O limite do poder diretivo do empregador e a caracterização do assédio moral

02/05/2012. Enviado por

O presente artigo tem por objetivo mostrar que deve haver limites ao poder diretivo do empregador em face do assédio moral, à busca desenfreada pelo lucro, ao modelo econômico neoliberal globalizado que gera o descaso em relação à dignidade humana.

1 INTRODUÇÃO

O assédio moral é desconhecido por grande parte das pessoas, inclusive a própria justiça tem tido dificuldades para tratar do assunto, visto inexistir no Brasil lei específica que trate do tema, definindo-o e quais as punições a serem aplicadas. Apesar disto, tem crescido o número de denúncias nos últimos anos.

A exposição do empregado a situações humilhantes e constrangedoras de maneira repetitiva, o afeta-o física e psicologicamente, prejudicando seu desempenho e muitas vezes levando-o a abandonar seu emprego, dada a pressão exercida, sendo as maiores vítimas aquelas pessoas que têm estabilidade no emprego, como as grávidas, podendo ter consequências que vão muito além do ambiente de trabalho.

Atitudes sem ética e respeito tornam o ambiente de trabalho insuportável. Quebra a integridade da vítima e degrada o ambiente de trabalho, gerando medo e angústia. É um comportamento cada vez mais frequente, diante de uma realidade caracterizada pela competitividade empresarial a qualquer custo, muitas vezes sem limites éticos, pelo excesso de oferta de mão-de-obra e pela redução dos postos de trabalho, fenômenos surgidos com a globalização e a disseminação das empresas transnacionais.

Não é um fenômeno dos tempos modernos. É um fenômeno generalizado, que afeta uma parte significativa da força de trabalho em todo o mundo.

É objeto de estudo de várias ciências, além do Direito.

2 PRINCÍPIOS DO DIREITO DO TRABALHO[1]

2.1 PRINCÍPIO DE PROTEÇÃO

No direito comum a preocupação está em assegurar igualdade jurídica às partes, já no direito trabalhista a preocupação principal está em proteger uma das partes. Portanto, este princípio tem o objetivo de estabelecer um amparo preferencial ao TRABALHADOR.

Este princípio se expressa de três formas, a saber:

a) In Dubio, Pro Operario – a interpretação do ordenamento jurídico deve-se ocorrer o mais favorável ao trabalhador;

b) Norma mais favorável – havendo mais de uma norma aplicável, deve-se optar pela mais favorável.

c) Condição mais benéfica - a aplicação de uma norma trabalhista jamais deve servir para diminuir a condição mais favorável que se encontra o trabalhador.   

2.2 PRINCÍPIO DA IRRENUNCIABILIDADE

Diz Miguel Hernainz Márquez, “é a não possibilidade de privar-se  voluntariamente, em caráter amplo e por antecipação, dos direitos concedidos pela legislação trabalhista”.

2.3 PRINCÍPIO DE CONTINUIDADE

Manuel Alonso Olea elucida, “O contrato de trabalho é, por assim dizer, um negócio jurídico de extrema vitalidade, de uma grande dureza e resistência em sua duração”.

2.4 PRINCÍPIO DA PRIMAZIA DA REALIDADE

Independentemente do que as partes tenham pactuado de forma solene ou expressa prevalece o que ocorre na prática.

2.5 PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE

Diz Pinho Pedreira, “Nas relações de trabalho, as partes, os administradores e juízes devem conduzir-se de uma maneira razoável na solução de problemas ou conflitos decorrentes”.

2.6 PRINCÍPIO DA BOA-FÉ

Krotoschin ao relatar o dever de fidelidade na relação de trabalho, diz:

No fundo, a fidelidade, não apenas etimológica, mas também materialmente, é outra expressão daquela boa-fé que tanta importância tem no contrato de trabalho que, portanto, engloba todo um conjunto de deveres recíprocos, emanados do espírito de colaboração e confiança que também no terreno interindividual caracteriza a relação de trabalho.

3 PODER DIRETIVO DO EMPREGADOR[2]

É o poder que deve ser exercido com limites fixados pela lei, doutrina e jurisprudência. Contudo, é legítimo e autorizado pelo Estado a fim de possibilitar o exercício de sua atividade econômico-empresarial, sua atuação pode por vezes extrapolar e atingir os direitos personalíssimos do empregado, haja vista a prática de atitudes arbitrárias, abusivas ou ilegais.

Portanto, apesar dos avanços, as relações trabalhistas ainda não são o retrato do total respeito à dignidade e liberdade do trabalhador, encontrando desmandos de empregadores despreparados que extrapolam o direito de disciplinar e dirigir a conduta do empregado no exercício da atividade laboral, chegando ao absurdo de quererem controlar a vida íntima e externa do trabalhador para mantê-lo em seu comando sob quaisquer meios e condições.

4 CONTRATO DE TRABALHO

Nas palavras de Amauri Mascaro Nascimento para configurar um contrato de trabalho faz-se necessário a existência de algumas características, tais como: pessoalidade, profissionalidade, indissociabilidade, continuidade e subordinação.

5 RELAÇÃO DE TRABALHO

5.1 DEFINIÇÃO

Dispõe o artigo 2º da CLT:

Considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviço.

        § 1º - Equiparam-se ao empregador, para os efeitos exclusivos da relação de emprego, os profissionais liberais, as instituições de beneficência, as associações recreativas ou outras instituições sem fins lucrativos, que admitirem trabalhadores como empregados.

