Maus-tratos aos animais em circos, rodeios e outros espetáculos

29/04/2013. Enviado por

O presente artigo demonstra com fatos científicos e apoio da jurisprudência pátria que os animais sofrem abuso em manifestações ditas "culturais" e aponta o fim de tais práticas, com fundamento da atual Constituição Federal.

"O circo ensina as crianças a rir da dignidade perdida dos animais. Nesse caso, a 'humanização' dos bichos reflete claramente a falta de humanidade das pessoas projetada em um macaco de vestido, camuflada sob os risos." (Olegário Schmitt)

Com a proibição de animais em circo vigorando em 6 estados e mais de 50 municípios brasileiros, agora, com o PL7291/06i, poderá ser proibida a utilização de animais da fauna silvestre e exóticos em circos em todo território nacional. São Paulo conta com a proibição desde 2005ii. Igual proibição vigora em países como Áustria, Dinamarca, Índia, Israel e Suécia.iii Entre as acusações sofridas pelos circos (no Brasil existem cerca de 600 circos) estão:

Maus-tratos devido ao treinamento impróprio e a (sobre)vivencia em espaços confinados e constantes movimentação;

Exposição de pessoas aos riscos de um animal estressado;

Disseminação de doenças para os seres humanos;

Estimular o tráfico de animais.

Em relatório apresentado pelaWSPA (World Society for the Protection of Animals - Sociedade Mundial de Proteção Animal), os animais de circo apresentam stress, alterando assim sua saúde, o funcionamento do cérebro e diminuindo a expectativa de vidaiv.

Para o Deputado Federal Ricardo Trípoli: "[...] Sabemos que há maus tratos aos animais por parte da grande maioria dos circos. Não tem cabimento autorizar essa prática nefasta". O mesmo entendimento é compartilhado pela Ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira: "É intolerável. Sou pessoalmente contrária ao uso de animais por parte dos circos."v

No relatório da Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania sobre o PL nº 7.291/2006, o relator assevera:

O cerne dessa complexa questão nos parece ser a impossibilidade, por melhor que seja a intenção dos artistas e administradores de circos, de se considerar humanitário o tratamento dispensado a animais que passam toda a vida confinados em cativeiro impróprio, sem o necessário enriquecimento ambiental, e que se submetem ao estresse do adestramento, das apresentações e das viagens constantes.

Para realizar tarefas como dançar, andar de bicicleta, tocar instrumentos, pular em argolas (com ou sem fogo), cumprimentar a platéia, entre outras proezas, os animais são submetidos a treinamento que, regularmente, envolve chicotadas, choques elétricos, chapas quentes, correntes e outros meios que os violentam. [...]vi

Corrobora com as informações acima a matéria apresentada pelo programa Fantástico, da Rede Globo, onde são mostradas cenas de maus-tratos a animais de circo. São exibidas cenas gravadas em 18 países diferentes, com cenas gravadas também no Brasilvii.

Na jurisprudência brasileira já foi aceita a proibição de animais em circo, como se lê:

ANIMAIS DE CIRCO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPLEMENTAÇÃO DE OPÇÕES DO LEGISLADOR QUANTO AO TRATO E MANTENÇA DE ANIMAIS. PROIBIÇÃO DE QUALQUER FORMA DE MAUS TRATOS A QUALQUER ANIMAL. ILEGÍTIMA INADEQUAÇÃO DAS AÇÕES PÚBLICAS.

A análise do sistema jurídico e a evolução da compreensão científica para o trato da fauna em geral, permitem concluir pela vedação de qualquer mau trato aos animais, não importando se são silvestres, exóticos ou domésticos.

