Posse responsável de animais domésticos

29/04/2013. Enviado por

O presente artigo retrata a posse de animais em apartamentos e a questão dos animais abandonados, à luz dos conceitos jurídicos e científicos.

"Como zeladores do planeta, é nossa responsabilidade lidar com todas as espécies com carinho, amor e compaixão. As crueldades que os animais sofrem pelas mãos dos homens está além do nossa compreensão." (Richard Gere)

Com a domesticação de alguns animais, principalmente cães e gatos, surgiu a necessidade de suprir estes animais de suas carências físicas e psíquicas, seja através de uma alimentação condizente, seja através da troca de carinho entre as espécies. O ser humano passou a ser responsável pelo bem-estar destes animaisi. Além dos benefícios a saúde dos animais e dos humanos, apontado por diversos veterináriosii, a posse através de adoção trás benefícios para a sociedade, reduzindo o número de animais abandonadosiii.

Algumas considerações são importantes de apontar, como a posse de animais em apartamentos e o abandono de animais, que não é abordado expressamente pelas leis federais. No âmbito municipal, na cidade de São Paulo, existe a Lei nº 13.131, 18 de maio de 2001, prevendo no artigo 17 "a manutenção de cães e gatos em condições adequadas de alojamento, alimentação, saúde, higiene e bem-estar, bem como a destinação adequada dos dejetos". Na mesma lei, em seu artigo 30, há um rol exemplificativo do que se considera maus-tratos aos animais:

Art. 30 - São considerados maus-tratos contra cães e/ou gatos:

a) submetê-los a qualquer prática que cause ferimentos, golpes, sofrimento ou morte;

b) mantê-los sem abrigo, em lugares impróprios ou que lhes impeçam movimentação e/ou descanso, ou ainda onde fiquem privados de ar ou luz solar, bem como alimentação adequada e água, assim como deixar de ministrar-lhe assistência veterinária por profissional habilitado, quando necessário;

c) obrigá-los a trabalhos excessivos ou superiores às suas forças, ou castigá-los, ainda que para aprendizagem e/ou adestramento;

d) criá-los, mantê-los ou expô-los em recintos exíguos ou impróprios, bem como transportá-los em veículos ou gaiolas inadequados ao seu bem-estar;

e) utilizá-los em rituais religiosos, e em lutas entre animais da mesma espécie ou de espécies diferentes;

f) deixar de socorrê-los no caso de atropelamentos e/ou acidentes domésticos;

g) provocar-lhes a morte por envenenamento;

h) abatê-los para consumo;

i) sacrificá-los com métodos não humanitários;

j) soltá-los ou abandoná-los em vias ou logradouros públicos.

Parágrafo único – A critério do agente sanitário do órgão municipal responsável pelo controle de zoonoses, outras práticas poderão ser definidas como maus-tratos, mediante laudo técnico.

Animais em apartamentos

Ao se comprar ou alugar um apartamento, o locatário está normalmente se vinculando através de um contrato de adesão, sem margem para negociação, como afirma Fábio Ulhoa Coelhoiv:

Não há margem possível para negociação. Se o consumidor quiser contratar, resta-lhe apenas a alternativa de concordar com as condições de negócio do fornecedor. Não havendo nestas nenhuma invalidade, por desrespeito à lei, serão válidas e eficazes entre as partes.

Se o contrato possuir a vedação de posse de animais, o locatário deverá observar essa vedação e respeitar. Se o contrato não dispuser nada sobre o assunto, mas uma convenção ou regulamento interno proibir a posse, está também deverá ser respeitada, conforme dispõe a Lei 8.245/91 (Lei do Inquilinato), que obriga o locatário a cumprir integralmente as normas estabelecidas por convenção ou regulamentov.

Para Carlos Alberto Bittar, as cláusulas contratuais devem prevalecer até mesmo em caso de litígio, em juízo, não podendo as partes mudar os termos ou condiçõesvi: "Os contratos ficam jungidos aos termos da avença, que, como lei em suas relações correspondentes, impõe-lhes o cumprimento fiel (...) prevalecendo, ademais, o contrato mesmo em juízo, em eventual litígio (...)".

