A amplitude expressiva do direito de defesa no Brasil

22/12/2013. Enviado por

O presente trabalho tem por escopo aprofundar o estudo do instituto ampla defesa, na medida em que investiga a importância e a efetivação deste preceito constitucional na prática processual em nosso país. Antes de explanar sobre o tema, é necessário

Resumo: O presente trabalho tem por escopo aprofundar o estudo do instituto ampla defesa, na medida em que investiga a importância e a efetivação deste preceito constitucional na prática processual em nosso país. Antes de explanar sobre o tema, é necessário tecer alguns comentários a respeito do conceito de ampla defesa. A Constituição Federal insculpiu em sua estrutura jurídica uma diversidade de princípios com o propósito de resguardar direitos e conferir garantias a todos. Um desses princípios refere-se à ampla defesa. Esse princípio em sua real concepção denota uma vasta possibilidade de defesa, inclusive a utilização, pelo réu, de provas obtidas por meios ilícitos, desde que comprovado o estado de necessidade de sua produção, o que contraria a regra de que são inadmissíveis e serão desentranhadas dos autos referidas espécies de provas. Contudo, o que se busca com essa situação de aceitação de determinadas provas é uma efetiva concretização do princípio da presunção de inocência, que ademais é relativa, ou seja, cabendo prova em contrário. A ampla defesa não se restringe a esfera jurídica, atentando-se também a outros procedimentos tais como: o extrajudicial e o administrativo. Consideram-se, por tanto, inválidos e absolutamente nulos os processos que não oportunizam a defesa, eivados de vícios insanáveis quando de sua ausência, pois se trata de uma questão de ordem pública, arguida de ofício, afinal vivemos num país essencialmente democrático de direito.

Palavras-chave: Ampla defesa. Contraditório. Plenitude de defesa.

INTRODUÇÃO

Conceito

A ampla defesa, assim como contraditório, é um direito assegurado aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, com os meios e recursos a ela inerentes.
A Constituição Federal insculpiu em sua estrutura jurídica uma diversidade de princípios, com o propósito de resguardar direitos e conferir garantias a todos. O princípio objeto deste estudo encontra-se expresso no art. 5º, inc. LV. Como se vê, a Constituição traçou o âmbito de alcance deste princípio ultrapassando a esfera judicial para incluir a administrativa. A ampla defesa é uma garantia das partes e é inerente ao Estado de Direito. Embora este princípio venha expresso como "ampla defesa", seu âmbito de alcance não se restringe única e exclusivamente a beneficiar o réu, posto que busca também beneficiar outros legitimados da relação processual.
Assim, é correto dizer que a ampla defesa constitui um direito que visa proteger réus, autores, bem como por ventura, terceiros juridicamente interessados. Contudo, somente se
constatará o efetivo aproveitamento da ampla defesa processual quando as partes inclusas na disputa litigiosa puderem por em prática o que está positivado normativamente, exercendo os direitos assegurados pela legislação vigente, dentre eles o do devido processo legal que inclui o contraditório, a ampla defesa, a dignidade da pessoa humana, entre outros.

Da Interpretação do Instituto Ampla Defesa

Foi instaurado em nossa Carta Política de 1988 um modelo constitucional do processo, o qual irradia em cada caso concreto os parâmetros constitucionais influenciados pelos princípios, de forma que estes devem ser interpretados substancialmente, em consonância com a teoria dos direitos fundamentais, desapegando-se do foco legalista, flexibilizando a aplicação da lei frente à finalidade maior que é o alcance da justiça.
A Declaração Universal dos Direitos Humanos trouxe em seu texto a ampla defesa, especificamente no inciso XI; a Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa Rica), o trouxe em seu artigo 8º que trata das garantias judiciais.

