A HISTÓRIA DAS RELAÇÕES DE TRABALHO E SUA LIGAÇÃO COM A TERCEIRIZAÇÃO TRABALHISTA

14/02/2017. Enviado por

Para melhor entender as relações jurídicas no Direito do Trabalho, bem como a terceirização trabalhista, que é um dos efeitos do capitalismo, faz-se necessário entender as fases históricas e suas características relativas às relações de trabalho.

Para melhor entender as relações jurídicas no Direito do Trabalho, bem como a terceirização trabalhista, que é um dos efeitos do capitalismo, faz-se necessário entender as fases históricas e suas características relativas às relações de trabalho, já que estas evoluíram e evoluem de maneira dinâmica, com avanços, retrocessos e transformações. É o que explica a autora Delgado (2003).

 

Delgado (2003) muito bem mostra toda essa evolução das relações de trabalho e dos modos de produção e ensina que, na Antiguidade, o modo de produção existente era o escravocrata, segundo o qual o escravo era tido como propriedade do senhor e, por isso, não lhe era permitida autonomia da vontade para estabelecer vínculos produtivos de quaisquer espécies. A prestação de serviços tinha cunho obrigatório e era sempre imposta pelos senhores da terra. (DELGADO, 2003, p. 28).

 

Conforme a autora supracitada leciona, a prestação de serviços imposta era exercida em condições precárias, sem direitos, dignidade e remuneração. Não se falava em direitos dos trabalhadores, pois estes, como escravos, não podiam manifestar sua vontade. Por isso, não existiam contratos de trabalho, e sim uma submissão ao trabalho imposto obrigatoriamente aos escravos pelos seus senhores de terra. A subordinação era, portanto, pessoal.

 

Nascimento (2009, p. 43) acrescenta que, por um longo período histórico, “predominou a escravidão, que fez do trabalhador simplesmente uma coisa, sem possibilidade sequer de se equiparar à sujeito de direito. O escravo não tinha, pela sua condição, direitos trabalhistas”.

 

Com a abolição da escravatura (Lei Áurea – 1888), o trabalhador, até então escravo, tornou-se livre, mas, na verdade, conforme explica Delgado (2003), o homem ainda continuou sendo tratado como “coisa”. Neste sentido, segundo Carvalho (2007, p. 5), “o homem se libertou do trabalho escravo, mas não completamente, pois se seguiu a Era Medieval e, nela, uma sociedade dividida em rígidos estamentos: os senhores feudais e os servos”.

 

Consolidou-se, então, o Estado Moderno (séculos XV e XVIII) que, conforme ensina Delgado (2003), colocava em evidência o absolutismo e a monarquia, sendo que o rei concentrava poder econômico e político. A burguesia também se interessava no fortalecimento da monarquia, pois visava maior impulso ao comércio. A mencionada autora acrescenta que a burguesia estabelecia-se como detentora hegemônica do poder econômico, em razão do desenvolvimento das práticas do comércio. O capital, forte, e em expansão, criava raízes no seio da sociedade. O “espírito burguês” era mais que um ideal da classe emergente. (DELGADO, 2003, p. 32). Neste sentido, de acordo com Carvalho (2007, p. 7), “a burguesia, que se fortalecia economicamente, interessava-se na instituição de um poder central que reduzisse a influência política da nobreza”.

 

Delgado (2003) explica que, com a especialização das corporações, começaram a surgir pequenas indústrias, o que contribuiu para a formação do capitalismo. Assim, o capitalismo se desenvolvia e a burguesia continuava sua ascensão econômica.

 

De acordo com o entendimento de Zangrando (2008, p. 52), a Primeira Revolução Industrial “caracterizou-se pelo aproveitamento de novas formas de energia e pela utilização da máquina na produção”. Além disso, é importante ressaltar que foi nesse contexto que se estruturou, de forma inovadora, a relação jurídica basilar do sistema de produção capitalista: a relação empregatícia, categoria propiciadora de mudanças nas relações de produção até então consolidadas, já que sustentada no elemento distintivo da subordinação jurídica. (DELGADO, 2003, p. 37).

 

Ou seja, o trabalhador seria livre, mas subordinado juridicamente à relação de emprego que possuía com o proprietário dos meios de produção. De acordo com o entendimento da autora acima mencionada, surgiram os elementos fáticos jurídicos caracterizadores da relação de emprego: pessoa física, pessoalidade, subordinação, não-eventualidade e onerosidade. Tais elementos estão contidos na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), especialmente, na combinação de seus artigos 2º e 3º.

 

Essa clássica relação bilateral de emprego, “empregado-empregador”, é a melhor relação jurídica comparando-a com a relação trilateral (terceirização), pois naquela os direitos dos empregados são mais bem atendidos, visto que o empregado, parte economicamente hipossuficiente, tem garantidos e exercidos os princípios trabalhistas.

 

Garantindo aos empregados o devido respeito e cumprimento dos princípios do Direito Individual do Trabalho, os mesmos têm melhores condições de lutarem por seus direitos. Nesse sentido, percebe-se que há também maior segurança na continuidade do emprego e, consequentemente, maior possibilidade de o empregado poder se qualificar, já que, com maior segurança e maiores garantias, o empregado se estimula para a função que exerce, querendo sempre melhorar.