Adotando este entendimento temos:

APELAÇÃO CÍVEL. ANIMAL EM APARTAMENTO. MESMO SENDO O CÃO, QUE DEU ORIGEM A PRESENTE LIDE, ANIMAL DE PEQUENO PORTE, NÃO DEVE SER MANTIDO NO APARTAMENTO, TANTO PORQUE A CONVENÇÃO DO CONDOMÍNIO VEDA A PRESENÇA DE ANIMAIS EM SUAS DEPENDÊNCIAS, TANTO NOS APARTAMENTOS COMO NAS ÁREAS COMUNS DO PRÉDIO, MAS TAMBÉM PELO FATO DE QUE QUALQUER ANIMAL, POR MENOR QUE SEJA, MANTIDO EM APARTAMENTO SEMPRE TRARÁ TRANSTORNO E DESCONFORTO AOS DEMAIS MORADORES. QUEM SE DISPÕE A MORAR EM APARTAMENTO NÃO PODE NUNCA ESQUECER QUE TEM DIREITOS, MAS TAMBÉM TEM DEVERES QUE DEVEM SER RESPEITADOS, QUE VIVE NUMA COMUNIDADE, NA QUAL PREVALECE A VONTADE DA MAIORIA, QUAL SEJA, DA CONVENÇÃO DO CONDOMÍNIO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. DECISÃO UNÂNIME. (TJPA - 1ª Câmara cível isolada - AC: 200730009518 PA 2007300-09518 - Rel. Desa. Marneide Merabet, d.j.: 12.01.2009)

Ocorre que a leitura dos dispositivos legais não podem ser efetuados de forma isolada, mas devem obedecer uma norma lógica, assim, não bastar ler que ocorre proibição de animais em determinado local, mas deve-se observar que a proibição fere o direito de propriedade dos condôminos e seus direitos acessórios. O artigo 1.335 do Código Civil prevê como direito do condômino a utilização e fluição das suas unidades individuaisvii e o artigo 1.336 do mesmo Diploma Legal estabelece a obrigação do condômino de não utilizar sua unidade individual de forma a prejudicar os demais condôminosviii. Também encontra respaldo no artigo 10, inciso III, da Lei 4.591/64 (Lei do Condomínio)ix.

Assim, a proibição não poder ser absoluta, mas deve se adequar caso a caso, como já foi alvo de avaliação por parte do Superior Tribunal de Justiça:

CONDOMÍNIO - ANIMAL EM APARTAMENTO - VEDAÇÃO NA CONVENÇÃO - AÇÃO DE NATUREZA COMINATÓRIA - FETICHISMO LEGAL - RECURSO INACOLHIDO - I. Segundo doutrina de escol, a possibilidade da permanência de animais em apartamento reclama distinções, a saber: a) se a convenção de condomínio é omissa a respeito; b) se a convenção é expressa, proibindo a guarda de animais de qualquer espécie; c) se a convenção é expressa, vedando a permanência de animais que causam incômodo aos condôminos. II. Na segunda hipótese (alínea b), a reclamar maior reflexão, deve-se desprezar o fetichismo normativo, que pode caracterizar o summum jus summa injuria, ficando a solução do litígio na dependência da prova das peculiaridades de cada caso. (STJ - REsp 12.166-0 - RJ - 4ª T. - Rel. Min. Sálvio de Figueiredo - DJU 04.05.92)

Desta feita, somente deve-se observar a vedação de animais em apartamento em caso de animais que venham a por em risco a saúde ou a tranqüilidade dos demais condôminos, como também já foi explicado pelo Superior Tribunal de Justiça:

CONDOMÍNIO - ASSEMBLÉIA GERAL - IMPOSIÇÃO DE MULTA PELA MANUTENÇÃO DE ANIMAL EM UNIDADE AUTÔNOMA - NULIDADE DA DELIBERAÇÃO - CONVENÇÃO E REGIMENTO INTERNO - I. Ao condômino assiste legitimidade para postular em Juízo a nulidade de deliberação, tomada em assembléia geral, que contrarie a lei, a convenção ou o regimento interno do condomínio. II. A exegese conferida pelas instâncias ordinárias a referidas normas internas não se mostra passível de análise em sede de recurso especial (enunciado nº 5 da Súmula/STJ). III. Fixado, com base na interpretação levada a efeito, que somente animais que causem incômodo ou risco à segurança e saúde dos condôminos é que não podem ser mantidos nos apartamentos, descabe, na instância extraordinária, rever conclusão, lastreada no exame da prova, que concluiu pela permanência do pequeno cão. (STJ - REsp 10.250-0 - RS - 4ª T. - Rel. Min. Sálvio de Figueiredo - DJU 26.04.93). Grifou-se.