        § 2º - Sempre que uma ou mais empresas, tendo, embora, cada uma delas, personalidade jurídica própria, estiverem sob a direção, controle ou administração de outra, constituindo grupo industrial, comercial ou de qualquer outra atividade econômica, serão, para os efeitos da relação de emprego, solidariamente responsáveis a empresa principal e cada uma das subordinadas.

Assim, observamos que o empregador exerce um poder de comando sobre o empregado. Ele fixa comandos da empresa que devem ser obedecidos e aceitos pelo empregado. Todavia, esses comandos têm de ter limites e, ao ultrapassá-los, o empregador estará desrespeitando seu poder de comando.

A princípio, o empregado tem de obedecer às normas da empresa imposta pelo empregador, caso contrário, poderá sofrer sanções, elencados no artigo 482 da CLT, dependendo do seu grau de insubordinação.

Art. 482 - Constituem justa causa para rescisão do contrato de trabalho pelo empregador:

  1.    a) ato de improbidade;
  2.    b) incontinência de conduta ou mau procedimento;
  3.    c) negociação habitual por conta própria ou alheia sem permissão do empregador, e quando constituir ato de concorrência à empresa para a qual trabalha o empregado, ou for prejudicial ao serviço;
  4.    d) condenação criminal do empregado, passada em julgado, caso não tenha havido suspensão da execução da pena;
  5.    e) desídia no desempenho das respectivas funções;
  6.    f) embriaguez habitual ou em serviço;
  7.    g) violação de segredo da empresa;
  8.    h) ato de indisciplina ou de insubordinação;
  9.    i) abandono de emprego;
  10.    j) ato lesivo da honra ou da boa fama praticado no serviço contra qualquer pessoa, ou ofensas físicas, nas mesmas condições, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem;
  11.    k) ato lesivo da honra ou da boa fama ou ofensas físicas praticadas contra o empregador e superiores hierárquicos, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem;
  12.    l) prática constante de jogos de azar.

   Parágrafo único - Constitui igualmente justa causa para dispensa de empregado a prática, devidamente comprovada em inquérito administrativo, de atos atentatórios à segurança nacional.

Ao demitir o empregado por justa causa, o empregador está dentro de seu poder de comando, na forma da lei. Caberá ao empregado comprovar em juízo que não houve a referida falta. E caso o juiz acate a versão do empregado, este poderá ser reintegrado ou terá direito a uma indenização, na forma do artigo 7º, inciso I, da Constituição Federal, igual a quarenta por cento sobre os depósitos do FGTS, férias proporcionais, 13º salário proporcional e as demais verbas como se fosse demitido imotivadamente.

Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

I - relação de emprego protegida contra despedida arbitrária ou sem justa causa, nos termos de lei complementar, que preverá indenização compensatória, dentre outros direitos.

Por existir uma pena especificada em lei no caso do empregado demonstrar que a dispensa por justa causa pelo empregador não foi correta, a cumulatividade com um pedido de indenização por danos morais não deve ser aceito, porquanto não constitui um dano ao empregado, mas um direito potestativo do empresário. Se um juiz decidir conceder o dano moral ao empregado, estará punindo duas vezes o empregador por ato que está implícito em seu poder de comando.

O mesmo acontecerá no caso de uma rescisão indireta, elucidada no artigo 483 da CLT.

Art. 483 - O empregado poderá considerar rescindido o contrato e pleitear a devida indenização quando:

  1.    a) forem exigidos serviços superiores às suas forças, defesos por lei, contrários aos bons costumes, ou alheios ao contrato;
  2.    b) for tratado pelo empregador ou por seus superiores hierárquicos com rigor excessivo;
  3.    c) correr perigo manifesto de mal considerável;
  4.    d) não cumprir o empregador as obrigações do contrato;
  5.    e) praticar o empregador ou seus prepostos, contra ele ou pessoas de sua família, ato lesivo da honra e boa fama;
  6.    f) o empregador ou seus prepostos ofenderem-no fisicamente, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem;
  7.    g) o empregador reduzir o seu trabalho, sendo este por peça ou tarefa, de forma a afetar sensivelmente a importância dos salários.

     § 1º - O empregado poderá suspender a prestação dos serviços ou rescindir o contrato, quando tiver de desempenhar obrigações legais, incompatíveis com a continuação do serviço.

     § 2º - No caso de morte do empregador constituído em empresa individual, é facultado ao empregado rescindir o contrato de trabalho.

     § 3º - Nas hipóteses das letras "d" e "g", poderá o empregado pleitear a rescisão de seu contrato de trabalho e o pagamento das respectivas indenizações, permanecendo ou não no serviço até final decisão do processo.

Se o empregado demonstrar em juízo que o empregador abusou de seu poder de comando, ele terá direito à uma indenização já prevista na legislação trabalhista, motivo que não há porque se falar em dano moral. Este deverá decorrer de atos que atinjam sua intimidade, sua honra e integridade mental, e não daqueles que decorrerem do poder de comando do empregador ou de discriminação expressa em lei específica.

Porém, existem doutrinadores que admitem a cumulatividade do dano moral com outra indenização no pedido da inicial. É no caso do empregado que sofre assédio moral durante sua jornada de trabalho. Quando o empregado se vê numa situação de extremo desconforto por atitudes além do poder de comando do empregador, poderá rescindir indiretamente o seu contrato de trabalho.