Por maus tratos não se entende apenas a imposição de ferimentos, crueldades, afrontas físicas, ao arrancar de garras, cerrilhar de dentes ou enjaular em cubículos. Maus tratos é sinônimo de tratamento inadequado do animal, segundo as necessidades específicas de cada espécie. "A condenação dos atos cruéis não possui origem na necessidade de equilíbrio ambiental, mas sim no reconhecimento de que são dotados de estrutura orgânica que lhes permite sofrer e sentir dor".(STJ, Resp 1.115.916, Rel. Ministro Humberto Martins)

Evoluída a sociedade, cientifica e juridicamente, o tratamento dos animais deve ser conciliado com os avanços dessa compreensão, de modo a impor aos proprietário a adequação do sistema de guarda para respeito, o tanto quanto possível, das necessidades do animal. A propriedade do animal não enseja direito adquirido a mantê-lo inadequadamente, o que impõe a obrigação de se assegurar na custódia de animais circenses, ao menos, as mesmas condições exigíveis do chamados mantenedores de animais silvestres, mediante licenciamento, conforme atualmente previsto na IN 169/2008.

Na ausência de recursos autárquicos e adequação da conduta pelos responsáveis, deve o órgão ambiental, contemporaneamente, dar ampla publicidade à sua atuação, convocando e oportunizando a sociedade civil auxiliar em um problema que deve, necessariamente, caminhar para uma solução. (TRF4 - 4ª Turma - AC 2006.70.00.009929-0/PR - Rel. Des. Valdemar Capeletti - d.j.: 21.09.2009)

Na data de 28 de julho de 2010 a região da Catalunha, na Espanha, proibia as touradas em seu território, o que causou grande discussão em todo mundo, sobre o direito dos animais. Embora tenham alegações sobre o possível interesse da região se tornar um país autônomo, não há como não falar que ocorreu um avanço na defesa dos animais, num país reconhecido internacionalmente pela tourada. Infelizmente, a prática do “correbous”, corrida de touros que provoca seu sofrimento, mas não sua morte, ainda continua em práticaviii.

Para a doutrina brasileira a farra do boi, os rodeios, a tourada e a vaquejada são consideradas como recreativas e de fundo cultural. Como bem defende Celso Antonio Pacheco Fiorillo, a prática da “farra do boi, nas localidades em que se constitui exercício tradicional da cultura da região, não importa violação ao preceito constitucional que veda práticas cruéis.” Pelo conceito antropocêntrico apresentado, a crueldade varia da cultura do povo ou do local do crime, mas com uma análise mais simples, vemos que o artigo 32 da Lei 9605/1998 não cita excludentes de ilicitude a cultura do povo ou o local do crime. A lei vale para todo território nacional e para todas as pessoas, sem nenhuma distinção. A Constituição também não apresentou esses quesitos como forma de validar a crueldade ou maus-tratos. Como afirma decisão do Supremo Tribunal Federal:

COSTUME - MANIFESTAÇÃO CULTURAL - ESTÍMULO - RAZOABILIDADE - PRESERVAÇÃO DA FAUNA E DA FLORA - ANIMAIS - CRUELDADE. A obrigação de o Estado garantir a todos o pleno exercício de direitos culturais, incentivando a valorização e a difusão das manifestações, não prescinde da observância da norma do inciso VII do artigo 225 da Constituição Federal, no que veda prática que acabe por submeter os animais à crueldade. Procedimento discrepante da norma constitucional denominado "farra do boi". (RE 153.531-8/SC – 2ªT. – STF – Rel. Min. Marco Aurélio – d.j. 03.06.1997).

Embora a alegação de manifestação culturalix e até mesmo recreativa possa ser utilizada, vemos que a norma constitucional veda casos em que a prática de tais atos prejudiquem o animal.

Em se tratando de rodeios, entende-se que são atividades de montaria, cronometragem e laço de animais, como consta no artigo 1º, § único, da Lei 10.519/2002x (dispõe sobre a promoção e a fiscalização da defesa sanitária animal quando da realização de rodeios).