1. DA HISTORICIDADE
1.1. Do Novo Modelo Processual

O sistema processual de um país está intimamente ligado ao momento histórico-político pelo qual vive, é um reflexo da cultura, dos valores e anseios da sociedade. Por isso, podemos observar que as mudanças ocorridas pela Constituição, como a positivação de direitos e garantias fundamentais, foram reflexo do impulso social, determinado pela expectativa de um povo que sentia necessidade de mudanças imediatas.
Logo após a segunda guerra mundial, tornou-se insustentável manter a velho e antigo constitucionalismo, pois este se baseava na priorização da vontade única do legislador em detrimento dos cidadãos, que viam seus direitos sendo violados constantemente. Contudo, como a própria sociedade clamava por mais direitos, iniciou-se uma nova forma de instituir a base constitucional, foi desde então que se cogitou num modelo diverso do anterior, com a positivação de princípios, a criação de normas programáticas e a ampliação do leque de direitos fundamentais, impulsionando, desta forma, o Neoconstitucionalismo3. 3 Para Luís Roberto Barroso são características do neoconstitucionalismo a redescoberta dos princípios jurídicos, (em especial a dignidade da pessoa humana), a expansão da jurisdição constitucional com ênfase no surgimento de tribunais constitucionais e o desenvolvimento de novos métodos e princípios na hermenêutica constitucional.
Com base no Neoconstitucionalismo, foi modelado o novo processo constitucional. A Constituição Federal introduziu um novo sistema no país, a partir de uma visão Social Democrática de Estado de Direito. Hoje, se busca não só efetivar as garantias determinadas na Constituição, como também se exige que este mesmo efeito seja alcançado pelos procedimentos processuais. Este deixou de ser um simples instrumento seguidor de regras, para perseguir a justiça como finalidade principal. Nesse sentido, Ada Pellegrini Grinover ensina “que todo o direito processual, por tanto, como ramo de direito público, tem suas linhas fundamentais traçadas pelo direito constitucional” (GRINOVER, 1972, p. 12).
Em consonância com o parágrafo anterior, Cândido Rangel Dinamarco, citado por Humberto Theodoro Júnior, em seu artigo Constituição e Processo aduz que é “indispensável que cada processo produza os resultados substanciais que melhor atendam à justiça do caso concreto” valorizando os direitos eleitos pela consciência da sociedade como essenciais, que segundo o autor, “no Estado Democrático de Direito, se confundem basicamente com as garantias e direitos fundamentais tutelados na Constituição” (THEODORO JÚNIOR, 2009, p. 240). Nesse sentido José Roberto dos Santos Bedaque, também citado por Theodoro Júnior, afirma que “é insuficiente, ou melhor, de nada serve o processo regular determinada matéria, se ele não o fizer em consonância com os princípios e valores constitucionais pelos quais é regido” (THEODORO JÚNIOR, 2009).
José Frederico Marques aduz: “Direito Processual um dos ramos das ciências jurídicas de mais íntimo e próximo contato com os preceitos constitucionais”. Devido o sistema processual está em perfeita conexão com as normas fundamentais, tende a realizar os direitos almejados pela sociedade, e que pela mesma foram determinados em nossa Carta Política, trazendo a realidade, a concretude e a efetividade aos preceitos constitucionais.
O autor Humberto Theodoro trata do tema contraditório no artigo Constituição e Processo, constatando que a nova concepção de processo é “dominada pela participação ativa de seus sujeitos” e não permite que o juiz decida sem dar oportunidade às partes para se manifestarem sobre a questão litigiosa e sem oferecer a elas um prazo razoável para formularem suas alegações. Afere ainda que é inadmissível a decisão de surpresa, ou seja, fora do contraditório, pois a decisão tem de ser fruto da discussão entre as partes, tendo o juizde motivar sua decisão com base nos argumentos dessas, seja em favor ou em desfavor das mesmas (THEODORO JÚNIOR, 2009, p. 253). Embora exista a necessidade de contraditório, é válido frisar que haverá casos em que a decisão poderá e deverá ser dada em caráter antecipatório ou cautelar, ou seja, sem oitiva da parte adversa. A ampla defesa e o contraditório estão intimamente ligados e até chegam a ser confundidos, pois foram trazidos pela constituição num mesmo dispositivo, mas cada um tem sua devida fundamentação e importância.
