Aborto Eugênico

25/12/2012. Enviado por

Esse artigo se refere ao estudo do direito comparado, nos aspectos gerais do delito de aborto. Em linhas gerais, com a evolução tecnológica, começou a ser possível diagnosticar uma série de malformações fetais inviabilizantes, uma delas anencefalia

            A perspectiva do estudo é do direito comparado dos aspectos gerais do delito de aborto e também da história do Brasil a respeito do aborto. Em poucos temas encontra  tanta modificação através do tempo e do espaço quanto ao aborto, porque quanto ao homicídio há um consenso sobre o ato ilícito a respeito do tempo e do espaço, quanto ao aborto não, por duas razões primeiro  porque o aborto sempre foi uma conduta  moral sexual, quer dizer a ideia de tirar um filho do ventre sempre foi ligado a idéia de que a conduta tem que ter a condta sexual tal, qual para não ter filhos indesejados, enfim que para tê-lo só dentro de uma relação de casamento, da religião, como se sabe são altamente mutáveis relacionada a atividade sexual etc.

             Por outro lado o aborto sempre dependeu de recursos tecnológicos muitos específicos para ser punido. Começa-se  a contar sobre os sistemas de punição do aborto.

            Para se fazer um apanhado da história da humanidade sobre tempo e espaço, existem 3 sistemas de punição para a punição do aborto, dois sistemas radicais e um sistema intermediário.

            Os dois sistemas radicais são de total liberação, no Direito Greco-romano, sobretudo na Grécia, o aborto era completamente liberado. Platão fala de aborto, Aristóteles diz a respeito do aborto, condizendo que o aborto é o meio idôneo para regulamentação de nascimentos, para regulação populacional,  portanto na Grécia era totalmente admitido, não se reconhecia nenhuma indignidade, nenhuma importância em si no feto, o que havia era o direito nos pais a descendência, então quando o aborto era realizado pelos pais não era problema nenhum.

            Durante o tempo da história  a gestação era um problema exclusivamente feminino, os próprios ciclos mestruais  eram irregulares e a própria mulher demorava a perceber que estava grávida. A gravidez era cercada de mistérios e depois do nascimento, o bebê era problema do homem.  Portanto se a mulher ficasse grávida e quisesse abortar, ninguém ficaria sabendo, não havia sentido em punir a mulher pela prática do aborto, porque aquilo era considerado parte do seu próprio corpo, não era considerado uma coisa em si,  um bem jurídico. Não se conhecia que o feto tinha dignidade em si, mas não como crime do próprio feto.

            Com a derrocada do Império Romano, o começo do declínio desse império,  houve uma grande revolução cultural da história da humanidade, essa revolução se chamava Cristianismo.

            O Cristianismo foi uma doutrina revolucionária, os pequenos camponeses que estavam  sendo expusos pelo Império Romano, se agarraram a dois tipos de movimento, os movimentos propriamente revolucionários que acabaram não fazendo efeito frente as força poderosa do Império Romano, foi chamada de movimentos messiânicos. Como o camponês não tinha nada nessa vida era preciso que ele acreditasse que todos, independentemente de sua casta, fossem filhos do mesmo Deus,  para valorizar a vida do pequinino, daquele que não tem se quer corpo,  e a onda de valorização e punição do aborto começou com a doutrina Cristã.

            Para a doutrina Cristã, o aborto era um pecado mais grave do que o próprio   homicídio, porque quando se mata alguém já nascido, deu a essa pessoa a oportunidade de  ser batizado, retirar os seus pecados permitindo entrar no reino dos céus, mas quando se mata a criança que ainda não nasceu, que ainda não recebeu o batismo, era ainda mais grave, o aborto era um crime equiparado de pena ao homicídio e era considerado pelo direito Canônico mais grave do aquele.  uma das percepções da doutrina canônica que o filho  não fazia parte do corpo da mâe, porque o bebê precisava ser batizado, se o bebê fizesse parte do corpo da mãe e estivesse na sua barriga, quando a mãe fosse batizada não precisava do batismo.  O bebê era uma alma diversa, colocada no ventre da mãe para portá-la, por isso exigia respeito e dignidade, portanto no cristianismo vigourou na Idade Média  o princípio da absoluta proibição do aborto, não conhecia exceções.

