A relevância das prerrogativas para o efetivo exercício da advocacia

30/01/2015. Enviado por

O artigo ora em tela pretende analisar as prerrogativas inerentes ao livre exercício da advocacia no Brasil. Em verdade, o que se almeja é apontar que a função social do advogado, profissional indispensável à realização da justiça.

1. INTRODUÇÃO

 

As prerrogativas profissionais do advogado são regramentos embasados pelo texto constitucional brasileiro e sua finalidade maior é garantir o direito do cidadão de fazer cessar eventuais arbitrariedades ou excessos existentes nas relações entre particulares ou entre estes e o Estado. Na realidade, é preciso prevalecer o pensamento de que o livre exercício da advocacia se configura como uma via de afirmação da justiça e da democracia brasileira.

De tal modo, escolhendo como ponto de partida a apreciação constitucional da matéria como fundamento maior de validade (legalidade), faz-se imperioso o estudo das prerrogativas advocatícias dentro de uma abordagem conjunta das normas imperativas da Carta Magna e do Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil.

Lamentavelmente, muitos são os problemas que em conjunto abalam a credibilidade social do trabalho desenvolvido pelos advogados e pelo Poder Judiciário. Nesse passo, não se pode olvidar que o representante jurídico que permanece na linha de frente entre o povo e o Judiciário é o advogado. E, por figurar nessa condição e não ter nenhum tipo de ingerência em relação à dinamização do trabalho pelos servidores do Judiciário, constantemente essa classe de profissionais sofre grande pressão social, além da injusta e malfadada disseminação da cultura de que grande parte dos advogados não tem ética, sentimentos e/ou probidade.

O advogado é uma figura pública que dedica a vida a solucionar conflitos de interesses e auxiliar a manutenção da harmonia e da paz social por meio do uso de mecanismos legais. Desta feita, o exercício da advocacia merece uma posição de destaque social, respeito e reconhecimento. Mas, o que se tem na realidade fática é um processo contínuo de desvalorização da classe tanto pela sociedade quanto por muitos integrantes do Poder Judiciário.

Aos advogados deve ser direcionado o tratamento nobre obtido outrora, mais precisamente no momento em que a classe passou a gozar do direito de ostentar o título de doutor. A incapacidade intelectual e o preconceito não permitem a compreensão popular sobre a razão do uso de um título tão importante por todos os patronos jurídicos que compõem os quadros da OAB, independente de sua qualificação técnica.

Na realidade, o título de doutor destinado aos advogados se perfaz como um título honroso de nobreza concedido à classe, no ano de 1827, pelo monarca Dom Pedro I. Portanto, este título real não se confunde com o nível de graduação estabelecido pela Lei n° 9.394/96, a qual regulamenta as diretrizes e bases da educação brasileira.

Além da injusta fama e da constante cobrança social pela conclusão dos processos judiciais, os doutores advogados são rigidamente fiscalizados pela legislação que regulamenta a carreira. E, tendo que laborar sob tanta pressão, as prerrogativas se impõem como ferramentas indispensáveis a fomentar a coragem e determinação que devem nortear a atividade da advocacia.

O advogado, além de ser um estudioso das ciências jurídicas, deve ser sensível aos problemas que lhe são apresentados, refletir sobre a melhor solução para cada caso concreto, concatenar ideias, defender bem a tese adotada, verbalizar perante autoridades do Poder Judiciário e obter, sempre que possível, o provimento judicial esperado por seu representado.

Demais disso, a conduta deste profissional deve ser pautada pela ética, credibilidade e extrema responsabilidade, principalmente no tocante ao cumprimento de prazos processuais, obtenção de liminares no intuito de salvar vidas, devolução da liberdade aos que estão presos de forma imotivada, entre outros. Não há como negar a importância da advocacia para a boa convivência em sociedade. Portanto, não podem ser aceitos, de forma passiva, qualquer tipo de desrespeito às prerrogativas destinadas a esses profissionais.

A ausência de celeridade do Poder Judiciário concorre para efetivar a ameaça e/ou lesão irreversível aos direitos dos cidadãos. É muito comum a conclusão de processos dando ganho de causa a pessoas falecidas. Esse é o maior desrespeito que pode ser identificado em relação ao descaso do Poder Judiciário com o cidadão, é frustrar a expectativa de justiça aguardada durante toda uma experiência de vida.

Diante desse quadro, somente o advogado é capaz de expor as razões pelas quais um determinado feito judicial deve ser processado com maior rapidez, pois, como é de domínio público, a maioria dos magistrados se nega a qualquer tipo de contato com as partes em momentos diversos de efetuação de atos processuais obrigatórios.

Nesse diapasão, as prerrogativas inerentes ao exercício da advocacia são benefícios e garantias dos direitos dos cidadãos frente ao poder do Estado, que exerce com exclusividade a jurisdição, ou seja, a capacidade de dizer o direito em última instância.

Todos os cidadãos devem ser tratados de forma isonômica, porque a administração da justiça é triangular e composta pela Magistratura, Ministério Público e, em especial, a Advocacia. Nesse passo, a advocacia configura-se como uma função essencial na formação do Poder Judiciário, que, inerte, deve ser provocado, e uma vez provocado deve pautar sua marcha processual no princípio do impulso oficial, o qual garante a efetiva prestação jurisdicional.

Cotidianamente assistimos à ausência de celeridade e desprezo aos princípios norteadores do Poder Judiciário. O resultado dessa situação é o descrédito das prerrogativas dos advogados, pois muitas vezes não há a efetiva prestação jurisdicional, uma vez que o juiz não acompanha a efetividade de suas decisões. 

A justificativa para a elaboração deste artigo é demonstrar os gravosos prejuízos sociais advindos das constantes tentativas de violação às prerrogativas dos advogados, bem como do enfraquecimento da classe.

O estudo ora em tela se propõe a responder as seguintes indagações: 1. Quem são os prejudicados em função do desrespeito às prerrogativas profissionais do advogado?; 2. Impedir o advogado de exercer plenamente a defesa de seu constituinte ofende a algum direito fundamental?; 3. A desmoralização dos profissionais da advocacia contribui para o enfraquecimento da democracia pátria?.