Os tribunais têm entendido que a posse de animais de pequeno e médio porte e inofensivos são permitidos, mesmo diante de proibição existente em contratos, como podemos ver:

COMINATÓRIA - Condomínio - Aplicação de cláusula do Regimento Interno que veda a manutenção de quaisquer animais nos apartamentos - Quando se trata de animais domésticos não prejudiciais, não se justifica a proibição constante do regulamento ou da convenção de condomínio, que não podem, nem devem, contrariar a tendência inata no homem de domesticar alguns animais e de com eles conviver - Na hipótese, se trata de cachorro de porte médio, cujo temperamento bravio e eventual ataque foram desmentidos pela prova oral realizada nos autos - Apelada que padece de doença mental, sendo que o convívio com o animal de estimação contribui para seu bem-estar - Nesses casos, a invocação da norma proibitiva constituiria injustificável apego ao formalismo (summum jus summa iniuna) - Precedentes - Sentença mantida - Recurso improvido. (TJSP - 1º Câmara de direito privado - Ap 238.500-4/8-00 - Rel. Paulo Eduardo Razuk - d.j.: 02.06.2009). Grifou-se.

Apenas animais considerados nocivos podem ser proibidos de permanecer em condomínios, pois estaria evidente a utilização de forma nociva da propriedade, como é previsto nos artigo 10, inciso III, da Lei 4.591/64 (Lei do Condomínio) e artigo 1.336, inciso IV, do Código Civil. Nestes termos, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo já se manifestou em Apelação e em Agravo de Instrumento:

CONDOMINIO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C.C. INDENIZAÇÃO POR PERDAS E DANOS MOVIDA POR CONDÔMINO CONTRA O CONDOMÍNIO E OUTRA CONDÔMINA VISANDO COMPELIR OS RÉUS A OBEDECER A PROIBIÇÃO DE PERMANÊNCIA DE ANIMAL DE GRANDE PORTE NAS DEPENDÊNCIAS DO EDIFÍCIO PREVISTA NA CONVENÇÃO. AÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE. APELAÇÃO. CACHORRO DA RAÇA "ROTTWEILLER". RISCO POTENCIAL. USO NOCIVO DA PROPRIEDADE QUE NÃO PODE SER AFRONTADO POR DECISÃO DE ASSEMBLÉIA GERAL EXTRAORDINÁRIA. MANUTENÇÃO DO CÃO AFASTADA. DANO MATERIAL NÃO COMPROVADO. RECURSO PROVIDO EM PARTE PARA PROIBIR A MANUTENÇÃO DO CACHORRO NO CONDOMÍNIO, COM DISTRIBUIÇÃO E COMPENSAÇÃO DOS ÔNUS SUCUMBENCIAIS ENTRE AS PARTES. (TJSP - 1ª Câmara de direito Privado B - Apelação Com Revisão 4224474100 - Rel. Daise Fajardo Nogueira Jacot - d.j.: 06.04.2009). Grifou-se.

Tutela antecipada - Condomínio - Cão - Pit bull - Norma do regulamento interno que proíbe a presença de animais raças grandes - Animal sabidamente violento - Insegurança aos demais condôminos - Uso nocivo da propriedade - Presentes os requisitos para a concessão da antecipação de tutela - Recurso provido. (TJSP - 3ª Câmara de direito privado - AI 6548654400 - Rel. Beretta da Silveira - d.j.: 15.09.2009).

Aquele que descumprir as obrigações de não fazer, in casu, a de não manter animal nocivo sobre sua responsabilidade, deverá responder pelos danos causados pelo mesmo, em caso de culpa, como é apontado por Maria Helena Dinizx:

A responsabilidade do dono ou do detentor de animal funda-se na idéia de culpa "in custodiendo" presumida, devendo, para dela se eximir, provar qualquer das circunstâncias arroladas no art. 936 (...). Além da responsabilidade civil, há a penal, pois a Lei das Contravenções Penais considera como contravenção a omissão de cautela na guarda ou condução de animais (art. 31)xi.