As verbas decorrentes deste tipo de rescisão são devidas, pois estão amparadas legalmente e, se restar comprovado que o empregador foi responsável por atos de desrespeito à dignidade e integridade física e moral do empregado, não há como deixar de deferir a cumulação com a indenização por danos morais.

O juiz julgador da causa deverá se atentar para não cometer injustiças no mundo prático, é a diferença do que é um ato decorrente da relação de emprego e um ato danoso moralmente.[3]

6 DANO MORAL

6.1 DEFINIÇÃO

Conceitua Maria Helena Diniz, “o dano moral é a lesão de interesses não patrimoniais de pessoa física ou jurídica, provocada pelo ato lesivo. Qualquer lesão que alguém sofra no objeto de seu direito, repercutirá, necessariamente, em seu interesse”.[4]

Desde a promulgação da Consolidação das Leis Trabalhistas, já se admitia expressa e legalmente a reparação e indenização por danos morais em seus artigos 482, “j” e “k” e 483, “e”. Sendo assim, a reparação pode ser de responsabilidade tanto do empregador como do empregado.[5]

Art. 482 - Constituem justa causa para rescisão do contrato de trabalho pelo empregador:

(...)

  1.        j) ato lesivo da honra ou da boa fama praticado no serviço contra qualquer pessoa, ou ofensas físicas, nas mesmas condições, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem;
  2.       k) ato lesivo da honra ou da boa fama ou ofensas físicas praticadas contra o empregador e superiores hierárquicos, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem;

 Art. 483 - O empregado poderá considerar rescindido o contrato e pleitear a devida indenização quando:

(...)

  1.       e) praticar o empregador ou seus prepostos, contra ele ou pessoas de sua família, ato lesivo da honra e boa fama;

Vasquez Vialard[6] expõe que:

Se em algum âmbito de direito o conceito de dano moral pode ter alguma aplicação é, precisamente, no do trabalho. A razão de subordinação a que está sujeito o trabalhador na satisfação de seu débito leva a que a atuação da outra parte, que dirige esta atividade humana, possa menoscabar a faculdade de atuar que diminui ou até frustra totalmente a satisfação de um interesse não patrimonial. [7]

No mesmo sentido, Jorge Pinheiro Castelo[8] aduz que:

A condenação no pedido de dano moral é fundamental para que se ponha um paradeiro em alegações pesadas, insinceras e levianas contra a honra das pessoas, especialmente de alguém que, por vezes, dedica até anos de sua vida a uma empresa. É preciso impor um basta à impunidade e penalizar a má-fé e a falta de seriedade e ética nas relações laborais.                      

6.2 ASPECTOS CONSTITUCIONAIS E LEGAIS

Flávio Augusto Ramanauskas[9], em seu trabalho monográfico, levantou uma interessante questão: “Por que será que não encontramos facilmente a expressão dano moral nos índices remissivos dos livros de Direito do Trabalho, já que é uma questão plenamente admissível e pacificada”?

Explica então que a partir da promulgação da CF/ 88, no seu artigo 5º, incisos V e X, esta matéria passou a adquirir relevância, declarada como direitos e garantias fundamentais. Elenca sete legislações onde podemos encontrar proteção ao dano moral. São elas:

  •                          Constituição Federal, art. 5º, V e X:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

(...)

       V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem;

(...)

       X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;

 

  •                        Código Civil Brasileiro, arts. 159, 1.537, 1.538, 1.547, 1.548, 1.550:

Art. 159. Serão igualmente anuláveis os contratos onerosos do devedor insolvente, quando a insolvência for notória, ou houver motivo para ser conhecida do outro contratante.

 

Art. 1.537. O instrumento da autorização para casar transcrever-se-á integralmente na escritura antenupcial.

Art. 1.538. A celebração do casamento será imediatamente suspensa se algum dos contraentes:

I - recusar a solene afirmação da sua vontade;

II - declarar que esta não é livre e espontânea;

III - manifestar-se arrependido.

Parágrafo único. O nubente que, por algum dos fatos mencionados neste artigo, der causa à suspensão do ato, não será admitido a retratar-se no mesmo dia.

Art. 1.547. Na dúvida entre as provas favoráveis e contrárias, julgar-se-á pelo casamento, se os cônjuges, cujo casamento se impugna, viverem ou tiverem vivido na posse do estado de casados.

Art. 1.548. É nulo o casamento contraído:

I - pelo enfermo mental sem o necessário discernimento para os atos da vida civil;

II - por infringência de impedimento.

Art. 1.550. É anulável o casamento:

I - de quem não completou a idade mínima para casar;

II - do menor em idade núbil, quando não autorizado por seu representante legal;

III - por vício da vontade, nos termos dos arts. 1.556 a 1.558;

IV - do incapaz de consentir ou manifestar, de modo inequívoco, o consentimento;

V - realizado pelo mandatário, sem que ele ou o outro contraente soubesse da revogação do mandato, e não sobrevindo coabitação entre os cônjuges;

VI - por incompetência da autoridade celebrante.

Parágrafo único. Equipara-se à revogação a invalidade do mandato judicialmente decretada.

  •                          Código Eleitoral, art. 234:

Art. 234. Ninguém poderá impedir ou embaraçar o exercício do sufrágio.

