Desaposentação

11/09/2015. Enviado por

O instituto da Desaposentação é entendido pela maioria dos doutrinadores como direito ao aposentado que, retornando ao trabalho, volta a contribuir para o regime geral de previdência social.

CONCEITO DE DESAPOSENTAÇÃO

A Desaposentação é instituto jurídico do Direito Previdenciário nomeado pela Doutrina e reconhecido pela Jurisprudência. Esta tem a finalidade de reconhecer as contribuições previdenciárias realizadas pelos aposentados que retornam a trabalhar após a concessão do benefício de aposentadoria, utilizando-as para aumentar a renda mensal auferida.

Para tanto, como tal situação não possui previsão legal, encontrou-se como solução o ato do aposentado renunciar ao benefício de aposentadoria e, após o reconhecimento da renúncia, este requerer outra benefício previdenciário de mesma natureza, comprovando as contribuições previdenciárias vertidas após a concessão do primeiro.

Destarte, entende-se por Desaposentação o ato do aposentado renunciar ao seu benefício previdenciário com o objetivo de requerer novo benefício de aposentadoria, levando em consideração as contribuições previdenciárias realizadas após o jubilamento. Nesse sentido, MARTINS (2009, p. 343) conceitua tal instituto dispondo que: “Desaposentação é a renúncia à aposentadoria, visando contar o tempo de serviço anterior para futura aposentadoria, no mesmo ou em outro regime”. IBRAHIM (2011, p. 35), de forma mais completa, afirma:

A desaposentação, (...), traduz-se na possibilidade do segurado renunciar à aposentadoria com o propósito de obter benefício mais vantajoso, no Regime Geral da Previdência Social ou em Regime Próprio de Previdência Social, mediante a utilização de seu tempo de contribuição. Ela é utilizada colimando a melhoria do status financeiro do aposentado.

A desapoentação pode existir em qualquer regime previdenciário, desde que tenha como objetivo a melhoria do status econômico do associado. O objetivo dela é liberar o tempo de contribuição utilizado para a aquisição da aposentadoria, de modo que este fique livre e desimpedido para a averbação em outro regime ou para novo benefício no mesmo sistema previdenciário, quando o segurado tem tempo de contribuição posterior à aposentação, em virtude da continuidade laborativa.

Castro e Lazzari (2004, p. 507) apresentam entendimento semelhante ao dispor:

Em contraposição à aposentadoria, que é o direito do segurado à inatividade remunerada, a desaposentação é o direito do segurado ao retorno à atividade remunerada. É o ato de desfazimento da aposentadoria por vontade do titular, para fins de aproveitamento do tempo de filiação em contagem para nova aposentadoria, no mesmo ou em outro regime previdenciário. Trata-se, em verdade, de uma prerrogativa do jubilado de unificar seus tempos de serviço/contribuição numa nova aposentadoria.

A Desaposentação surgiu como solução criada após a extinção do pecúlio pela Lei nº 9.032, de 1995. Este era espécie de benefício previdenciário previsto na Lei nº 8.213, de 1991, em sua redação original nos Arts. 81 a 85, o qual consistia em uma espécie de poupança constituída com as contribuições previdenciárias vertidas pelos aposentados que continuavam a trabalhar após a aposentadoria, sendo devido a estes quando deixassem definitivamente de exercer atividade econômica. Era fórmula que garantia aos aposentados auferir vantagem com suas contribuições posteriores.

Deve-se ressaltar que o aposentado por invalidez não pode requerer a Desaposentação, uma vez que seu benefício decorre da incapacidade total para o trabalho, estando ele impossibilitado de voltar a exercer qualquer atividade nesse sentido, caso contrário terá seu benefício originário cancelado, nos termos do Art. 46, da Lei nº 8.213, e 1991.

CONDIÇÃO PREVIDENCIÁRIA DO APOSENTADO QUE RETORNA A EXERCER ATIVIDADE LABORATIVA APÓS O JUBILAMENTO

A Desaposentação teve espaço no ordenamento jurídico brasileiro na medida em que os aposentados continuam a trabalhar mesmo após o jubilamento. Esta situação decorre do fato de que a renda mensal auferida em razão dos benefícios de aposentadoria ser baixa, precisando eles continuar a exercer atividade remunerada com a finalidade de manter seus ganhos e as condições econômicas de suas famílias.