 

Por outro lado, como será visto no presente trabalho, a terceirização gera vantagens apenas para a empresa, deixando o trabalhador terceirizado sem a devida proteção, precarizando assim, sua força de trabalho.

 

Delgado (2003) ressalta que, no Estado Liberal, surgiram duas classes sociais: a dos proletários e a dos detentores do capital. Por ter sido uma época em que existiam situações de submissão, exploração, insalubridade, periculosidade, percebe-se que os proletários passaram a ter consciência das situações às quais se submetiam no trabalho. Conscientizaram-se da necessidade de lutar por seus direitos e por melhores condições sociais e econômicas de trabalho.

 

A primeira Constituição a agir assim foi a do México (1917) e, em 1919, foi criada a Organização Internacional do Trabalho (OIT), visando ao desenvolvimento do Direito do Trabalho. Mais tarde, ocorreu a Segunda Guerra Mundial (1939-1945) e os países capitalistas lutavam por poder e expansão. Mais uma vez, ocorreu a devastação em vários países. Na tentativa de que a paz entre os países durasse mais, foi criada, em 1945, aOrganização das Nações Unidas (ONU). E a solução encontrada pelos países para se restabelecerem foi um Estado que interviesse na economia e garantisse direitos. É o que mostra Delgado (2003).

 

Diante dessa situação, legitimou-se o Estado do Bem-Estar Social (pós 2ª Guerra Mundial), o qual passou a intervir de maneira acentuada nas questões sociais e econômicas, a fim de regular o capitalismo e de assumir políticas de planejamento e de assistência social. Delgado salienta-se que além de ampliar os direitos de segunda geração – sociais, culturais e econômicos – redefiniu o papel dos de primeira [...], concedendo-lhes certo cunho social, como, por exemplo, pela limitação da idéia de propriedade privada, com a exigência de que cumprisse sua função social. (DELGADO, 2003, p. 50).

 

Segundo o entendimento da autora supracitada, nesse período do pós-guerra e da legitimação do Estado do Bem-Estar Social, o Direito do Trabalho estava em ascensão, o movimento sindical aumentou, a economia estava em avanço, a indústria cresceu e, devido a isso, necessitava-se de um novo modelo de produção. Foi, então, que surgiu o modelo fordista de produção, o qual “aliou-se” ao modelo taylorista, aliança essa que se espalhou pelos países capitalistas.

 

Delgado (2003) explica também que, nesse modelo fordista de produção, as atividades necessárias para se alcançar o produto eram realizadas na empresa, pois o objetivo desse novo modelo de produção era diminuir o tempo e o desperdício, e aumentar o ritmo de trabalho, de forma a aumentar o ritmo da produção e reduzir o tempo ocioso. O trabalhador não precisava ser qualificado, criativo, inteligente, visto que o trabalho era exercido de forma mecanizada, fixando-se em uma parte e exercendo-a repetitivamente.

 

Nesse diapasão, os referidos autores mostram que também foi marcante a tendência à especialização das atividades e à redução dos custos da produção, de modo a se atingir um produto que fosse mais atrativo no mercado.

 

E, segundo Delgado (2003), com a reestruturação do capitalismo, foi notável o desempenho das multinacionais, em torno das quais e interdependentes, surgiram as pequenas e médias empresas. Ou seja, as grandes empresas descentralizavam suas atividades, passando-as para as pequenas e médias empresas, o que possibilitou um maior acúmulo de capital e intensificou novas formas de trabalho, especialmente a terceirização.

 

Um acontecimento fundamental para a globalização, ainda no contexto do Estado Neoliberal, foi, conforme ensina Delgado (2003), a Terceira Revolução Industrial (século XX), a qual foi além das mudanças industriais, pois englobou os avanços na robótica, na informática, na engenharia genética, objetivando uma produção dotada de mais sofisticação, maior tecnologia e utilizando menos mão-de-obra. A autora supracitada explica que Delgado (2003) explica também que, no neoliberalismo, o taylorismo/fordismo foi abandonado pelo surgimento de um novo modelo de produção, chamado de modelo toyotista, também conhecido como um novo conceito empresarial denominado de “empresa enxuta”.

 

No mesmo sentido, de acordo com o entendimento de Reis: já com a terceira revolução industrial ou a revolução tecnológica ou robótica acompanhadas da microeletrônica, da microinformática, do teletrabalho, das empresas virtuais com o avanço da internet, aliadas à possibilidade de fusão, desmembramento e aquisição de empresas multinacionais, desvirtuam-se completamente do modelo de produção taylorista/fordista, que preconizava estabelecimentos fixos, grandes fábricas e a alta produção visando o estoque. Pois, para atender a essa nova demanda do sistema capitalista neoliberal, a organização política do Estado mínimo e as empresas, em sintonia com o novo modelo de Estado passam a adotar fórmulas redutoras, sempre com vistas a aumentar seus lucros. Estrutura-se assim, o modelo toyotista de produção cuja filosofia consiste na horizontalização da produção, enxugamento da máquina, aumento da eficiência para garantir a qualidade total e conquistar mercados. Da empresa se diz que, quanto menor melhor, empresa magra ou enxuta. (REIS, 2005).

 

Segundo Delgado, a produção enxuta torna-se rentável na medida em que as empresas passam a não estocar mercadorias – produzidas com alto grau de especialização, porém em pequena escala – atendendo, tão-somente, às demandas de públicos específicos. (DELGADO, 2003, p. 94).