Nas alegações pertinentes aos rodeios, a maior defesa apresentada é lei 10.519/2002 (dispõe sobre a promoção e a fiscalização da defesa sanitária animal quando da realização de rodeios), que elenca no artigo 3º, inciso II, a proibição de “maus-tratos e injúrias de qualquer ordem” nos animais utilizados para o fim do rodeio, e no artigo 4º e parágrafos seguintes, determina e proíbe a utilização de certos apetrechos que possam causar injúrias aos animais. Porém, conforme consta nos argumentos do Acórdão 0335664-10.2009.8.26.0000, do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, não são só apetrechos que causam maus-tratos aos animais, mas o próprio rodeio em si:

Não existem indícios que favoreçam a tese de presunção de atrocidades ou crueldades, porque o rodeio é naturalmente bruto e causa ferimentos nos animais e nos peões, tanto que, freqüentemente, são relatados acidentes fatais. (TJSP, 4ª Câmara de Direito Privado, Ap. 994.09.335664-7/50000 SP 0335664-10.2009.8.26.0000, Rel. Enio Zuliani, d.j. 22.07.2010).

Pela simples leitura desta decisão, podemos notar claramente a visão que o rodeio passa as pessoas, onde ocorrem brutalidades e maus-tratos aos animais, porém, o que mais impressiona é a letargia da Justiça, que não enxerga, ou não quer enxergar, por motivos espúrios, como podemos ver na manifestação supracitada:

Não há liberdade de exprimir suas convicções quando essas manifestações ultrapassam o campo da legalidade e invadem esferas privadas dignas de tutela, como o patrimônio de quem organiza e realiza festas de peões, eventos que alimentam a economia de uma cidade, constituindo, a partir desse lado econômico relevante, uma espécie de orgulho municipal.

Ora, claramente a interpretação da lei está firmada na economia geradaxi, onde o fator econômico supera a dignidade da vida animal e da noção de razoabilidade admitida pelo cidadão comum. Neste assunto, tentando impedir a realização de rodeios em Santo Antonio do Jardim e Espírito Santo do Pinhal, o MP propôs ação civil pública com as alegações de que os shows musicais seriam o responsável pelo grande público das festasxii. No Parecer realizado por Renata de Freitas Martins, e publicado na Revista Brasileira de Direito Animal de 2009, consta que o maior atrativo dos rodeios são os shows, ficando o rodeio em 2º lugarxiii.

Colaborando com a afirmação econômica está o PL 4548xiv, de 1998, de autoria de José Thomaz Nonô, onde podemos constatar a alegação econômica e cultural para infringir norma constitucional:

Em momento algum o legislador pretendeu vulnerar tradições existentes em nosso território ou, muito menos, constranger atividades que hoje se revestem de inegável relevância econômica, constituindo fator de geração de empregos notadamente no meio rural.

Contrariando toda afirmação econômica apresentada, e demonstrando que a lei brasileira deve ser lida de forma integra, e não apenas em partes que venham a defender um único ponto, está a Apelação n.º 0013772-21.2007.8.26.0152, do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, proferida em razão de obrigação de não fazer rodeios na cidade de Cotia, como é apresentado:

AÇÃO CIVIL PÚBLICA AMBIENTAL - RODEIO - Obrigação de não fazer - Sentença que julgou improcedente o pedido sob o argumento de o mesmo ser genérico e amplo - Inadmissibilidade - O pedido deve ser parcialmente provido como medida de prevenção e proteção ao bem estar dos animais, conforme os pareceres do Ministério Público em 1ª e 2ª grau - Contundência dos laudos e estudos produzidos a comprovar que a atividade do rodeio submete os animais a atos de abuso e maus tratos, impinge-lhes intenso martírio físico e mental, constitui-se em verdadeira exploração econômica da dor - Incidência do art. 225, § 1º, VII, da Constituição Federal, do art. 193, X, da Constituição Estadual, além do art. 32 da Lei nº 9.605/98, que vedam expressamente a crueldade contra animais - Inadmissível a invocação dos princípios da valorização do trabalho humano e da livre iniciativa, pois a Constituição Federal, embora tenha fundado a ordem econômica brasileira nesses valores, impôs aos agentes econômicos a observância de várias diretivas, dentre as quais a defesa do meio ambiente, e a consequente proteção dos animais, não são menos importantes - Condenação do apelado MARCELO CHADDAD MAGOGA (DOCTOR'S RANCH) na obrigação de não fazer para que se abstenha de realizar provas de rodeio em festivais/eventos (bulldogging, team roping, calf roping e quaisquer outras de laço e derrubada), e ainda para que se abstenha de realizá-las em treinos e aulas na Fazenda Nascimento, sob pena de aplicação de multa diária - Apelo parcialmente provido. (TJSP - Câmara Reservada ao Meio Ambiente - Apelação n° 0013772-21.2007.8.26.0152, Rel. Renato Nalini, d.j. 31.03.2011)

E ainda continua, apontando diversos fundamentos para sua decisão, como se pode ler:

Em verdade, sequer haveria necessidade dos laudos produzidos e constantes dos autos para a notória constatação de que tais seres vivos, para deleite da espécie que se considera a única racional de toda a criação, são submetidos a tortura e a tratamento vil.

Ainda que houvesse fundada dúvida sobre o fato do sofrimento e dor causados aos animais utilizados em rodeios - dúvida inexistente diante da prova colacionada -,incide na espécie o princípio da precaução, segundo o qual "as pessoas e o seu ambiente devem ter em seu favor o beneficio da dúvida, quando haja incerteza sobre se uma dada ação os vai prejudicar", ou seja, existindo dúvida sobre a periculosidade que determinada atividade representa para o meio ambiente, deve-se decidir favoravelmente a ele - ambiente - e contra o potencial agressor.

Além das questões econômicas, alega-se que os instrumentos utilizados não causariam sofrimento, mas como pode-se verificar na Apelação Cível nº 539.402.5/9, não é o que ocorre na realidade:

[...]

Ora, o instrumento sedem, como cediço, visa produzir estímulos dolorosos nos animais, sendo, por isso, irrelevante o material com o qual é confeccionado.

A função de tal instrumento é pressionar a virilha, o saco escrotal, o pênis e o abdômen do animal, provocando a dor e o sofrimento, que por sua vez levam o animal a pular, a corcovear, conforme já reconhecido por este Tribunal na Apelação Cível n° 122.093.5/1.00 (Rei Des. Clímaco de Godoy) e Agravo de Instrumento n° 328.048.5/9.00 (Rei. Des. Sérgio Godoy), ambos da 04a Câmara de Direito Público.

[...]

Ressalte-se, ainda, o parecer da Douta Procuradoria de Justiça:

"Destaque-se que a pretensão da peça inicial da ação civil pública não é impedir a "festa" ou o rodeio, mas somente impedir que sejam utilizados os aparelhos que causem aos animais o sofrimento ou incômodo.

Se a não utilização dos referidos aparelhos fizer o animal ficar parado, sem pular e o "espetáculo" perder a graça, estará comprovada de forma irrefutável que os animais eram tratados de forma cruel, se mesmo sem os aparelhos ou outros estimuladores o animal pular, o rodeio poderia continuar a ser realizado. (TJSP - Câmara Especial do Meio Ambiente - APELAÇÃO CÍVEL COM REVISÃO n° 539.4 02-5/9-00, Rel. Samuel Junior, d.j. 29.11.2007)

No parecer apresentado pela Mountarat Associação de Proteção Ambiental apresenta-se várias espécies de instrumentos utilizados nos rodeios, além do sedém e das esporasxv. Quanto ao uso ser permitido em razão da Lei 10.519 de 17 de julho de 2002 (promoção e fiscalização sanitária animal quando da realização de rodeio)xvi, cumpre apontar comentário da Apelação Cível 168.456-5/5 do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo:

[...]"um certo instrumento, ou uma determinada prova, não deixam de ser cruéis simplesmente porque o legislador assim dispôs. Não se desfaz a crueldade por expressa disposição de lei. Portanto, se demonstrado, em cada caso, que algum dos equipamentos legalmente permitidos no rodeio lesiona, física ou mentalmente, o animal, se impõe sua proibição, para que se cumpra fielmente a vedação à crueldade, assegurada nas Constituições Federal e Estadual.