Com a edição da Constituição atual foi estendido os princípios da ampla defesa e do contraditório ao procedimento administrativo, sendo que, toda e qualquer aplicação de penalidade ou conclusão de processos administrativos deve ser precedida de defesa do servidor, sendo que não é mais possível à utilização do termo “verdade sabida”, o qual aplicava sanções de imediato sem oportunizar a defesa do acusado. Tal forma de procedimento é incompatível com o novo modelo processual aplicado pelo legislador constitucional, pelo simples fato de suprimir por completo a manifestação de defesa, convertendo-se em punição sumária.
Na esfera civil, o direito de defesa é uma busca pelo não deferimento do pedido do autor, conforme pensamento de Wambier e Talamini, quando afirmam que o réu tem “direito de pleitear um provimento jurisdicional”. Ressaltam que o réu não é obrigado a se defender, podendo ficar inerte ao processo, porém correrá o risco de sofrer os efeitos da revelia, que poderão ser aplicados pelo magistrado, ou seja, correrá o risco de que os fatos trazidos pelo autor sejam presumidos verdadeiros (WAMBIER; TALAMINI, 2008).
Nas palavras de Vicente Greco Filho “a lei estabelece os termos, os prazos e os recursos suficientes, de forma que a eficácia, ou não, da defesa dependa da atividade do réu, e não das limitações legais” (GRECO FILHO, 2003, p. 56), sendo que, a legislação estatui o âmbito para a defesa, para que o réu, dentro desse âmbito, realize sua tese, bem como as provas pertencentes a ela, sendo que o resultado do processo será o desenrolar natural da tese de defesa aplicada.
Tratando-se de inquérito policial, entendido como uma preparação para a ação penal, como integra o conceito de fase inquisitiva - dispensável ao processo - não lhe será condicionado à validade a presença de contraditório e ampla defesa. É que neste procedimento não há por si só a possibilidade de condenação de acusados, nem tão pouco poderá servir de único fator gerador de condenação em meio a um processo que comprova o contrário do que se verifica em seu conjunto probatório. Constata-se de fato apenas como uma mera peça informativa. Contudo, “tem por finalidade reunir elementos probatórios mínimos. Verdade sabida consiste na possibilidade da autoridade competente impor uma pena administrativa, ou seja, autuar diretamente o agente público, quando presencia uma irregularidade. Não existe mais no nosso ordenamento jurídico após a Constituição Federal de 1988, que garante o direito ao contraditório, ampla defesa e devido processo legal, também no processo administrativo.
acerca da autoria e materialidade que possam justificar a propositura da ação penal competente”. (TOURINHO FILHO, 2009). Embora inexistente a ampla defesa e o contraditório no inquérito policial, isso não quer dizer que os direitos fundamentais devam ser esquecidos, pelo contrário, necessariamente deverão ser aplicados, pelo respeito à dignidade da pessoa humana.
É indispensável atentar-se para o direito de defesa quando estamos diante do direito de ação, são situações que caminham juntas e em perfeita harmonia. O simples fato de se reunirem num mesmo processo a fase inicial - em que se pede um fazer, uma intervenção do Estado, na produção efetiva do direito almejado que se encontra resistido ou na busca pela punição daquele que feriu um bem jurídico protegido - e outra fase posterior, qual seja, a de resposta e produção de provas, abre-se, assim, a oportunidade de debates sobre tudo o que fora afirmado e negado pelas partes, conferindo desta forma a existência de um processo em que se respeitou o direito a ampla manifestação dos litigantes, e consequentemente o direito a defesa digna e íntegra.
Por tanto, é assegurando às partes, o acesso aos autos e a apresentação de provas, sejam documentais, periciais ou testemunhais, e dando-lhe ciência dos motivos e fundamentos da decisão proferida que se alcança a finalidade do processo. O direito à ampla defesa condiciona à autoridade a uma fiel observância das normas processuais e de todos os princípios jurídicos incidentes sobre o processo, para que seja efetiva a prestação jurisdicional.