 

Da mesma forma entende o doutrinador Zangrando, segundo o qual: diferentemente do taylorismo e do fordismo, o toyotismo observa o processo produtivo e busca reduzir seus eventuais entraves, por intermédio da eliminação da concentração de estoques na linha de montagem, ou seja, a matéria prima e o material sob fluxo deve ser necessário apenas para tender a encomenda existente. Os estoques devem ser zerados, pela aplicação da metodologia just in time, que significa basicamente o seguinte: a peça necessária, na quantidade necessária, no momento necessário. (ZANGRANDO, 2008, p. 190, grifo do autor).

 

Conforme entende Delgado (2003), o toyotismo foi desenvolvido no Japão e implantado na empresa Toyota pelo engenheiro Ohno, como sendo uma alternativa para superar a crise do capitalismo. Nesse novo modelo de produção, a produção era em pequena escala e grande especialização, diminuindo os custos e os espaços, aumentando a eficiência, a qualidade, a competitividade e o rendimento.

 

É claro que, com essas formas flexíveis de contratação, aumentou a precariedade da força de trabalho, principalmente na terceirização trabalhista. Isso se deve ao fato de a busca por contratos de trabalho mais flexíveis (para se atingir maior especialização dos produtos, menores espaços, redução de custos, aumento da eficiência, da qualidade, da competitividade e do rendimento da produção) tornar-se um objetivo para as empresas. Por conseguinte, essas empresas não se preocupavam tanto com a força de trabalho de seus trabalhadores nem com as relações de trabalho, que acabaram por se tornarem precárias.

 

No caso da terceirização, que está inserida nesse contexto flexibilizatório, essa precariedade ocorre porque aos trabalhadores terceirizados não é possibilitada maior capacitação, melhor qualificação, maior criatividade e autonomia, além de os mesmos não terem possibilidade de se integrarem efetivamente à empresa na qual exercem realmente sua força de trabalho.

 

Além disso, a necessidade de manter-se no emprego fez com que os trabalhadores aceitassem as condições que lhes eram impostas, já que, num mundo globalizado e competitivo, o que os trabalhadores buscam é garantir seu trabalho para que, assim, garantam a subsistência de sua família. E mais, se esses trabalhadores não aceitassem o que as empresas lhes estabeleciam, poderiam até mesmo estar fora do mercado de trabalho.

 

Diante disso, o que se nota é que a flexibilização das relações de trabalho gera a precarização das mesmas. É perceptível que não proporcionar os direitos aos trabalhadores terceirizados vai de encontro ao que o Direito do Trabalho objetiva primordialmente: a proteção ao trabalhador.

 

Conforme entende a autora, os sindicatos foram, então, perdendo força e espaço para reivindicar direitos dos trabalhadores, visto que estes estavam cada vez mais sujeitos ao que a empresa lhes impunha, diminuindo, por consequência, a consciência coletiva que haviam conquistado e o número de sindicalizados. Assim, os sindicatos passaram a negociar os direitos e não mais reivindicar.

 

Diante dessa conjuntura econômica, Delgado (2003) mostra que surgia a necessidade de o Direito do Trabalho se adequar a essa nova realidade do mercado globalizado. Foi assim que houve a flexibilização das normas trabalhistas, no sentido de que fossem menos rígidas e se adaptassem para que houvesse meios de compatibilizar os interesses das empresas com os dos trabalhadores.

 

Uma forma de flexibilização foi a terceirização trabalhista. Ocorre, porém, que, ao inverso do que se pretendia inicialmente, houve privilégio aos interesses dos empregadores. A falta de proteção aos trabalhadores provocou a precariedade da mão-de-obra dos mesmos. É o que explica Delgado (2003).

 

Nota-se, portanto, o fenômeno da terceirização trabalhista, inserido no contexto de flexibilização, também está caracterizado pela precarização da força de trabalho. E, diante da evolução histórica anteriormente explicada, observa-se que o referido instituto foi consequência do Estado Neoliberal, juntamente com o novo modelo de produção toyotista.

 

Após entender o surgimento da terceirização no contexto histórico das relações de trabalho, passar-se-á adiante ao estudo do instituto da terceirização trabalhista.

 

O INSTITUTO DA TERCEIRIZAÇÃO TRABALHISTA

 

O instituto da terceirização trabalhista é uma tendência de reorganizar o modo de produção capitalista, contratando serviços especializados, repassando a terceiros toda atividade que não é essencial, para que a empresa concentre sua energia em sua principal vocação, segundo o entendimento de Gomes Neto (2006). Assim, conforme mostra o referido autor, as consequências imediatas da terceirização são: enxugamento da mão-de-obra, investimento na especialização, aumento da produtividade e aperfeiçoamento da qualidade do produto.

 

A terceirização trabalhista é uma exceção à clássica relação bilateral de contrato de trabalho, sendo caracterizado pela relação trilateral formada pelas seguintes partes: empresa terceirizante, trabalhador terceirizado, empresa tomadora de serviço. Entre os dois primeiros há uma relação jurídica de emprego, a qual, conforme o artigo 2º, caput, da Consolidação das Leis do Trabalho, se caracteriza pelos cinco elementos fáticos jurídicos – pessoa física, pessoalidade, não eventualidade, onerosidade e subordinação.