Evidente, em conseqüência, que os rodeios e festas de peão não podem incluir práticas e equipamentos cruéis, ainda que eventualmente permitidos na Lei Estadual 10.359/99, podendo ser assim considerados aqueles que causam lesão, consistente em ferimento, dor física ou sofrimento mental, aos animais." (TJSP - 8ª Câmara de Direito Público - Apelação Cível 168.456-5/5; Des. Teresa Ramos Marques, d.j. 24.10.2001)

Acompanha o mesmo entendimento:

Conforme vem sendo decidido por este Tribunal, os instrumentos utilizados para que os animais, sejam bovinos ou eqüinos, pulem ou corcoveiem durante os eventos de rodeio, impõem sofrimento, dor, tortura e crueldade.

E tal prática deve ser afastada. (TJSP - Câmara Especial do Meio Ambiente - APELAÇÃO CÍVEL COM REVISÃO n° 539.4 02-5/9-00, Rel. Samuel Junior, d.j. 29.11.2007)

Frisa-se assim, que não existe fundamentação quanto as alegações que os instrumentos utilizados não causem maus-tratos aos animais de rodeio, nem que sua realização é de ordem econômica, ou apresenta-se como cultura do povo brasileiro. Na verdade a história dos rodeios começou nos EUA, por volta de 1880, no Texas, onde os vaqueiros (cowboys) competiam entre sixvii. No Brasil o rodeio começou na década de 1950, em Barretos, como uma forma de brincadeira, mas que foi uma clara cópia do rodeio norte-americanoxviii.

Como bem aponta Vanice Teixeira Orlandi, em seu texto Cruéis Rodeios - A exploração econômica da dorxix, nos rodeios ocorre sim maus-tratos, e comprovados por diversos laudos técnicos:

Os corcoveios dos animais exibidos em rodeios resultam da dor e tormento de que padecem, não só pelas esporas que lhes castigam o pescoço e baixoventre, mas também pelo “sedém,” artefato amarrado e retesado ao redor do corpo do animal, na região da virilha, tracionado ao máximo no momento em que o animal é solto na arena. É o que concluem dezoito laudos oficiais solicitados pelo Ministério Público e pelo Judiciário, dentre os quais se destacam os proferidos pelo Ibama, pelo Instituto de Criminalística do Rio de Janeiro e pela Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade de São Paulo. As universidades que atestam o contrário participam ou promovem o “Rodeio Universitário”, como a UNESP e a Universidade de Uberlândia, o que as tornam inidôneas para se manifestarem sobre o tema.

Recentemente foi divulgada a morte de um bezerro na Festa do Peão de Barretosxx, demonstrando mais uma vez a crueldade por que passam para o divertimento humano. Vanice Teixeira Orlandi aponta:

Na prova denominada “bulldogging”, o peão desmonta de seu cavalo, em pleno galope, atirando-se sobre a cabeça do animal em movimento, devendo derrubá-lo ao chão, agarrando-o pelos chifres e torcendo violentamente seu pescoço. Ocorre assim deslocamento de vértebras, rupturas musculares e diversas lesões advindas do impacto recebido em sua coluna vertebralxxi.

As provas de laço também são consideradas cruéis, pelo ponto de vista ético, pois podem causar lesões nos animais, que atinge até 40 km/h antes da abrupta paradaxxii.