  •                          Código de Defesa do Consumidor, art. 6º, VII:

Art. 6º São direitos básicos do consumidor:

(...)

VII - o acesso aos órgãos judiciários e administrativos com vistas à prevenção ou reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos ou difusos, assegurada a proteção Jurídica, administrativa e técnica aos necessitados;

  •                          Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei Nº 8.069/ 90), art. 7:

Art. 7º A criança e o adolescente têm direito a proteção à vida e à saúde, mediante a efetivação de políticas sociais públicas que permitam o nascimento e o desenvolvimento sadio e harmonioso, em condições dignas de existência.

  •                         Direitos de Autor (Lei Nº 9.610/98), arts. 25 a 27:

Art. 25. Cabe exclusivamente ao diretor o exercício dos direitos morais sobre a obra audiovisual.

Art. 26. O autor poderá repudiar a autoria de projeto arquitetônico alterado sem o seu consentimento durante a execução ou após a conclusão da construção.

        Parágrafo único. O proprietário da construção responde pelos danos que causar ao autor sempre que, após o repúdio, der como sendo daquele a autoria do projeto repudiado.

Art. 27. Os direitos morais do autor são inalienáveis e irrenunciáveis.                             

  •                         Código de Propriedade Industrial, art. 126:

Art. 126. A marca notoriamente conhecida em seu ramo de atividade nos termos do art. 6º bis (I), da Convenção da União de Paris para Proteção da Propriedade Industrial, goza de proteção especial, independentemente de estar previamente depositada ou registrada no Brasil.

        § 1º A proteção de que trata este artigo aplica-se também às marcas de serviço.

       § 2º O INPI poderá indeferir de ofício pedido de registro de marca que reproduza ou imite, no todo ou em parte, marca notoriamente conhecida.

Porém, é indubitável que não há outro âmbito em que o dano moral se aplica tanto como no Direito Trabalhista; isto por causa da relação de subordinação a que está sujeito o trabalhador na relação de trabalho.

6.3 DANO MORAL NAS FASES CONTRATUAIS

Parte da doutrina entende que a fase pré-contratual não estabelece um vínculo efetivo entre empregador e empregado, posto que ainda não se firmou o contrato de trabalho e que, portanto, é competência da justiça comum conhecer da ação, bem como julgá-la[10].

Apesar deste entendimento, é pacífico na jurisprudência trabalhista o direito à indenização tanto na fase pré-contratual como na pós-contratual.

Vejamos as cinco fases que pode ser apurado o dano moral trabalhista:

  1. a) Fase Pré-Contratual - procedimento prévio à efetiva contratação do empregado. Nesta fase, o empregador, ou seu preposto, faz uma seletiva para contratar ou promover determinado empregado. Isto se dará através de várias formas: solicitação de dados pessoais, análise de curriculum vitae, entrevistas, questionários, exames médico e psicotécnico e prova grafológica [11].

Sobre esta última, Teixeira Lima afirma que:

Ela é em tese, demolidora da tutela à intimidade. Partindo da escrita do candidato, visa desnudar seus recatos, revelar, por uma fórmula matriz, o caráter, a personalidade da pessoa. Sua invasividade é evidente. E a lesão ao direito não está no vazamento do resultado da prova, mas na aplicação do teste em si, já que a recusa do pretendente a emprego de submeter-se aos desígnios da grafologia tolherá a possibilidade de sua contratação. [12]

Sobre o teste psicotécnico, o autor supracitado nos ensina que ele difere da prova grafológica, na medida em que não se aprofunda sobre o âmago do ser. O exame psicotécnico aplicado ao trabalho tem a ver com fatores motivacionais e de adaptabilidade do candidato ao cargo, o que é comparável com a possibilidade de aferição das condições de saúde do pretendente ao posto de trabalho. [13]

Délio Maranhão sustenta que:

Se os entendimentos preliminares chegaram a um ponto que faça prever a conclusão do contrato e uma das partes os rompe sem um motivo justo e razoável (culpa in contrahendo), a outra terá o direito ao ressarcimento do dano por esse rompimento (interesse contratual negativo) quando possa provar que, confiando na previsível conclusão do contrato, fez despesas em virtude de tais entendimentos ou deixou de aceitar outra oferta mais vantajosa. Consideramos perfeitamente cabível uma ação dessa natureza na Justiça do Trabalho, em face do art. 114 da Constituição, que fala em “outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho.”

Dir-se-á que esta relação não se chegou a completar. Mas o dano se apura, e a culpa ocorre na fase preliminar de um contrato de trabalho: a controvérsia se origina, pois, de uma relação de trabalho, embora no nascedouro.[14]

O dano moral trabalhista também se verifica nos casos em que o empregador deixa explícito dentro da empresa que o motivo que o levou a não contratar determinado empregado foi por preconceito, seja racial, moral ou de qualquer outro tipo, como por exemplo, dizer que tal contratação não prosperou porque a pessoa era soro positivo, cleptomaníaca, homossexual, prostituta, etc. Este tipo de publicidade totalmente sem necessidade torna-se ainda mais grave quando é falsa.

A Lei nº 9.029/1995 que proíbe a exigência de atestados de gravidez e esterilização e, outras práticas discriminatórias para efeitos admissionais ou de permanência da relação jurídica de trabalho, e dá outras providências, veda expressamente em seu art. 1º a prática discriminatória e limitativa para efeito de acesso à relação de emprego ou sua manutenção, por motivo de sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar ou idade. Nesta mesma linha, a CF/88 prevê em seus arts. 5º, incisos VI, XVII e 8º, inciso V, a liberdade de crença das pessoas e vedação de discriminações às escolhas das mesmas.[15]

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

(...)