 

Conforme explica Delgado (2007), o elemento “pessoa física” significa que o empregado que presta o serviço deve ser pessoa física. Vinculado a esse elemento está a pessoalidade do empregado, pois existe um caráter de infungibilidade do trabalhador, pois a relação jurídica é intuito personae. Portanto, o trabalhador não pode se fazer substituir por outro no contrato de trabalho, pois isso descaracterizaria a relação de emprego. Delgado (2007) salienta que, em algumas situações, há casos de eventuais substituições consentidas pelo empregador ou autorizadas por lei, sem que isso descaracterize a relação empregatícia.

 

Além disso, o autor mostra que o elemento “pessoalidade” incide também na extinção do contrato, já que o mesmo não é transmitido a herdeiros, ou seja, a morte do empregado extingue o contrato firmado. A não-eventualidade significa que o contrato de trabalho tem um caráter de continuidade, sem ser esporádico, com permanência e ânimo definitivo. A onerosidade, elemento que deve ser observado em relação ao trabalhador e é considerado como a intenção econômica, é a contraprestação paga ao trabalhador pela sua prestação de serviços. E a subordinação refere-se ao modo de prestação do serviço, é uma subordinação jurídica e não pessoal, ou seja, conforme Delgado (2007, p. 303), “ela atua sobre o modo de realização da prestação e não sobre a pessoa do trabalhador”.

 

Já entre o trabalhador e a empresa tomadora há apenas uma relação de trabalho, a realização das atividades pelo trabalhador junto à empresa tomadora de serviços. E, por fim, entre a empresa terceirizante e a empresa tomadora existe apenas uma relação civil de prestação de serviços. Nas palavras de Delgado: a terceirização provoca uma relação trilateral em face da contratação de força de trabalho no mercado capitalista: o obreiro, prestador de serviços, que realiza suas atividades materiais e intelectuais junto à empresa tomadora de serviços; a empresa terceirizante, que contrata este obreiro, firmando com ele os vínculos jurídicos trabalhistas pertinentes; a empresa tomadora de serviços, que recebe a prestação de labor, mas não assume a posição clássica de empregadora desse trabalhador envolvido. (DELGADO, 2007, p. 430).

 

Como conceito de terceirização, tem-se que é a contratação, pela empresa tomadora, dos serviços de uma empresa terceirizante para que esses sejam prestados pelos trabalhadores terceirizados. Estes realizam as atividades periféricas da empresa tomadora, de modo a permitir que esta se concentre em sua atividade principal. Nota-se que o objetivo de tal instituto, para as empresas, é manter-se competitiva no mercado e obter sempre maiores lucros.

 

Para Delgado (2007, p. 430), terceirização “é o fenômeno pelo qual se dissocia a relação econômica de trabalho da relação justrabalhista que lhe seria correspondente”. Ferraz acrescenta que em resumo, terceirizar, usando a expressão de Sérgio Pinto Martins, “significa a empresa contratar serviços de terceiros para suas atividades-meio”. Ou seja, para o tomador dos serviços não mais importa a pessoalidade, mas o serviço. Não mais importa dirigir a prestação dos serviços, mas sim os resultados. (FERRAZ, 2006, p. 241, grifo do autor).

 

E Delgado acrescenta, ainda, que a terceirização pode ser compreendida como sendo uma relação trilateral que possibilita à empresa tomadora de serviços (“empresa cliente”) descentralizar e intermediar suas atividades acessórias (atividades-meio), para empresas terceirizantes (“empresa fornecedora”), pela utilização de mão-de-obra terceirizada (“empregado terceirizado”) (DELGADO, 2003, p. 142).

 

E, conforme leciona Palmeira Sobrinho, terceirização é a forma de organização da produção que possibilita a uma empresa, chamada de contratante, transferir a outra, chamada contratada, a obrigação pela produção de bens, pela realização de serviços e pelos riscos decorrentes de tais atividades. Na maioria dos casos, a utilização da terceirização é justificada com base na especialização dos serviços, na diminuição de custos e na descentralização da produção. (PALMEIRA SOBRINHO, 2008, p. 83).

 

Em relação à evolução jurídica da terceirização trabalhistas, Delgado (2003) mostra que o Decreto-lei nº 200/67, em seu parágrafo 7º do artigo 10, foi o primeiro a dispor sobre o referido instituto, vejamos: § 7º Para melhor desincumbir-se das tarefas de planejamento, coordenação, supervisão e controle e com o objetivo de impedir o crescimento desmesurado da máquina administrativa, a Administração procurará desobrigar-se da realização material de tarefas executivas, recorrendo, sempre que possível, à execução indireta, mediante contrato, desde que exista, na área, iniciativa privada suficientemente desenvolvida e capacitada a desempenhar os encargos de execução.

 

Após, ainda de acordo com o entendimento de Delgado (2003), a fim de firmar melhores parâmetros, foi promulgada a Lei 5.645/70, que assim dispunha no parágrafo único de seu artigo 3º:

Parágrafo único. As atividades relacionadas com transporte, conservação, custódia, operação de elevadores, limpeza e outras assemelhadas serão, de preferência, objeto de execução indireta, mediante contrato, de acordo com o artigo 10, § 7º, do Decreto-lei número 200, de 25 de fevereiro de 1967. (Revogado pela Lei nº 9.527, de 1997).