O problema se define em debater os posicionamentos doutrinários e jurisprudenciais acerca da seguinte questão: ‘as prerrogativas são necessárias ou tratam-se de privilégios?’. Os objetivos principais do presente trabalho são avaliar em que condições a advocacia é exercida atualmente e no que este fator influencia a realização da justiça; pontuar a inconstitucionalidade decorrente do desrespeito às prerrogativas do advogado; identificar os ocasionados pela morosidade na prestação judicial e apontar possíveis soluções para a problemática debatida.

Com o fito de facilitar a compreensão deste artigo, foram abordados os seguintes temas: a regulamentação da advocacia, a origem da OAB, as prerrogativas do profissional da advocacia no Brasil e suas garantias funcionais, a relevância do exercício da advocacia, a indispensabilidade do advogado à administração da justiça e um debate sobre o papel da advocacia sob a ótica do Conselho Nacional de Justiça – CNJ.

A metodologia adotada é a bibliográfica e documental, envolve pesquisas sobre a literatura jurídica já publicada sobre a matéria em forma de livros, jornais, artigos, documentos históricos e outros insumos que se fizeram necessários ao enriquecimento jurídico deste artigo.

Por fim, cabe ressaltar que o pleno exercício da advocacia por meio do fortalecimento das prerrogativas inerentes à carreira proporciona o acesso do cidadão ao Poder Judiciário e auxilia a materialização da justiça tão necessária à paz que deve prevalecer nas relações em sociedade.

 

2. HISTÓRICO SOBRE A REGULAMENTAÇÃO DA ADVOCACIA E CRIAÇÃO DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL – OAB

 

O surgimento da advocacia no Brasil data do período colonial. Nas lições de Machado (2004, p. 12), em sua publicação intitulada “História da Ordem dos Advogados do Brasil”, pode ser observada a origem do exercício da advocacia pátria. Note-se:

O exercício da advocacia no Brasil, durante o período colonial, como não poderia deixar de ser, foi absolutamente determinado pelos regulamentos metropolitanos. Estes se encontram concentrados e consolidados nas Ordenações Filipinas de 1603, cuja influência estendeu-se até a independência e, em muitas circunstâncias, no que se refere às normas civis gerais e processuais, até a república.

Desta feita, é notório que, nesse período, o Brasil era regido apenas por normas lusitanas e permaneceu assim até a proclamação da independência. Bem após o marco histórico da independência do Brasil, foram criados vários regramentos com o fito de regulamentar o exercício da advocacia nacional.

Os ideais iluministas de liberdade, igualdade e fraternidade, devidamente expressos na Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1789, incentivaram povos de inúmeras nações a desenvolver um sentimento de justiça. Assim, no ano de 1824, a primeira constituição pátria previu normativos que viabilizaram o fortalecimento da atividade advocatícia, mormente nas áreas política e judicial.

A Constituição do Império outorgada em 1924 garantiu aos bacharéis em direito a possibilidade de votar nas eleições primárias, bem como a faculdade de concorrer a cargos públicos eletivos. No ano de 1828, o Aviso nº 151, de 7 de outubro, determinou que a advocacia no Brasil era uma prática de exercício restrita a brasileiros, proibindo a atuação jurídica de estrangeiros. Em sequência, no ano de 1830, foi inserida no ordenamento jurídico daquela época a responsabilidade do advogado, no intuito de prevenir e reprimir eventuais abusos de artifícios ardilosos, a saber, calúnia e injúria na prática de quaisquer atos processuais.

A Ordem dos Advogados do Brasil foi idealizada no ano de 1843. Em momento anterior à criação da OAB, a classe era representada sem grande expressividade pelo Instituto dos Advogados Brasileiros – IAB.

A Ordem dos Advogados do Brasil – OAB foi criada em meio a Revolução de 30, em 18 de novembro daquele ano, em função de um decreto assinado pelo Chefe do Governo Provisório, sendo o referido diploma legal posteriormente assinado e validado pelo então Presidente da República Getúlio Vargas. Naquele momento histórico, a criação de entidades de classes representava uma forma de organizar a administração caótica do País. O artigo 17 do Decreto n° 19.408/30 determinou a criação da Ordem dos Advogados Brasileiros. Observe-se:

 

Art. 17 Fica criado a Ordem dos Advogados Brasileiros, órgão de disciplina e seleção da classe dos advogados que se regerá pelos estatutos que forem notados pelo instituto da Ordem dos Advogados Brasileiros, com a colaboração dos Institutos dos Estados, e aprovados pelo Governo.

  

Ao longo do tempo, a OAB foi firmando sua boa atuação social e, por isso, permaneceu respeitada por todas as Constituições que sucederam a de 1824. Hodiernamente, a Constituição Federal de 1988, popularmente chamada de ‘Carta Cidadã’, concedeu aos profissionais da advocacia o status constitucional de função indispensável à administração da justiça. Reza o artigo 133 do texto constitucional vigente: “O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei”.

No ano de 1994, passou a vigir a Lei nº 8.906, com a finalidade de regulamentar a atividade da advocacia no Brasil. O referido diploma legal estabeleceu diversas prerrogativas aos advogados, porém, tais regramentos não se configuram como privilégios, mas como instrumentos de defesa da cidadania e promoção efetiva da justiça.

O trabalho do advogado se difere das demais profissões em função de sua atuação interferir diretamente nos sentimentos mais íntimos das pessoas (direito de família), com a preservação da vida (medidas liminares para garantir tratamentos de saúde em geral), o bem mais importante do ser humano, que é a liberdade (esfera criminal), entre muitas outras áreas.

O Poder Judiciário é caracterizado pela inércia em função do dever de imparcialidade do magistrado no momento da prestação jurisdicional. Nesse contexto, o advogado é o elo entre o cidadão e a justiça, salvo exceções previstas em leis ordinárias, como juizados especiais e justiça do trabalho, searas em que o jus postulandi resta mitigado.

As previsões de ordem infraconstitucional que concedem aos cidadãos o direito de estarem em Juízo sem a presença de advogado são consideradas formas de facilitação do acesso do cidadão à justiça, porém, na verdade, põem em risco a essência de seus direitos, porque a complexidade da marcha processual deixa desguarnecidos os direitos postulados em Juízo sem uma assistência jurídica adequada/ especializada.

A contratação de advogado configura uma relação de interesse privado, todavia busca a realização da atividade fim do Poder Judiciário, que é a realização da justiça social. Dessa forma, ao exercer o seu ofício, ou seja, o múnus público, o causídico estará servindo aos interesses da coletividade.