Quanto a posse de animais da fauna silvestre, desde que provindos de criadouros regulamentados pelo IBAMAxii, e seguindo as normas previstas nas Leis 5.197/67 e 9.605/98 e no Decreto 3.179/99, são possíveis, observadas a razoabilidade e a inexistência de maus-tratos, como já foi julgado pelo Tribunal Regional Federal da 5ª Regiãoxiii:

MEIO AMBIENTE - Guarda de papagaios em ambiente doméstico - Admissibilidade - Impossibilidade de readaptação ao ambiente silvestre em razão da longa permanência saudável em cativeiro - Inexistência de maus-tratos, comprometimento da espécie e exploração ilegal do comércio - Apreensão que acarreta prejuízo maior aos animais - Aplicação do princípio da razoabilidade - Inteligência do art.225 da CF/1988. (TRF-5ª Reg. - 3ª turma - Ap/Reexame necessário 8349/PB - Rel. Des. Federal Geraldo Apoliano - d.j.: 19.08.2010).

Animais abandonados

O abandono de animais não está expressamente declarado na Lei 9.605/98 (Lei de crimes ambientais), mas poder ser configurado pela suposição que o animal venha a sofrer pelo “ato de abuso” ou “maus-tratos”, constantes no artigo 32.

O Código Penal tratou apenas do abandono de animais em propriedade alheia, que resulte em prejuízo ao proprietário, não sendo extensivo aos casos de abandono em que o animal fica vagando pelas ruasxiv.

A falta de educação e respeito para os animais, transformando-os em coisas, meros objetos da vaidade humana, como com a compra de animais para crianças, imaginado que são iguais a brinquedos, e a posse por pessoas irresponsáveis tem resultado em populações de cães e gatos abandonados, sofrendo a toda sorte de situações na sua tentativa de sobreviver.

Para a Organização Mundial de Saúde (OMS) e a Organização Pan-America de Saúde (OPAS) os problemas com os animais abandonados não estão mais em adoção de métodos tradicionais (captura e sacrifício), mas em meios mais eficazes e humanitários:

Estima-se que a população canina mundial seja de 500 milhões de indivíduos. De acordo com a Organização Mundial da Saúde, a apreensão sistemática e a eliminação de cães foram utilizadas em várias partes do mundo como método de controle, embora estudos atuais mostrem que a eutanásia é menos efetiva e apresenta maior custo em relação ao controle da reprodução animal e educação da comunidade. Os métodos tradicionais de controle populacional de cães e gatos também têm impactos negativos sobre a sociedade que critica a ação dos funcionários que desempenham a função de "laçadores", geralmente identificados como "vilões assassinos". Deficiências no manejo e no trato dos animais tornam o órgão público e seus funcionários desrespeitados pela comunidadexv.

Na justificativa para a adoção da Lei nº 12.916, de 16 de abril de 2008, o autor, o Deputado Feliciano Filho, aponta:

No que tange ao controle da raiva, a vacinação sistemática de cães nas áreas de risco, o controle populacional, por meio da captura e esterilização, aliados à educação para a guarda responsável de animais são as estratégias aceitas mundialmente, segundo a OPAS.

O ato de abandonar animais é uma questão cultural, como aponta-se:

[...] poder-se-ia esperar que campanhas de esterilização levassem à redução da taxa de abandono. No entanto, a redução das taxas de abandono depende da posse responsável de animais; assim, não é simples modelar como a esterilização afetaria o abandono. Embora seja possível organizar campanhas educacionais para promover a posse responsável, sua efetividade dependerá da resposta da população, o que, por sua vez, pode depender de aspectos culturaisxvi.

Infelizmente, na cultura brasileira, a opção por abandonar animais é muito utilizada, principalmente diante das férias de final de ano, com um crescimento de até 1.000% de casosxvii. Além das férias de final de ano, no carnaval também ocorre o abandono de animais, como comenta Maria E. H. Montagutixviii:

A maioria simplesmente joga os animais na rua, como se fossem objetos indesejados. Esta época (final de ano) e o Carnaval são as que as pessoas mais abandonam animais. Muita gente ganha cachorro e gato de presente no fim do ano e depois não conseguem cuidar.