            Não havia consenso quando a alma se fundia ao corpo, São Tomás de Aquino que foi  releitura de Aristóteles,  que considerava que à alma se fundia ao corpo semanas após a concepção. Esse período vigorava a proibição total do aborto.

            Hoje em dia, não há nenhum país que adote em sua pureza, o sistema da proibição absoluta , o sistema da permissão absoluta, o que se encontra é o sistema intermediário, o sistema que permite o aborto até certo tempo e não depois, até certos casos e não depois.

            No sistema intermediário, se tem duas linhas que são o sistema de prazo e o sistema de indicações. No mundo, tem países que adotam o sistema de prazo e tem outros que adotam o sistema de indicações.

            Na Europa, é amplamente majoritário o sistema de prazo, é o sistema que com algumas diferenças regionais admite-se que durante determinado prazo a escolha da mulher é livre, ou seja, ela que dá a última palavra, alguns países adotam que a mulher  pode passar por algum aconselhamento, que após todos os procedimentos protocolares pode  decidir em abortar ou seguir com a gestação, a escolha é dela.

            Grande parte dos países europeus adotam o sistema de prazo, um exemplo é a Inglaterra que foi o primeiro país a regulamentar o aborto desde 1967 e é permitido  até  a vigésima segunda  semana de gestação.

            O sistema de prazos sempre estabelece um prazo, sobretudo à atenção a própria segurança da vida da mulher, porque o aborto é uma intervenção cirúrgica extremamente  invasiva.

            Desde  1978, a Itália adota o sistema de prazos, mediante um sistema de aconselhamento, e ele ainda é obrigatório, e ainda prevê um intervalo entre o aconselhamento e a realização do aborto, que é  um prazo de 48 horas como uma  solução para que a mulher tenha a certeza de que realmente quer fazer  o aborto.

            A Espanha, em 2010, permitiu o aborto até a décima semana de gestação. O único estado europeu que ainda adota o sistema de indicação, o sistema brasileiro, é Portugal, o único país importante da Europa que não adotou o sistema de indicação. Esse   sistema proíbe o aborto e só é permitido à indicação teraupêutica para salvar vida, a indicação sentimental proveniente da gravidez decorrente do  estupro e a indicação eugênica.

            Na América, nos Estados Unidos,  desde 73 adota o sistema de prazos, se sabe que o direito Norte Americano  é consuetudinário, vai se formando por precedentes. O Direito Norte Americano  utiliza três faixas. O primeiro diz que até o terceiro mës o aborto é total livre a decisão da mulher; segunda faixa dos três aos seis meses o aborto só pode ser feito caso haja extrema  necessidade; e nos três últimos meses o aborto não pode ser feito de forma alguma.

            Na América Latina, a totalidade dos países adotam o sistema de indicação, inclusive o Brasil, esse sistema é que o aborto só é permitido em determinados casos.

            O país mais permissivo  da América Latica é o Uruguai que adota   a indicação  terapêutica, indicação  sentimental e a indicação econômica, que é bastante amplo no caso  se a mulher não tiver condições econômicas para suportar  a criança, mas a indicação eugênica não.  E   o país mais radical, contra o aborto é o Chile, tem a legislação mais severa contra o aborto, não reconhece nenhuma exceção, os próprios doutrinadores chilenos entendem que tendo conflito entre a gestante  e a vida do feto, pode resolver esse conflito pelas as regras gerais do estado de necessidade e legitima defesa podem ser aplicada.

            O  Brasil se encontra no intermédio e  aceita duas situações que o aborto é permitido, o primeiro realizado para salvar a vida da gestante, o aborto terapêutico ou o aborto necessário e a segunda quando a gestação decorre de estupro chamado aborto sentimental ou aborto humanitário, não há nenhuma outra possibilidade de aborto na legislação brasileira.

            O  primeiro código penal  do Brasil, como país independente, foi o Código Criminal do Império de 1830, punia o aborto sem nenhuma exceção, que era um código considerado moderno, inspirado na Constituição de 1824, não punia a gestante, ele punia o terceiro que praticava o aborto, considerava-se que uma mulher quando decidia abortar já tinha superado tantas barreiras morais, barreiras ética, que não era a barreira da pena que ia desmotivá-la.

