Aspectos da incidência de ISSQN nos atos das cooperativas de trabalho

22/09/2014. Enviado por

O presente estudo tem como objetivo demonstrar os aspectos da incidência tributária nos atos das cooperativas de trabalho do imposto sobre serviços de qualquer natureza, a tentativa do legislador constituinte em trazer um incentivo às sociedades coop

Para alcançar os objetivos propostos no presente artigo, abordarei de forma sucinta questões relativas à hipótese de incidência do Imposto sobre Serviço de Qualquer Natureza - ISSQN, nas sociedades cooperativas de trabalho e sobre a necessidade premente de ser promulgada uma lei específica para dar o real tratamento adequado às sociedades cooperativas.
A lei 5.764/71 define a política nacional do cooperativismo e institui o regime jurídico das sociedades cooperativas.
O art. 146, da CF/88, em seu inciso III, na alínea “c”, dispõe que: cabe a lei complementar dar o adequado tratamento tributário ao ato cooperativo praticado pelas sociedades cooperativas. Por sua vez o legislador complementa no § 2º, do seu art. 174 na Constituição Federal de 1988, que a lei apoiará e estimulará o cooperativismo.
Da mesma forma, o § 1º do art. 145, define que, sempre que possível os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte.
Neste sentido, a sociedade cooperativa recebe um tratamento tributário diferenciado em comparação a uma sociedade empresarial.

Os Atos Cooperativos e Sua Tributação, Incidências e Isenções

A teor do disposto no art. 79 da Lei n.º 5.764/71, atos cooperativos são aqueles praticados entre as cooperativas e seus associados, e entre as próprias cooperativas, quando associadas.

Portanto, todos os atos praticados pela cooperativa buscando negócios para os produtos ou serviços dos associados são atos cooperativos.Os atos cooperativos não geram faturamento ou receita para a cooperativa, de modo que o resultado financeiro deles não se sujeita à incidência tributária. Tais resultados não são classificados como lucros e sim, como sobras, devendo retornar aos associados proporcionalmente ao trabalho realizado por cada um.

Desta sistemática se extrai o fundamento de que as sobras não sejam objeto de tributação na sociedade cooperativa, pois não pertencem à sociedade e sim aos cooperados.
Alguns doutrinadores, a exemplo de Walmor Franke[1] defendem uma classificação para os atos cooperativos, a fim de constituir etapas de concretização das operações realizadas por uma sociedade cooperativa; os atos acessórios, os atos auxiliares e as operações de contrapartida.

Porém, vou abordar no presente artigo apenas os atos auxiliares, que são aqueles praticados visando o andamento de suas atividades econômicas, sendo indispensáveis aos atos cooperativos principais.
Atos cooperativos auxiliares, são aqueles que importam em operação com terceiros não associados, ou seja, atos-não cooperativos. A ex: nas cooperativas de saúde, a locação e o fornecimento de serviços de hospitais e laboratórios.

Denota-se que, tanto a doutrina quanto os tribunais apresentam grande dificuldade em definir sua classificação como ato cooperativo ou não-cooperativo.

Ainda que se possam classificar os atos auxiliares como uma espécie de ato cooperativo, não há indício legislativo que autorize permiti-los dentro do regime jurídico-tributário como sendo atos cooperativos principais.

 

Os Atos Não Cooperativos e a Incidência Tributária 

O legislador, prevendo a hipótese de necessidade de utilização de negócios internos serem realizados por terceiros estranhos a cooperativa, editou os artigos 85 e 86 da Lei 5764/71[2], permitindo que os negócios internos possam ser realizados por terceiros, estranhos a cooperativa visto que, se não pudesse ser admitido tais operações, cem por cento dos negócios seriam com associados[3].

Na pratica, vários atos não cooperativos são essenciais à existência da sociedade cooperativa, sem os quais seus objetivos não seriam atingidos.

Quando um serviço passa a ser prestado por não associado, foge do objeto social da cooperativa, assumindo o papel de intermediária, agregando valor à operação remunerando-a por tal. O resultado desta operação resultará em aspecto lucrativo.

Tanto a doutrina quanto os Tribunais apresentam dificuldade em definir uma correta distinção entre o ato cooperativo ou não cooperativo.

Com isso, o poder judiciário passou a aplicar uma interpretação restritiva à legislação vigente, concluindo que, toda operação realizada por sociedades cooperativas e que não se encaixa expressamente as diretrizes do artigo 79 da Lei será considerada como ato não-cooperativo, e, por consequência, sofrerão incidência de tributos sob o fato gerador, não importando se o ato é essencial ou não a pratica do trabalho do cooperado.

Dispõe o art.111 da Lei que os resultados positivos obtidos pelas cooperativas, nos atos não-cooperativos terão incidência de tributos.

 

As Cooperativas de Trabalho e sua Tributação

As sociedades cooperativas de trabalho são constituídas por pessoas ligadas a uma determinada ocupação profissional com o objetivo de melhorar a remuneração e as condições de trabalho dos seus associados[4]. A cooperativa de trabalho poderá adotar como objeto social qualquer gênero de serviço[5].

Os trabalhadores de uma sociedade cooperativa de trabalho são, ao mesmo tempo, usuários e donos do próprio negócio, no primeiro, utilizam-se da cooperativa para buscar postos de trabalho e no segundo porque ingressam com capital para constituir a sociedade. Esta espécie de sociedade cooperativa de trabalho age em nome do sócio cooperado, eliminando o intermediário do serviço ou, como chamado: “explorador de mão-de-obra”, agenciando serviços para o cooperado. EX: as cooperativas constituídas por trabalhadores da construção civil, garçons, carregadores, vigilantes, médicos, dentistas.