As prerrogativas profissionais inerentes ao exercício da advocacia são traduzidas como meios essenciais destinados a ensejar a proteção e o amparo dos direitos e garantias que o sistema de direito constitucional reconhece às pessoas e à coletividade em geral.

 

2.1 DAS PRERROGATIVAS DO PROFISSIONAL DA ADVOCACIA NO BRASIL

 

No decorrer dos anos, a OAB se firmou como uma instituição de atuação eficiente no tocante à defesa das prerrogativas dos profissionais que compõem seus quadros. Muitas foram as conquistas direcionadas à classe. Atualmente, o advogado é visto pela sociedade como um profissional que auxilia o cumprimento das leis na delicada tarefa de apaziguar os ânimos e interesses antagônicos do corpo social.

Nesse contexto, é possível esclarecer que o livre exercício da advocacia serve aos interesses dos cidadãos e violar as prerrogativas reservadas a esta classe constitui uma afronta ao respeito devido à sociedade.

Sobrevém lembrar que, mesmo diante do conteúdo anteriormente exposto, existe quem defenda a malfadada ideia de que as prerrogativas equivalem a privilégios. Os autores que vinculam seu pensamento a esse tipo de ideia demonstram um profundo desconhecimento da importância da advocacia para a promoção e manutenção do equilíbrio e da paz social.

Violar as prerrogativas dos advogados, isto é, ofender os regramentos do Estatuto dos Advogados do Brasil, significa uma lesão irreparável ao preceito constitucional da legalidade. Não obstante o enfrentamento de discursos inflamados contra a liberdade de expressão de que gozam os advogados, a OAB continua a escrever uma história de lutas em defesa da cidadania e dos segmentos democráticos brasileiros. Na tessitura desse raciocínio também se adensa em nível propriamente doutrinário a seguinte passagem de Szafir (2010, p. 07):

Em todos esses casos, a inviolabilidade assegurada ao advogado ergue-se como uma poderosa garantia em prol do cidadão de modo a permitir que o profissional legalmente incumbido de falar por si não se acovarde e nem possa sofrer qualquer tipo de represália que lhe retire a liberdade profissional. É, pois, a cidadania que, em última análise, interessa a proteção que se confere ao advogado. A libertas conciciandi serve antes à causa defendida e, nessa medida, à justiça, do que propriamente ao advogado.

Cabe averiguar que as prerrogativas reservadas ao exercício da advocacia atingem toda a classe, isto é, são válidas tanto para advogados privados quanto para advogados públicos, a saber, representantes de defensorias, advogados da união e procuradorias em geral.

 

2.1.1 Conceito de prerrogativas

 

O termo prerrogativa deve ser compreendido como garantias destinadas ao livre exercício de uma determinada profissão. Na verdade, o vocábulo ‘prerrogativas’ equivale a ‘permissão especial’. Estas expressões revelam o conceito distinto do que pode ser entendido como ‘privilégio’, que denota a ideia de vantagem. Sobre a matéria, observe-se a opinião de Ramos (2003, p. 134):

Estes direitos não lhe são concebidos na condição de pessoas físicas, comuns, mas na especial condição de agente público, no exercício de seu mister, que já dissemos, é um múnus público, para que lhe sejam asseguradas perfeitas condições ao pleno exercício profissional, de modo a garantir seja atendido o interesse público na realização da justiça.

É importante atentar para o fato de que a vivência em um Estado Democrático de Direito exige que as prerrogativas inerentes ao desempenho eficaz de uma profissão, principalmente as que se destinam a servir à coletividade e à preservação da paz social, devem usufruir do manto da legalidade. Assim como a advocacia, existem outras profissões que impõem prerrogativas para que possam ser exercidas com independência e liberdade, a título ilustrativo afiguram-se a magistratura, os parlamentares e os representantes do Ministério Público.

Dessa forma, insta afirmar que as normas que regulamentam o exercício da advocacia estão expressas na Lei nº 8.906/1994 – Estatuto da Advocacia e no Código de Ética e Disciplina da OAB.

 

2.1.2 Natureza jurídica

 

A democracia é legitimada pelo arcabouço legislativo que forma o ordenamento jurídico pátrio e sua finalidade mais lídima é garantir a materialização dos direitos e garantias fundamentais. Dessa forma, o trabalho desenvolvido pelos patronos jurídicos, no intuito de prover a defesa dos interesses de seus constituintes, deve ser livre para dispor de todos os meios lícitos disponíveis.

Impedir o trabalho do advogado não fere somente às prerrogativas profissionais inerentes a esta classe, viola, principalmente, os direitos e garantias constitucionais destinadas a todo cidadão, independente de sua condição física, moral, psíquica e/ou financeira.

Para fins de tornar mais claro tal entendimento, é possível mencionar algumas hipóteses em que o tolhimento indevido das prerrogativas advocatícias prejudica os direitos dos cidadãos. Observe-se que cercear o direito à entrevista individual entre advogado e cliente fere o princípio constitucional da ampla defesa, notadamente, tal violação impede o estabelecimento do vínculo e confiança entre o profissional e o cliente. Nesse sentido, a natureza jurídica das prerrogativas profissionais é de garantia, pois assegura direitos decorrentes da própria natureza do exercício da advocacia.

As prerrogativas advocatícias integram a prática do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa. Inspirado nesses fundamentos, Szafir (2010, p. 20) ensina que:

Em linhas gerais, malgrado a relevância das prerrogativas conferidas aos advogados, junto com o incremento dos esforços repressivos em nome da luta contra o crime organizado, assistimos ao crescente desprezo aos direitos dos advogados que, de forma expressiva, traduzem uma garantia para o cidadão.

 

Acertado sob o fundamento de que a preservação das prerrogativas atende somente às funções legítimas da advocacia, Silva (2000, p. 525) explica que:

 

Aponta o equívoco daqueles que identificam na inviolabilidade insculpida no artigo 133 da Carta Magna um privilégio corporativo. De fato, o que temos, ainda que de forma mediata, é uma proteção ao cidadão que, na figura do advogado por ele escolhido para representá-lo perante os Tribunais, terá ampla proteção para agir em seu nome e sem medo de ser reprimido penalmente em decorrência de condenações por expressões ofensivas, mas necessárias à defesa da causa.

