Da aplicação do IPCA-E como índice de atualização monetária das contas vinculadas de FGTS

22/01/2014. Enviado por

O presente artigo versa sobre a possibilidade da alteração da Taxa Referencial (TR), como forma de correção do saldo das contas vinculadas do FGTS.

O presente artigo versa sobre a possibilidade de alteração da Taxa Referencial – TR, como forma de correção do saldo das contas vinculadas ao FGTS, visto que o índice não reflete a real correção monetária do período, ocasionando perda no valor que se encontra depositado em favor do trabalhador.

O Fundo de Garantia por Tempo de Serviço – FGTS, criado pela Lei n° 5.107/1966, regido atualmente pela Lei n° 8.036/1990, constitui-se de depósitos mensais realizados pelo empregador em conta vinculada ao trabalhador, com objetivo de garantir ao empregado estabilidade no emprego, além de auxílio monetário em caso de despedida sem justa causa.

Segundo a Lei n° 8.036/1990, no início de cada mês, o empregador deve depositar, em conta aberta na Caixa Econômica Federal, em nome do empregado, valor correspondente a 8% (oito por cento) da remuneração deste, que pode movimentá-la sempre que verificada uma das hipóteses estabelecidas no art. 20 da citada Lei Federal.

O FGTS é gerido e administrado a partir das normas e diretrizes do Conselho Curador e os recursos fundiários, por expressa previsão legal, são utilizados para financiar investimentos sociais nas áreas de habitação, saneamento e infraestrutura urbana (art. 9°, §§2° e 3° da Lei n° 8.036/1990).

A remuneração do FGTS, na forma do art. 13 da Lei n° 8.036/1990, será realizado nos depósitos efetuados nas contas vinculadas, com correção monetária baseada nos parâmetros fixados para atualização dos saldos dos depósitos de poupança e capitalização de juros de 3 (três) por cento ao ano.

Atualmente, os parâmetros de atualização monetária dos saldos de poupança, por sua vez, encontram-se previstos no art. 12 da Lei n° 8.177/1991, assim disposto, verbis:

“Art. 12. Em cada período de rendimento, os depósitos de poupança serão remunerados: I – como remuneração básica, por taxa correspondente à acumulação das TRD, no período transcorrido entre o dia do último crédito de rendimento, inclusive, e o dia do crédito do rendimento, exclusive;”.

Assim, além de dispor que a TR seria o índice utilizado para correção da poupança, a Lei n° 8.177/1991, por meio do art. 17, também determinou que tal taxa seria aplicada para fins de correção dos depósitos do FGTS.

Dessa forma, ficou determinado que aos saldos das contas do FGTS será utilizado a taxa aplicável aos depósitos de poupança, ou seja, a TR, mantidas as taxas de juros previstas na legislação própria do FGTS, de 3% (três por cento) de juros anuais.

Por tal razão, não se discute que a aplicação da TR como índice de correção dos saldos do FGTS é legal. No entanto, há que se considerar se a legalidade é capaz de afastar o fato de que o índice previsto na norma não é capaz de corrigir monetariamente, de fato, o saldo dos depósitos do FGTS, como expressamente encontra-se previsto na Lei n° 8.036/1991, precisamente nos artigos 2° e 13, que assim dispõem:

“Art. 2°. O FGTS é constituído pelos saldos das contas vinculadas a que se refere essa lei e outros recursos a ele incorporados, devendo ser aplicados com atualização monetária e juros, de modo a assegurar a cobertura de suas obrigações” (grifamos).

“Art. 13. Os depósitos efetuados nas contas vinculadas serão corrigidos monetariamente com base nos parâmetros fixados para atualização dos saldos dos depósitos de poupança e capitalização de juros de (três) por cento ao ano” (grifamos).

A Lei, portanto, é clara no sentido de exigir que o fundo seja corrigido monetariamente e a correção monetária, por óbvio, não representa qualquer acréscimo, mas simples recomposição do valor da moeda corroído pelo processo inflacionário, conforme entendimento do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp n° 1.191.868, da lavra da Ministra Eliana Calmon.