 

A supramencionada doutrinadora mostra que esse rol era exemplificativo e os serviços prestados eram ligados a atividades-meio. Em seguida, foi promulgada a Lei 6.019/74, que tratava do trabalho temporário, o qual, de acordo com Delgado (2003), alterou a estrutura empregatícia, trazendo a relação trilateral de prestação de serviço. Após, foi promulgada a lei (Lei 7.102/83) que regulava os serviços de segurança e transporte de valores para estabelecimentos financeiros, autorizando a terceirização dos serviços de vigilância, os quais foram, posteriormente, ampliados, sendo possíveis, também, fora do segmento bancário.

 

Posteriormente, ainda seguindo o entendimento de Delgado (2003), o Tribunal Superior do Trabalho aprovou a Súmula 256 que dispunha que a terceirização era ilegal, exceto nos casos de trabalho temporário e de serviço de vigilância: 

Nº 256    CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. LEGALIDADE (cancelada) - Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003. Salvo os casos de trabalho temporário e de serviço de vigilância, previstos nas Leis nºs 6.019, de 03.01.1974, e 7.102, de 20.06.1983, é ilegal a contratação de trabalhadores por empresa interposta, formando-se o vínculo empregatício diretamente com o tomador dos serviços.

 

Conforme mostra Gomes Neto (2006), aos poucos, a jurisprudência foi flexibilizando o rigor dessa súmula, razão pela qual o Tribunal Superior do Trabalho cancelou-a e editou a atual Súmula 331 arespeito da terceirização trabalhista.

 

A terceirização, em consonância com o entendimento de Delgado (2003), pode ser dividida em duas modalidades: de serviços e de atividade. A terceirização de atividades ou terceirização para fora da empresa tomadora é aquela na qual a empresa descentraliza atividades para outras empresas autônomas, que se responsabilizam pela produção dessas atividades.

 

Já a terceirização de serviços ou terceirização para dentro da empresa tomadora, corresponde àquela na qual a empresa incorpora em seus quadros trabalhadores terceirizados. Estes trabalhadores são contratados por empresas terceirizantes, ou seja, a empresa tomadora é a responsável pela produção, mas utiliza mão-de-obra terceirizada.

 

A terceirização de serviços é a hipótese que está regulada pela Súmula 331 do Tribunal Superior do Trabalho e, em vista disso, o presente estudo limitou-se à análise da precarização da mão-de-obra nas hipóteses de terceirização de serviços.

 

Atualmente, as hipóteses de terceirização lícita estão previstas apenas na Súmula 331 do Tribunal Superior do Trabalho, razão pela qual ela é utilizada como parâmetro de análise sobre a legalidade ou ilegalidade das contratações de trabalho terceirizado: 

331    CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. LEGALIDADE (mantida) - Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003

I - A contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando-se o vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho temporário (Lei nº 6.019, de 03.01.1974).

II - A contratação irregular de trabalhador, mediante empresa interposta, não gera vínculo de emprego com os órgãos da administração pública direta, indireta ou fundacional (art. 37, II, da CF/1988).

III - Não forma vínculo de emprego com o tomador a contratação de serviços de vigilância (Lei nº 7.102, de 20.06.1983) e de conservação e limpeza, bem como a de serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta.

IV - O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços, quanto àquelas obrigações, inclusive quanto aos órgãos da administração direta, das autarquias, das fundações públicas, das empresas públicas e das sociedades de economia mista, desde que hajam participado da relação processual e constem também do título executivo judicial (art. 71 da Lei nº 8.666, de 21.06.1993).

 

Delgado (2003) explica que, apesar de a Súmula supracitada ter tido o objetivo de delinear a terceirização, a prática desta ainda extrapola os limites estabelecidos e os princípios do Direito do Trabalho.

 

Analisando o inciso I da Súmula 331 do C. TST, pode-se perceber que a terceirização é, a princípio, ilegal e o vínculo empregatício se formará diretamente com o tomador de serviços. Entretanto, existem quatro exceções à regra, ou seja, quatro hipóteses nas quais é considerada lícita e permitida pelo ordenamento jurídico: trabalho temporário, serviços de conservação e limpeza, serviços de vigilância e serviços especializados ligados à atividade-meio. É o que entende Delgado (2003).

 

Quanto à terceirização ilícita, esta tem como efeito, segundo Delgado (2007), a formação do vínculo direto com a empresa tomadora de serviços, caso em que ocorre a formação da clássica relação empregatícia bilateral. O vínculo do trabalhador com a empresa terceirizante será desfeito e o mesmo formar-se-á com a própria empresa tomadora de serviços, que passará a ser considerada empregadora efetiva.

 

Quanto às hipóteses lícitas de terceirização, de acordo com a Súmula 331 do TST, analisar-se-á, primeiramente, a hipótese de contratação de serviços terceirizados mediante o contrato de trabalho temporário. Conforme ensina Delgado (2003), a terceirização temporária somente pode ocorrer (artigo 2º Lei 6019/74), quando a empresa tomadora de serviços estiver em situação de necessidade transitória de substituição de seu pessoal regular e permanente ou em situação de acréscimo extraordinário de serviços. Conforme a autora ressalta, caso sejam desrespeitadas tais regras, o contrato de trabalho temporário será nulo, ensejando a formação do vínculo de emprego clássico (art. 3º, CLT) entre o trabalhador terceirizado e a empresa tomadora dos serviços. (DELGADO, 2003, p. 160).