Não se pode olvidar que a atuação de magistrados e advogados tem por escopo ofertar aos cidadãos uma prestação jurisdicional eficaz e isenta. Por isso, para o exercício de suas atividades fins, o advogado é detentor de imunidade profissional, mormente em se tratando de crimes contra a honra, pois a natureza jurídica de seu trabalho infere que ele se posicione de forma independente e impositiva para realizar a melhor defesa dos interesses de seu constituinte.

 

2.1.3 Das garantias funcionais do advogado

 

O artigo 6° da Lei n° 8.906/94 determina a inexistência de hierarquia e subordinação entre advogados, magistrados e promotores de justiça. Observe-se:

Art. 6º Não há hierarquia nem subordinação entre advogados, magistrados e membros do Ministério Público, devendo todos tratar-se com consideração e respeito recíprocos.

Parágrafo único. As autoridades, os servidores públicos e os serventuários da justiça devem dispensar ao advogado, no exercício da profissão, tratamento compatível com a dignidade da advocacia e condições adequadas a seu desempenho.

Entretanto, apesar do que revela a norma, o cotidiano laboral enfrentado pelos profissionais da advocacia é bem distinto. Tudo que existe é uma notável discrepância no tocante ao tratamento destinado a cada classe profissional apontada.

Muitas vezes, o magistrado tende a não respeitar as prerrogativas da advocacia, pois quiçá nem conheça as normas constantes no Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil. Os serventuários da justiça, não raro, também desmerecem as garantias destinadas ao exercício da advocacia.

Tais fatores alinhados culminam em uma prestação jurisdicional lenta, ineficaz e, em casos extremos, completamente inservíveis. A guisa ilustração é possível mencionar óbitos em função da demora em expedir mandados de internação e tratamentos imediatos a pacientes com risco iminente de morte, pois, muitas vezes, tais ordem judiciais são expedidas somente após o óbito da parte requerente.

Entre os direitos do advogado, de plano, ganham maior relevância: o livre exercício da advocacia em todo o território nacional; a preservação de seu ambiente de trabalho (escritório ou residência) e seus instrumentos de trabalho, a saber, livros, agendas, computadores, celulares, correspondências escritas e eletrônicas relativos à prática da advocacia; a comunicação com o cliente de forma pessoal e reservada em qualquer estabelecimento onde esteja em face do tolhimento legal de sua liberdade; a presença de representante da OAB na hipótese de prisão em flagrante por motivo ligado ao exercício da advocacia, sob pena de anulação do procedimento na ausência do referido representante; somente ser recolhido preso antes de sentença transitada em julgado em sala de Estado-Maior, com instalações e comodidades condignas. Caso o Estado não disponha de tal alojamento, o advogado deverá ser recolhido à prisão domiciliar.

Ao advogado é garantido o direito de transitar livremente em ambientes, a saber: salas de sessões dos Tribunais, salas e dependências de audiências, secretarias, cartórios, ofícios de justiça, serviços notariais e de registro, delegacias e prisões.

O advogado poderá se recusar a figurar como testemunha no processo em que patrocinou, independente de autorização do constituinte. Essa garantia expressa o direito ao sigilo profissional da advocacia. Demais disso, o advogado é detentor de imunidade profissional, não podendo suas manifestações, em Juízo ou fora dele, que tiverem por objetivo a defesa dos interesses de seu cliente, ser passíveis de punição ou consideradas injúrias ou difamações.

Bom é lembrar que essa garantia não isenta o advogado de responder eventuais procedimentos administrativos perante a OAB. Cabe, ainda, ressaltar que a prisão de um advogado em exercício somente poderá ser realizada mediante situação de flagrância em crime inafiançável.

 

2.1.3.1 Inviolabilidade do local de trabalho do advogado

 

Não deve ser considerada lícita a prova penal obtida por meio ilícito, principalmente quando a sua aquisição transgrida a garantia constitucional de violação do ambiente laboral do advogado. Esse tipo de contexto probatório deve sofrer repúdio por parte do julgador em função da inobservância às prerrogativas inerentes à advocacia.

A legitimidade da atuação investigativa da polícia judiciária não autoriza a ocorrência de abusos e nem de violação às leis, especialmente no que se refere à inviolabilidade do local de trabalho dos advogados. A Lei n° 11.767/08 proveu nova redação ao inciso II, do artigo 7°, da Lei 8906/94, de tal sorte que a quebra da inviolabilidade do ambiente laboral do advogado somente será possível na hipótese colacionada no §6º do mesmo artigo abaixo delineado. Veja-se:

 

Art. 7° [...].

II - a inviolabilidade de seu escritório ou local de trabalho, bem como de seus instrumentos de trabalho, de sua correspondência escrita, eletrônica, telefônica e telemática, desde que relativas ao exercício da profissão.

[...]

§ 6º Presentes indícios de autoria e materialidade da prática de crime por parte de advogado, a autoridade judiciária competente poderá decretar a quebra da inviolabilidade de que trata o inciso II do caput deste artigo, em decisão motivada, expedindo mandado de busca e apreensão, específico e pormenorizado, a ser cumprido na presença de representante da OAB, sendo, em qualquer hipótese, vedada a utilização dos documentos, das mídias e dos objetos pertencentes a clientes do advogado averiguado, bem como dos demais instrumentos de trabalho que contenham informações sobre clientes.

§ 7º A ressalva constante do § 6º deste artigo não se estende a clientes do advogado averiguado que estejam sendo formalmente investigados como seus partícipes ou co-autores pela prática do mesmo crime que deu causa à quebra da inviolabilidade.

A relativização da garantia em comento deve ser realizada somente com a posse de ordem judicial fundamentada e na presença de representante da OAB. Na ausência do representante da OAB, tendo sido esta devidamente informada da busca e apreensão a ser feita no escritório, a diligência não será frustrada, ou seja, poderá ocorrer sem problemas. A ordem judicial somente acarreta autorização para o conhecimento de documentos restritos ao crime investigado; no entanto, caso o advogado e seu cliente estejam sendo investigados pelo crime ensejador da diligência policial, a documentação deste cliente também poderá ser apreendida.