Mesma visão é compartilhada por Marcelo Misga, presidente da Associação Amigo Animal:

Quem abandona é quem tem condições de viajar e que adquiriu o cachorro. Aí não querem pagar hotel para o animal e não se importam com ele como deveriam. Quando voltarem de férias, se quiserem ou as crianças reclamarem, compram outro e fica por isso.

O abandono de animais, além de trazer prejuízo psicológico para o animal, como saudade e depressãoxix, põem em risco os animais domesticados, pois eles tem poucas chances de sobreviver sem a ajuda humana, ao contrário dos “vira-latas” ou Sem Raça Definida (SRD):

O SRD tolera e resiste a doenças e enfrenta sozinho condições ambientais adversas nas quais outros cães não teriam nenhuma chance de sobrevivência, seja no meio do mato, seja na área rural ou mesmo nos grandes centros urbanos. Oposto aos cachorros de raça, especialistas por natureza, o vira-lata é antes de tudo um generalista. Seu talento, seu conhecimento e seu interesse se estendem a vários “campos”, não se confinando em nenhum setor, como seus parentes de pedigree. Ele está geneticamente equipado para lidar com diversas situações, impostas pela natureza ou pelos seres humanosxx.

Todos os animais abandonados, além das situações psíquicas a que estão sujeitos, também podem ser vítimas de maus-tratos por parte de pessoas que não gostam de animais, ou que se divertem com a agressãoxxi, como crianças e adolescentes, e estão sujeitos a sofrerem acidentes de trânsito (atropelamentos)xxii ou contraírem alguma doença, como a raivaxxiii. Segundo informe da OPAS, são vítimas de morte por raiva cerca de 55 mil pessoas em todo o mundoxxiv, sendo que no Brasil os casos são baixos, com Estados da região sul e alguns da região sudeste não apresentando casos de raiva humanaxxv. A OPAS sugere a imunização de animais selvagens e domésticos contra a raivaxxvi, permitindo assim que se reduza o número de acidentes que possam resultam em transmissão de raiva para humanos, além de evitar o sacrifício de animais.

Para Conselho Regional de Medicina Veterinária de Curitibaxxvii a melhor solução para o manejo de animais abandonados é o envolvimento de toda a comunidade e a posse responsável dos animais:

Tendo em vista que os cães e gatos visualizados em vias públicas podem ser enquadrados como animais semidomiciliados (possuem um responsável que os deixa com livre acesso à rua), animais comunitários (possuem mantenedores com forte vínculo com animais) e animais em abandono, constata-se que as propostas para manejos e controle das populações de cães e gatos só será efetiva com o envolvimento de diversos atores sociais (responsáveis por cães e gatos, criadores de animais, médicos veterinários, zootecnistas e sociedade em geral), e que este envolvimento gere um movimento constante de amadurecimento e incorporação de atitudes de guarda responsável a todas as pessoas envolvidas com a manutenção de animais de companhia.

Mesmo a prática de sacrificar animais deve ser observada com certo cuidado, sendo que é vedada a morte desses animais de forma cruel, como já se manifestou o Superior Tribunal de Justiça:

ADMINISTRATIVO E AMBIENTAL -CENTRO DE CONTROLE DE ZOONOSE -SACRIFÍCIO DE CÃES E GATOS VADIOS APREENDIDOS PELOS AGENTES DE ADMINISTRAÇÃO -POSSIBILIDADE QUANDO INDISPENSÁVEL À PROTEÇÃO DA SAÚDE HUMANA -VEDADA A UTILIZAÇÃO DE MEIOS CRUÉIS.

1. O pedido deve ser interpretado em consonância com a pretensão deduzida na exordial como um todo, sendo certo que o acolhimento do pedido extraído da interpretação lógico-sistemática da peça inicial não implica em julgamento extra petita.

2. A decisão nos embargos infringentes não impôs um gravame maior ao recorrente, mas apenas esclareceu e exemplificou métodos pelos quais a obrigação poderia ser cumprida, motivo pelo qual, não houve violação do princípio da vedação da reformatio in pejus.

3. A meta principal e prioritária dos centros de controles de zoonose é erradicar as doenças que podem ser transmitidas de animais a seres humanos, tais quais a raiva e a leishmaniose. Por esse motivo, medidas de controle da reprodução dos animais, seja por meio da injeção de hormônios ou de esterilização, devem ser prioritárias, até porque, nos termos do 8º Informe Técnico da Organização Mundial de Saúde, são mais eficazes no domínio de zoonoses.