 

Ou seja, a não observância e respeito às hipóteses acima faz com que a terceirização seja considerada ilegal. 

 

Em consonância com o entendimento da doutrinadora Delgado (2003), a terceirização, no caso de trabalho temporário, é transitória e não se vincula a situações imprevisíveis. É a única hipótese na qual existe subordinação e pessoalidade entre o trabalhador terceirizado e a empresa tomadora de serviços, além de sua atividade ser permitida tanto em relação à atividade-meio quanto à atividade-fim.

 

Delgado (2003) salienta que, nessa hipótese de terceirização, exige-se que o contrato seja obrigatoriamente por escrito e que conste o seu motivo justificador (necessidade transitória de substituição de pessoal regular e permanente ou acréscimo extraordinário de serviços). O prazo máximo do contrato é de três meses, sendo permitida uma única prorrogação por igual período, exigindo-se, neste caso, autorização do Ministério do Trabalho e Emprego.

 

Conforme entende Delgado (2003), são direitos do trabalhador temporário: salário equitativo (isonomia na remuneração do trabalhador terceirizado e o empregado da empresa tomadora da mesma categoria), jornada de trabalho de oito horas diárias e quarenta e quatro horas semanais, com adicional mínimo de 50% (cinquenta por cento) nas horas extraordinárias, férias proporcionais e o terço constitucional, repouso semanal remunerado, adicional noturno no percentual de 20% (vinte por cento), indenização por dispensa sem justa causa ou término normal do contrato correspondente a 1/12 da remuneração mensal por mês de contrato ou fração igual ou superior a 15 dias, assinatura da Carteira de Trabalho e Previdência Social, proteção previdenciária, seguro contra acidentes de trabalho, vale-transporte, depósitos do Fundo de Garantia (FGTS), gratificação natalina.

 

Palmeira Sobrinho (2008) entende que a terceirização, no caso de trabalho temporário somente poderá ocorrer nos contratos urbanos e que as demais formas de terceirização podem ser utilizadas em trabalho urbano e rural.

 

Em relação ao estudo das demais situações de terceirização, cabe ressaltar que, segundo o entendimento de Delgado (2003), nas hipóteses de terceirização nos serviços de conservação e limpeza, serviços de vigilância e serviços especializados ligados à atividade-meio, que são as situações de terceirização permanente, exige-se que estejam ausentes pessoalidade e subordinação diretas entre o trabalhador terceirizado e a empresa tomadora de serviços.

 

Nesse sentido, o doutrinador Delgado (2007, p. 443), leciona que a "subordinação e a pessoalidade, desse modo, terão de se manter perante a empresa terceirizante e não diretamente em face da empresa tomadora dos serviços terceirizados”. Ou seja, a pessoalidade e a subordinação devem existir entre o trabalhador terceirizado e a empresa terceirizante e não entre aquele e a empresa tomadora, já que o vínculo de emprego estabelece-se entre os dois primeiros.

 

Se a condição supracitada for desobedecida, a terceirização será considerada ilegal. Em virtude disso, será desfeita a relação trilateral até então existente. Isso quer dizer que será desconfigurado o vínculo empregatício do trabalhador terceirizado com a empresa terceirizante. Tal vínculo de emprego será formado diretamente entre o trabalhador terceirizado e a empresa tomadora de serviços, a qual se tornará, então, a efetiva empregadora.

 

Passando-se ao estudo da hipótese de terceirização nos serviços de conservação e limpeza, Delgado (2003) leciona que: 

As atividades de conservação caracterizam-se pelo “[...] conjunto de medidas e práticas, periódicas e permanentes, que visam à proteção e à manutenção em bom estado de bens, monumentos e objetos pertencentes a instituições públicas ou privadas”.

 

De cunho genérico, materializam-se especialmente por meio das atividades de limpeza, com a devida “exclusão de substâncias indesejáveis, purificação, depuração” de lugares, bens, monumentos e objetos. Como exemplos de atividades de asseio e conservação, citem-se: a faxina, a detetização, a limpeza de vidros, os serviços de copeira, etc. (DELGADO, 2003, p. 145).

 

Quanto à hipótese de terceirização relacionada aos serviços de vigilância, é necessário diferenciar vigilante de vigia. Delgado (2003) explica que vigilante é um empregado qualificado, devidamente registrado no Departamento de Polícia Federal, preparado em curso de formação, possui porte de armas de fogo, exercendo verdadeira atividade policial. E o serviço de vigia é realizado por qualquer pessoa física, sem exigência de qualificação ou formação técnica. Delgado (2007) acrescenta que vigia é um empregado não especializado e vigilante faz parte de uma categoria especializada.

 

Já em relação aos serviços especializados ligados à atividade-meio, é extremamente importante diferenciar atividade-meio de atividade-fim, porém essa distinção não é fácil. Conforme Delgado (2003), não há parâmetros bem definidos capazes de diferenciar tais atividades. Assim também é o entendimento de Ferraz:

 

Ocorre, porém, que muitas vezes torna-se difícil ou mesmo impossível fazer essa distinção entre atividade-fim e atividade-meio, uma vez que a produção de alta tecnologia necessita de atividades polivalentes dos trabalhadores, tornando sutil a identificação das tarefas normais ou principais dos empreendimentos contratantes. (FERRAZ, 2006. p. 244).