VI - é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias;

(...)

XVII - é plena a liberdade de associação para fins lícitos, vedada a de caráter paramilitar;

 

Art. 8º É livre a associação profissional ou sindical, observado o seguinte:

(...)

V - ninguém será obrigado a filiar-se ou a manter-se filiado a sindicato;

Outro caso em que podemos aferir o dano moral trabalhista é quando o empregador pré-ajusta a contratação de um empregado, fazendo com que o mesmo se adapte ao “pré-emprego”, pedindo demissão do seu trabalho atual, mudando de cidade, alugando imóvel na cidade da empresa contratante, matriculando os filhos na nova cidade e, de repente, é pego de surpresa quando do cancelamento do contrato.[16]

  1. b) No momento da contratação – caracteriza-se com a assinatura do contrato de trabalho. Por algum motivo, o empregador interrompe o curso da contratação, afirmando algum fato ilícito e/ou vexatório à figura do empregado ou simplesmente não externaliza o motivo.

Em alguns procedimentos prévios à contratação pode-se verificar a solicitação da ficha de antecedentes criminais do candidato. No Brasil não há impedimentos para tal prática, porém, é importante prestar atenção no que dispõe o inciso LVII do artigo 5º da CF/ 88, qual seja: “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória”.[17]

  1. c) Na fase de execução do contrato - o dano moral pode ocorrer quando o empregador não cumpre algumas obrigações relacionadas à higiene ou segurança no trabalho e de respeito à personalidade e dignidade do trabalhador.

No caso do agente ofensivo ser o empregado, Pinho Pedreira cita como exemplo o empregado que não cumpre suas obrigações acessórias, derivadas da relação empregatícia e trata seu empregador e seus representantes com desrespeito à sua personalidade e dignidade.[18] Essas obrigações emanam do princípio geral da execução de boa fé do contrato, basilar da disciplina contratual.

Segundo João de Lima Teixeira Filho, na execução do contrato de trabalho, a intimidade do trabalhador expõe-se a arranhaduras. Uma das questões mais discutidas na atualidade, devido à introdução de novas tecnologias e técnicas gerenciais, diz respeito às formas de controle da atividade do trabalhador no local de trabalho. Dentre elas, encontramos os controles visuais (vídeo) e auditivo (escuta), as revistas pessoais e de pacotes.[19]

Neste sentido, Enoque Ribeiro dos Santos revela que:

A invasão da intimidade do empregado, por violar direito, salvo se por autorização judicial, não legitima o exercício do poder disciplinar nem o jus variandi pelo empregador. Mesmo que a falta se tenha verificado ou a alteração contratual seja pertinente, a ilicitude de forma as torna insubsistentes, além de reparável o Dano Moral.[20]

Sendo assim, não é admitida a rescisão por justa causa quando a intimidade do empregado é violada, salvo quando autorizada judicialmente.

Outro exemplo de dano moral nesta fase é quando o empregado é colocado em uma situação vexatória quando deslocado para atividades menos nobres que as desempenhadas anteriormente. Neste caso, entende-se que “há o desencadeamento da rescisão do contrato por via oblíqua, suscitando o dano moral e a lesão à honra do obreiro que, exige a compensação pelo dano moral”. [21]

A prática persistente e contumaz do empregador de chacotear a pessoa do empregado, de fazer deboche, gracejos, que macula a imagem do ofendido no meio em que convive, também enseja a reparação por danos morais. [22]

O art. 483 da Consolidação das Leis do Trabalho autoriza o empregado a rescindir o contrato de trabalho e pleitear a devida indenização quando o empregador invadir sua vida privada nos casos:

l                  forem exigidos serviços superiores às suas forças;

l                  se for tratado com rigor excessivo;

l                  correr perigo manifesto de mal considerável;

l                  não cumprir o empregador as obrigações do contrato;

l                  praticar o empregador ou seus prepostos, contra ele e sua família, ato lesivo da honra e da boa fama;

l                  o empregador ou seus prepostos ofenderem-no fisicamente, etc.[23]

Quando ocorrerem estes casos, o empregado terá direito a pleitear indenização por danos morais e materiais.

  1. d) No momento da despedida do empregado - É nesta fase, no qual os ânimos estão mais exaltados, que mais ocorre a perpetração do ato ilícito.

João de Lima Teixeira Filho, explica:

“É na cessação do contrato de trabalho que as emanações da vida provada do empregado são captadas pelo ordenamento jurídico, autorizando o empregador a romper, sem ônus, o vínculo de emprego.[...] estas justas causas praticadas pelo empregado podem provocar um dano moral em seu empregador. Todavia, se desfeito o contrato, por qualquer destes motivos, não restar provada em juízo a justa causa, a comutação da rescisão motivada em dispensa injusta redundará para o empregado o direito à percepção de indenizações trabalhistas e da compensação pelo dano moral, ambas decorrentes da infundada imputação”. [24]

Sendo assim, o empregado terá direito a pleitear indenização por danos morais sempre que o empregador lhe imputar, no momento de sua dispensa, acusações infundadas e não verdadeiras que venham a lhe difamar e diminuir.