            A gestante começou a ser punida no Código Penal de 1890, o primeiro código da República, a gestante historicamente com uma pena menor, é uma exceção a teoria monista, historicameente o legislador sempre considerou que a conduta da gestante menos reprovável, a única possibilidade o caso de risco para a vida da gestante.

            O próximo Código Penal é de 1940, permanece punindo a gestante, sempre com pena menor. Esse código trouxe duas exceções que é  para salvar a vida da gestante, independentemente de sua autorização,  o aborto necessário ou terapêutico praticado sempre por médico que  visa proteger a incolumidade física da gestante e a segunda hipótese é o aborto em caso de estupro chamado de aborto sentimental ou humanitário, ao respeito a mulher a sua dignidade.

            O bem jurídico protegido no delito de aborto é a expectativa de nascimento com vida, não a expectativa do embrião ou o feto por si só. Existem duas correntes  que tendem a explicar qual o momento do início da vida, a primeira corrente,  é a partir da concepção, desde a fecundação e a segunda corrente entende juridicamente só é protegida quando se mostrar minimamente viável, com a nidação ou nidificação, a fecundação na parede uterina e começar a se desenvolver.  A nidação se dá em volta do  décimo quarto  dia a partir da fecundação. Essa discussão não tem muita importância prática no delito do aborto, tal como nós conhecemos ocorre após a nidação.

            Mas tem muita importância no caso da pílula do dia seguinte e o dil, a pílula do dia seguinte é um método contraceptivo, na verdade  impede o desenvolvimento do embrião e a sua fixação no cólo uterino. O dil tem dois efeitos, por um lado é contraceptivo, do material que ele é feito cobre o colo do útero, deixa o ambiente não propício a fecundação, impedindo a fecundação. Uma  vez tendo havido a fecundação, ele impede a nidação. A maior importância da nidação e a fecundação vai ser por causa desses método. Em 2011 o TJ , já decidiu pela  inconstitucionalidade de uma lei municipal que proibia a pílula do dia seguinte e o dil naquela cidade. Embora não declarado no STF, o Brasil está na prática na teoria da nidação, só aborto após a fixação do ovo no colo do útero.

            A partir da década de 70, começou a ser possível diagnosticar uma série  de malformações fetais inviabilizantes, uma delas anencefalia. A anencefalia não é prevista na legislação brasileira, não é caso permitido, mas já está sendo objeto de discussão pelo STF.

             A anencefalia é um defeito de fechamento do tubo neural, defeito de  fechamento do sistema nervoso, que acontece por volta dos vinte e cinco dias após a concepção. Ela impede a formação do cérebro e do cerebelo, até a própria formação da  calota crâniana. O anecéfalo possui o tronco encefálico, a coluna vertebral, é uma situação diferente da morte encefálica,. O anencéfalo têm atividades encefálica, chamadas de cérebro baixo,  responsável pelas atividades vegetativas, puramente mecânicas, motivo pelo qual não ocorre relação com o mundo exterior e nem conscientização à dor. É fato a inexistência de todos as funções superiores do sistema nervoso central – responsáveis pela consciência, cognição, vida relacional, comunicação, afetividade e emotividade. Restam apenas algumas funções inferiores que controlam parcialmente a respiração, as funções vasomotoras e a medula espinhal.

             Nesse sentido,  sendo um distúrbio irreversível, não há nenhuma possibilidade de reversão, não tem causas conhecidas e acomete na população brasileira mais ou menos dois  em dez mil reais nascidos vivos, ela é cem porcento letal ou podem sobreviverem por dias ou  meses, com atividades puramente mecânica.

            Nesse caso, pode exemplificar com o caso Marcela, diagnosticada com anencefalia, sobreviveu até  1 ano e oito meses, período que foi mantida viva, com um capacete de oxigênio e alimentação por sonda.  Todos os médicos posteriormente desmentiram o diagnósticos de anencefalia, a Marcela era vítima de outra forma de deformidade genética, a merocrania. Ela tinha um defeito menos grave na formação do crânio, e o resquício de cérebro  e não de anencefalia. A anencefalia é letal, o bebê pode até sobreviver por alguns dias, ou meses.