2. A APLICABILIDADE DA AMPLA DEFESA

Apesar de haver distinção procedimental entre processo civil e penal, é de menor importância referida distinção no que tange ao direito amplo de defesa, pelo simples fato desse princípio vir garantido em nossa Constituição Federal de forma geral, abrangendo “n” procedimentos, pois desta feita partimos do pressuposto de que a teoria geral do processo se baseia no Estado Democrático de Direito e não somente em regras positivas expressamente declaradas em leis. Mas quando se fala em ampla defesa no processo civil não se fala em obrigatoriedade de manifestação da parte ré, pois esta poderá seguir a revelia, sendo considerados verídicos os fatos alegados pelo autor na inicial, contudo, nos processos penais isso não se verifica. Quando da ausência de defesa, ou quando o réu não constituir advogado, obrigatoriamente deverá ser nomeado, pelo juiz, um curador para realizar a defesa genérica do réu (art. 396-A, § 2º)6, pois não há sentença penal condenatória sem defesa, constituindo nulidade insanável e absoluta.
Valem mais os princípios na aplicação do direito do que algumas próprias leis, pois em algumas delas poderão conter vícios que contrariam a dignidade da pessoa humana, princípio corolário dos demais, bem como, haver desequilíbrio e contrastes na interpretação de leis, as quais deverão ser entendidas à luz dos princípios constitucionais norteadores de todas as esferas jurisdicionais.
Nesse diapasão, são merecedoras de citação as palavras do renomado garantista LUIGI FERRAJOLI (2002, p. 39), quando ele diz que "Para que a disputa se desenvolva lealmente e com paridade de armas, é necessária, por outro lado, a perfeita igualdade entre as partes”, bem como “que a defesa seja dotada das mesmas capacidades e dos mesmos poderes da acusação".
É necessária a busca pela equidade na utilização de armas entre acusação e defesa, proporcionando equilíbrio e justiça na busca de uma responsabilização sancionadora dos culpados.
No âmbito do direito processual penal, com a reforma ocorrida pela lei n. 11.689, de 2008, a absolvição sumária (art. 397 CPP)7 passou a ser possível já na fase em que o réu apresenta sua defesa, desde que esteja presente alguma dessas circunstâncias: existência manifesta de causa excludente da ilicitude do fato; existência manifesta de causa excludente da culpabilidade do agente, salvo inimputabilidade; atipicidade do fato; e extinção da punibilidade do agente.
As modificações trazidas pela Lei n. 11.719, de 2008, priorizou o instituto da ampla defesa, pois o interrogatório do réu que antes era realizado inicialmente, agora passou a ser o último procedimento da instrução probatória. O art. 396 traz a garantia de que o réu será citado para responder a acusação no prazo de 10 dias.
Haverá casos em que o juiz, após as diligências, análise de provas e ouvida de testemunhas, verificará a necessidade de modificar a tipificação do crime. São os casos de 6 Art. 396-A. Na resposta, o acusado poderá argüir preliminares e alegar tudo o que interesse à sua defesa, oferecer documentos e justificações, especificar as provas pretendidas e arrolar testemunhas, qualificando-as e requerendo sua intimação, quando necessário. § 2º Não apresentada a resposta no prazo legal, ou se o acusado, citado, não constituir defensor, o juiz nomeará defensor para oferecê-la, concedendo-lhe vista dos autos por 10 (dez) dias. 7 Art. 397. Após o cumprimento do disposto no art. 396-A, e parágrafos, deste Código, o juiz deverá absolver sumariamente o acusado quando verificar: (Alterado pela L-011.719-2008) I - a existência manifesta de causa excludente da ilicitude do fato; (Acrescentado pela L-011.719-2008) II - a existência manifesta de causa excludente da culpabilidade do agente, salvo inimputabilidade; III - que o fato narrado evidentemente não constitui crime; ou IV - extinta a punibilidade do agente.
Emendatio libelli (art.383 CPP) e Mutatio libelli (384, caput CPP). Não haverá afronta ao direito de defesa na ocorrência de emendatio libelli, pelo simples motivo de não ter sido alterado os fatos narrados pela acusação, o que se mudou foi apenas a imputação contra o réu. Na mutatio libelli haverá uma modificação dos fatos e consequentemente na imputação feita ao réu. Então, assim como na emendatio, a mutatio não viola o princípio do contraditório e ampla defesa, pois nesta será reaberto um novo prazo para manifestação da defesa, serão ouvidas testemunhas, uma nova colheita de provas, será designada nova audiência, onde o acusado será interrogado a respeito dos novos fatos.