4. Em situações extremas, nas quais a medida se torne imprescindível para o resguardo da saúde humana, o extermínio dos animais deve ser permitido. No entanto, nesses casos, é defeso a utilização de métodos cruéis, sob pena de violação do art. 225 da CF, do art. 3º da Declaração Universal dos Direitos dos Animais, dos arts. 1º e 3º, I e VI do Decreto Federal n. 24.645 e do art. 32 da Lei n. 9.605/1998. 5. Não se pode aceitar que com base na discricionariedade o administrador realize práticas ilícitas. É possível até haver liberdade na escolha dos métodos a serem utilizados, caso existam meios que se equivalham dentre os menos cruéis, o que não há é a possibilidade do exercício do dever discricionário que implique em violação à finalidade legal. 6. In casu, a utilização de gás asfixiante no centro de controle de zoonose é medida de extrema crueldade, que implica em violação do sistema normativo de proteção dos animais, não podendo ser justificada como exercício do dever discricionário do administrador público. Recurso especial improvido. (STJ - REsp 1115916 MG 2009/0005385-2 - T2 - Segunda Turma - Rel. Ministro Humberto Martins - d.j.: 01/02/2009).

O caminho que se espera seguir, e com base em dados científicos, é o da posse responsável dos animais, evitando-se o abandono, seja através da conscientização pela educação, seja através de punição pelo crime de maus-tratos.

iPosse Responsável de Cães e Gatos. Disponível em: <http://www.arcabrasil.org.br/acoes/posse/index.htm>. Acesso em: 17 set. 2011.

iiDe acordo com os mais recentes estudos médico-veterinários, a companhia desses animais para o ser humano produz os seguintes efeitos benéficos: a) Efeitos psicológicos: diminui depressão, estresse e ansiedade; melhora o humor; b) Efeitos fisiológicos: menor pressão arterial e freqüência cardíaca, maior expectativa de vida, estímulo a atividades saudáveis; c) Efeitos sociais: socialização de criminosos, idosos, deficientes físicos e mentais; melhora no aprendizado e socialização de crianças. Disponível em: <http://www.egov.ufsc.br/portal/sites/default/files/anexos/26684-26686-1-PB.pdf>. Acesso em: 17 set. 2011.

iiiPosse responsável de animais. Disponível em:

<http://www9.prefeitura.sp.gov.br/secretarias/sms/probem/posseResponsavel/index>. Acesso em: 17 set. 2011.

iv COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil, 3: contratos. 4ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 89-91.

v Art. 23. O locatário é obrigado a: [...]X - cumprir integralmente a convenção de condomínio e os regulamentos internos;[...]

vi BITTAR, Carlos Alberto. Direito dos contratos e dos atos unilaterais. 2ª Ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2004, p. 99-104.

vii Art. 1.335. São direitos do condômino: [...] I - usar, fruir e livremente dispor das suas unidades;

viii Art. 1.336. São deveres do condômino: [...] IV - dar às suas partes a mesma destinação que tem a edificação, e não as utilizar de maneira prejudicial ao sossego, salubridade e segurança dos possuidores, ou aos bons costumes.

ix Art. 10. É defeso a qualquer condômino: [...] III - destinar a unidade a utilização diversa de finalidade do prédio, ou usá-la de forma nociva ou perigosa ao sossego, à salubridade e à segurança dos demais condôminos;

x DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, volume 3: teoria das obrigações contratuais e extracontratuais. 20ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 802.

xi Código Civil: Art. 936. O dono, ou detentor, do animal ressarcirá o dano por este causado, se não provar culpa da vítima ou força maior.

Lei das Contravenções Penais: Art. 31. Deixar em liberdade, confiar à guarda de pessoa inexperiente, ou não guardar com a devida cautela animal perigoso:

Pena – prisão simples, de dez dias a dois meses, ou multa, de cem mil réis a um conto de réis.