Por fim, cita-se a conclusão do Parecer de Irvênia Luiza de Santis Pradaxxiii:

Face ao exposto, e obedecendo o rigor do método científico,podemos concluir que:

é impossível provar que os animais não sentem dor física ou que não tenham sofrimento mental, quando submetidos aos procedimentos do chamado rodeio completo;

a identidade de organização morfo-funcional existente entre o sistema nervoso do homem e o dos animais é altamente sugestiva de que os animais vivenciem sofrimento físico e mental, quando submetidos aos procedimentos do chamado rodeio completo.

Outras formas de maltratar os animais são a vaquejada, a farra do boi e a rinha (briga de galos), estes dois últimos já considerados contrários a Constituição Federal e a lei de crimes ambientais, como se lê nas sábias decisões proferidas:

COSTUME - MANIFESTAÇÃO CULTURAL - ESTÍMULO - RAZOABILIDADE - PRESERVAÇÃO DA FAUNA E DA FLORA - ANIMAIS - CRUELDADE. A obrigação de o Estado garantir a todos o pleno exercício de direitos culturais, incentivando a valorização e a difusão das manifestações, não prescinde da observância da norma do inciso VII do artigo 225 da Constituição Federal, no que veda prática que acabe por submeter os animais à crueldade. Procedimento discrepante da norma constitucional denominado "farra do boi". (STF - RE 153531 - SC - 2ª T. - Rel. p/ Acórdão: Min. Marco Aurélio - d.j.: 03.06.1997).

INCONSTITUCIONALIDADE. Ação direta. Lei nº 7.380/98, do Estado do Rio Grande do Norte. Atividades esportivas com aves das raças combatentes. "Rinhas" ou "Brigas de galo". Regulamentação. Inadmissibilidade. Meio Ambiente. Animais. Submissão a tratamento cruel. Ofensa ao art. 225, § 1º, VII, da CF. Ação julgada procedente. Precedentes. É inconstitucional a lei estadual que autorize e regulamente, sob título de práticas ou atividades esportivas com aves de raças ditas combatentes, as chamadas "rinhas" ou "brigas de galo". (STF - ADI 3776 - RN - Tribunal Pleno - Rel.: Cezar Peluso - d.j.: 14.06.2007).

Não aceitando o exercício da tradição cultural em detrimento da proteção ambiental temos julgamento proferido pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarinaxxiv:

AÇÃO CIVIL PÚBLICA - Obrigação de fazer - Proibição da prática da "farra do boi" que submete animais à crueldade - Admissibilidade - Livre exercício de tradição açoriana obstaculizada pela proteção e preservação da fauna - Inteligência do art. 225, VII, da CF/1988. (TJSC - ApCiv 2009.050178-1 - 1ª Câmara de direito público - Rel. Des.: Vanderlei Romer - d.j.: 04.05.2010).

A vaquejada é um espetáculo que ocorre no Nordeste brasileiro, mantendo uma certa similaridade com o rodeio, mas tendo como atividade a derrubada de um boi por 2 cavaleiros, infringindo danos físicos aos animais, devido ao tomboxxv.

Não se pode permitir o detrimento do direito à vida que os animais possuem, uma vida livre de sofrimento, em nome da cultura, quanto mais alegações de geração de empregos, movimentação financeira ou outros absurdos, pois, como pondera-se no relatório da Apelação Cível, supra citada, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina:

A postura de coibir apenas os abusos, porque a "tradição" deve ser preservada, em se tratando de "farra do boi", cujos contornos foram muito bem delineados pelo STF, admitiria igual interpretação, ab absurdo, se, eventualmente, algum grupo de imigrantes aqui se estabelece com "tradição de canibalismo" (obviamente repelida pela nossa Constituição), garantindo-se o seu exercício com fundamento na proteção constitucional das manifestações culturais (art. 215, § 1º, CF/1988), preocupando-se o Poder Público apenas em coibir abusos para minimizar o sofrimento das pobres vítimas(!).xxvi