A alteração legislativa conferiu maior clareza ao texto que veda a possibilidade genérica da expedição do mandado de busca e apreensão que permitia uma ampla devassa nos escritórios de advocacia, salvo o que determina a redação do § 6º. O artigo 5°, caput, inciso IX, da Constituição Federal vigente, garante a inviolabilidade domiciliar dos cidadãos. Note-se: “a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial”.

Promover invasão a escritórios de advocacia, bem como a residência de advogados, em busca de provas para configurar a incidência de crimes, importa em desrespeito à ordem constitucional supramencionada. A cláusula constitucional de inviolabilidade domiciliar é apta a alcançar qualquer compartimento não aberto ao público, estendendo-se também ao local onde são exercidas as atividades profissionais. A invasão domiciliar configura ilícito penal previsto no artigo 150, § 4º, inciso III, do Código Penal brasileiro, in verbis:

 

Art. 150 - Entrar ou permanecer, clandestina ou astuciosamente, ou contra a vontade expressa ou tácita de quem de direito, em casa alheia ou em suas dependências:

§ 4º - A expressão "casa" compreende:

III - compartimento não aberto ao público, onde alguém exerce profissão ou atividade.

A proteção constitucional dispensada à inviolabilidade do domicílio já figurou como tema de inúmeras decisões emanadas dos tribunais superiores. Nessa toada, o Supremo Tribunal Federal – STF, durante o julgamento do HC 82.788/RJ, decidiu pela limitação do acesso a locais de trabalho, entendendo ser esta uma determinação constitucional. Observe-se:

HC 82.788/RJ, Rel. Min. CELSO DE MELLO, Segunda Turma) – A GARANTIA DA INVIOLABILIDADE DOMICILIAR COMO LIMITAÇÃO CONSTITUCIONAL AO PODER DO ESTADO (...) – CONCEITO DE ‘CASA’ PARA EFEITO DE PROTEÇÃO CONSTITUCIONAL – AMPLITUDE DESSA NOÇÃO CONCEITUAL, QUE TAMBÉM COMPREENDE OS ESPAÇOS PRIVADOS NÃO ABERTOS AO PÚBLICO, ONDE ALGUÉM EXERCE ATIVIDADE PROFISSIONAL: NECESSIDADE, EM TAL HIPÓTESE, DE MANDADO JUDICIAL (CF, ART. 5º, XI). - Para os fins da proteção jurídica a que se refere o art. 5º, XI, da Constituição da República, o conceito normativo de ‘casa’ revela-se abrangente e, por estender-se a qualquer compartimento privado não aberto ao público, onde alguém exerce profissão ou atividade (CP, art. 150, § 4º, III), compreende, observada essa específica limitação espacial (área interna não acessível ao público), os escritórios profissionais, inclusive os de contabilidade, ‘embora sem conexão com a casa de moradia propriamente dita’ (NELSON HUNGRIA). Doutrina.

A garantia constitucional da inviolabilidade domiciliar deve ser vista na perspectiva de atuar como um fator de restrição às diligências empreendidas pelos órgãos do Estado, que não poderão desrespeitá-la, sob pena de cometer ato de transgressão capaz de negar a validade da ordem jurídica. Seguindo essa linha de raciocínio, Aieta (1999, p. 191) assevera que:

Atualmente, a teoria majoritariamente aceita é a da inadmissibilidade processual das provas ilícitas (colhidas com lesões a princípios constitucionais), sendo irrelevante a averiguação, se o ilícito foi cometido por agente público, ou por agente particular, porque, em ambos os casos, lesa princípios constitucionais.

Em função do sobredito, bom é destinar maior atenção à necessidade de repúdio às tentativas de flexibilização dos comandos constitucionais aplicáveis à matéria. A doutrina adverte que qualquer das provas oriundas de meios ilícitos devem ser desprezadas.

 

2.1.3.2 Quebra do sigilo das comunicações telefônicas

 

O STF trata da matéria relativa à quebra de sigilo telefônico na súmula vinculante de nº 14, leia-se: “É direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia judiciária, digam respeito ao exercício do direito de defesa”.

A súmula apontada garante o acesso ao material colhido em diligência realizada pela polícia judiciária. Caso seja negado ao advogado o livre acesso ao conhecimento aos autos, este poderá propor perante o Poder Judiciário um pedido de liminar fundamentado pela ocorrência de abuso de autoridade e transgressão à súmula vinculante retro mencionada.

O atual posicionamento do Pretório Excelso reafirma os ditames expressos no Estatuto da OAB e garante ao patrono jurídico da causa a liberdade de acesso à peça inquisitorial administrativa, ao processo judicial em trâmite, ao conteúdo resultante de laudos, perícias e tudo o mais que seja importante para subsidiar a defesa de seu constituinte.

O artigo 7° da Lei nº 8.906/94 dispõe sobre o acesso do advogado aos procedimentos estatais, inclusive os que tramitam sob sigilo (hipótese em que será exigida a exibição de instrumento procuratório). Desta feita, os advogados podem examinar os autos do processo, conhecer dos dados probatórios, tudo com o fito de prover a melhor defesa do réu em face da persecução criminal por este sofrida.

A Constituição garante ao réu todas as formas de defesa possíveis em função dos princípios do contraditório e da ampla defesa, por isso é inaceitável que o advogado seja destituído desses direitos e garantias. A Excelsa Corte expressou entendimento isonômico ao inferir que o sistema de liberdades públicas vincula-se, em sua vocação protetiva, a amparar o cidadão contra eventuais excessos, abusos ou arbitrariedades estatais. Observe-se:

 RTJ 168/896-897, Rel. Min. CELSO DE MELLO. […] Não custa advertir, como já tive o ensejo de acentuar em decisão proferida no âmbito desta Suprema Corte (MS 23.576/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO), que o respeito aos valores e princípios sobre os quais se estrutura, constitucionalmente, a organização do Estado Democrático de Direito, longe de comprometer a eficácia das investigações penais, configura fator de irrecusável legitimação de todas as ações lícitas desenvolvidas pela Polícia Judiciária, pelo Ministério Público ou pelo próprio Poder Judiciário. A pessoa contra quem se instaurou persecução penal – não importa se em juízo ou fora dele - não se despoja, mesmo que se cuide de simples indiciado, de sua condição de sujeito de determinados direitos e de senhor de garantias indisponíveis, cujo desrespeito só põe em evidência a censurável (e inaceitável) face arbitrária do Estado, a quem não se revela lícito desconhecer que os poderes de que dispõe devem conformar-se, necessariamente, ao que prescreve o ordenamento positivo da República. Cabe relembrar, no ponto, por necessário, a jurisprudência firmada pelo Supremo Tribunal Federal em torno da matéria pertinente à posição jurídica que o indiciado – e, com maior razão, o próprio réu - ostenta em nosso sistema normativo, e que lhe reconhece direitos e garantias inteiramente oponíveis ao poder do Estado, por parte daquele que sofre a persecução penal. [...] O indiciado é sujeito de direitos e dispõe de garantias, legais e constitucionais, cuja inobservância, pelos agentes do Estado, além de eventualmente induzir-lhes a responsabilidade penal por abuso de poder, pode gerar a absoluta desvalia das provas ilicitamente obtidas no curso da investigação policial.