Parágrafo único. Incorre na mesma pena quem:

a) na via pública, abandona animal de tiro, carga ou corrida, ou o confia à pessoa inexperiente;

b) excita ou irrita animal, expondo a perigo a segurança alheia;

c) conduz animal, na via pública, pondo em perigo a segurança alheia.

xii Criadouros de Animais Silvestres. Disponível em:

<http://www.ibama.gov.br/fauna/criadores.php>. Acesso em 17 set. 2011.

xiii Revista de Direito Ambiental. Ano 15 - nº 60 - out-dez/2010. Ed. Revista dos Tribunais - São Paulo, p. 308-310.

xiv Art. 164 - Introduzir ou deixar animais em propriedade alheia, sem consentimento de quem de direito, desde que o fato resulte prejuízo:

Pena - detenção, de quinze dias a seis meses, ou multa.

xv Curso de formação de oficiais de controle animal: nova perspectiva nos serviços de controle de zoonoses do Estado de São Paulo. Disponível em:

<http://www.scielosp.org/scielo.php?pid=S0034-89102009000300022&script=sci_arttext>. Acesso em: 23 ago. 2011.

xvi Dinâmica populacional canina: potenciais efeitos de campanhas de esterilização. Disponível em: <http://www.scielosp.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1020-49892009000400003>. Acesso em: 23 ago. 2011.

xvii Abandono de animais cresce até 1.000% nas férias. Disponível em: <http://noticias.terra.com.br/brasil/noticias/0,,OI2214446-EI306,00-Abandono+de+animais+cresce+ate+nas+ferias.html>. Acesso em: 30 set. 2011.

xviii Abandono de animais domésticos cresce nas férias. Disponível em: http://www.parana-<online.com.br/editoria/cidades/news/502966/?noticia=ABANDONO+DE+ANIMAIS+DOMESTICOS+CRESCE+NAS+FERIAS>. Acesso em: 30 set. 2011.

xix Animais têm sentimentos? Disponível em:

<http://www2.uol.com.br/vivermente/reportagens/animais_tem_sentimentos__imprimir.html>. Acesso em: 17 set. 2011.

xx Um velho companheiro. Disponível em: <http://viajeaqui.abril.com.br/national-geographic/edicao-120/cao-vira-lata-brasileiro-534874.shtml?page=1>. Acesso em: 30 set. 2011.

xxi Cavalo queimado por jovens recebe tratamento especial em batalhão policial do Rio. Disponível em: <http://noticias.r7.com/videos/cavalo-queimado-por-jovens-recebe-tratamento-especial-em-batalhao-policial-do-rio/idmedia/c0fd80d0cd57de200331c4684b535b5f.html>. Acesso em: 30 set. 2011.

xxii Atropelamento de animais. Disponível em:

<http://www.zoonoses.piracicaba.sp.gov.br/site/comapalavra/218-atropelamento-de-animais.html>. Acesso em: 30 set. 2011.

xxiii A raiva é uma encefalite viral grave transmitida por mamíferos, únicos animais susceptíveis ao vírus. Não existe tratamento específico para a doença. Após a instalação do quadro clínico, as únicas condutas possíveis se limitam a diminuir o sofrimento do paciente. São raros os casos de pacientes com quadro confirmado de raiva que não evoluíram para óbito, mesmo com o auxílio de todo arsenal terapêutico moderno. Disponível em: <http://www.pasteur.saude.sp.gov.br/informacoes/manuais/manual_4/norma_01.htm>. Acesso em: 30 set. 2011.

xxiv Dia Mundial da Raiva. Disponível em:

<http://www.opas.org.br/mostrant.cfm?codigodest=343>. Acesso em: 23 ago. 2011.

xxv Avaliação do programa nacional de controle de raiva no Brasil. <http://www.paho.org/cdmedia/hdmvp01/docs.rabia/paises/EVAL.RABIA.BRASIL.pdf>. Acesso em: 23 ago. 2011.

xxvi Organização Pan-Americana da Saúde. Módulos de Princípios de Epidemiologia para o Controle de Enfermidades. Módulo 6: controle de enfermidades na população. Brasília: Organização Pan-Americana da Saúde; Ministério da Saúde, 2010, p. 23-24.

xxvii Comissão de Zoonoses e Bem-estar Animal (CZBEA/CRMV-PR). Recomendações para o planejamento de ações de manejo das populações de cães e gatos de áreas urbanas.Conselho Regional de Medicina Veterinária, Curitiba, nº 34, ano IX, p. 16-18, jan/fev/mar, 2011.

 

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