A "Coisa" Julgada no Processo Coletivo

14/09/2012. Enviado por

Nas ações coletivas, em regra, a coisa julgada ocorre de acordo com o resultado do processo, isto é, a mesma ação coletiva não pode ser proposta inúmeras vezes.Dessa forma, caso ocorra igualdade de ações coletivas.

SUMÁRIO:1 INTRODUÇÃO; 2 CONCEITO E CARACTERISTICAS DA COISA JULGADA; 3 IMUTABILIDADE E EFEITOS DA COISA JULGADA; 4 RELATIVIZAÇÃO DA COISA JULGADA; 5 COISA JULGADA MATERIAL E COISA JULGADA FORMAL; 6 COISA JULGADA NO PROCESSO COLETIVO; 7 CONCLUSÃO; 8 REFERÊNCIAS.

Resumo

É cediço que no contexto de nosso atual ordenamento jurídico toda  decisão ligada às relações submetidas à apreciação do judiciário é passível de recurso e findas as vias recursais ou, ainda, pelo decurso do tempo, aquela decisão torna-se imutável. Desta forma, a coisa julgada é entendida como uma técnica do legislador para garantir à sociedade a estabilidade das decisões judiciais.

A imutabilidade do provimento jurisdicional é uma garantia constitucional que visa, como já dito, a segurança jurídica das decisões, inclusive, para efeito de advento de lei posterior, ou seja, nem a edição de uma nova lei tem o condão de alterar os efeitos da coisa julgada.

Nas ações coletivas, em regra, a coisa julgada ocorre de acordo com o resultado do processo, isto é, a mesma ação coletiva não pode ser proposta inúmeras vezes. Dessa forma, caso ocorra igualdade de ações coletivas, podem ser aduzidas exceções de litispendência e de coisa julgada.

Palavras-Chaves: Coisa Julgada. Processo Coletivo. Imutabilidade.

INTRODUÇÃO

O presente estudo visa abordar o instituto da coisa julgada no processo coletivo, sendo necessário já inicialmente definir que, embora no processo civil nos deparemos com a imutabilidade da coisa julgada, no caso dos direitos coletivos é o resultado da demanda que vai determinar a existência ou não de tal característica.

Levando-se em conta que os interesses coletivos englobam os direitos coletivos, difusos e os individuais homogêneos, ou seja, a coletividade e um bem maior a ser tutelado, qual seja, seu interesse; neste caso não impera a imutabilidade da coisa julgada, sendo que esta surge quando da procedência da demanda ou face à improcedência fundada em provas suficientes, caso contrário, havendo improcedência por falta de provas, poderá ser proposta nova ação, com base em novas provas (relativização da coisa julgada).

Face a tal peculiaridade dos efeitos da coisa julgada no processo coletivo passaremos à discussão de suas características, natureza jurídica e efeitos.

CONCEITO E CARACTERÍSTICAS DA COISA JULGADA

 A coisa julgada no processo coletivo é regida pelos artigos 103 e 104 do CDC e pelo CPC, sendo que as regras nucleares da coisa julgada nas ações coletivas estão no artigo 103 do Código de Defesa do Consumidor, senão vejamos:

Art. 103 - Nas ações coletivas de que trata este Código, a sentença fará coisa julgada:

- erga omnes, exceto se o pedido for julgado improcedente por insuficiência de provas, hipótese em que qualquer legitimado poderá intentar outra ação, com idêntico fundamento, valendo-se de nova prova, na hipótese do inciso I do parágrafo único do artigo 81;

II - ultra partes, mas limitadamente ao grupo, categoria ou classe, salvo improcedência por insuficiência de provas, nos termos do inciso anterior, quando se tratar da hipótese prevista no inciso II do parágrafo único do artigo 81;

III - erga omnes, apenas no caso de procedência do pedido, para beneficiar todas as vítimas e seus sucessores, na hipótese do inciso III do parágrafo único do artigo 81.

Art. 81 - A defesa dos interesses e direitos dos consumidores e das vítimas poderá ser exercida em juízo individualmente, ou a título coletivo.

Parágrafo único - A defesa coletiva será exercida quando se tratar de:

I - interesses ou direitos difusos, assim entendidos, para efeitos deste Código, os transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato;

II - interesses ou direitos coletivos, assim entendidos, para efeitos deste Código, os transindividuais de natureza indivisível de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica-base;

III - interesses ou direitos individuais homogêneos, assim entendidos os decorrentes de origem comum.

É cediço que no contexto de nosso atual ordenamento jurídico toda  decisão ligada às relações submetidas à apreciação do judiciário é passível de recurso e findas as vias recursais ou, ainda, pelo decurso do tempo, aquela decisão torna-se imutável.

Desta forma, a coisa julgada é entendida como uma técnica do legislador para garantir à sociedade a estabilidade das decisões judiciais (segurança jurídica).

E mais, visa garantir ao jurisdicionado que seu direito reconhecido não será desrespeitado ou modificado. A coisa julgada é, pois, instituto jurídico que integra o conteúdo do direito fundamental à segurança jurídica, consoante art. 5º, XXXVI, CR/88.