O entendimento majoritário emanado da Suprema Corte reflete o imperioso respeito às garantias constitucionais, enfatizando a necessidade de respeito a todos os princípios jurídicos que dão suporte ao Estado Democrático de Direito. Bom é dizer que as interceptações telefônicas reduzidas a texto e constantes nos autos do inquérito podem ser lidas sem restrições pelos advogados.

 

2.1.3.3 Dos honorários

 

A doutrina e a jurisprudência pátrias consideram os honorários advocatícios como uma verba de caráter alimentar, isto é, se traduz como a remuneração dos advogados. A cobrança de honorários advocatícios encontra guarida no artigo 22 e seguintes da Lei nº 8.906/94, in verbis: “A prestação de serviço profissional assegura aos inscritos na OAB o direito aos honorários convencionados, aos fixados por arbitramento judicial e aos de sucumbência. [...]”. Sobre a temática abordada, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS), há tempos, manifesta-se pela condenação do pagamento de verbas honorárias. Veja-se:

Nº 70038972220 - Primeira Câmara Especial Cível. Comarca de Porto Alegre. AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO PRIVADO NÃO ESPECIFICADO. [...] Honorários advocatícios na fase de cumprimento de sentença. Os honorários advocatícios se prestam a remunerar o trabalho despendido pelo procurador da parte no curso do processo tendo o devedor resistido ao cumprimento da obrigação e, ainda, aforado impugnação ao cumprimento de sentença, correta a fixação de honorários advocatícios. (grifo nosso).

Por sua vez, o Código de Processo Civil também ressalvou disposições para tratar do pagamento de honorários. Observe-se:

Art. 20. A sentença condenará o vencido a pagar ao vencedor as despesas que antecipou e os honorários advocatícios. Esta verba honorária será devida, também, nos casos em que o advogado funcionar em causa própria.

[...]

§ 3º Os honorários serão fixados entre o mínimo de dez por cento (10%) e o máximo de vinte por cento (20%) sobre o valor da condenação, atendidos:

a) o grau de zelo do profissional;

b) o lugar de prestação do serviço;

c) a natureza e importância da causa, o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço.

§ 4º Nas causas de pequeno valor, nas de valor inestimável, naquelas em que não houver condenação ou for vencida a Fazenda Pública, e nas execuções, embargadas ou não, os honorários serão fixados consoante apreciação eqüitativa do juiz, atendidas as normas das alíneas a, b e c do parágrafo anterior. [...].

 

A quitação da verba honorária somente será dispensada da parte perdedora se esta tiver obtido previamente o deferimento da gratuidade judiciária. A condenação ao pagamento de honorários é devida mesmo quando o advogado atua em causa própria. Nos termos da lei, o valor dos honorários compreenderá entre 10% (dez) e 20% (vinte) sobre o valor da condenação. Sob este aspecto, além de caráter alimentar, a condenação em sucumbência reconhece o bom trabalho desenvolvido pelo advogado para o deslinde da causa de forma mais justa e proba.

 

2.1.3.4 Das guias de levantamento de valores em nome dos advogados

 

A impossibilidade de expedição de guias de levantamento de valores em nome dos advogados ocasiona uma sensação de insegurança e desconfiança entre o patrono jurídico e seu constituinte. Esse tipo de vedação, em função de ato administrativo infundado e abusivo emitido por alguns representantes do Poder Judiciário, reforça o desrespeito ao livre exercício da advocacia.

Tal ato administrativo enseja inúmeros transtornos, tendo em vista que muitas são as partes leigas que não compreendem o que deve ser feito com uma guia de levantamento de valores. A contratação de um advogado é fundada na confiança, daí o representante jurídico adentrar no processo por livre opção do constituinte, portanto, o Poder Judiciário não guarda competência para intervir nessa relação particular.

É de se reconhecer o trabalho da OAB no intuito de coibir decisões abusivas e prejudiciais à prática da advocacia. Nesse passo, sobre a questão apontada, a comissão de Direitos e Prerrogativas da Ordem dos Advogados do Brasil de São Paulo protocolou a consulta n.º 0001440-12.2010.2.00.0000 junto ao Conselho Nacional de Justiça para questionar a legalidade do ato administrativo que impediu os advogados de levantarem guias de depósitos perante a justiça do trabalho.  A consulta aventada tomou por base jurisprudências que reconhecem a prerrogativa do advogado em praticar tal ato. Leia-se:

 

RECURSO ESPECIAL Nº 874.462 - RS (2006/0172369-5). RELATORA: MINISTRA ELIANA CALMON. EMENTA: PROCESSUAL CIVIL – EXECUÇÃO DE TÍTULO JUDICIAL PROMOVIDA PELA PARTE – HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS: LEVANTAMENTO PELO ADVOGADO – ART. 23 DA LEI 8.906/94 – EXIGÊNCIA DE APRESENTAÇÃO DE PROCURAÇÃO COM PODERES ESPECIAIS PARA DAR E RECEBER QUITAÇÃO – DISSÍDIO NÃO CONFIGURADO. 1. Não se configura o dissídio jurisprudencial quando não demonstrada a similitude fática entre acórdãos confrontados. 2. Acórdão recorrido que indeferiu expedição de alvará em nome de advogado, em execução de título judicial promovida pela parte, porque não apresentada procuração com poderes especiais para dar e receber quitação. 3. A jurisprudência desta Corte é pacífica no sentido de que, a teor do art. 23 da Lei 8.906/94, os honorários sucumbenciais fixados na sentença transitada em julgado é direito autônomo do advogado, podendo a execução, nesse particular, ser promovida tanto pela parte quanto pelo próprio advogado. Assim, mesmo promovida pela parte, é possível o levantamento ou expedição de precatório dos honorários em nome do advogado, independentemente da apresentação de procuração com poderes especiais. 4. Recurso especial conhecido em parte e, nessa parte, provido.

