O controle jurisdicional em concursos públicos

12/08/2014. Enviado por

A Justiça brasileira tende a decidir atualmente em favor da não intervenção no mérito das questões objetivas e dissertativas dos concursos públicos. O posicionamento atual está sofrendo mudanças, visando controlar atos errôneos da Administração.

O Estado Democrático de Direito experimentou até sua consolidação uma infinidade de avanços e retrocessos, porém indicando sempre sua tendência contínua ao aperfeiçoamento. Uma progressão lenta se deu em parte por entraves oriundos de fatores sócio-culturais, em que a manifestação subjetiva e individual confunde-se com os propósitos comuns, no desempenho de atribuições conferidas pelo organismo estatal. É inegável que reiterados desvios de finalidade tornaram-se a mácula peculiar da Administração Pública brasileira, perpetuada por uma fiscalização ineficaz e pela impunidade.

Nesse ponto, há inúmeros debates sobre a análise da discricionariedade administrativa como instrumento garantidor dessa manifestação deturpada dos gestores públicos, sobretudo, quando efetivada sob o manto do mérito administrativo e da engessada tripartição funcional do Estado.

Sendo assim, o conceito adotado atualmente de poder discricionário infere em discussões acaloradas, principalmente sobre a intervenção do poder público no mérito dos concursos públicos. A saber, o poder discricionário confere uma determinada liberdade que o agente do Estado pode usar visando agir em determinado procedimento, sempre respeitando os limites impostos em lei. Critérios de conveniência e oportunidade dão esse poder ao agente público que, no caso concreto, o usará da forma mais adequada para satisfazer o interesse público.

Nota-se, que diversas são as ponderações acerca da atuação da Administração, no que refere à realização de concursos públicos. Entretanto, ponto incontroverso é a insatisfação generalizada de suas medidas comumente adotadas neste contexto, rompendo a relação de confiança entre ela e seus administrados.

É perceptível que a realização de concursos públicos encerra uma infinidade de atribuições às autoridades administrativas, ensejando, em muitos aspectos, maior liberdade em suas deliberações.

Destarte, já se constatou que a interpretação extensiva da legalidade restringe a liberdade do agente, legitimando o controle judicial. É na contramão desta inclinação doutrinária, que se verifica nos concursos públicos o fato de não haver uma lei geral que os discipline, resultando em maior discricionariedade dos gestores responsáveis pela realização do certame e, por derradeiro, mais incidência de abusos e desvios de finalidade.

Há, entretanto, limites para esse poder. A brilhante Ex-Ministra do STJ, Eliana Calmon, em um voto proferido no ano de 2009 aduz que “é possível a anulação judicial de questão objetiva em concurso público, em caráter excepcional, quando o vício que a macula se manifesta de forma evidente e insofismável, ou seja, quando se apresenta primo octuoculi.” Isso quer dizer que o Judiciário pode apreciar os feitios da legalidade e verificar se a Administração não excedeu os limites da discricionariedade; neste caso, pode o Judiciário infirmar o ato, porque a autoridade ultrapassou o espaço livre deixado pela lei e submergiu o campo da legitimidade.

O princípio da Legalidade no âmbito da Administração Pública, largamente antevisto no artigo 37 da Constituição da República do Brasil, deve ser observado no sentido de moderar a discricionariedade administrativa, legitimando o Judiciário a revisar o ato administrativo discricionário sem que haja intervenção na vontade do administrador, mas, apenas, corrigindo estas arbitrariedades, evidenciadas quando a Administração Pública extrapola seus limites.

Conclui-se assim que a discricionariedade administrativa não pode ser utilizada como empecilho a devida análise judicial de atos administrativos viciados, eis que representaria indevida ratificação de atos arbitrários, prejudiciais aos cidadãos. Desta forma, forçoso reconhecer a legitimidade do Poder Judiciário para revisar tais atos que, apesar da conveniência e oportunidade que o revestem, mostram-se notadamente ilegais.

Assuntos: Concurso Público, Direito Administrativo, Direito processual civil, Direitos trabalhistas, Funcionário público

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