  1. e) Após a extinção do contrato de trabalho - Quando o empregador age de forma lesiva à moral do empregado momentos após a extinção do contrato laboral, tem-se a despedida injuriosa.

Afirma Pinho Pedreira que:

“A imputação mentirosa que causa atentado à honra do empregado constituirá por esse fato uma falta caracterizada que compromete a responsabilidade do empregador que agiu com espírito de malícia ou pelo menos com uma leviandade censurável”.[25]

Da mesma forma, o dano moral pode recair sobre a figura do empregador quando o empregado, ao sair da empresa após sua demissão, imputa à mesma ou ao empregador calúnias ou difamações injuriosas ou mentirosas. Desse modo, quem sofrerá a indenização por danos morais será o empregado.

6.4 OUTRAS CIÊNCIAS

Atitudes sem ética e respeito tornam o ambiente de trabalho insuportável. Quebra a integridade da vítima e degrada o ambiente de trabalho, gerando medo e angústia. É um comportamento cada vez mais frequente, diante de uma realidade caracterizada pela competitividade empresarial a qualquer custo, muitas vezes sem limites éticos, pelo excesso de oferta de mão-de-obra e pela redução dos postos de trabalho, fenômenos surgidos com a globalização e a disseminação das empresas transnacionais.

Vem sendo objeto de estudo, por parte dos juristas, por não mais que dez ou quinze anos. Não diz respeito unicamente ao mundo do Direito, mas, também, a psicoterapia, a medicina e a sociologia jurídica vêm se dedicando à pesquisa do tema. Nos últimos anos tem adquirido destaque na doutrina e despertado o interesse da comunidade jurídica em geral, notadamente dos magistrados e advogados.

7 ASSÉDIO MORAL

Quando falamos de atos que ferem o íntimo de uma pessoa numa relação de trabalho, não podemos deixar de analisar um assunto tão antigo, mas com uma intensidade e amplitude em sua abordagem tão recente: o assédio moral. Foi no ano de 2000 que a então mestranda em Psicologia Social da PUC/ SP, Margarida Barreto, defendeu sua tese sob o título “Uma jornada de humilhações”, assunto que até então não tinha grande interferência e reflexão nos debates sobre direitos trabalhistas[26].

A partir deste momento, já em agosto do mesmo ano, um livro de Marie France Hirigoyen sobre o tema foi publicado no Brasil, traduzido pela Editora Bertrand Brasil, com o título Assédio moral: a violência perversa no cotidiano. Desde então o tema tem tido presença constante em todos os instrumentos de mídia, debates, palestras e etc.

O assédio moral consiste em atos de humilhação repetitivos e prolongados durante a jornada de trabalho, que rebaixa, constrange, intimida, menospreza e ofende um(a) empregado(a). Esta atitude causa um sentimento de tristeza, revolta, mágoa, vergonha, sofrimento, raiva e perturbação.

Esta situação é mais comum em relações hierárquicas, assimétricas e autoritárias e a humilhação ocorre justamente com o intuito de forçar o empregado a pedir demissão do emprego. Normalmente, o “assediado moralmente” é vítima constante de xingamentos, isolamento do grupo, difamação, constrangimento, perseguição, desprezo e ironia, tudo por parte dos chefes a qual está subordinado e por parte dos outros empregados que, para se manterem na empresa, muitas vezes tornam-se agentes ativos na prática do assédio moral com medo de serem demitidos ou causarem uma má impressão na empresa por conviverem amigavelmente com pessoas que estão sendo assediadas.

A pesquisa realizada por Margarida Barreto, em 2000, com 870 homens e mulheres vítimas de opressão no ambiente profissional revela como cada sexo reage a essa situação.

Nas mulheres, é comum terem crises de choro, palpitações, sentimento de inutilidade, insônia ou sonolência excessiva, diminuição da libido, distúrbios digestivos e tonturas. Já nos homens, a incidência é maior de casos como depressão, sede de vingança, aumento da pressão arterial, ideia e tentativa de suicídio, falta de ar e aumento no consumo de bebida alcoólica.

O assédio moral constitui um risco invisível, porém concreto nas relações de trabalho e é uma das formas mais poderosas de violência sutil nas relações organizacionais, sendo mais frequente com as mulheres e adoecidos. Para constituir o nexo causal entre a desordem de saúde e as atividades do trabalhador, além do exame clínico (físico e mental) e os exames complementares, quando imprescindíveis, o médico deve analisar, conforme a Resolução 1.488/98, artigo 2º do Conselho Federal de Medicina [27]:

  1. a) A história clínica e ocupacional, decisiva em qualquer diagnóstico e/ou investigação de nexo causal;
  2. b) O estudo de local de trabalho;
  3. c) O estudo da organização do trabalho;
  4. d) Os dados epidemiológicos;
  5. e) A literatura atualizada;
  6. f) A ocorrência de quadro clínico ou subclínico em trabalhador exposto a condições agressivas;
  7. g) A identificação de riscos físicos, químicos, biológicos, mecânicos, estressantes, etc;
  8. h) O depoimento e a experiência dos trabalhadores;
  9. i) Os conhecimentos e as práticas de outras disciplinas e de seus profissionais, sejam ou não da área de saúde".