Nas sociedades cooperativas de trabalho, as operações que incidem tributos ocorrem quando os serviços são prestados através de terceiros não sócios, trabalhadores autônomos ou empregados.

No entanto, há diversas discussões e posicionamentos doutrinários contrários, no sentido de que, quando o cooperado presta serviços aos terceiros não associados, a operação transforma-se em ato não-cooperativo, ocorre o fato gerador, sendo aplicável pelo fisco a incidência de impostos.

 

A incidência do ISSQN nas Cooperativa de Trabalho 

A CF, em seu inciso III do art. 156, atribuiu a competência aos municípios instituir e cobrar o imposto sob serviços de qualquer natureza.

A matéria prevista nestes artigos passou a ser tratada pela Lei Complementar 116/2003, esta lei não traz a definição do que são “Serviços De Qualquer Natureza”, trazendo como complemento uma lista de serviços em anexo.

Estando definido no art. 5º da Lei Complementar 116/2003, que todos os prestadores de serviços são contribuintes do referido imposto.

Em uma sociedade cooperativa de trabalho, se o cooperado presta serviços diretamente ao associado, trata-se de ato cooperativo puro, o que, de acordo com o artigo 79 da Lei não se submete a incidência do ISSQN.

No entanto, se os associados das cooperativas de trabalho prestar serviços na qualidade de trabalhadores autônomos, enquadram-se como contribuintes individuais, devendo inscrever-se nos órgãos municipais para o recolhimento do referido imposto.

Se a sociedade cooperativa, presta serviços aos terceiros não associados, a operação transforma-se em ato não-cooperativo e a receita passa a ser tributável.

A exemplo das sociedades cooperativas de trabalho médico, existem duas operações jurídicas distintas, uma é o agenciamento de clientes a fim de favorecer o associado, atendendo o seu objetivo social, sendo esta considerado o autêntico ato cooperativo e outra é a prestação de serviços médicos por não cooperados.

Contudo, o Poder judiciário tem se posicionado contrário ao que se aplica na teoria, entendendo pela incidência do ISS sobre os valores recebidos pelas cooperativas médicas de terceiros.

Grande parte dos municípios brasileiros preceitua que a incidência do ISSQN é sobre o total do faturamento das sociedades cooperativas.

Entretanto, vários doutrinadores entendem que o fato gerador do tributo na sociedade cooperativa de trabalho é a Taxa de Administração, que se tornaria o fato gerador do ISSQN.

Alguns doutrinadores e a jurisprudência tem se posicionado pela incidência do imposto em questão sob o fornecimento de serviços a terceiros não cooperados e o fornecimento de serviços de terceiros não associados, considerando-os como atos não cooperativos.

Embora existam manifestações doutrinárias e algumas decisões judiciais favoráveis à não-incidência do ISSQN às sociedades cooperativas, vários municípios do país continuam tentando de forma administrativa e judicial cobrar o imposto.

 

Concluindo

A Constituição Federal, ao presentear as sociedades cooperativas com o adequado tratamento tributário ao ato cooperativo, deixou uma lacuna para os operadores do direito, quando ao que poderia se interpretar como “adequado tratamento” às sociedades cooperativas.

De um lado, tem-se os defensores do contribuinte reforçam a tese de que os atos auxiliares ou não-cooperativos devem ser conferidos o mesmo tratamento dado aos atos cooperativos.

De outro, o Poder Judiciário posiciona-se mais restritivo, afirmando que todos os atos que não se enquadram aos expressos no artigo 79 da Lei das Cooperativas, são considerados atos não-cooperativos e passíveis de incidência tributária.

Diante de diversos questionamentos suscitados no que pertine à tributação das atividades desenvolvidas pelas Cooperativas de Trabalho, sabe-se que se trata de matéria de relevada importância no cenário jurídico-científico.

Resta evidente a premente necessidade da legislação tributária adequar-se às peculiaridades das cooperativas, uma vez que estas, distinguem-se das sociedades com fins comerciais e lucrativos.

É necessário que a doutrina insurja-se para este tipo societário, que muito têm contribuído para economia do nosso país, propiciando ao legislador editar e promulgar a lei complementar que tentará trazer o adequado tratamento tributário às sociedades cooperativas.

 


[1] FRANKE, Walmor. Doutrina e Aplicação do Direito Cooperativo, edição do autor, p.23, Porto Alegre, 1983.

[2] BRASIL. Lei nº 5764 de 16 DE Dezembro de 1971. Define a Política Nacional de Cooperativismo, institui o regime jurídico das sociedades cooperativas, e dá outras providências. De 16 de Dezembro de 1971, Brasília. DF, Disponível em:> http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l5764.htm, acesso em 21 de Junho de 2013.

[3] MACEI, Demetrius Nichle, Tributação & Ato Cooperativo, Curitiba, Juruá Editora, 2011, pg.66/67

[4] Disponível em:> http://www.ocergs.coop.br/cooperativismo/conceitos-principios, acesso em 21 de Junho de 2013.

[5] BRASIL. Lei 12690 de 19 de Julho de 2012. Dispõe sobre a organização e o funcionamento das Cooperativas de Trabalho; institui o Programa Nacional de Fomento às Cooperativas de Trabalho - PRONACOOP; e revoga o parágrafo único do art. 442 da Consolidação das Leis do Trabalho - CLT, aprovada pelo Decreto-Lei no 5.452, de 1o de maio de 1943. Art.10 Disponível em:> http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2012/Lei/L12690.htm, acesso em 05 de Setembro de 2013.

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