Com a continuidade do exercício do trabalho, o aposentado é obrigado a verter contribuições para a Previdência Social, uma vez que é tido como segurado obrigatório, nos termos do Art. 12, §4º, da Lei nº 8.212/91, que assim dispõe:

O aposentado pelo Regime Geral de Previdência Social - RGPS que estiver exercendo ou que voltar a exercer atividade abrangida por este Regime é segurado obrigatório em relação a essa atividade, ficando sujeito às contribuições de que trata esta Lei, para fins de custeio da Seguridade Social.

Ressalte-se que o aposentado em Regime Próprio que voltar a exercer atividade laborativa também é segurado obrigatório, seja no Regime Geral ou novamente em Regime Próprio, neste último caso não sendo mais considerado aposentado, visto que seu retorno só é possível em decorrência da reversão.

Apesar de ser considerado segurado obrigatório, o aposentado é tratado de forma diversa dos outros contribuintes, uma vez que não tem direito a receber nenhum benefício previdenciário, exceto o salário-família e a reabilitação profissional (Art. 17, §2º, da Lei nº 8.213/91). Assim, há violação ao Princípio da Isonomia já que, apesar de segurado e de verter contribuições para a previdência, este é excluído de parte do sistema protetivo da Previdência Social.

Nota-se que a conduta do Estado em não conceder benefícios previdenciários ao aposentado que retorna a trabalhar contraria também o Princípio da Proteção à Confiança. Este estabelece que o Estado tem o dever de agir de modo esperado, possibilitando que os submetidos as suas determinações prevejam as condutas que serão tomadas por este, bem como que tais condutas sejam pautadas pela moralidade. No presente caso, o aposentado na condição em questão, ao verter contribuições para a previdência, imagina que terá contraprestações em decorrência destas, o que não ocorre.

Desse modo, o aposentado que retorna a trabalhar assume a condição de parcialmente protegido pela Previdência Social, mesmo contribuindo como os demais segurados para o custeio desta.

NATUREZA JURÍDICA DO ATO DE CONCESSÃO DA APOSENTADORIA E SUAS IMPLICAÇÕES NA DESAPOSENTAÇÃO

Os benefícios previdenciários, após o requerimento destes por parte do segurado, são concedidos no momento em que a autarquia previdenciária verifica que este possui os requisitos legais para auferi-lo. Desse modo, trata-se de ato que apenas reconhece o direito que se encontra no âmbito de disponibilidade do segurado, o qual escolhe o melhor momento para requerê-lo, desde que alcançadas às exigências legais.

O ato de concessão dos benefícios, como dito, é elaborado pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), autarquia federal, ente pertencente à Administração Pública Indireta, no exercício concreto de sua função administrativa de gerir a Previdência Social, sendo, portanto, um ato administrativo. Nesse sentido, IBRAHIM (2011, p. 33) afirma que:

A concessão da aposentadoria é materializada por meio de um ato administrativo, pois consiste em ato jurídico emanado pelo Estado, no exercício de suas funções, tendo por finalidade reconhecer uma situação jurídica subjetiva. É ato administrativo na medida em que emana do Poder Público, em função típica (no contexto do Estado Social) e de modo vinculado, reconhecendo o direito do beneficiário em receber sua prestação.

Conceituando ato administrativo, Carvalho Filho, de forma que nos permite incluir o ato de concessão em questão, aduz (2012, p. 99) que este é: “a exteriorização da vontade dos agentes da Administração Pública ou de seus delegatórios, nessa condição, que, sob regime de direito público, vise à produção e efeitos jurídicos, com o fim de atender ao interesse público.”

Vemos assim que o ato concessório da aposentadoria, bem como dos demais benefícios previdenciários, possui as seguintes características: emana do Poder Público, visto que é elaborado por entidade pertencente ao Estado; decorre do exercício da função administrativa, pois objetiva atender exigências individuais ante as obrigações do Estado, no caso prover a Previdência Social; e é ato vinculado, já que alcançadas as exigências previstas em lei, o administrador deve reconhecer o direito do segurado, concedendo o benefício, sem nenhum juízo de conveniência ou oportunidade.

Firma-se ainda que o ato concessivo em questão, quanto ao seu efeito, é ato administrativo declaratório, uma vez que a administração reconhece direito existente antes de sua concessão (DI PIETRO, 2001, p. 209).