 

O resultado da consulta determinou o restabelecimento da prerrogativa dos advogados para o levantamento de recursos vinculados a processos judiciais decorrentes de precatórios, remissão ou depósitos judiciais, desde que este disponha de instrumento procuratório concedendo poderes para tanto.

 

2.1.3.5 Do direito de vistas e exame processual

 

No que se refere ao livre acesso dos autos processuais pelo advogado, pode-se dizer que essa prerrogativa auxilia a materialização de diversos princípios constitucionais. A título ilustrativo é possível mencionar o contraditório, a ampla defesa e a publicidade dos atos processuais.

Diante da recorrência de consultas direcionadas ao CNJ sobre a possibilidade de consulta aos autos processuais por pessoas não habilitadas ou não inscritas na OAB foi decidido que é permitida a vista dos autos processuais às partes; aos advogados em geral, independente do porte instrumento procuratório e também a pessoas estranhas à relação processual.

A vedação ao livre acesso ao processo é restrita aos autos grafados com segredo de justiça sob a motivação legítima de defesa da intimidade das partes ou preservação do interesse público. Observe-se abaixo a decisão procedente nos autos da consulta nº 200710000015168, que reconheceu o direito à publicidade processual. Leia-se:

 

PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO – REGULAMENTO DO TRIBUNAL SOBRE ACESSO AOS AUTOS E CARGA DOS AUTOS CONFLITO ENTRE OS PRINCÍPIOS DA PUBLICIDADE E DA INDISPENSABILIDADE DO ADVOGADO – AUSÊNCIA DE MEIOS PARA O EXERCÍCIO PLENO DO DIREITO DE ACESSO AO PROCESSO – DEFERIMENTO. I – Não se confunde acesso dos autos com a carga dos autos. O acesso significa a concretização do direito de qualquer pessoa compulsar os autos na serventia do Tribunal, enquanto que a carga dos autos é o direito das partes e seus representantes retirarem os autos do processo em que litigam das dependências da Corte. II – Não se mostra razoável permitir que apenas partes integrantes do processo possam acessar e retirar os autos das dependências da Corte, sobretudo para fins de extração de cópias. [...] III – Devem os tribunais ofertar o serviço de fotocópia em suas serventias para possibilitar o direito do acesso e extração de cópias. Não disponibilizando o serviço, deverão permitir, mediante cautela idônea, a retirada dos autos, mesmo que por pessoas estranhas ao processo. IV – Procedimento de controle administrativo a que se dá provimento para anular o ato normativo impugnado.

 

O acesso aos autos fica a critério da administração do magistrado, mas este deverá agir com estrita observância aos princípios constitucionais sobreditos, à legislação vigente e aos normativos expedidos pelo CNJ. O direito do advogado em compulsar os fólios processuais se configura como uma garantia intangível da ampla defesa, pois o livre exercício da advocacia é uma atividade indissociável à administração da justiça.

 

2.1.3.6 Do horário de atendimento aos advogados nas repartições judiciais

 

Perfaz-se como uma prerrogativa do advogado a livre circulação nos recintos em que funcionem repartições judiciais. A proibição da entrada dos patronos jurídicos nestes ambientes em horário integral de funcionamento causa lesões à garantia em comento.

Mesmo fundamentado sob um regramento expresso em lei, é comum a desconsideração de tal prerrogativa por alguns fóruns ou secções judiciárias. Observando a problemática de cerceamento de acesso às repartições públicas em horário integral de funcionamento, a Comissão de Prerrogativas da Ordem dos Advogados do Brasil, com base nos preceitos determinados pela alínea “c”, do inciso VI do artigo 7º da Lei nº 8.906/1994, requereu junto ao CNJ o respeito imperativo à prerrogativa violada por todos os órgãos integrantes do Poder Judiciário brasileiro.

Em resposta à pretensão, o CNJ determinou o livre ingresso dos advogados aos ambientes onde funcionem repartições judiciais durante o período integral de duração do expediente forense, na forma da decisão abaixo colacionada. Note-se:

 

PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO Nº 200910000041875. RELATOR: CONSELHEIRO JEFFERSON KRAVCHYCHYN. REQUERENTE: COMISSAO DE PRERROGATIVAS DA ORDEM DOS REQUERIDO: TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 2ª REGIÃO. ASSUNTO: TRF 2ª REGIÃO – PROIBIÇÃO – RESTRIÇÃO – ACESSO DEPENDENCIAS JUSTIÇA FEDERAL – PARTES PRERROGATIVAS ADVOGADO LEI Nº 8.906/1994. DECISAO LIMINAR: [...] Dado o relevo constitucional da atuação profissional dos advogados, indispensáveis à administração da Justiça (CF, art. 133), a autonomia dos Tribunais para estipulação do horário de expediente deve ser conjugada com a garantia de atendimento dos advogados enquanto haja nos recintos forenses a presença de serventuário (Lei 8.906/94, art. 7º, IV, “c”). Pedido conhecido e parcialmente acolhido para, mantendo intacto o ato administrativo sucessor de ato atacado, determinar que as Secretarias das Varas do Trabalho da Bahia atendam os advogados enquanto houver serventuário em atividade, ainda que aquém ou alem do horário de expediente fixado pela Presidência. (CNJ – PCA 200810000012703 – Rel. Designado Cons. Antonio Umberto de Souza Junior – 80º Seção – j. 17.03.2009 – DJU 06.04.2009).

 

A decisão em tela restabeleceu a prerrogativa dos advogados de livre acesso às repartições judiciais no horário integral do expediente forense. O CNJ, mais uma vez, valorou de forma justa a atuação dos advogados e reconheceu que esse tipo de limitação prejudica a eficiência do Judiciário no intuito de promoção mais célere da tão almejada justiça.

 

3.  A RELEVÂNCIA DO EXERCÍCIO DA ADVOCACIA

 

O intangível respeito às prerrogativas inerentes ao exercício pleno da advocacia facilita o livre acesso do cidadão ao Poder Judiciário. É por meio do advogado que o cidadão obtém provimentos judiciais indispensáveis a sua experiência de vida com dignidade.

