistratura, o pronunciamento de vários de seus Ministros foi no sentido de que sua força normativa deriva diretamente dos princípio abrigados no art. 37, caput, da Constituição, tendo a dita Resolução apenas disciplinado, em maior detalhe, aspectos da vedação ao nepotismo que são próprios à atuação dos órgão jurisdicionais. (...)” (RE 579951, Relator(a):  Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Tribunal Pleno, julgado em 20/08/2008, REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-202 DIVULG 23-10-2008 PUBLIC 24-10-2008 EMENT VOL-02338-10 PP-01876)

Ainda neste mesmo julgado, em interpretação flexível da Súmula Vinculante nº 13, o próprio Supremo Tribunal Federal excetuou sua aplicação em caso de nomeação de agente políticos, por entendimento de que os mesmos não se enquadrariam na definição de cargos em comissão:

“Então, quando o artigo 37 refere-se a cargo em comissão e função de confiança, está tratando de cargos e funções singelamente administrativos, não de cargos políticos. Portanto, os cargos políticos estariam fora do alcance da decisão que tomamos na ADC nº 12, porque o próprio Capítulo VII é Da Administração Pública enquanto segmento do Poder Executivo. E sabemos que os cargos políticos, como, por exemplo, os de Secretário Municipal, são de agentes de Poder, fazem parte do Poder Executivo. O cargo não é em comissão no sentido do artigo 37. Somente os cargos e funções singelamente administrativos – é como penso – são alcançados pela imperiosidade do artigo 37, com seus lapidares princípios. Então, essa distinção me parece importante agora para, no caso, excluir do âmbito da nossa decisão anterior os Secretários Municipais, que correspondem a Secretários de Estado, no âmbito dos Estados, e Ministros de Estado, no âmbito Federal.” Voto do Min. Carlos Ayres Britto.

(RE 579951, Relator(a):  Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Tribunal Pleno, julgado em 20/08/2008, REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-202 DIVULG 23-10-2008 PUBLIC 24-10-2008 EMENT VOL-02338-10 PP-01876)

Dessa forma, divergem os Tribunais sobre possível analogia ao texto da Resolução invocado, devendo o Administrador Público tomar a máxima cautela e usar de ponderação acerca de sua aplicação.

Esclarecemos que tal exposição é feita em sede de debate argumentativo e não se presta, sob hipótese alguma, a expor os motivos ensejadores do ato exoneratório da servidora, cuja subjetividade permanece adstrita ao campo psíquico da Autoridade nomeante.

3)       Quanto ao terceiro argumento lançado pela Requerente, ad argumentandum tantum, pedimos licença para apontar as posições existentes.

Deve-se buscar como primeira base para análise do caso, a interpretação sobre o surgimento da Súmula Vinculante nº 13, do STF. 

Quando da discussão sobre a edição da referida Súmula, os Ministros do Supremo Tribunal Federal deliberaram no sentido de tornar rígida a proibição do nepotismo, optando de forma expressa, pela proibição no âmbito da “mesma pessoa jurídica” em substituição do mesmo “órgão”.

Transcrevemos trecho da discussão dos Doutos Ministros quando da aprovação da Súmula Vinculante nº 13[1]:

(...)

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR MINISTRO CARLOS BRITTO - Ainda acho que “órgão” fica melhor do que “pessoa jurídica”.

A EXCELENTÍSSIMA SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Mas “órgão” fica só “aquele órgão”.

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO - É. Pode ser só um setor, uma seção.

A EXCELENTÍSSIMA SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Pode ser outro órgão, mas da mesma entidade.

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO – É melhor para se evitar dúvida. É até mais abrangente.

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR MINISTRO CARLOS BRITTO – A pessoa jurídica da União. Compreende toda a Justiça Eleitoral do Brasil, em todos os Estados, aqui no TSE. Acho que órgão está mais de acordo com essa imediatidade de vínculo entre o nomeante e o nomeado.

