Quem é o titular dos Direitos Autorais em obras psicografadas?

16/05/2018. Enviado por em Direito Autoral

Os médiuns são conscientes que não são os autores, então quem pode receber de acordo com a lei?

O que são obras psicografadas?
São pinturas, escritas ditadas por um espírito para um médium que as reproduz.
 
Atualmente o mercado editorial espírita aumentou muito, a literatura de obras espíritas psicografadas tem muitos adeptos inclusive consumidores que não seguem a religião espírita.
 
Com esse crescimento não há como se questionar a quem pertence a autorias dessas obras psicografadas?
 
Analisando somente do campo religioso onde o médium tem todo o trabalho, inclusive cedendo seu corpo para esse trabalho, sua dedicação, para esse médium não há nenhum questionamento ele é totalmente consciente que a autoria da obra é do espírito.
 
Aqui analisaremos um pouco para o direito como funciona a autoria de obras psicografadas?
Pertence ao médium, aos herdeiros do falecido os direitos autorais advindos dessa obra psicografada?
 
Um dos principais pontos dessa análise vem do nosso código Civil, que somente protege a pessoa natural em vida, Código Civil, Título I, Das Pessoas Naturais, Art. 20- "A personalidade civil da pessoa começa com o nascimento com vida", art 6- "A existência da pessoa natural termina com a sua morte".
 
Assim percebemos que pelo nosso ordenamento jurídico é impossível a proteção de direitos para espírito , ou seja, alguém que já passou desse plano para outro, que faleceu.
 
Portanto, se não há direitos para o espírito, tampouco haverá transmissão aos seus herdeiros.
 
Porém, os herdeiros tem direitos sim nas obras psicografadas de proteção a imagem do falecido, ou ainda, se houverem todos os requisitos e seja considerado um plágio a obra psicografada.
 
Herdeiros não podem receber direitos sobre essas obras, pois estaríamos entendendo que o falecido adquiriu direitos pós morte, o que é vedado por lei, ofendendo a tese da personalidade do nosso direito.
 
Não há que confundir com as obras escritas em vida e lançadas pós morte, nesse caso, quando escritas o autor era pessoa natural com tutela jurisdicional e sobre essas obras os herdeiros terão todos os direitos.
 
Mas a nossa Lei de Direitos Autorias, 9610/98, em seu caput do artigo 7º daria a entender que os espíritos teriam tutela jurisdicional: "São obras intelectuais protegidas as criações dos espíritos, expressas por qualquer meios ou fixadas em qualquer suporte, tangível ou intangível..."
Portanto, analisando somente a LDA entendemos sim não ser necessária a criação humana para haver proteção, mas como já explicamos anteriormente quem faleceu não tem mais personalidade jurídica diante de nosso ordenamento.
 
Podemos então concluir que a obra psicografada não tem proteção autoral?
 
Não porque como já frisamos a LDA diz que qualquer obras até criações dos espíritos devem ser protegidas. Não esquecendo que nosso judicário aqui não questiona nem pode a religião, pois somos um estado laico.
 
Entendo que a obra psicografada se tiver os requisitos de criatividade e originalidade, sendo uma criação intelectual deverá ser protegida pelo ordenamento jurídico. E, ainda acredito que o médium passou sim por um processo de criação no que tange a compilação de idéias.
 
SOLTANOVICH (2009, p.192 e seg): "Se, porém admitirmos que as idéias, relações ou fatos, enfim, o conteúdo contido nas obras psicografadas é de autoria de um ser espiritual ou não-humano e que a criação de tal obra não deveria diretamente de um esforço criativo humano, devemos considerar sobre idéias, revelações e fatos em si não recaia qualquer proteção autoral. Contudo, obrigatoriamente devemos reconhecer a existência de um mínimo de criatividade humana na relação, organização e compilação de idéias , fatos ou revelações e na forma de expressão pela qual tais idéias , fatos e revelações foram transportadas para o mundo terreno o que nos levará a inafastável conclusão que a obra psicografada deverá ser vista e considerada como obra intelectual representada por uma compilação de textos que , em razão de seus critérios de seleção, preenche aos requisitos de criatividade e originalidade, sendo assim, protegida sobre a égide de direitos autorais."
 