Embora a forma mais comum de assédio moral seja de chefes em relação aos subordinados, pode acontecer também no caso de um subordinado em relação ao chefe; do grupo de funcionários em relação a um novo chefe e entre os próprios colegas de trabalho. Desta forma, é necessário, na organização e gestão do trabalho, visualizar a possibilidade de ocorrências de diversas origens. Todas as ocorrências, independentemente da origem e da forma, afetam o ambiente do trabalho e provocam danos pessoais àqueles que sofrem a ação.

Visto isto, basta então a efetiva comprovação da existência de nexo de causalidade entre a conduta do agressor (o empregador, seu preposto ou o próprio empregado) e o dano produzido à vítima, para que se verifique a responsabilidade do empregador/ empregado, independentemente de culpa.

7.1 DEFINIÇÃO DOUTRINÁRIA

No início da década de 1980, o psicólogo sueco Heinz Leymann publicou o resultado de pesquisa demonstrando as consequências neuropsíquicas do assédio moral numa pessoa exposta durante certo tempo a tratamentos humilhantes no ambiente de trabalho, pelos superiores ou por colegas de trabalho. A partir deste estudo difundiu-se o conceito de mobbing.

“Mobbing são todos aqueles atos e comportamentos provenientes do patrão, gerente ou superior hierárquico ou de colegas, que traduzem uma atitude de contínua e ostensiva perseguição que possa acarretar danos relevantes às condições físicas, psíquicas e morais da vítima”. (GUEDES), 2003.

Segundo as palavras de Jouberto de Quadros Pessoa Cavalcante e Francisco Ferreira Jorge Neto, aqui reproduzidas:

O individualismo exacerbado reduz as relações afetivas e sociais no local de trabalho, gerando uma série de atritos, não só entre as chefias e os subordinados, como também entre os próprios subordinados. O implemento de metas, sem critérios de bom-senso ou de razoabilidade, gera uma constante opressão no ambiente de trabalho, com transmissão para os gerentes, líderes, encarregados e os demais trabalhadores que compõem um determinado grupo de trabalho. As consequências dessas tensões (= pressões) repercutem na vida cotidiana do trabalhador, com sérias interferências na sua qualidade de vida, gerando desajustes sociais e transtornos psicológicos.

Atualmente, o assédio moral é um dos problemas mais sérios nas relações de trabalho, decorrentes, entre outros fatores, da realidade do mundo globalizado, onde está presente a exacerbada preocupação com a produção, com as concorrências entre empresas, a manutenção e ampliação de mercados explorados pelas empresas, exigindo uma competição agressiva entre trabalhadores e opressão destes por medo e ameaça.

O dicionário Aurélio nos diz que:

“Assédio significa, entre outras coisas, insistência inoportuna junto a alguém, com perguntas, propostas e pretensões, dentre outros sintomas”.

“Assediar, por sua vez, significa perseguir com insistência, que é o mesmo que molestar, perturbar, aborrecer, incomodar, importunar”.

Apesar de o assédio moral ser considerado uma das piores formas de estresse social, somente nas últimas décadas do século XX é que veio a ser estudado pela psicologia e pela sociologia, que o identificaram como um fenômeno destruidor do ambiente laboral.

O assédio moral é um tema bastante divulgado, mas pouco compreendido nas organizações brasileiras e, normalmente, é confundido com o assédio sexual.

Nas palavras de Nascimento (2004, p. 922):

“A importância de se estudar o tema está no alcance de uma definição que pode agrupar uma série de comportamentos que suas vítimas, principalmente aquelas que trabalham em empresas de médio e grande porte, notavam como sendo “algo errado”, porém pela falta de categoria específica deste mal, muitas vezes submetiam-se e tornavam-se cúmplices de tais práticas perversas”.

Marie-France Hirigoyen (2002) conceitua o tema como:

“Toda e qualquer conduta abusiva manifestando-se, sobretudo por comportamentos, palavras, atos, gestos, escritos que possam trazer dano à personalidade, à dignidade ou à integridade física ou psíquica de uma pessoa, por em perigo seu emprego ou degradar o ambiente de trabalho”.

Cria-se no ambiente de trabalho uma situação de conflito entre colegas ou entre superior e subordinado, pondo a pessoa atacada na condição de debilidade, sendo agredida direta ou indiretamente por uma ou mais pessoas, de forma sistemática, geralmente por um período de tempo relativamente longo, tendo por objetivo sua exclusão do mundo do trabalho, consistindo num processo que é visto pela vítima como discriminatório.

Margarida Maria Silveira Barreto (2000) ensina que:

“Assédio moral no trabalho é a exposição dos trabalhadores e trabalhadoras a situações humilhantes e constrangedoras, repetitivas e prolongadas durante a jornada de trabalho e no exercício de suas funções, sendo mais comuns em relações hierárquicas autoritárias e assimétricas, em que predominam condutas negativas, relações desumanas e aéticas de longa duração, de um ou mais chefes dirigida a um ou mais subordinado(s), desestabilizando a relação da vítima com o ambiente de trabalho e a organização, forçando-o a desistir do emprego”.

No Brasil o instituto foi batizado como manipulação perversa, psico terror, coação ou assédio moral. O tema tem sido objeto de estudo de juristas e médicos do trabalho e ganhou notoriedade a partir do estudo feito por Margarida Barreto em seu livro “Violência, Saúde, Trabalho – Uma Jornada de Humilhações”, tendo sido no país o primeiro estudo que tratou da violência no trabalho como um fator de agravamento da saúde.

