O polêmico Novo Código Florestal

12/12/2011. Enviado por

O Senado aprovou em 30/11 por 58 votos favoráveis e seis contrários, o requerimento para votação em regime de urgência do Projeto de Lei da Câmara 30/2011, que atualiza o Código Florestal.

Aprovado nesta terça-feira, o texto-base do polêmico novo Código Florestal, coloca na reta final um processo que se arrasta há meses e vem causando discórdia entre políticos, ambientalistas, ruralistas e acadêmicos.

Para mostrar o lado jurídico do novo código, conversamos com Dr. Cássio Peixoto, advogado do escritório Advocacias & Tribunais

MeuAdvogado: Qual o motivo da votação ser em caráter de urgência e quais as mudanças mais relevantes?

Dr. Cássio Peixoto: A urgência sempre está relacionada aos interesses e a pressão exercida pelos setores envolvidos. De um lado ruralistas e a indústria agrícola e do outro lado ambientalistas e grande parte da sociedade. O desgaste político é enorme e as discussões vêm se arrastando. Além de ser muito comum nesta época de festas de fim de ano, apressar os projetos polêmicos, face à desatenção da sociedade.

Existem muitas mudanças, principalmente em relação ao código florestal atual. Entretanto alguns pontos têm sido alvo de duras críticas, como: a redução das APP’s (Áreas de Preservação Permanente) – com o gravame das matas ciliares e o perdão das multas para quem desmatou até julho de 2008.

M.A: A presidente da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), senadora Kátia Abreu, defendeu a modernização da legislação ambiental e destacou que a aprovação do novo código será uma decisão “a favor do Brasil.” O senhor (a) concorda com a afirmação da senadora?

Dr. Cássio: Qualquer legislação sempre precisa ser revista de tempos em tempos. O mundo muda e a legislação deve se adaptar e acompanhar os avanços. Contudo, as alterações não devem beneficiar aqueles que descumpriram a lei. Premiar os descumpridores da lei e penalizar aqueles que a cumprem.

Não entendo como beneficiar o Brasil estimulando o enfraquecimento das regras ambientais, num momento de preocupação mundial com o aquecimento global, escassez de água e etc. Atualmente a tecnologia permite produzir mais e melhor no mesmo espaço cultivável, me parece que “afrouxar” as regras não pode ser considerado algo a favor do Brasil.

  • Que o Brasil tem a missão de produzir alimentos para o mundo é a maior falácia veiculadas ao som da irresponsabilidade legislativa.

Concordaria com a Senadora se ela propusesse medida de desoneração fiscal para fabricação de equipamentos e desenvolvimento de tecnologias que aumentam a produção sem alargamento das áreas. 

M.A: A senadora também afirma que a medida entrará como proteção à vegetação nacional. No entanto, muitos ainda discutem um possível aumento no desmatamento de áreas preservadas. Como o novo código atuará? Haverá alterações na fiscalização?

Dr. Cássio: Não acredito em proteção à vegetação com flexibilização da lei e perdão aos descumpridores. Se a lei mais restrita não foi obedecida, flexibilizada será mais ignorada. O infrator aguardará um futuro perdão. O que se pretende é legalizar a impunidade nas infrações ambientais em detrimento de florestas e áreas de preservação.

Um perdão dessas proporções retira o incentivo da fiscalização. O corpo de fiscalização deixa de acreditar na sua própria função fiscalizadora. O poder de polícia do estado ficará fragilizado.

M.A: O presidente do Instituto CNA, Moisés Gomes, enfatizou o compromisso do setor agropecuário com o meio ambiente. Segundo ele os produtores rurais brasileiros querem apenas manter a atual área agrícola. Para assegurar a produção, quais medidas o agricultor terá que realizar?

Dr. Cássio: Quem garantirá que as áreas se manterão nas bases atuais? Que bases seriam estas? Onde estariam registradas e monitoradas? Qual foi o tamanho do dano?

Serão estas perguntas que teremos que fazer. O Estado precisará conhecer a situação atual, até porque nem todas serão iguais. Aprovado em definitivo a produção continuará a mesma em relação às áreas já desmatadas. 

M.A: Sobre a polêmica gerada no início da apresentação deste projeto, o senhor acredita que os interesses deste código estão voltados mais aos setores ruralistas do que para o de preservação, por quê?

Dr. Cássio: Quando há uma legislação mais restritiva e se busca “relaxá-la”, os interesses se voltarão para os que poderão se beneficiar deste relaxamento. Não tenho dúvidas que o setor ruralista será o maior beneficiado. Os preservacionistas trabalham na defensiva. Nas negociações os ruralistas pediram muito para avançar e os preservacionistas perderam significativamente.

M.A: Nos últimos anos, o Brasil foi considerado uma das principais lideranças nas discussões internacionais sobre mudanças climáticas. No entanto, na Conferência de Durban, após o anúncio de que o país ganhou o primeiro lugar no Fóssil do Dia – prêmio concedido pela Climate Action Network (CAN) aos países que ameaçam o combate às mudanças climáticas no planeta, a posição do país como líder de discussão ficou comprometida. O senhor (a) acredita que este “prêmio” possa realmente interferir na imagem do Brasil para o exterior e na elaboração do novo código? De que forma?

Dr. Cássio: No contexto internacional existem inúmeras frentes que precisaremos analisar com cuidado. O Brasil vinha bem no seu papel frente à comunidade internacional. A Europa, também, possuía um papel importante nas reduções dos gases de efeito estufa e na aquisição CRE’s.

Com a crise financeira mundial, afetando fortemente a Europa, a tendência será ceder menos ou pouco quanto às restrições das emissões. Não acredito que a imagem será tão afetada internacionalmente face ao momento de fragilidade econômica, onde todos não irão se comprometer tanto.

  • A meu ver, a imagem será pior para a sociedade brasileira, pois, estamos vivenciando um retrocesso legislativo, jogando por terra todas as evoluções restritivas/protetoras do passado. Isto é real!

Estamos absolvendo quem agiu em desconformidade com a Lei. Essa mensagem pode ficar por muito tempo no inconsciente da sociedade. A lei do “levar vantagem em tudo”.

A redução das matas ciliares vai contra estudos sérios desenvolvidos por universidades e experientes técnicos. A lição que ficará incutida é que pode-se descumprir a lei. Que um dia tudo será perdoado em nome do “bem do Brasil”.

M.A: De que forma o governo pretende agir mediante aos protestos de ONGs e outras organizações ambientais?

Após a aprovação o governo terá o veto como ferramenta. Pode ser usado como forma de atendimento a estas organizações ou clamor popular. Entretanto, este veto estará refém de acordos políticos que estão sendo feitos neste momento. 

M.A: De acordo com o Jornal do Brasil, o líder do PSDB, senador Alvaro Dias (PSDB-PR), afirmou que, antes de votar o projeto do novo Código Florestal, é preciso um acerto entre governo e oposição sobre a votação da regulamentação da Emenda 29, que estabelece gastos mínimos para a saúde nos três níveis de governo (PLS 121/2007). Qual a relação da comparação feita pelo Senador?

Dr. Cássio: Lamentavelmente é uma prática absurda utilizada pela maioria dos políticos. Usar o Código Florestal, sua discussão e aprovação como moeda de troca para aprovação de outros projetos de interesse é uma total falta de responsabilidade e descumprimento do princípio da intergeracionalidade (compromisso com as futuras gerações).

Objetivamente, não existe vinculação entre os temas. Aliás, todos merecem destaque, contudo esta “barganha” é no mínimo vergonhosa. 

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