Cumpridos os requisitos legais pelo segurado e emanado o ato concessório em conformidade com todas as exigências, este se aperfeiçoa e recobre-se pela prerrogativa de ato jurídico perfeito. Garantia esta prevista no texto constitucional (Art. 5º, inciso XXXVI, CRFB/88), a qual é corolário da segurança jurídica, juntamente com o direito adquirido e a coisa julgada, e tem como finalidade resguardar os direitos individuais e coletivos. O ato jurídico perfeito impermeabiliza o ato contra futuras alterações, não podendo este ser atingido por exigências legais ou requisitos administrativos posteriores à sua elaboração.

A Lei de Introdução às Normas de Direito Brasileiro (Decreto-Lei nº 4.657/42), em seu Art. 6º, §1º, define o ato jurídico perfeito como: “[...] o já consumado segundo a lei vigente ao tempo em que se efetuou.”

No âmbito do Direito Previdenciário, o ato jurídico perfeito protege os atos concessórios de benefícios previdenciários de modificações posteriores, determinando que estes sejam realizados nos termos da legislação vigente no momento de sua elaboração. Pode-se dizer que é garantia decorrente do Princípio do Tempus Regit Actum, norteador da aplicação das normas previdenciárias, que determina que os atos sejam regulamentados pelas normas vigentes no momento de sua elaboração.

Ante o exposto, observa-se que o ato de concessão da aposentadoria trata-se de ato administrativo revestido da garantia do ato jurídico perfeito. Esta natureza visa assegurar os direitos dos indivíduos, sendo Direito Individual classificado como Direito Fundamental de Primeira Dimensão, que impede o Estado de atuar de forma que o contrarie. Não pode, entretanto, ser utilizada em desfavor dos sujeitos, uma vez que é garantia concedida para proteger seus direitos.

Os indivíduos, todavia, podem desconstituir os atos jurídicos perfeitos quando for para lhes possibilitar melhores condições e desde que não atinjam direitos de terceiros, cenário que se insere no caso da Desaposentação. Nesta, o cidadão renuncia à sua aposentadoria, ato jurídico perfeito, com a finalidade de requerer benefício posterior, de maior renda mensal, visando melhorar sua condição econômica.

Referindo-se à possibilidade de renúncia à aposentadoria como hipótese de desconstituição do ato jurídico perfeito, SERAU JUNIOR apud Wladimir Novaes Martinez (2013, p. 82) afirma:

No caso em tela, o ato jurídico perfeito é uma proteção ao cidadão e nãodo órgão gestor. Nessas exatas condições, os responsáveis pela seguradora não poderão ser penalizados por atender pretensão do indivíduo de se aposentar. (...) Compondo o patrimônio jurídico do indivíduo, uma segurança sua, o ato jurídico perfeito não pode ser arguido contra ele, petrificando condição gessadora de um direito maior, que é o de legitimamente melhorar a vida. Por ser produto dessa proteção constitucional, a Administração Pública não poderá ex offício desfazer a aposentação. Porém, o indivíduo que teve e tem o poder de requerer deve ter o direito de desfazer o pedido.

Tem-se assim uma possibilidade de desconstituição do ato jurídico perfeito na medida em que há a proteção a outros preceitos constitucionais, como a construção de uma sociedade justa e solidária, por meio de uma interpretação teleológica da Constituição da República de 1988, uma vez que esta busca salvaguardar os direitos dos cidadãos, não permitindo que suas garantias sejam utilizadas para impedir o exercício destes. Ademais, possibilita o alcance das finalidades da Previdência Social, possibilitando uma situação mais favorável ao segurado.

Nesse sentido, o Tribunal Regional Federal da 5ª Região, um dos órgãos de segunda instância da Justiça Federal, a qual é competente para julgar as causas que envolvam o INSS, nos termos do Art. 109, inciso I, da CRFB/88, emitiu o seguinte julgado:

PREVIDENCIÁRIO. RENÚNCIA À APOSENTADORIA. CONTAGEM DO TEMPO PARA OBTENÇÃO DE NOVA APOSENTADORIA. POSSIBILIDADE. DIREITO DE OPÇÃO DO SEGURADO.

- Não há óbice legal à renúncia da aposentadoria previdenciária. a disposição contida nos decretos 2.172/97 e 3.048/99, dada a suas natureza puramente regulamentar, não tem força para criar, extinguir ou modificar direitos, somente possível mediante lei em sentido formal.

- A ocorrência de ato jurídico perfeito na aposentadoria previdenciária regularmente concedida, não impede a renúncia do segurado. tal como o direito adquirido e o direito emanado de coisa julgada, pode o direito resultante do ato jurídico perfeito, no caso da aposentadoria previdenciária, ser renunciado com vistas a possibilitar a contagem do mesmo tempo de serviço para fins de aposentadoria estatutária, mais vantajosa para o mesmo. precedentes do c. STJ e deste Tribunal.