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES (PRESIDENTE) - Mas acho que a idéia é abranger, na verdade, a pessoa jurídica. Porque, se houver intervalos nas relações, por exemplo, entre o prefeito, ele não pode nomear nem - parece que isso decorre do espírito - no seu gabinete, nem na secretaria de fazenda. Então tem a vantagem.

A EXCELENTÍSSIMA SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Exatamente. São dois órgãos diferentes.

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR MINISTRO CARLOS BRITTO - Tem essa vantagem, é mais amplo.

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES (PRESIDENTE) - É esse o espírito, parece-me -, não é?

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR MINISTRO CARLOS BRITTO – Ou seja, a proibição se faz mais rígida.

A EXCELENTÍSSIMA SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Nem na secretaria da saúde, nem na secretaria da administração. São dois órgãos diferentes.

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR MINISTRO CARLOS BRITTO – Se o espírito é esse, está melhor. A proibição se faz mais rígida e é muito mais difícil de fraude, de contorno. Está melhor assim: “pessoa jurídica”. (...) (grifos nossos)

Assim, ficou expressa a intenção do Supremo Tribunal Federal quando da edição da Súmula Vinculante em comento em elastecer sua aplicação à pessoa jurídica, com o englobamento dos órgãos subalternos.

Ocorre, entretanto, que a terminologia utilizada fez crescer uma interpretação que diverge daquela adotada pelo STF na discussão da Súmula.

Insta discorrermos sobre a denominação “mesma pessoa jurídica”, que consta da redação da Súmula Vinculante nº 13, do STF.

Dispõe o Código Civil em seu art. 41, sobre o elenco das pessoas jurídicas de direito público:

Art. 41. São pessoas jurídicas de direito público interno:

I - a União;

II - os Estados, o Distrito Federal e os Territórios;

III - os Municípios;

IV - as autarquias, inclusive as associações públicas;

V - as demais entidades de caráter público criadas por lei. (grifo nosso)

Dessa forma, há entendimento de alguns Tribunais no sentido de que as pessoas jurídicas de direito público são os entes federativos, suas autarquias, fundações e demais entidades de caráter público criadas por lei.

Assim discorreu o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, em recente julgado:

Ementa: AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇAO CIVIL PUBLICA. EXONERAÇÃO DE SERVIDORES OCUPANTES DE CARGO EM COMISSÃO. NEPOTISMO. MANUTENÇÃO. O agravo interposto de decisão que aplicou Súmula Vinculante do Egrégio STF não merece seguimento. A decisão que determina a exoneração, dos cargos em comissão, de servidores que detém parentesco até o terceiro grau - filho e cunhado - com servidor que integre a mesma pessoa jurídica do nomeante dá cumprimento à Súmula Vinculante n. 13 do STF. Precedente. Nos termos do que dispõe o art. 41, III do CCB, o Município é a pessoa jurídica de direito interno, da qual integram os servidores do Legislativo, que conquanto seja Poder autônomo, não detém personalidade jurídica própria. Precedentes. AGRAVO A QUE SE NEGA SEGUIMENTO. (Agravo de Instrumento Nº 70042838052, Vigésima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Denise Oliveira Cezar, Julgado em 20/05/2011)

Nessa linha, não seria correto dizer que a Câmara Municipal de Vereadores configuraria pessoa jurídica diversa do Município.

O célebre Rui Stocco, em argumentação sobre a capacidade processual das Câmaras de Vereadores, afirmou:

“Certo é que a Câmara não tem personalidade jurídica, mas tem personalidade judiciária. Pessoa jurídica é o Município. Mas nem por isso há de negar capacidade processual, ativa e passiva, à Edilidade, para ingressar em juízo quando tenha prerrogativas ou direitos próprios a defender.