Sendo assim, a coisa julgada é entendida como a imutabilidade dos efeitos da sentença, obtida através do trânsito em julgado, gerando empecilho para que as partes discutam a mesma causa novamente.

IMUTABILIDADE E EFEITOS DA COISA JULGADA

A imutabilidade do provimento jurisdicional é uma garantia constitucional que visa, como já dito, a segurança jurídica das decisões, inclusive, para efeito de advento de lei posterior, ou seja, nem a edição de uma nova lei tem o condão de alterar os efeitos da coisa julgada.

Com relação à natureza do interesse jurídico, se difuso e havendo a procedência, o efeito será erga omnes, entretanto, havendo improcedência por insuficiência de provas, não há o referido efeito.

 Sendo a improcedência causada por outro motivo, a coisa julgada terá efeito erga omnes.

Sendo o interesse coletivo, a procedência da demanda produz efeitos ultra partes limitado ao grupo ou categoria titular da demanda; improcedência por falta de provas, não há eficácia ultra partes; do contrário, se houver improcedência por outro motivo, há eficácia entre as partes envolvidas no litígio.

Quando se tratar de interesses individuais homogêneos, a sentença que decidir pela improcedência não terá efeito erga omnes; havendo procedência, a coisa julgada terá eficácia erga omnes apenas em relação às vítimas ou aos seus sucessores. A procedência do pedido beneficiará todos os lesados, salvo o disposto no art. 104 do CDC. Assim como, sendo o interesse coletivo abrangerá apenas o grupo de pessoas atingidas; se for improcedente por falta de provas, não prejudicará os lesados, e, se improcedente por qualquer outro motivo, prejudicará os lesados, excetuando-se daí os titulares de interesses individuais homogêneos, ressalvando-se o disposto no art. 94 do CDC.

A eficácia preclusiva da coisa julgada se caracteriza pelo impedimento de rediscussão de matéria já submetida à apreciação do judiciário.

Assim a coisa julgada material sempre surgirá quando o mérito de uma questão for decidido, e se esgotadas ou preclusas todas as vias recursais.

Neste sentido, o que se deve compreender é que a coisa julgada material significa imutabilidade apenas no que tange aos fatos existentes ao tempo do processo que o originou, com relação aos fatos que não foram trazidos aos autos opera-se o efeito preclusivo e assim não há que se falar em imunidade a fatos supervenientes, isso significaria tornar a coisa julgada material um instituto engessador de situações dinâmicas.

RELATIVIZAÇÃO DA COISA JULGADA

Muito se discute acerca da relativização da coisa julgada no processo civil e diante de alguns fatos doutrina e jurisprudência tem mantido o entendimento de que existem bens jurídicos que merecem valoração maior que a conferida à segurança jurídica.

Mais especificamente, a relativização da coisa julgada foi admitida em casos, por exemplo, de investigação de paternidade, que há um tempo eram julgados improcedentes por insuficiência de provas. Hoje, com a possibilidade de se fazer exames de DNA e nessas hipóteses os tribunais desconsideram os efeitos da coisa julgada.

O argumento preponderante da relativização da coisa julgada é o nobre primado da justiça. Segundo esta corrente, o valor da segurança jurídica não é um valor absoluto no ordenamento jurídico, dado que deve conviver com um valor de primeiríssima grandeza, qual seja, o da justiça das decisões emanadas pelo judiciário.

Com base nisso as decisões manifestamente inconstitucionais não transitariam em julgado, não podendo ser rescindidas por ofensa à lei, porque, nesta hipótese, estariam eivadas de nulidade, não podendo sequer ser acobertadas pelo manto da coisa julgada.

COISA JULGADA MATERIAL E COISA JULGADA FORMAL

A distinção entre coisa julgada material e coisa julgada formal é de suma importância, tendo em vista que o ponto principal de tal diferenciação se refere à extensão dos efeitos fora da relação processual.

A coisa julgada formal refere-se à imutabilidade da decisão endo processualmente, por não haver mais recurso cabível, seja pelo esgotamento destes ou pelo decurso de prazo. É simplesmente quando ocorre o trânsito em julgado da decisão.

A coisa julgada material é mais abrangente, repercutindo efetivamente nas relações jurídicas, porque torna indiscutível a decisão judicial dentro e fora do processo. A coisa julgada formal é pressuposto necessário para que haja coisa julgada material.

Para haver a coisa julgada material, devem estar presente uma decisão judicial, sendo esta referente ao mérito da demanda; uma decisão definitiva, ou seja, não sendo mais passível de recurso.

Com a decisão deve concorrer seu trânsito em julgado.

Portanto, toda e qualquer decisão judicial que preencha esses requisitos fará a coisa julgada material.

 Vale frisar que, quando nos referimos à coisa julgada formal significa dizer que se operou o trânsito em julgado do processo, ou seja, houve o fim do processo.

Assim, verifica-se que a coisa julgada formal ocorre com o simples trânsito em julgado da decisão, sem ocorrer, contudo, a coisa julgada material, que só ocorrerá quando a sentença for de mérito.