 

Ferraz, citando Andrade, acrescenta que: 

O objetivo da terceirização é, pois, “a concentração de esforços na atividade final da empresa, definindo-se como atividade-fim aquela ligada diretamente ao núcleo da atividade empresarial à finalidade precípua da empresa. Já a atividade-meio é toda aquela que não se dirige propriamente ao núcleo da atividade da empresa, sendo apenas caminho para alcançar atividade final, não importando que a natureza dos serviços revele a necessidade permanente de trabalho” (ANDRADE, apud FERRAZ, 2006. p. 248).

 

Para Zangrando (2008), na terceirização lícita há a transferência na execução das atividades-meio e na terceirização ilícita há a transferência na execução das atividades-fim. Porém, a definição de tais atividades é incerta, “aceitando-se na atualidade uma maior elasticidade no conceito de terceirização lícita” (ZANGRANDO, 2008, p. 1009). Conforme assevera, genericamente, poderíamos dizer que entendem-se por atividades-meio aquelas atividades complementares ou suplementares, mas que não representam o objeto social da empresa, não sendo diretamente necessárias para a consecução dos fins empresarias.

[...]

E também genericamente, diríamos que se entende por atividades-fim aquelas que se traduzem no próprio objeto social da empresa, ou são essenciais para a sua consecução, sendo normalmente definidas no objeto social da empresa, embora a ele não necessariamente limitadas. (ZANGRANDO, 2008. p. 1008, grifo do autor).

 

Diferentemente dos demais autores pesquisados no presente estudo, Zangrando (2008) entende que, diante do aperfeiçoamento das empresas e da necessidade de se manter no mercado competitivo, a licitude da terceirização dever-se-ia estar ligada apenas à verificação da subordinação jurídica e não ao tipo de atividade (meio ou fim). O autor mencionado acima entende que se estivesse presente a subordinação direta do terceirizado ao tomador de serviços haveria terceirização ilícita, exceto nos casos de trabalho temporário. O referido autor compreende que a diferenciação de atividades fim e meio para caracterizar a licitude ou não da terceirização prejudica a terceirização, que não poderia ficar adstrita à atividade acessória.

 

Entretanto, conforme salienta Palmeira Sobrinho (2008), é inconsistente presumir que a terceirização típica existe quando não há subordinação do trabalhador terceirizado em relação à empresa tomadora de serviços. A afirmação do referido autor baseia-se no fato de haver quem presuma, de maneira equivocada, que, nas hipóteses de terceirização permanente, o trabalhador iria prestar os serviços sem se sujeitar, mesmo minimamente, a ordens da empresa tomadora de serviços.

 

Para melhor explicar seu posicionamento, Palmeira Sobrinho (2008) utiliza o exemplo do setor de petróleo, no qual a empresa tomadora ordena, controla, dirige a prestação de serviços dos trabalhadores terceirizados, ficando a cargo da empresa terceirizante realizar os pagamentos e aplicar as sanções, quando devidas.

 

Diante disso, acredita-se que a caracterização da terceirização lícita ou ilícita não deve ser feita apenas com base na presença ou ausência de subordinação. Não há como considerar que um trabalhador terceirizado, exercendo seus serviços na empresa tomadora, não se submeta a ordens desta. A distinção entre atividades meio e fim também não é bem definida, mas, apesar disso, não se deve deixar de analisar a diferenciação entre tais atividades.

 

Zangrando (2008) salienta que, diante da inexistência de definição exata entre atividade meio e fim, acabou-se deixando a cargo dos tribunais resolverem a questão por meio de jurisprudências. A diferenciação de atividade-meio ou atividade-fim pelos tribunais deve ser feita com análise também nas seguintes razões: a especialização da empresa, a concentração de esforços naquilo que é a vocação principal da empresa, a busca da empresa por maior eficiência na sua finalidade principal. Presentes esses aspectos, estaria caracterizada a atividade-fim. E ausentes os mesmos, seria caso de atividade-meio.

 

O problema é que, ao longo do tempo, as atividades-fim de uma empresa podem transformar-se em atividades-meio e vice-versa, já que as empresas estão em constantes mudanças em busca por maior competitividade no mercado.

 

Segundo Delgado (2007), atividades-fim são as atividades nucleares, fazem parte da essência da empresa tomadora de serviços, podendo ser conceituadas como sendo as funções e tarefas empresariais e laborais que se ajustam ao núcleo da dinâmica empresarial do tomador dos serviços, compondo a essência dessa dinâmica e contribuindo inclusive para a definição de seu posicionamento e classificação no contexto empresarial e econômico. (DELGADO, 2007. p. 442).

 

O mesmo autor define, também, as atividades-meio, que seria as atividades periféricas, conceituando-as como aquelas funções e tarefas empresariais e laborais que não se ajustam ao núcleo da dinâmica empresarial do tomador dos serviços, nem compõem a essência dessa dinâmica ou contribuem inclusive para a definição de seu posicionamento e classificação no contexto empresarial e econômico mais amplo. (DELGADO, 2007. p. 442-443).

 

Conforme entende Palmeira Sobrinho (2008), não há um parâmetro definido para realizar a distinção das atividades meio e fim, visto que ambas, apesar de diferentes, são igualmente necessárias à produção. O autor ressalta que a inconsistência de critério para distinção de tais atividades sugere que sua caracterização dependa do modo como a empresa se autodefine em relação à sua atividade econômica.