A personalidade jurídica não se confunde com a personalidade judiciária; esta é um minus em relação àquela. Toda pessoa jurídica tem, necessariamente, capacidade processual, mas órgãos há que, embora sem personalidade jurídica, podem estar em juízo, em seu próprio nome, em mandado de segurança porque são titulares de direitos subjetivos suscetíveis de proteção judicial quando relegados ou contestados. Nessa situação se encontram os órgãos do governo local - Prefeitura e Câmara - aos quais se atribuem funções específicas, prerrogativas funcionais, e direitos próprios inerentes à instituição. Desde que estes órgãos têm direitos subjetivos, hão de ter meios judiciais - mandado de segurança - e capacidade processual para defendê-los e torná-los efetivos.”[2] (grifos nossos)

Seguindo este entendimento, a constatação de nepotismo no âmbito municipal independeria de nomeações recíprocas, devendo ser observada a regra contida na Súmula Vinculante nº 13, do STF, sendo vedada a simples nomeação de parentes de membros de um dos Poderes para exercício de cargo no outro, sem “trocas”.

Entretanto, a questão não é pacífica, como veremos.

Inclusive, o próprio Tribunal de Justiça do Paraná, perfila de entendimento contrário, ou seja, sobre a necessidade de concessões recíprocas entre membros do Poder Executivo e Poder Legislativo:

DECISÃO: Acordam os Desembargadores integrantes da Quarta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade, em dar parcial provimento ao recurso. EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - NEPOTISMO - APLICAÇÃO DA SÚMULA VINCULANTE Nº 13 - SECRETARIADO MUNICIPAL - CARGO DE NATUREZA POLÍTICA - AUSÊNCIA DE IRREGULARIDADE - CARGOS DE DIREÇÃO E ASSESSORAMENTO - LIGAÇÃO PARENTAL COM AUTORIDADE EM PODER DIVERSO - NECESSIDADE DE CONFIGURAÇÃO DE NOMEAÇÕES RECÍPROCAS - NEPOTISMO CRUZADO NÃO COMPROVADO - RECURSO A QUE SE DÁ PARCIAL PROVIMENTO. 1) Segundo firme entendimento do STF, os cargos de natureza política, tais quais os de Secretário, não se submetem às limitações da Súmula Vinculante nº 13, sendo livre sua nomeação. 2) Para que haja configuração de irregularidade na nomeação, pelo viés do nepotismo, no caso em que o nomeado tem relação de parentesco com autoridade ocupante de cargo somente em outro Poder, é necessário que se demonstre a ocorrência do denominado "nepotismo cruzado", isto é, que autoridades nomeantes beneficiem, reciprocamente, parentes seus em Poderes distintos. Tal situação não foi comprovada nos autos, de forma que as nomeações realizadas mostram- se regulares. 3) A nomeação do companheiro da autoridade nomeante, para ocupação de cargo de assessoramento, perante o mesmo Poder Executivo, configura-se em situação de plena aplicação da Súmula Vinculante nº 13, sendo irregular tal nomeação.  

(Apelação Cível nº605378-5, 4ª Câmara Cível, Tribunal de Justiça do Paraná, Relator: Desembargador Luís Carlos Xavier, Julg. 29.11.2011)

Também nesse diapasão entende a 8ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo e a 3ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de Santa Catarina:

Ementa: APELAÇÃO AÇÃO CIVIL PÚBLICA OBRIGAÇÃO DE FAZER E DE NÃO FAZER Ajuizamento visando decisão judicial para compelir o Prefeito Municipal a observar a aplicação da Súmula Vinculante nº 13, bem como para condená-lo na obrigação de fazer consistente na exoneração de cinco servidores comissionados parentes de Vereadores Municipais Improcedência do pedido pronunciada em primeiro grau Decisório que merece subsistir Nomeações realizadas dentro da legalidade. Nepotismo cruzado não configurado na espécie. Negado provimento ao recurso.