COISA JULGADA NO PROCESSO COLETIVO

A coisa julgada no processo individual produz os efeitos já mencionados alhures a fim de tornar indiscutível o provimento final em busca da segurança jurídica. E tais efeitos atingem, apenas, as partes envolvidas na lide.

Nas ações coletivas, em regra, a coisa julgada ocorre de acordo com o resultado do processo, isto é, a mesma ação coletiva não pode ser proposta inúmeras vezes. Dessa forma, caso ocorra igualdade de ações coletivas, podem ser aduzidas exceções de litispendência e de coisa julgada.

Urge salientar que a coisa julgada sempre se formará, independentemente de procedência ou não do pedido, o que difere no caso de direitos individuais e coletivos, é que nesta o rol de pessoas atingidas pela decisão é que pode variar, existindo efeito erga omnes ou ultra partes.

O Código de Defesa do Consumidor trouxe em seus artigos 81 a 104 a determinação e extensão dos efeitos da coisa julgada.

Com relação às ações ajuizadas individualmente, será beneficiado pela coisa julgada da ação coletiva o autor da ação individual que houver feito requerimento, em momento oportuno, da suspensão de sua demanda individual.

 Não sendo suspensa a ação individual o autor não poderá se beneficiar do resultado, nem também terá, em tese, seu direito prejudicado pela eventual improcedência na ação coletiva, o que significa que, havendo improcedência na ação coletiva, aqueles que não integraram a lide como assistentes litisconsorciais podem propor demanda individual.

Nas ações que versam sobre interesses individuais homogêneos, as vítimas e seus sucessores beneficiam-se tanto com a sentença de procedência processo atinente à defesa de interesses difusos, bem como, com a sentença penal condenatória.

As ações coletivas não induzem à litispendência ou coisa julgada em relação às ações individuais, salvo se os interesses protegidos forem de natureza individual homogênea - ocorrendo, neste caso, a coisa julgada em relação aos lesados que intervieram na ação, tendo pedido a suspensão da sua demanda individual caso existisse; ou mesmo, tendo ingressado como assistente litisconsorcial da ação coletiva. Na hipótese de improcedência da ação coletiva, aqueles que não ingressaram na lide coletiva poderão propor ações individuais, pois a coisa julgada produzida naquela ação não atinge o direito individual.

Assim, se o direito for difuso, a coisa julgada terá efeitos erga omnes; se for coletivo os efeitos serão ultra partes, atingindo a todos os sujeitos identificáveis; e se for direito individual homogêneo, a decisão terá efeitos erga omnes com relação a aqueles que comprovarem serem vítimas da lesão relativa ao direito discutido em juízo.

Tais situações podem ser solucionadas através de certos instrumentos do processo, qual sejam; a ação civil pública, ação popular, mandado de segurança coletivo, o mandado de injunção. 

CONCLUSÃO

O instituto da coisa julgada é entendido como uma técnica utilizada pelo legislador para assegurar a convivência social e a estabilidade de determinadas relações jurídicas, isso porque é conveniente que algumas decisões permaneçam imutáveis e tenham validade erga omnes, sempre com o fito de se concretizar a segurança jurídica.

Ocorrer que nas ações coletivas, em regra, a coisa julgada tem seus efeitos definidos conforme o resultado do processo, ou seja, sendo procedente o pedido ou diante da improcedência fundada em provas suficientes, operar-se-á coisa julgada. Entretanto se houver a improcedência por falta de provas, poderá ser proposta nova ação, com base em prova nova.

Diante disso, concluímos que apesar de ser regra a imutabilidade da coisa julgada em nosso ordenamento jurídico, em sede de processo coletivo esta ocorrerá conforme o resultado da demanda, posto que, versando sobre interesses coletivos estes devem muitas vezes ser priorizados, levando à relativização da coisa julgada.

REFERÊNCIAS

ALMEIDA, João Batista de. Aspectos controvertidos da ação civil pública. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2001.

ALONSO JR., Hamilton. Direito fundamental ao meio ambiente e ações coletivas. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006.

CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de direito processual civil. Vol. 01, 3 ed. – São Paulo: Editora Bookseller, 2002.

DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil: direito probatório, decisão judicial, cumprimento e liquidação da sentença e coisa julgada. Bahia: Editora Jus Podvium, 2007.

GOZZOLI. Maria Clara - Mirna Cianci - Petrônio Calmon – Rita Quartieri (coordenadores). Em defesa de um novo sistema de Processos Coletivos. Estudos em Homenagem a Ada Pellegrini Grinover. – São Paulo: Editora Saraiva.2010.

MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Ação Civil Pública em defesa do meio ambiente, do patrimônio cultural e dos consumidores. 9 ed. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2004.

MAZZILI, Hugo Nigro. A defesa dos interesses difusos em juízo. 10 ed. São Paulo: Editora Saraiva, 1998.

 WAMBIER, Luiz Rodrigues. (coordenação), Curso Avançado de Processo Civil vol. 1. 8 ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006.

Assuntos: Consumidor, Direito do consumidor, Direito processual civil

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