Assim, diante das constatações científicas de que o sistema nervoso do animal pode converter os estímulos em dor, apresentando agonia e stress, e que a realização de rodeios, apresentações de animais em circos e outros espetáculos que utilizem animais de forma a submetê-los a situações que importem em maus-tratos, pode-se concluir que essas atividades são contrárias aos dispositivos legais vigentes em nosso país, notadamente à Constituição Federal e a Lei de Crimes Ambientaisxxvii, resultando em ações prejudiciais ao meio ambiente.

i Disponível em: <http://www.camara.gov.br/sileg/integras/430964.pdf>. Acesso em: 26 fev. 2011.

ii Lei Estadual nº 11.977/2005.

Artigo 21 - É vedada a apresentação ou utilização de animais em espetáculos circenses.

Embora esteja suspensa pela ADIN nº 3595, no Acórdão de Apelação Cível nº 704.103.5/1, do TJSP consta: "Não há que se falar em inconstitucionalidade do artigo 21 da Lei nº 11 977/05." Disponível em: <http://www.robertotripoli.com.br/site/images/pdf/tjcodestadual.pdf>. Acesso em 12 set. 2011.

iii Brasil perto de proibir animais em circo. Disponível em: <http://ultimosegundo.ig.com.br/brasil/brasil+perto+de+proibir+animais+em+circo/

n1237593330943.html.>. Acesso em: 26 fev. 2011.

iv The lack of appropriate social interaction, reduction in time spent foraging and the restricted freedom to perform many highly motivated behaviours represent stressors for captive animals. Stress can have short-term as well as chronic long-term behavioural and physiological effects. Through time this can induce poor welfare by compromising health, altering brain function, reducing breeding potential and lowering life expectancy. Disponível em: <http://content.www.rspca.org.uk/cmsprd/Satellite?blobcol=urldata&blobheader=application/pdf&blobkey=id&blobnocache=false&blobtable=MungoBlobs&blobwhere=1233001368035&ssbinary=true>. Acesso em: 17 set. 2011.

v Defesa Animal: Tripoli solicita e Ministério do Meio Ambiente apóia proibição de animais em circos do país. Disponível em: <http://www.ricardotripoli.com.br/?p=857>. Acesso em: 17 set. 2011.

vi Projeto de Lei Nº 7.291, DE 2006.Disponível em: <http://www.camara.gov.br/sileg/integras/673221.pdf>. Acesso em: 17 set. 2011.

vii Imagens mostram os maus-tratos a animais em circos. Disponível em: <http://fantastico.globo.com/Jornalismo/FANT/0,,MUL846583-15605,00-IMAGENS+CHOCANTES+DE+MAUSTRATOS+A+ANIMAIS.html>. Acesso em: 17 set. 2011.

viii Catalunha veta touradas e desafia país.Disponível em: <http://www.estadao.com.br/estadaodehoje/20100729/not_imp587459,0.php>. Acesso em: 26 fev. 2011.

ix"O texto constitucional fala em "práticas" - o que quer dizer que há atos cruéis que acabam tornando-se hábitos, muitas vezes chamados erroneamente de manifestações culturais." MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro. 16ª Ed. São Paulo: Malheiros Editores Ltda., 2008. p. 143.

x Art. 1º A realização de rodeios de animais obedecerá às normas gerais contidas nesta Lei.