3. DA POSSIBILIDADE DE PROVAS OBTIDAS POR MEIOS ILÍCITOS

A ampla defesa em sua real concepção denota uma vasta possibilidade de defesa, inclusive a utilização, pelo réu, de provas obtidas por meios ilícitos, desde que comprovado o estado de necessidade de sua produção, o que contraria a regra de que são inadmissíveis e serão desentranhadas dos autos referidas espécies de provas. Contudo, o que se busca com essa possibilidade de aceitação de determinadas provas é uma efetiva concretização do princípio da presunção de inocência, que ademais é relativa, ou seja, cabendo prova em contrário.
Desta feita, a inocência, considerada apenas como uma presunção, aliando-se a possibilidade de um vasto lastro probatório, por meio de sua defesa, o réu terá uma imensurável chance de demonstrar a sua não culpabilidade, transformando a presunção em afirmação absoluta de inocência. Por tanto, é justificável a utilização de provas obtidas por meios ilícitos, que confirmem a inocência do acusado, até porque o objetivo do direito penal em si não é aplicar penas ao maior número possível de acusados, mas buscar a verdade real dos fatos. Há uma incessante corrida Constitucional a procura de meios para se evitar que danos irreparáveis ocorram, tendo em vista o confronto de um lado, do poder-dever de punir do Estado e do outro, o direito a liberdade do indivíduo, e é a partir desta realidade que se verificou que no aparente conflito de normas principiológicas, deve ser feito uma ponderação de qual princípio no caso concreto deverá ser efetivado. A Constituição Federal brasileira de 1988, no rol dos direitos e garantias individuais, artigo 5º, inc. LVI, faz referência as provas ilícitas, com o seguinte dispositivo: “são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos”. Considerando-se como provas ilícitas as obtidas com violação da intimidade, da vida privada, da honra, da imagem, do domicílio, e das comunicações, salvo nos casos permitidos no inciso XII, do mesmo artigo, a das comunicações telefônicas.

Conforme exposto, convém frisar que a cada modificação da sociedade o direito dá um passo de evolução, vê-se que não será mais necessário que o acusado figure no polo passivo da ação por um longo e desnecessário período, quando inicialmente pode comprovar sua inocência logo na primeira oportunidade, é este o objetivo e a verdadeira expressão da ampla defesa.
Evita-se que um inocente se mantenha na condição de culpado, procrastinando um vício insanável ao ferir o princípio da presunção de não culpabilidade. Destarte, a admissão do pedido de absolvição sumária verifica-se em atenção ao princípio da ampla defesa.
O procedimento do júri integra além de outros, o princípio da plenitude de defesa, o qual é considerado como mais vasto que a ampla defesa, tendo ambos advindos da nossa Carta Política de 1988, e permite que sejam utilizados todos os meios legítimos para uma realização digna de defesa. Na disputa pela liberdade/defesa x poder-dever de punir do Estado, esse ameaçando restringir, em último caso, a liberdade do acusado, tem-se que para uma real e efetiva defesa, é indispensável que se conheça amplamente de que está sendo acusado e por quem. É um direito a livre manifestação de requerer a produção de provas, e de se pronunciar das consequências delas advindas, ou seja, replicar, utilizando-se do contraditório. Destarte, há um grupo de observações importantes a serem feitas antes de se atestar que está aproveitando-se da tal ampla defesa, como por exemplo: quando de vários autores do crime, se todos estão sendo investigados individualmente, por suas atitudes, as circunstâncias que os levaram a praticar o(s) ato(s), se está tendo realmente uma defesa técnica adequada, ou se foi devidamente citado no início do processo e intimado dos demais atos, quando regularmente deveria ser intimado.
A ampla defesa não se restringe a esfera jurídica, atentando-se também a outros procedimentos tais como: o extrajudicial, o administrativo, em associações, a vínculos trabalhistas. Embora seja como o nome já diz “amplo”, a ampla defesa não se aplica quando da utilização de procedimentos inquisitivos, os quais não se pautam por esse princípio, pois não tem o condão de punir alguém.
São com essas atitudes dentre outras, que se verifica a probabilidade de se beneficiar com o instituto da ampla defesa, considerando-se inválidos e absolutamente nulos os processos eivados de vícios insanáveis quando da ausência da ampla defesa, pois se trata de uma questão de ordem pública, afinal vivemos num país essencialmente democrático de direito.
O Supremo Tribunal Federal editou a Súmula Vinculante n. 14, com o seguinte teor:
"É direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia judiciária, digam respeito ao exercício do direito de defesa".
Deve ser considerado que, a ampla defesa exige que além do conhecimento do inteiro teor da acusação, pelo defensor, lhe seja dada ciência com antecedência razoável, para que a produção de defesa não se torne deficiente.
É no sentido de preservar uma íntegra defesa que o art. 392 do CPP exige a intimação pessoal da sentença condenatória, isso ocorre devido à carga principiológica que carrega direito a ampla defesa.

