Justiça: princípio ou postulado?

11/06/2014. Enviado por

Qual o significado do termo justiça para o direito? Trata-se de um princípio ou de um postulado? Breve escorço sobre a matéria.

Muito se fala em justiça! Quando diante de um crime bárbaro, o termo justiça é citado com frequência. Ou no caso de um contrato não cumprido dá-se o mesmo. Não se está perante o termo utilizando-se do seu significado no sentido jurídico, contudo.Mas de seu sentido alcandorado.

No entanto, o termo justiça tem conteúdo tautológico. Não é unívoco também. Senão, vejamos! Naqueles exemplos acima mencionados o sentido do termo justiça é ver o delinquente “pagar” com a pena pelo delito praticado ou cumprir a obrigação avençada. Ocorre que na acepção jurídica o termo justiça pode ser aplicado como dizer o direito (jurisdictio ), daí o termo jurisdição para a nobre missão do judiciário.

O juiz, porém, não somente diz o direito aplicável, mas também mantém a integridade do ordenamento jurídico, na opinião abalizada de José Roberto dos Santos Bedaque-, seja através da sentença tem força de lei nos limites da lide e das questões decididas(art. 468, da Lei nº 5.869/73) - eis que a violação de uma norma transgride, com efeito, a metanorma, ou seja, a norma em sentido lato, que é um conceito metafísico. Todavia, nos conduz à verdade de que infringida a norma em sentido estrito, aquela, realmente, não surtiu o efeito desejado; isto é, a sua coercibilidade, que é virtual, a par da sua coercitividade, não foi coativamente observada. Daí a afetação da lisura do ordenamento jurídico.

Podemos dizer que nem sempre o termo justiça é aplicável ao direito, haja vista que as instâncias revisoras dos julgamentos nem sempre estão reapreciando os fatos, mas, no caso da apelação é devolvido o conhecimento da matéria impugnada (art. 515, do CPC), isto é aplicado as instâncias superiores tais como o Supremo Tribunal Federal e ao Superior Tribunal de Justiça, que, respectivamente, julgam os chamados recurso extraordinário e o recurso especial. Para os retrorreferidos recursos não cabe o reexame de prova, o que, inclusive, é vedado pelos verbetes nº 7 e nº 279, das Súmulas da jurisprudência das respectivas instâncias. Inclusive em sede de apelação não há que se falar em reapreciação dos fatos, mas da matéria impugnada, o que nos leva a crer que na fase da apelação há uma espécie de impugnação para a justiça da decisão, ainda que protelatório o recurso.

Logo, segundo Rodolfo de Camargo Mancuso, nestas colendas cortes não têm aqueles recursos o condão de, não comportando verificação de provas, apurar a justiça da decisão, isto é, a revisão da instância superior não é dikelógica, mas nomofilácica, ou seja, manter a integridade do ordenamento e obrigar os juízes de 1ª instância a aplicar o direito à espécie.

Sendo assim, fica fácil distinguir que justiça não é um princípio a ser perseguido. Não é também um postulado, na diferenciação consignada por Humberto Ávila. Pois este implica no sentido jurídico em não estar abarcado no ordenamento. Mas não é só um princípio por isto. Conquanto, não é princípio pois os conceitos indeterminados, nas palavras de Humberto Ávila, não podem ser supridos pelo termo justiça, em havendo lacunas no ordenamento(art. 4º, da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro); em não sendo, portanto, um princípio, ou um postulado como o são a razoabilidade e a proporcionalidade. Eis que nas palavras daquele doutrinador: “os princípios são normas imediatamente finalísticas, primariamente prospectivas e com pretensão de complementaridade e de parcialidade, para cuja aplicação se demanda uma avaliação da correlação entre o estado de coisas a ser promovido e os efeitos decorrentes da conduta havida como necessária à sua promoção”.(pág. 85)

Mas o ideal de justiça perseguido pelos autores da demanda se confunde com a mantença da integridade do ordenamento. Ocorre que nem sempre o ideal de justiça está tão-só com o lado que a persegue justamente. Ideal este que perdura até a sentença após o conhecimento dos fatos. Quando o réu não tem razão resta-lhe tão somente fazer com que a lei seja cumprida, na percuciente opinião de Ruy Barbosa.

Se o juiz se atém tão-só ao ideal de justiça estará suspeito de parcialidade, ao que toca todo juiz deve ser imparcial(princípio da imparcialidade do juiz).

Naquelas espécies de recursos nas instâncias superiores não se persegue o ideal de justiça, mas a intangibilidade do ordenamento jurídico. Daí que podemos concluir que o termo justiça, tanto pode ser o ideal como também ver a lei ser cumprida, ou seja, manter a integridade do ordenamento para cada jurisdicionado que toma a posição de autor ou de réu. O ideal sempre estará presente. Mas a função judicial está acima do ideal, pois a parte detém o ideal, mas não detém esta preocupação de manter a integridade do ordenamento. O que para muitos soa como justiça -manter a integridade do ordenamento- na acepção pós liberal que concerne ao princípio da dignidade da pessoa humana (art. 1º , inciso III, da Constituição da República) está açambarcado pela função nomofilácica, acima de qualquer ideal. Entretanto, o nomos (palavra grega que significa lei escrita) não afasta este. Que poderia muito bem ser interpretado como uma nova acepção de justiça no sentido de manter a integridade do ordenamento. A dike (palavra grega que denomina a deusa grega da justiça) estaria sendo empregada em seu sentido alcandorado. Não é um princípio nem postulado, pois.

 

BIBLIOGRAFIA

Poderes Instrutórios do Juiz- 6ª edição - BEDAQUE, José Roberto dos Santos

Teoria dos Princípios – da definição à aplicação dos princípios jurídicos – 14ª edição - ÁVILA, Humberto

Recurso Extraordinário e Recurso Especial – 11ª edição - MANCUSO, Rodolfo de Camargo

Oração aos moços – Ruy Barbosa

Assuntos: Criminal, Direito Constitucional, Direito Penal, Direito processual civil, Direito processual penal

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