A TR foi índice capaz de refletir a inflação ocorrida na economia brasileira por significativo período de tempo, mas, não é a realidade desde janeiro de 1999, quando o índice deixou de espelhar a desvalorização da moeda.

Diante da notória desigualdade/desproporção entre a TR e o IPCA-E, analisa-se a real função da correção monetária em cotejo com o princípio constitucional do direito à propriedade (art. 5° XXII, da CRFB/1988).

No julgamento da ADI n° 493-0, o Supremo Tribunal Federal, no voto do relator Moreira Alves, determinou que haveria impossibilidade de aplicação da TR aos contratos do Sistema Financeiro de Habitação somente para o período anterior à vigência da Lei n° 8.177/1991. Embora nesse julgado o STF não ter declarado a impossibilidade de utilização de tal índice aos contratos firmados após esta data, nele ficou reconhecido, de forma cristalina e inconteste, que o Supremo Tribunal não reconhecia a TR como índice hábil a promover a atualização monetária, verbis:

“(...) A taxa referencial (TR) não é índice de correção monetária, pois, refletindo as variações do custo primário da captação dos depósitos a prazo fixo, não constitui índice que reflita a variação do poder aquisitivo da moeda(...). (ADI 493, Relator Min. Moreira Alves, Tribunal Pleno, julgado em 25/06/1992, DJ 04-09-1992 PP-14089) (grifamos).

No entanto, foi através do julgamento das ADI 4425 e 4357, que o Supremo Tribunal Federal analisou a inconstitucionalidade da Emenda Constitucional n° 62/2009, pacificando o entendimento no sentido de que a TR não pode ser utilizada como índice de atualização monetária, eis que não é capaz de espelhar o processo inflacionário brasileiro.

Dessa forma, tem-se, em resumo, que a Lei n° 8.036/1990, lei específica do FGTS, determina que ao saldo de suas contas deve ser obrigatoriamente aplicado índice de correção monetária, não sendo a TR índice hábil a atualizar monetariamente tais saldos, e estando tal índice em lei não específica do FGTS, entende-se que como inconstitucional a utilização da TR para tal fim, subsistindo a necessidade de aplicar-se índice de correção monetária que reflita a inflação do período, como prevê a Lei n° 8.036/1990.

Assim sendo, tem-se que o índice aplicável à atualização monetária em substituição à TR deve ser o IPCA-E, por alcançar o patamar familiar de 1 a 40 salários-mínimos, sendo calculado pelo IBGE de forma direta, abrangendo os setores de alimentação, bebidas, habitação, artigos de residência, vestuário, transportes, saúde, cuidados pessoais, despesas pessoais, educação e comunicação, sendo mais abrangente e refletindo a real inflação nos principais setores econômicos que influenciam os gastos familiares de forma real.

Não bastasse a eleição de tal índice pelos Tribunais Pátrios, a Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2014 (Lei n° 12.919/2013), dispôs no seu artigo 27 que os precatórios do ano de 2014 serão corrigidos pelo IPCA-E do IBGE, senão vejamos:

“Art. 27. A atualização monetária dos precatórios, determinada no §12 do art. 100 da Constituição Federal, inclusive em relação às causas trabalhistas, previdenciárias e de acidente de trabalho, observará, no exercício de 2014, a variação do Índice Nacional de Preços do Consumidor Amplo – Especial – IPCA-E do IBGE” (grifamos).

Corroborando ainda com esse entendimento, vale destacar que em sessão ordinária do Conselho da Justiça Federal – CNJ, ocorrida em 25/11/2011, foi aprovado o novo “manual de cálculos da Justiça Federal” onde passa a incidir o IPCA-E como indexador de correção monetária para as sentenças condenatórias em geral, como pode ser comprovado no site do CJF (www.cjf.jus.br).

Por tais razões, deve ser aplicado, para fins de cumprimento à atualização monetária dos saldos das contas do FGTS, prevista no art. 2° da Lei n° 8.036/1990, o IPCA-E do IBGE, em substituição à TR, desde janeiro de 1999, quando tal índice deixou de refletir a variação inflacionária da moeda.

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