(Apelação Cível nº 0003133-56.2009.8.26.0189, 8ª Câmara de Direito Público, Tribunal de Justiça de São Paulo, Relator: Des. Rubens Rihl, Julg. 24/08/2011)

Apelação cível e reexame necessário. Ação Popular. Administrativo. Pretendido o afastamento de Prefeito do cargo, em vista de condenação criminal transitada em julgado, bem como a nulificação de atos de improbidade, resultantes de suposto nepotismo cruzado entre o Poder Legislativo e Executivo. Afastamento superveniente do alcaide, oriundo de ação civil de improbidade administrativa. Ausência superveniente de interesse processual no tocante ao pedido de afastamento do Chefe do Poder Executivo. Nepotismo. Parentes de vereadores contratados pelo Município, ora por concurso público para cargo efetivo, ora por processo seletivo para cargo temporário, sem demonstração, contudo, de que tenha havido reciprocidade ou ajuste entre as autoridades nomeantes. Prova não produzida. Sentença irretorquível. Remessa obrigatória e recurso voluntário desprovidos.

(Apelação Cível nº 2010.075422-1, 4ª Câmara de Direito Público, Tribunal de Justiça de Santa Catarina, Relator: Des. Pedro Manoel Abreu, Julg. 05.05.2011)

O Supremo Tribunal Federal, em decisão do Min. Marco Aurélio no bojo da Rcl 11129 MC / SP, também nesse sentido entendeu:

“(...) 2. Tudo recomenda o julgamento definitivo da reclamação considerado o Verbete Vinculante nº 13. De início, tem-se decisão interlocutória do Juízo, sendo certo que elucida a ausência de parentesco dos interessados com o Chefe do Poder Executivo ou outro servidor detentor de cargo de direção, chefia ou assessoramento. Não há notícia de procedimento que possa ser apanhado pela cláusula final do citado Verbete, ou seja, de prática de nomeações recíprocas presente o Executivo e o Legislativo. Eis o teor do Verbete:

                  A nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, da autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa jurídica investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o exercício de cargo em comissão ou de confiança ou, ainda, de função gratificada na administração pública direta e indireta em qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, compreendido o ajuste mediante designações recíprocas, viola a Constituição Federal.
3. Indefiro a liminar.”

(Medida Cautelar da Reclamação nº 11.129/SP, STF, Relator: Min. Marco Aurélio, Julg. 27.11.2011)

Dessa forma, mostra-se espinhoso o tema, ficando a cargo da autoridade nomeante sopesar os argumentos aqui expostos e trilhar o caminho mais adequado, proporcional e moralmente mais indicado, de acordo com sua análise e subjetividade.

Lembramos, mais uma vez, que tal debate é feito somente em sede de argumentação, não configurando, de maneira alguma, exposição de motivos do ato questionado.

4)       Sobre o requerimento de motivação para o ato de dispensa pela autoridade, temos por prejudicada a análise por esta Procuradoria, tendo em vista a natureza discricionária do ato, em evidente exceção ao princípio da motivação dos atos administrativos, conforme disposto no art. 37, II, da CF/88:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

(...)

II - a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração; (grifo nosso)

Assim, deixamos de nos manifestar sobre a motivação do ato questionado, posto que exclusiva sua exposição pela autoridade nomeante.

II.        DA NATUREZA DESTE PARECER.

É importante salientar que as considerações feitas neste parecer são meras recomendações ao Administrador Público, expondo quais são as possibilidades jurídicas e recomendações doutrinárias e jurisprudenciais.

O poder decisório, por óbvio, está alheio às nossas competências e possibilidades.

Outrossim, insta salientar que a análise feita por esta Procuradoria cinge-se aos documentos presentes nos autos e as exigências presentes na legislação pertinente.

A aferição da veracidade das informações e documentos escapa à competência e às possibilidades deste órgão, sendo sempre necessária a fiscalização efetiva pelos órgãos competentes.

Salvo melhor juízo, é o parecer.

João Paulo da Silva

OAB/PR 59.291



[1] http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/jurisprudenciaSumulaVinculante/anexo/DJE_11.11.2008.pdf

[2] STOCO, Rui. Natureza jurídica das câmaras municipais. Disponível em: <http://blig.ig.com.br/mnvaz/2009/02/23/natureza-juridica-das-camaras-municipais-por-rui-stocco/>. Acesso em 14/02/2012.

Assuntos: Concurso Público, Direito Administrativo, Direitos do funcionário público, Funcionalismo público

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