Assim, entendemos que sim a obra psicografada é protegida por direitos autorais, somente cabe ao judiciário decidir, mas não a religião e sim o direito, pois nosso estado é laico.
 
O autor da obra psicografada não tem mais personalidade jurídica assim nem ele e muito menos seus herdeiros serão detentores desses direitos.
 
O médium que psicografou, ele emprestou seu corpo e tem total consciência não ser o autor de tal obra.
 
Não há em nenhum país do mundo qualquer respaldo de quem seria ao certo o detentor dos direitos autorais em obra psicografadas.
 
Autores e juristas importantes como Bittar defendem que o médium seria como um intérprete do espírito possuindo assim, os chamados diretos conexos.
 
Lembrando aqui, que o espiritismo é uma religião, não cabendo ao julgador decidir se existe a psicografia, pelo nosso estado ser laico, cabe somente ao julgador decidir quem detém os direitos dessa obra psicografada.
 
Tratar o médium como detentor de direitos conexos me parece muito adequado, porém se este ficaria com metade dos valores advindos de tal obra, e a outra metade? Já sabemos que não irá para os herdeiros do autor.
 
Importante colocar aqui que a obra psicografada por si só não pode ser considerada um plágio, porém, caso seja a apropriação de uma obra já existente, será sim considerada plágio, e nesse caso não há dúvidas que quem responde será o médium e a editora , pois deveriam ver a autenticidade de suas publicações.
 
Portanto até qui vimos:
 
A obra psicografada por si só não é plágio.
Contendo os requisitos deverá ser tutelada pelo direito autoral.
Os herdeiros do autor não tem direito pois este não tem personalidade jurídica diante de nosso ordenamento.
 
Então há quem cabe o recebimento desses direitos?
 
E esse tema há cada dia torna-se mais importante devido realmente ao crescimento muito  grande do mercado editorial espírita, gerando inclusive empregos direitos diversos.
 
Ao meu parecer, correta seria colocar o médium como detentor dos direitos conexos.
 
Porém o ideal seria o médium antes da publicação entrar em contato com a família do autor da obra psicografada e ele, editora, e herdeiros fazerem um contrato especificando e concordando com o que será feito com os direitos.
 
O caso mais conhecido do judiciário brasileiro ocorreu entre os herdeiros do Humberto de Campos x Chico Xavier.
 
Humberto de Campos foi membro da cadeira 20, da Academia Brasileira de Letras.
Um ano após eu falecimento Chico Xavier começou a receber suas mensagens.
 
A viúva e seus filhos chegaram até ao STF postulando que fosse reconhecida a autoria do falecido e os direitos de sucessão aos herdeiros. E, caso o primeiro pedido não fosse deferido, que a obra fosse tirada de circulação por uso indevido do nome.
 
Sobre o primeiro pedido o STF decidiu:
"Assim, o grande escritor Humberto de Campos, depois da sua morte não pode ter adquirido direitos de espécie alguma, e consequentemente nenhum direito autoral da pessoa dele deve ser transmitido a seus sucessores."
Quanto ao segundo pedido, entendeu não haver nenhum uso indevido por não estar havendo calúnia, com o nome dele, assim a obra não seria tirada de circulação.
 
Hoje em dia a legislação permite que a família se insurja contra o uso do nome do falecido sem que haja qualquer tipo de difamação, calunia, etc.
 
Muitos autores e juristas em sua maioria entendem que se a obra psicografada contiver os elementos da originalidade e da criatividade e assim tiver a proteção do direito autoral, a autoria seria de quem a produziu no plano terreno, ou seja somente do médium.
 
Sabemos que o médium por sua vez tem plena consciência não ser o autor dessa obra.
 
Assim, ao meu ver, hoje a única e certeira solução antes de publicar a obra é um contrato entre médium e os herdeiros do autor da obra psicografada. 

Assuntos: Direito Autoral, Propriedade intelectual


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