            Em 1991, o Juiz do   Mato Grosso concedeu o primeiro alvará que consentiu a gestante a realização do aborto com o diagnostico de anencefalia. Em 1997, a Lei de Transplante de órgãos passou a estabelecer o critério de morte para retirada de órgãos para transplante seria a morte encefálica, essa lei deu origem aos argumentos mais comuns para defender o aborto no caso do anencéfalo. Se o morto é aquele que não tem cérebro,não tem atividade cerebral  e o anencéfalo é um morto e com isso está retirando um feto morto, então não há aborto,  crime impossível.

            A Lei de Transplantes  de órgãos previu que o conceito de morte era a parada irreversível da atividade cerebral, ela atribuiu ao Conselho Federal de Medicina quais são os requisitos para constatar a morte e expediu a Resolução nº 1.480, previa todos os procedimentos da constatação da morte encefálica, mas esses procedimentos não podem ser aplicados em crianças menos de 7 dias de vida.

            Acontece que em 2004, o Conselho Federal de Medicina expediu a Resolução 17522004 , que permitiu a retirada de órgãos de bebês anencéfelos vivos, mesmo antes da morte encefálica. É uma contradição, porque juridicamente   não pode fazer o aborto, mas depois que nasce pode ser retirado os órgãos para transplante, essa situação perdurou de 2004 à 2007.

            Em 2007, o Ministério da Saúde, expediu a Portaria n. 487 , revogava a Resolução 1752, dizendo que em respeito à vida só era possível retirar os órgãos do anencéfalo após a parada cardio-respiratória.

            No ponto de vista legalmente não tem disciplina, ponto de vista médico se tem uma resolução permite a retirada de órgãos de anencéfalos vivos, não se fala de aborto, mas de retirada de órgãos e uma portaria revogando a resolução dizendo que não permite a retirada de órgão nenhum tendo que esperar a morte.

             Jurisprudencialmente muitos alvarás estão sendo concedidos, mas no caso de Gabriela  não concedeu. É por sorte que uma ação caia num Juiz que possa conceder.

            No mesmo ano de 2004, a Confederação Nacional  dos Trabalhadores da Saúde ingressou  com uma Ação de Arguição Descumprimento de Preceito Fundamental de nº 54, no Supremo Tribunal Federal, pretendendo legalizar o aborto  em caso de anencefalia, justamente para que se dê um tratamento uniforme, que as gestantes não ficassem ao sabor das decisões  desencontradas. O Ministro Marco Aurélio concedeu a liminar monocraticamente devido ao recesso de julho, surtindo  dois efeitos, o primeiro para permitir o aborto de feto  anencéfao nesse período e o segundo que todas as ações envolvendo os casos de anencéfalia ficassem suspensas, quando o Supremo voltou do recesso em outubro para decidir questão de ordem, por pleito do Ministro Eros Grau, trouxe-se ao crivo do plenário a liminar,  a liminar  foi revogada . De 2004 a 2011 essa à ação não foi julgada ainda.

            Existem  dois argumentos que tendem a dizer  que à antecipação terapêutica  de parto é atípica. O  primeiro argumento usado por muitos doutrinadores que biologicamente o feto  anencéfalo é um natimorto, o segundo argumento que é a expectativa do nascimento com vida,  não há aborto por ausência de bem jurídico,ou seja  o feto é inviável não há possibilidade de vida, não há aborto, é exatamente isso que à ADPF pede, foca que ao interpretar o artigo 124 e 126 do Código Penal, a luz do preceito constitucional, para que se constate que ao lê a palavra aborto não está à antecipação terapêutica de feto anencéfalo.

            Há o reconhecimento do aborto decorrente de estupro por razões sentimentais, que exclui a ilicitude, porque o sentimento que ocorre para mulher, pode causar com relatos,  traumas, depressão  grave, de tentativa de suicídio dependendo de mulher para  mulher.  O abalo psíquico da mulher nao pode ceder espaço para uma vida com uma gravíssima doença, deve ser mais a intensidade de dor que essa situação pode provocar. Veja que no caso do estupro tem uma vida  de um feto perfeito, que não tem culpa de ser concebido pelo fruto de violência e do outro lado o sentimento da mulher, sentimento de ser indignada.  Quando se fala na anencefalia praticamente estando falando dos mesmos valores, de um lado uma vida limitada, sem consciência, muito curta, inviável e de outro lado o sentimento de desespero de indignadade muito maior, porque não permitir a mulher no seu sentimento que aborte.

Assuntos: Direito de Família, Direito Penal, Direito processual civil, Família

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