 

Delgado (2003) mostra que grande parte da prática da terceirização refere-se às atividades-meio, hipótese já prevista na Súmula 331 do TST. Apesar de existir a referida súmula, há empresas que terceirizam quase toda a produção, até mesmo atividades-fim, o que afronta a Súmula 331 do Tribunal Superior do Trabalho. Ou seja, essas empresas estão praticando uma terceirização ilícita e dever-se-ia desfazer a relação trilateral existente.

 

Par exemplificar a questão supracitada, Delgado (2003) cita o caso de um Departamento da Polícia Federal que contratou trabalhadores terceirizados, devido à falta de pessoal em decorrência de não ter tido autorização para a abertura de concurso público. Esses trabalhadores terceirizados estariam trabalhando em áreas sigilosas da Polícia Federal. Assim, nota-se que há empresas que terceirizam de forma diretamente ofensiva ao entendimento do TST.

 

Necessário se faz também falar sobre a questão das terceirizações no âmbito da Administração Pública. Insta salientar que esta pode realizar terceirizações lícitas, porém, o problema que surge é quando a terceirização é ilícita, pois existe um óbice constitucional de formação de vínculo empregatício direto, conforme prevê a Súmula 331 do TST.

 

Em conformidade com o que mostram os doutrinadores Delgado (2003) e Delgado (2007), a Constituição da República de 1988 colocou, em seu artigo 37, II, como requisito para a investidura em cargo ou emprego público a prévia aprovação em concurso público, sob pena de ser o ato considerado nulo. O vínculo empregatício com os órgãos da Administração Pública forma-se mediante a aprovação em concurso público, pois esse é a forma mais viabilizadora de criar possibilidades de todos os cidadãos aptos lutarem pelo acesso ao cargo ou emprego público.

 

Em virtude do disposto do artigo 37, II da CR/88 e em consonância com a Súmula 331 do TST, em nenhuma hipótese, haverá o reconhecimento de vínculo empregatício com os entes da Administração Pública sem a prévia aprovação em concurso público. Conforme entende Delgado (2003), isso reforça a prevalência do interesse público e do bem-estar coletivo sobre o interesse particular.

 

Assim, segundo os mencionados autores, mesmo no caso de contratação irregular de trabalhador mediante empresa interposta, não há reconhecimento de vinculo de emprego do trabalhador terceirizado com os órgãos da Administração Pública.

 

Os doutrinadores supracitados entendem que, quanto aos efeitos da terceirização ilícita com os órgãos da Administração Pública, há três correntes interpretativas. Ou seja, não ficou realmente resolvido o problema, restando entender como ficaria, por exemplo, a questão do pagamento das verbas trabalhistas, a posição do ente estatal em relação ao trabalhador terceirizado.

 

A primeira corrente defende a não formação do vínculo empregatício entre o ente estatal e o trabalhador terceirizado, em virtude da exigência da aprovação em concurso público. Como não há formação de vínculo empregatício, também não geraria nenhum benefício ao trabalhador terceirizado ilicitamente, ou seja, não haveria pagamento de qualquer diferença trabalhista. Essa corrente defende que não se deve beneficiar aquele que foi conivente com a ilicitude praticada.

 

A segunda corrente é exatamente o oposto da primeira, estabelecendo a formação de vínculo de emprego entre o trabalhador terceirizado e o ente estatal, sendo que este assume a posição de empregador efetivo desde o início da relação socioeconômica verificada. No entanto, essa posição desrespeita a Constituição Federal.

 

Por fim, a terceira corrente adota o caminho mais correto. Conforme essa posição, não há formação de vínculo empregatício, sendo o contrato nulo e é vedado à Administração Pública assinar a Carteira de Trabalho e Previdência Social com o trabalhador ilicitamente terceirizado. Entretanto, a esse trabalhador é garantido o pagamento das verbas trabalhistas. O referido pagamento deve ser realizado pela entidade terceirizante, sendo que a Administração Pública (entidade tomadora dos serviços) responderia subsidiariamente pelas mencionadas verbas.

 

Esta posição é vista como a mais correta, pois está, também, em consonância com o disposto na Súmula 363 do TST, que prevê o seguinte: 

Contratação de Servidor Público sem Concurso - Efeitos e Direitos

A contratação de servidor público, após a CF/1988, sem prévia aprovação em concurso público, encontra óbice no respectivo art. 37, II e § 2º, somente lhe conferindo direito ao pagamento da contraprestação pactuada, em relação ao número de horas trabalhadas, respeitado o valor da hora do salário mínimo, e dos valores referentes aos depósitos do FGTS.

 

Assim, a Administração Pública assume o papel de responsável subsidiário no caso de inadimplemento dessas verbas trabalhistas.

 

Depois de realizada a análise das hipóteses legais da terceirização trabalhista, a partir do estudo da Súmula 331 do TST, passar-se-á agora ao estudo dos modos de precarização do instituto da terceirização, haja vista que o mesmo rompe com a estrutura dos princípios do Direito do Trabalho, os quais objetivam a proteção do empregado. Além disso, a terceirização não proporciona igualdade entre o trabalhador terceirizado e o empregado originário da empresa tomadora de serviços. E é isso que será analisado no capítulo que se segue.

 

 

Assuntos: CLT, Direito do Trabalho, Terceirização

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