- Apelação e remessa oficial improvidas.

TRF5. APELAÇÃO EM MS Nº 80556/CE, 2002.05.00.010990-2. RELATOR DESEMBARGADOR FEDERAL FRANCISCO WILDO. PRIMEIRA TURMA, DIÁRIO DA JUSTIÇA - DATA: 21/09/2004 - PÁGINA: 539 - Nº: 182 - ANO: 2004.

O Tribunal Regional Federal da 2ª Região emitiu julgados semelhantes, dentre os quais o seguinte:

PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO INTERNO. DESAPOSENTAÇÃO. DECISÃO MANTIDA PELOS SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. RECURSO NÃO PROVIDO.

- A hipótese de renúncia a aposentadoria anterior não encontra qualquer vedação no ordenamento jurídico, quer de ordem constitucional quer legal, sendo legítima a pretensão do autor ao pretender perceber, por conseguinte, benefício que lhe é mais benéfico, inclusive, diante do caráter alimentar dos benefícios previdenciários.

[…]

- Não há que se falar em violação ao ato jurídico perfeito que concedeu aposentadoria ao autor, pois o art. 5º, XXXVI da Constituição Federal, objetiva justamente resguardar direitos, entre os quais o do segurado contra atos do Poder Público, não podendo servir de pretexto para lesar direitos individuais.

[…]

(TRF2. APELAÇÃO CIVEL Nº 201050010155327 RJ 2010.50.01.015532-7. RELATOR DESEMBARGADOR FEDERAL MESSOD AZULAY NETO. SEGUNDA TURMA ESPECIALIZADA, E-DJF2R - DATA::12/06/2012 - PÁGINA::82).

O BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO DE APOSENTADORIA COMO DIREITO PATRIMONIAL, SENDO PASSÍVEL DE RENÚNCIA NO CASO DA DESAPOSENTAÇÃO

O benefício previdenciário da aposentadoria é concedido aos que cumprirem os requisitos de uma de suas modalidades. Como dito, esta objetiva assegurar o indivíduo, quando este não possuir mais condições de trabalhar, seja por idade avançada ou doença, ou já tiver trabalhado grande quantidade de tempo que lhe garanta a retirada, possibilitando os meios de subsistência econômica deste.

A aposentadoria visa apenas dar meios suficientes para o segurado se manter economicamente. Assim, pode ser considerada como um direito patrimonial o qual pertence ao âmbito de disponibilidade do indivíduo. Corrobora esta tese o fato do beneficiário poder requerê-la a qualquer tempo, após ter cumprido os requisitos para tanto.

O Superior Tribunal de Justiça tem pacífico entendimento nesse sentido, conforme se pode depreender do seguinte julgado:

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA. DIREITO PATRIMONIAL DISPONÍVEL. RENÚNCIA. POSSIBILIDADE.

1. É firme a compreensão desta Corte Superior de Justiça que, sendo a aposentadoria direito patrimonial disponível, é cabível a renúncia a tal benefício, não havendo, ainda, impedimento para que o segurado que continue a contribuir para o sistema formule novo pedido de aposentação que lhe seja mais vantajoso. Precedentes.

2. Agravo regimental a que se nega provimento.

(STJ. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL : AGRG NO RESP 1121427 SC 2009/0116056-6. RELATOR MINISTRO O G FERNANDES. SEXTA TURMA, DJE 13/12/2010.) (grifo nosso).

Corroborando o afirmado, temos também a seguinte decisão do mesmo Tribunal:

PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. RENÚNCIA À APOSENTADORIA. DECADÊNCIA DO DIREITO DO SEGURADO. INOVAÇÃO RECURSAL. INADMISSIBILIDADE. RECONHECIMENTO DE REPERCUSSÃO GERAL, PELO STF. PEDIDO DE SOBRESTAMENTO DO JULGAMENTO DO RECURSO ESPECIAL. IMPOSSIBILIDADE. ART. 543-B DO CPC. APRECIAÇÃO DE ALEGADA VIOLAÇÃO A DISPOSITIVOS CONSTITUCIONAIS. INVIABILIDADE, NA VIA DE RECURSO ESPECIAL. ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO À CLÁUSULA DA RESERVA DE PLENÁRIO. NÃO OCORRÊNCIA. PRECEDENTES DO STJ. RENÚNCIA À APOSENTADORIA, PARA OBTENÇÃO DE NOVO BENEFÍCIO. POSSIBILIDADE. DESNECESSIDADE DE RESTITUIÇÃO DOS VALORES PERCEBIDOS. PRECEDENTES DO STJ. REEMBOLSO DE CUSTAS PROCESSUAIS, PELAS ENTIDADES ISENTAS, QUANDO VENCIDAS. ART. 4º, I E PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI 9.289/96. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. FIXAÇÃO EM VALOR FIXO, NOS TERMOS DO ART. 20, § 4º, DO CPC. AGRAVOS REGIMENTAIS IMPROVIDOS.

[...]

VI. Na forma da pacifica jurisprudência do STJ, por se tratar de direito patrimonial disponível, o segurado pode renunciar à sua aposentadoria, com o propósito de obter benefício mais vantajoso, no Regime Geral de Previdência Social ou em regime próprio de Previdência, mediante a utilização de seu tempo de contribuição, sendo certo, ainda, que tal renúncia não implica em devolução dos valores percebidos. Precedentes.

[...]

(STJ. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL: AgRg no REsp 1241379 / SP. RELATORA Ministra ASSUSETE MAGALHÃES. SEXTA TURMA, DJe 18/06/2013). Disponível em: <http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/toc.jsp>. Acesso em maio de 2015.

Ocorre que, a aposentadoria decorre do sistema de seguridade social, o qual é direito fundamental do indivíduo, não podendo ser retirado deste, sendo, portanto, protegida pelas garantias da imprescritibilidade, inalienabilidade, irrenunciabilidade e possibilidade de requerimento imediato ante ao Poder Judiciário. Como pode, portanto, a aposentadoria ser alvo de renúncia no caso da Desaposentação?

Nesta hipótese, o segurado não dispõe de seu benefício de forma que deixe de ser amparado pela Previdência Social, tornando-se desprotegido. A renúncia se impõe como meio de buscar prestação mais favorável, que majore sua renda mensal, atingindo os próprios preceitos constitucionais, em especial o ideal de justiça e a dignidade da pessoa humana. Para tanto, leva em consideração as contribuições previdenciárias vertidas pelo segurado, que, caso não fossem aceitas, seriam incorporadas ao cofre da previdência sem nenhuma contraprestação para com este.

A DESNECESSIDADE DE PREVISÃO LEGAL PARA A VIABILIDADE DO INSTITUTO DA DESAPOSENTAÇÃO

Um dos principais argumentos utilizados pelo Instituto Nacional do Seguro Social para não conceder a Desaposentação é a inexistência de previsão legal permitindo-a. Alega-se que o segurado estaria violando os preceitos legais na medida em que se comportaria de modo não autorizado pela lei.

O Princípio da Legalidade, entretanto, estabelece com relação aos particulares que: “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei” (Art. 5º, inciso II, da CRFB/88). Este assim pode ser entendido como a permissão aos particulares de fazer tudo àquilo que a lei não vedar, bem como que estes serão obrigados a fazer tudo que a lei impor. No âmbito da Administração Pública, este princípio, de forma diversa, determina que os entes a esta pertencentes só podem atuar nos limites estabelecidos em lei, sendo permitido a eles fazer apenas aquilo que está expressamente previsto em texto legal, todo o resto os é vedado.

Corroborando este entendimento, Maria Sylvia Zanella Di Pietro afirma, referindo-se à Hely Lopes Meirelles:

Segundo o princípio da legalidade, a Administração Pública só pode fazer o que a lei permite. No âmbito das relações entre particulares, o princípio aplicável é o da autonomia da vontade, que lhes permite fazer tudo o que a lei não proíbe. Essa é a ideia expressa de forma lapidar por Hely Lopes Meirelles (1996:82) e corresponde ao que já vinha explícito no artigo 4º da Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789: “a liberdade consiste em fazer tudo aquilo que não prejudica a outrem; assim, o exercício dos direitos naturais de cada homem não tem outros limites que os que asseguram aos membros da sociedade o gozo desses mesmos direitos. Esses limites somente podem ser estabelecidos em lei”. (DI PIETRO. 2001, p. 68).