Parágrafo único. Consideram-se rodeios de animais as atividades de montaria ou de cronometragem e as provas de laço, nas quais são avaliados a habilidade do atleta em dominar o animal com perícia e o desempenho do próprio animal.

xi Os negócios milionários nas festas de rodeio no Brasil. Disponível em: <http://gestoratual.com.br/noticia/431-os-negocios-milionarios-nas-festas-de-rodeio-no-brasil.html>. Acesso em: 12 set. 2011.

xii MP quer proibir rodeios em duas cidades. Disponível em: <http://blogs.estadao.com.br/jt-cidades/mp-quer-proibir-rodeios-em-duas-cidades/>. Acesso em 25 ago. 2011.

xiii Parecer: Utilização de animais em rodeios. Disponível em: <http://www.abolicionismoanimal.org.br/revistas/revista_dir._animal_v5_virtual-1.pdf>. Acesso em: 25 ago. 2011

xiv Disponível em:

<http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=20954>. Acesso em: 26 ago. 2011.

xv Disponível em: <http://conjectura.com.br/PDF/parecer_rodeios_SA.pdf>. Acesso em: 12 set. 2011.

xvi Art. 4º Os apetrechos técnicos utilizados nas montarias, bem como as características do arreamento, não poderão causar injúrias ou ferimentos aos animais e devem obedecer às normas estabelecidas pela entidade representativa do rodeio, seguindo as regras internacionalmente aceitas.

§ 1o As cintas, cilhas e as barrigueiras deverão ser confeccionadas em lã natural com dimensões adequadas para garantir o conforto dos animais.

§ 2o Fica expressamente proibido o uso de esporas com rosetas pontiagudas ou qualquer outro instrumento que cause ferimentos nos animais, incluindo aparelhos que provoquem choques elétricos.

xvii História do Rodeio. Disponível em:

<http://www.expoagrorv.com.br/expo2010/index.php?option=com_content&view=article&id=36&Itemid=11>. Acesso em: 12 set. 2011.

xviii Disponível em: <http://conjectura.com.br/PDF/parecer_rodeios_SA.pdf>. Acesso em: 12 set. 2011.

xixCruéis Rodeios - A exploração econômica da dor. Disponível em:

<http://www.mp.go.gov.br/portalweb/hp/9/docs/artigo_-_crueis_rodeios_(a_exploracao_economica_da_dor).pdf>. Acesso em: 25 ago. 2011.

xx Morte de bezerro reacende polêmica sobre maus tratos a animais no rodeio de Barretos. Disponível em: <http://noticias.uol.com.br/cotidiano/2011/08/25/morte-de-bezerro-reacende-polemica-sobre-animais-no-rodeio-de-barretos.jhtm>. Acesso em: 14 set. 2011 e Morte de bezerro em rodeio pode gerar ação por formação de quadrilha. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/963846-morte-de-bezerro-em-rodeio-pode-gerar-acao-por-formacao-de-quadrilha.shtml>. Acesso em: 14 set. 2011.

xxi Cruéis Rodeios - A exploração econômica da dor. Disponível em:

<http://www.mp.go.gov.br/portalweb/hp/9/docs/artigo_-_crueis_rodeios_(a_exploracao_economica_da_dor).pdf>. Acesso em: 25 ago. 2011.

xxii Nas mãos do bicho homem. Disponível em:

<http://www.videolog.tv/video.php?id=307091>. Acesso em: 14 set. 2011.

xxiii Diversão Humana e Sofrimento Animal. RODEIO. Disponível em:

<http://www.forumnacional.com.br/parecer_irvenia_luiza_de_santis_prada.pdf>. Acesso em: 23 ago. 2011.

xxiv Revista de Direito Ambiental. Ano 15 - nº 59 - jul-set./2010. Ed. Revista dos Tribunais - São Paulo, p. 379-391.

xxv SIRVINSKAS, Luis Paulo. Manual de direito ambiental. 5ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 287.

xxvi Revista de Direito Ambiental. Ano 15 - nº 59 - jul-set./2010. Ed. Revista dos Tribunais - São Paulo, p. 389.

xxvii Mesmo entendimento compartilhado por Paulo A. F. Machado. MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro. 16ª Ed. São Paulo: Malheiros Editores Ltda., 2008, p. 804.

Assuntos: Criminal, Direito Ambiental, Direito Penal, Maus-tratos a Animais

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