Genericamente poder-se-ia conceituar assédio moral no ambiente de trabalho como condutas abusivas de chefes ou mesmo colegas, visando a objetivos práticos, que se manifestam por comportamentos, atos, gestos ou palavras que têm repercussão direta na saúde psíquica da vítima.

Entende-se por conduta abusiva impingir ao assediado pressões, intimidações, humilhações, perseguições, ridicularizações, xingamentos, causando situações de degradação das condições de trabalho, com ameaças de demissão, sobrecarga de atividades, desmoralização perante os colegas, falta de reconhecimento e desprezo pelos esforços do empregado, de modo a conduzi-lo ao comportamento almejado pelo assediador. É pressuposto essencial para configurar assédio moral: repetição da conduta e cumulação de atos. Um episódio isolado não caracteriza assédio.

O constante clima de terror psicológico gera na vítima um sofrimento capaz de atingir sua saúde física e psicológica, criando uma pré-disposição ao desenvolvimento de doenças crônicas. Para caracterização do assédio moral, é imperioso que o processo agressor ocorra durante o exercício do trabalho, não podendo ser confundido com questões pessoais que possam surgir dentro do ambiente de trabalho.

A conduta que causa o assédio moral não precisa ser explícita e, em expressivo número de casos não o é, manifestando-se de forma tácita, através de gestos sutis e palavras equívocas, justamente para dificultar sua identificação.

Em outros casos, mais graves e evidentes, o assédio moral se mostra de forma expressa, através de determinações claras e diretas do empregador, a exemplo de deixar o empregado isolado numa sala e sem trabalho ou modificar sua atividade profissional, determinando a realização de tarefas mais singelas, aquém de sua capacidade.

Trata-se de um processo e não de um ato isolado. O objetivo do assédio moral, portanto, é desestabilizar emocionalmente a pessoa, causando-lhe humilhação e expondo-a a situações vexatórias perante os colegas de trabalho, fornecedores, clientes e perante a si mesma. Quando praticado pelo superior hierárquico, tem a clara finalidade de forçar um pedido de demissão ou a prática de atos que possam ensejar a caracterização de falta grave, justificando uma dispensa por justa causa (GUEDES, 2003).

 Importante ressaltar que o assédio moral difere do assédio sexual, pois este se caracteriza pela relação “vertical descendente”, ou seja, é praticado por um superior hierárquico, que usa de sua posição para obter favores sexuais do subordinado.

A doutrina, como se observa de Menezes (2003), indica um rol numeroso de situações em que pode haver assédio moral, pela sua repetição ou sistematização, de forma mais concreta que as formas sutis:

  1. 1)                  rigor excessivo;
  2. 2)                  confiar tarefas inúteis ou degradantes;
  3. 3)                  desqualificação ou críticas em público;
  4. 4)                  isolamento ou inatividade forçada;
  5. 5)                  ameaças explícitas ou veladas;
  6. 6)                  exploração de fragilidades psíquicas e físicas;
  7. 7)                  limitação ou proibição de qualquer inovação ou iniciativa do trabalhador;
  8. 8)                  impor obrigação de realizar autocríticas em reuniões públicas;
  9. 9)                  exposição ao ridículo (Por exemplo: impor o uso de fantasias, sem que isso guarde relação com sua função e inclusão no rol de empregados com menor produtividade);
  10. 10)               divulgação de doenças e problemas pessoais de forma direta ou pública;
  11. 11)               agressões verbais ou através de gestos;
  12. 12)               atribuição de tarefas estranhas à atividade profissional do empregado para humilhar e expor a situações vexatórias, como lavar banheiros, fazer limpeza, levar sapatos para engraxar ou rebaixar de função (de médico para atendente de portaria, por exemplo);
  13. 13)               trabalho superior às forças do empregado;
  14. 14)               sugestão para pedido de demissão;
  15. 15)               ausência de serviço ou atribuição de metas dificílimas ou impossíveis de serem cumpridas;
  16. 16)               controle de tempo no banheiro;
  17. 17)               divulgação pública de detalhes íntimos;
  18. 18)               instruções confusas;
  19. 19)               referência a erros imaginários;
  20. 20)               solicitação de trabalhos urgentes para depois jogá-los no lixo ou na gaveta;
  21. 21)               imposição de horários injustificados;
  22. 22)               transferência de sala por mero capricho;
  23. 23)               retirada de mesa de trabalho e pessoal de apoio;
  24. 24)               boicote de material necessário à prestação dos serviços, além de instrumentos como telefone, fax, computador, e;
  25. 25)               supressão de funções ou tarefas.

 

A caracterização do assédio moral pode se dar sob várias formas:

  •                     vertical ou descendente: tipo mais comum. Pela ação de um superior hierárquico contra um subordinado. Visa à demissão ou apenas a auto-afirmação do chefe;
  •                     horizontal: pela ação de trabalhadores do mesmo nível, normalmente, nasce da competição;
  •                     ascendente: tipo raro. Aquela violência que parte do subordinado contra o chefe, sendo mais comum em empresas públicas, em razão da estabilidade no emprego, devendo, contudo, ser continuada, visando à exclusão da vítima do ambiente de trabalho, forçando-a a demitir-se, aposentar-se precocemente ou licenciar-se para tratamento de saúde;
  •              &

Assuntos: Assédio moral, Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS), Direito do Trabalho, Direitos trabalhistas, Patronal, Trabalho

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