Usucapião familiar

13/02/2013. Enviado por

Quando um dos cônjuges ou companheiro abandona o lar comum, deixando o outro sozinho no imóvel, este poderá usucapi-lo, desde que cumpra os requisitos legais.

Fato comum é o abandono do lar por um dos companheiros ou cônjuges.

Por o ex-cônjuge/companheiro ser possuidor de fração ideal, era impossível o usucapião pelo “ex” que ficava no imóvel, além disso gerava um direito perpétuo para quem abandonava o lar, que a qualquer momento poderia voltar e pleitear seus direitos sobre o imóvel, o que gerava uma situação de incerteza e instabilidade social.

Também provocava um desconforto constitucional, pois a família é “base da sociedade, tem especial proteção do Estado” (art. 226 da Constituição Federal), não obstante ficavam desamparados, pois enquanto um abandonava o lar em busca de felicidade ou de uma aventura amorosa, o outro ficava só, tendo seus rendimentos tolhidos, muitas das vezes com a responsabilidade pela criação dos filhos só para si, e com a espada de Damócles perpetuamente sobre a cabeça, pois a qualquer momento o “ex” poderia ingressar judicialmente para vender compulsoriamente o imóvel, deixando a anterior família irresponsavelmente desamparada.

Visando trazer estabilidade social, e uma especial proteção a família, bem como antecipar os problemas que virão com o desenvolvimento do mercado imobiliário, a Lei nº 12.424/2011 (que tutelou questões relativas ao plano “Minha Casa, Minha Vida”), introduziu o artigo 1.240-A do Código Civil que expressamente prevê:

“Art. 1.240-A. Aquele que exercer, por 2 (dois) anos ininterruptamente e sem oposição, posse direta, com exclusividade, sobre imóvel urbano de até 250m² (duzentos e cinquenta metros quadrados) cuja propriedade divida com ex-cônjuge ou ex-companheiro que abandonou o lar, utilizando-o para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio integral, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.

§ 1o O direito previsto no caput não será reconhecido ao mesmo possuidor mais de uma vez.

§ 2o (VETADO)”

Assim os requisitos para o atualmente denominado “Usucapião Familiar” são:

1)  Registro do imóvel em nome dos cônjuges, tal usucapião é somente para imóvel registrado em nome dos cônjuges ou companheiros, uma vez que a lei visa integrar os direito de propriedade em um único ex-cônjuge/ companheiro, assim se o registro estiver em nome de terceiro, o usucapião será o comum ou especial.

2)  Imóvel de até 250 m², uma vez que a lei veio proteger as famílias de classe moderada, e não as de classe abastadas e seus imóveis monumentais;

3)  uma divisão dos direitos de propriedade com ex-cônjuge ou companheiro, assim o imóvel tem que ser adquirido durante o relacionamento, ou em caso de comunhão universal de bens.

Nos casos de separação total de bens ou de imóvel adquirido antes da união em regime de comunhão parcial de bens, não se aplica este artigo, um vez que sendo os direitos de propriedade integralmente pertencentes ao que abandonou o imóvel, o outro poderá facilmente ingressar com um usucapião comum ou especial.

4)  posse ininterrupta (não pode ter perdido e retomado a posse do imóvel), exclusiva (sem voltar a viver com o “ex” durante o lapso de tempo de 2 anos), posse direta (não serve a exercida através e por intermédio de terceiro, ou seja, o próprio cônjuge ou companheiro tem que possuir estando presente pessoalmente no imóvel pelo tempo de 2 anos), sem oposição (o “ex” não deve de ter tentado retomar o imóvel, impondo obstáculos a posse);

Discussão interessante que começou na doutrina e jurisprudência, seria se o prazo de dois anos reconheceu situações pretéritas, tendo portanto efeitos retroativos, ou somente começa a contagem após o início da vigência da lei.

Parte da doutrina defende que a lei tem eficácia retroativa, uma vez que o usucapião tem efeito meramente declaratório, ou seja, ele não dá o direito de propriedade, ele meramente declara a existência de uma situação de fato já consumada pelo tempo para recebimento dos efeitos jurídicos.

Todavia grande parte da doutrina e jurisprudência tem se manifestado em sentido contrário.

Especialmente em nome da segurança jurídica que deve existir em todas as relações jurídicas, pois o ex-cônjuge/companheiro não pode ser surpreendido do dia para noite com uma perda bruta do seu direito de propriedade.

Assim o prazo de 2 anos iniciaria somente após a vigência da lei.

O Supremo Tribunal Federal já se manifestou de maneira parecida, quando a Constituição de 88 reduziu o prazo para o usucapião especial urbano:

“Criou o legislador uma nova e controversa modalidade de usucapião, denominada familiar, entre ex-cônjuges e ex-companheiros, com o reduzidíssimo prazo de dois anos.

Cuida-se de instituto novo. O prazo aquisitivo bienal somente pode ser contado a partir da vigência da lei (16.06.2011), sob pena de incidir em caráter retroativo e colher de surpresa o ex-cônjuge ou ex-companheiro que irá perder a sua parte ideal sobre o imóvel comum. Aplica-se o entendimento pacificado do  STF, ao examinar situação jurídica semelhante (novo usucapião especial urbano, com redução de prazo, na

CF de 1988), no sentido de que, por se tratar de instituto novo, não se computa o prazo anterior à lei (RTJ 165/348, 165/371, 166/237 e 175/352, entre outros.” (Código Civil Comentado, Coordenador Ministro Cezar Peluso, 6ª edição, Barueri, SP: Manole, 2012, p. 1.234)

Se passar dois anos o fato estará consumado, assim, se por ventura o “ex” dissidente retornar e buscar no judiciário sua parte do imóvel, o outro, ainda que não tenha movido o processo de usucapião, poderá alegar em matéria de defesa o cumprimento dos requisitos através da exceção de usucapião, que uma vez comprovado processualmente, levará no inevitável afastamento da pretensão do “ex”, mas não gerará os mesmos efeitos do usucapião, devendo a parte buscar futuramente entrar com o devido processo de usucapião para sedimentar definitivamente seu direito.

A fim de evitar futuros transtornos, o ex-cônjuge que completar os requisitos previstos em lei, deverá procurar um advogado, a fim de entrar no judiciário com o usucapião para regularizar seu direito.

 

Assuntos: Abandono de Lar, Bem de família, Direito Civil, Direito de Família, Direito processual civil, Família, Usucapião

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