Ilustrando essa afirmação, é possível mencionar a obtenção de medidas liminares com o fito de garantir tratamentos terapêuticos e insumos médicos para aliviar o sofrimento de pessoas doentes, a determinação de matrícula para crianças especiais na rede pública de ensino, a concessão de alvará de soltura nos casos de prisão ilegal, entre outros.

O trabalho do advogado realizado sem impedimentos é fator determinante para a formação de uma sociedade justa e harmônica necessária à manutenção da paz e da ordem do Estado Democrático de Direito.

 

3.1 DA INDISPENSABILIDADE DO ADVOGADO À ADMINISTRAÇÃO DA JUSTIÇA

 

A partir da vigência da Constituição da República no ano de 1988, a sociedade, antes reprimida pelo regime totalitário destituído outrora, assumiu uma posição ativista na busca pela efetivação de seus direitos e garantias fundamentais. Desta feita, o volume de ações judicial cresceu consideravelmente, bem como a presença dos advogados tornou-se quase que indispensável para guiar e defender os melhores interesses de seus constituintes.

Houve a afirmação da democracia e a conscientização de que os cidadãos poderiam dispor de provimentos judiciais, desde que suas pretensões fossem amparadas pela legislação vigente. A inércia do Poder Judiciário deve ser quebrada a partir da propositura de ações judiciais aptas a garantir direitos e promover a defesa dos jurisdicionados.

O artigo 133 da Magna Carta expressa à essencialidade da advocacia para a obtenção da justiça. Note-se: “O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei”. Essa concepção reconhece que desvendar a linguagem jurídica, bem como se dirigir ao Poder Judiciário sem o conhecimento dos procedimentos judiciais, não é uma tarefa para leigos.

Há plausibilidade no argumento de que na convivência em sociedade, um grande número de pessoas, independente de grau de instrução, é capaz de identificar abusos e práticas ilegais, mas não são aptas a enfrentar sem assistência jurídica uma batalha judicial.

Assim sendo, o advogado se apresenta como o profissional adequado para interpretar a lei em conformidade com os direitos e interesses de seus clientes. A relação desenvolvida entre clientes e advogados é de extrema confiança e respeito mútuo.

Em conformidade com o texto constitucional anteriormente destacado, o artigo 2º da Lei nº 8.906/94 reafirma a indispensabilidade do advogado à administração da justiça. Sobre o tema, o Supremo Tribunal Federal – STF ratificou a importância do advogado para a administração da justiça em inúmeras decisões. Leia-se:

 

A CF/88 determina que ‘o advogado é indispensável à administração da justiça’ (art. 133). É por intermédio dele que se exerce ‘o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes’ (art. 5º, LV). O falecimento do patrono do réu cinco dias antes da publicação do acórdão, do STJ, que não admitiu o agravo de instrumento consubstancia situação relevante. Isso porque, havendo apenas um advogado constituído nos autos, a intimação do acórdão tornou-se impossível após a sua morte. Em consequência, o paciente ficou sem defesa técnica. Há, no caso, nítida violação do contraditório e da ampla defesa, a ensejar a desconstituição do trânsito em julgado do acórdão e a devolução do prazo recursal, bem assim a restituição da liberdade do paciente, que respondeu à ação penal solto.” (HC 99.330, Rel. Min. Cezar Peluso, julgamento em 16-3-2010, Segunda Turma, DJE de 23-4-2010).

 

Nesse contexto, Nacif (2010, p. 32) afirma que a atuação do advogado se irradia aos atos de gestão do Poder Judiciário. Observe-se:

 

Todavia, a indispensabilidade do advogado vai muito além e torna necessária a intervenção desses profissionais não só no processo judicial, mas, também, e com igual imprescindibilidade, nos atos de gestão de todos os órgãos judiciários do país. Afinal de contas, a expressão “administração da justiça” engloba, além da prestação jurisdicional propriamente dita, os atos de “gestão da justiça”.

Analisando o conteúdo já explanado, pode-se afirmar que os advogados não detêm o direito de intervir na administração do Poder Judiciário. Tal possibilidade de interferência somente é legítima na hipótese de haver prejuízos ao processo patrocinado. Forçoso é reconhecer que na defesa da classe jurídica corriqueiramente são vistas movimentações capitaneadas pela OAB. Valorizar o profissional da advocacia é mais que valorizar a justiça, é respeitar a sociedade e promover progresso no intuito de obter a harmonia e a paz coletiva.

 

3.2 A ADVOCACIA E O CNJ

 

O Conselho Nacional de Justiça é um órgão detentor da missão de auxiliar o Poder Judiciário no alcance da celeridade processual, no respeito às partes que integram as lides judiciais e, sobretudo, em relação ao controle, transparência e aperfeiçoamento dos atos de gestão administrativa e processual. A legitimidade para atuação do CNJ encontra abrigo legal nos ditames do artigo 103 – B da Constituição da República de 1988. Pode-se inferir que desde a criação do órgão em comento, no ano de 2004, houve significativa melhora em relação aos trabalhos desenvolvidos por magistrados de todo o País.

As problemáticas apontadas ao desempenho das funções do Poder Judiciário envolvem temas delicados, tais como morosidade judicial, corrupção de magistrados, favorecimento pessoal, tráfico de influência, nepotismo, irregularidades administrativas e licitatórias, entre outros. É válido lembrar que são os advogados que lidam e sofrem diretamente as consequências dos problemas destacados, uma vez que as partes não entendem a motivação para tanta demora, bem como para a prática de atos ilícitos. Em vista disso, com o fito de ouvir os anseios da classe dos advogados, o CNJ incluiu em seus quadros vagas para advogados de notável saber jurídico, na forma delimitada pelo artigo 103–B da Constituição Federal de 1988. Observe-se:

Art. 103-B. O Conselho Nacional de Justiça compõe-se de 15 (quinze) membros com mandato de 2 (dois) anos, admitida 1 (uma) recondução, sendo:

[...]

XII dois advogados, indicados pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil;

[...]

§ 6º Junto ao Conselho oficiarão o Procurador-Geral da República e o Presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil.

Em atenção às regras constitucionais, são atribuições do CNJ: controlar a atua

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