CONCLUSÃO

As modificações ocorridas nas últimas décadas em nosso país estão proporcionando cada vez mais a solidificação do respeito aos direitos fundamentais do ser humano, em especial o direito de produzir sua própria defesa em larga escala. Está ocorrendo o que se chama de Constitucionalização do Processo, que tem como escopo a introdução das normas constitucionais ao regramento processual, para a efetiva aplicação dos princípios nas fases procedimentais.
O direito segue a conduta dos indivíduos, o sistema processual de um país é reflexo do momento em que as pessoas vivem a cultura, a política e a economia. E o momento em que surgiu o Neoconstitucionalismo foi logo após dolorosas tragédias do pós-guerra, quando a sociedade exigia mudanças, que foram em sua maioria atendidas. Com base neste contexto foi-se expandindo o conceito e utilização da ampla defesa em todos os procedimentos, por conta da determinação constitucional. Hoje, o rito do sistema processual brasileiro segue normas garantidoras de direitos, tem como finalidade a busca pela justiça, não se tratando apenas de um instrumento, mas um realizador de justiça, conforme a Constituição.
Os princípios constitucionais são os instrumentos adequados que visam efetivar a garantia do processo justo, e esse, por sua vez também garante a aplicação dos princípios. É uma união dependente, harmônica e inseparável para a consecução dos fins almejados pelo Estado que pretenda manter-se intitulado de democrático.
O contexto deste trabalho avaliou o que há de mais importante na esfera processual, ou seja, a ampla defesa acompanhada do contraditório, princípios que garantem o respeito à paridade de armas entre os litigantes, a abertura de possibilidades de defesa do acusado, as oportunidades de provar a sua não culpabilidade, enfim, da limitação do Estado que não pode agir com autoritarismo frente aos direitos inerentes a condição humana, evitando a existência de processos puramente inquisitoriais que atentem contra o Estado Democrático de Direito.

REFERÊNCIAS:

FERRAJOLI, Luigi. Direito e Razão. Teoria do Garantismo Penal. São Paulo: RT, 2002.
GRECO FILHO, Vicente. Direito Processual Civil Brasileiro. 17ª. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. v. 1.
GRINOVER, Ada Pellegrini. A garantia constitucional do direito de ação e sua relevância no processo civil, Livre-Docência, São Paulo: Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, 1972, p.12.
MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo. Curso de Direito Constitucional. 5ª ed. rev. e atual., São Paulo: Saraiva, 2010.
SANTOS, Eduardo Rodrigues. Disponível em:˂http://www.conteudojuridico.com.br/artigo,o-contraditorio-e-a-ampla-defesa-no-rocesso-civil-a-luz-do-modelo-constitucional-do-processo-enquanto-instrum˃. Acesso em: 02 de nov. 2011.
SIQUEIRA JR, Paulo Hamilton. Direito Processual Constitucional. 5ª ed. São Paulo: Saraiva, 2011.
Supremo Tribunal Federal', da Súmula Vinculante n. 14. Disponível em: ˂http://www.stf.jus.br/portal/cms/verTexto.asp?servico=jurisprudenciaSumulaVinculante˃. Acesso em: 30 de out. 2011.
TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de Processo Penal. 11ª Ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2009.
THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil: Teoria Geral do Direito Processual Civil e Processo de Conhecimento. 50ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2009. v. 1.
______. Constituição e Processo: desafios constitucionais da reforma do processo civil no Brasil. In: MACHADO, Felipe Daniel Amorim; OLIVEIRA, Marcelo Andrade Cattoni de (coord.). Constituição e Processo: A contribuição do processo ao constitucionalismo democrático brasileiro. Belo Horizonte: Del Rey, 2009.
WAMBIER, Luiz Rodrigues; TALAMINI, Eduardo. Curso Avançado de Processo Civil: Teoria geral do processo e processo de conhecimento. 10ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. v. 1.

Assuntos: Direito processual civil, Direito processual penal

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