Destarte, vê-se que aos segurados é permitido requerer e ver concedida a Desaposentação, visto que esta não é vedada por expressa disposição legal. Ademais, o direito de renunciar a aposentadoria e requerer posteriormente benefício de mesma natureza mais vantajoso, levando em conta as contribuições vertidas pelo segurado após o jubilamento, está dentro das disponibilidades a serem realizadas pelo indivíduo, visto que a este compete julgar as condições mais adequadas para sua vida, impedí-lo de praticar tal liberalidade viola a dignidade da pessoa humana (IBRAHIM. 2011, p. 70 e 71).

Contrariando tal entendimento, o Decreto nº 3.048 de 1999, em seu Art. 181-B, nega a renúncia dos benefícios de aposentadoria ao dispor que: “As aposentadorias por idade, tempo de contribuição e especial concedidas pela previdência social, na forma deste Regulamento, são irreversíveis e irrenunciáveis.”, em clara tentativa de impedir a Desaposentação.

A vedação à renúncia ou à reversibilidade dos citados benefícios foi estabelecida por meio de decreto, ato inidôneo para limitar a atuação dos particulares, uma vez que o Princípio da Legalidade dispõe que estes só serão impedidos de praticar qualquer ato por meio de lei. O termo “lei”, inserido no diploma constitucional, possui caráter estrito, já que impõe limitações aos direitos e garantias individuais, não podendo qualquer outra espécie normativa ser elaborada para tal finalidade.

Merece menção ainda o Art. 18, §2º, da Lei nº 8.213/91. Este determina:

O aposentado pelo Regime Geral de Previdência Social – RGPS que permanecer em atividade sujeita a este Regime, ou a ele retornar, não fará jus à prestação alguma da Previdência Social em decorrência do exercício dessa atividade, exceto ao salário-família e à reabilitação profissional, quando empregado.

Nota-se que o presente dispositivo não trata da Desaposentação. Este se refere aos benefícios previdenciários que podem ser concedidos ao aposentado que volta a trabalhar no curso do auferimento de um dos benefícios de aposentadoria. Assim, tal vedação legal não abrange a renúncia à esta. Quanto à interpretação aqui apresentada acerca destes dois dispositivos legais, há decisões do Tribunal Regional Federal da 1ª Região que seguem entendimento semelhante. Como exemplo, transcreve-se parte da ementa do seguinte julgado:

PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL. APOSENTADORIA. RENÚNCIA. CONCESSÃO DE NOVO BENEFÍCIO. DESAPOSENTAÇÃO. POSSIBILIDADE. DIREITO PATRIMONIAL DISPONÍVEL. LEI Nº 8.213/1991, ART. 18, § 2º. ATO JURÍDICO PERFEITO. ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL.

1. Conforme a jurisprudência predominante, ressalvado o ponto de vista do Relator, não há óbice legal ao exercício do direito de renúncia, tendo em vista que a vedação contida no nº 3.048/99 (art. 181-B), com redação dada pelo Decreto nº 3.265/99, que estabelece que os benefícios concedidos pela Previdência Social são irreversíveis (ato jurídico perfeito) e irrenunciáveis (dado o seu caráter alimentar), não tem força para criar, extinguir ou modificar direito, dada sua natureza meramente regulamentadora, pelo que tal impedimento só seria possível mediante lei no sentido formal.

2. Consoante a posição agora predominante nesta Corte Regional, o art. 18, § 2º, da Lei nº. 8.213/91 deve ser interpretado de forma sistemática com o art. 124, II, do mesmo diploma legal, que proíbe apenas a concessão de nova aposentadoria ao segurado já aposentado, quando permanece ou retorna à atividade profissional, mas desde que represente cumulação de benefícios, não impedindo a renúncia da aposentadoria e a concessão de novo benefício.

3. Agravo regimental a que se nega provimento.

(TRF 1. AGRAVO REGIMENTAL NA APELAÇÃO CIVEL : AGRAC 119006620114013900 PA 0011900-66.2011.4.01.3900. RELATOR DESEMBARGADOR FEDERAL NÉVITON GUEDES. PRIMEIRA TURMA, e-DJF1 p.843 de 02/07/2013.)

Destarte, nota-se que não há necessidade de previsão legal autorizadora para a concessão da Desaposentação, sendo esta direito do segurado de ter reconhecida suas contribuições posteriores após o jubilamento.

Assim, espero que esse trabalho sirva aos opeadores do Direito na busca do melhor benefício para seus clientes

Milza Regina Fedatto Pinheiro de Oliveira

Assuntos: Aposentadoria, Direito previdenciário, Direitos trabalhistas, Previdência social

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